
| D.E. Publicado em 22/08/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Terceira Seção do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, em juízo rescindendo, julgar improcedente a presente ação rescisória, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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AÇÃO RESCISÓRIA Nº 0000044-43.2013.4.03.0000/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de ação rescisória proposta por IRENO DE PAULA CAMARGO em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, com fundamento no artigo 485, V e IX, do CPC/1973, objetivando rescindir sentença de mérito, a fim de que lhe seja concedido auxílio-doença, desde o requerimento administrativo em 26.10..2000, convertendo-o em aposentadoria por invalidez, a partir da realização da perícia médica judicial.
Aduziu que o julgado rescindendo violou disposição literal do artigo 58, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91, bem como incorreu em erro de fato, pois, no seu entender, "o AVC nada mais é que o agravamento de uma hipertensão arterial severa", sendo que esta teve início desde 1997, razão pela qual não se trataria de doença preexistente, uma vez que originada na época em que detinha qualidade de segurado.
À fl. 196, foram deferidos ao autor os benefícios da assistência judiciária gratuita.
Citado (fls. 198-199), o réu apresentou contestação e documentos, às fls. 201-214, alegando, em preliminar, a ausência de interesse de agir e, no mérito, a inexistência de violação à literal disposição de lei ou erro de fato.
O autor ofereceu réplica (fl. 217-220).
À fl. 225, foi rejeitada a preliminar suscitada, oportunizando-se às partes a especificação de provas. O autor se manteve inerte (fl. 225v) e o réu informou não ter provas a produzir (fl. 226).
O Ministério Público Federal opinou pela improcedência da ação rescisória (fls. 229-238).
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, verifico que a presente demanda foi ajuizada em 07.01.2013, observado o prazo decadencial previsto no artigo 495 do CPC/1973, dada o trânsito em julgado no processo originário ocorrido em 16.07.2012 (fl. 193)
O autor fundamenta a ação rescisória no artigo 485, V e IX, do CPC/1973, sob a alegação de violação à disposição literal do artigo 58, parágrafo único, da Lei n.º 8.213/91 e ocorrência de erro de fato no julgado rescindendo, pois, no seu entender, "o AVC nada mais é que o agravamento de uma hipertensão arterial severa", sendo que esta teve início desde 1997, razão pela qual não se trataria de doença preexistente, uma vez que originada na época em que detinha qualidade de segurado.
Na ação subjacente, ajuizada em 04.07.2008, o autor postulou a concessão de auxílio-doença, a partir do indeferimento administrativo em 06.05.2008, com sua conversão em aposentadoria por invalidez, a partir do ajuizamento (fls. 08v-12). Aduziu ser "portador de doenças identificadas pelo CID: G46.0, I64 e I10", bem como que percebeu auxílio-doença administrativamente, entre 29.10.1998 e 20.09.2000, fazendo "jus ao restabelecimento de seu benefício, tendo em vista que ainda se encontra na situação acima descrita desde a primeira concessão do benefício em 1998, conforme atestado em anexo".
Para comprovação do alegado, juntou àqueles autos:
1) atestado médico, sem data, declarando que o autor esteve sob cuidados médicos "no período de 03/06/97 a 02/10/00", com indicação do "CID I10" (fl. 29);
2) tomografia computadorizada de crânio, datada de 23.04.2006 (fls. 30 e 32);
3) atestado médico, datado de 29.11.2006, informando que o autor "é portador de sequela de AVC com hemiplegia. Está total e definitivamente incapaz para o trabalho. I10 G46.0 I64" (fl. 31);
4) receitas de medicamentos (fls. 33-34).
Consta que o autor teve vínculos empregatícios (fls. 19-21) de 01.02.1990 a 30.03.1990 (auxiliar de campo em estabelecimento atacadista) e 02.08.1993 a 30.11.1997 (motorista), bem como que recolheu contribuições na qualidade de segurado facultativo nas competências de janeiro a abril de 2008 (fl. 51).
Ainda, conforme extratos anexos do CNIS e Sistema Único de Benefício, esteve em gozo de auxílio-doença no período de 23.09.1998 a 20.09.2000 (CID I10), tendo posteriormente requerido o benefício em duas oportunidades (28.06.2006 e 19.05.2008), constando em ambas o motivo de indeferimento "perda da qualidade de segurado", haja vista a constatação de incapacidade pela perícia médica desde abril de 2006 (CID I64).
Consta laudo médico pericial (fls. 86-88), datado de 22.04.2010, no qual o perito afirma que o autor:
Em razão da alegação do autor de que "está acometido de males cardiológicos e palpitações advém (sic) desde o ano de 1997" (fl. 163), foi apresentado laudo pericial complementar (fl. 177), em que o perito assentou:
Em 1ª Instância, o pedido foi julgado improcedente (fls. 186-190), verbis:
Sem interposição de recurso pelas partes, foi certificado o trânsito em julgado ocorrido em 16.07.2012 (fl. 193).
A viabilidade da ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei pressupõe violação frontal e direta da literalidade da norma jurídica, não se admitindo a mera ofensa reflexa ou indireta (confira-se: STJ, S1, AR 4264, relator Ministro Humberto Martins, DJe 02.05.2016).
Ressalto que, em 13.12.1963, o e. Supremo Tribunal Federal fixou entendimento, objeto do enunciado de Súmula n.º 343, no sentido de que "não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais".
Para que seja possível a rescisão do julgado por violação literal de lei decorrente de valoração da prova, esta deve ter sido de tal modo desconexa que resulte em pungente ofensa à norma vigente ou em absoluto descompasso com os princípios do contraditório ou da ampla defesa.
De outro lado, para que seja reconhecido erro de fato, hábil à rescisão da coisa julgada na forma do artigo 485, IX, §§ 1º e 2º, do CPC/1973, exige-se que, sem que tenha havido controvérsia ou pronunciamento judicial sobre o fato, o julgado tenha admitido um fato inexistente ou considerado inexistente um fato efetivamente ocorrido, que tenha influído de forma definitiva para a conclusão do decidido.
Ainda, o erro de fato, necessariamente decorrente de atos ou documentos da causa, deve ser aferível pelo exame do quanto constante dos autos da ação subjacente, sendo inadmissível a produção de provas na demanda rescisória a fim de demonstrá-lo.
Nesse sentido, encontra-se sedimentada a jurisprudência dos Tribunais superiores e desta Corte:
Verifica-se que o não reconhecimento do direito a benefício previdenciário por incapacidade laborativa se deu em razão da perda de qualidade de segurado.
É patente a inexistência de erro de fato no julgado, seja em decorrência da controvérsia entre as partes quanto à comprovação da qualidade de segurado, seja porque houve pronunciamento judicial expresso sobre o fato.
O autor teve vínculos empregatícios de 01.02.1990 a 30.03.1990 e 02.08.1993 a 30.11.1997, bem como recolheu contribuições na qualidade de segurado facultativo nas competências de janeiro a abril de 2008.
Esteve em gozo de auxílio-doença no período de 23.09.1998 a 20.09.2000, em decorrência de hipertensão arterial, registre-se, em relação à referida doença, que o atestado médico juntado pelo autor delimita expressamente o período de tratamento da moléstia entre 03.06.1997 e 02.10.2000.
Em abril de 2006, sofreu acidente vascular cerebral, remanescendo sequelas, inclusive hemiplegia, que o incapacitam total e definitivamente para o trabalho.
Ainda que a hipertensão arterial seja um fator de risco para a ocorrência de um AVC, tal como salientado pelo perito médico, não há qualquer elemento médico que indique a existência de incapacidade laborativa, relacionada à hipertensão arterial, a partir de outubro de 2000, tampouco sobre a ocorrência de complicações médicas de qualquer natureza decorrentes do quadro de hipertensão arterial ao longo dos anos.
O perito judicial foi assertivo ao avaliar a inexistência de elementos que indiquem a presença de complicações cardíacas, renais, oftalmológicas ou outras de qualquer natureza que pudessem ser atribuídas à hipertensão arterial e que estivessem interferindo no cotidiano ou na condição laborativa do autor. Categoricamente afirmou que a sua incapacidade laborativa está diretamente relacionada a sequelas de derrame cerebral ocorrido em abril de 2006, fixando nesse período a data de início da incapacidade laborativa.
Não há dúvida que o autor apresenta quadro de hipertensão arterial desde 1997, entretanto, somente esteve incapacitado para suas atividades laborativas em decorrência dessa moléstia no período de 1998 a 2000, tendo recebido auxílio-doença, na própria via administrativa.
Somente em abril de 2006, em função do AVC sofrido, voltou a se encontrar incapacitado para suas atividades laborativas, ocasião em que requereu administrativamente o benefício, que lhe foi negado em razão da perda da qualidade de segurado, embora reconhecida a existência de incapacidade laborativa desde abril de 2006, por decorrência do IVC.
Considerado o último vínculo empregatício, findado em novembro de 1997, e o gozo de benefício por incapacidade até setembro de 2000, o autor manteve sua qualidade de segurado até 15.11.2001, na forma do artigo 15 da Lei n.º 8.213/91. Assim, em abril de 2006, quando sofreu o AVC cujas sequelas implicaram sua incapacidade total e permanente para o trabalho, o autor há muito havia perdido a qualidade de segurado.
Em 2008, o autor recolheu as quatro contribuições necessárias para recuperar a qualidade de segurado e carência, reiterando seu requerimento de benefício imediatamente após tais recolhimentos, entretanto, sobreveio nova recusa administrativa, haja vista inalterada a situação de incapacidade laborativa desde abril de 2006, logo, preexistente à refiliação ao RGPS ocorrida em 2008.
Ressalto que, da mesma forma que o juízo não está adstrito ao laudo pericial, ante o princípio do livre convencimento motivado e o disposto nos artigos 436 do CPC/1973 e 479 do CPC/2015, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juízo o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame (Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010).
Tem-se, ainda, que os benefícios previdenciários por incapacidade são concedidos ou indeferidos rebus sic stantibus, ou seja, conforme a situação no momento da decisão. Com efeito, o próprio legislador estabeleceu a necessidade de perícias periódicas tendo em vista que a incapacidade laborativa, por sua própria essência, pode ser suscetível de alteração com o decurso do tempo. Assim, a decisão judicial exarada se mantém íntegra enquanto perdurarem as condições aferidas ao tempo da sua prolação, revelando-se a excepcionalidade de rescisão de julgados revestidos da característica rebus sic stantibus. Em caso de alteração da situação jurídica ou fática, inclusive por meio de novas provas, os pedidos podem ser renovados na esfera administrativa e/ou judicial.
Assim, o julgado não se afastou dos parâmetros legais e jurisprudenciais que existiam à época. Tem-se que o Juízo originário apreciou as provas segundo seu livre convencimento, de forma motivada e razoável, tendo adotado uma solução jurídica, dentre outras, admissível.
A excepcional via rescisória não é cabível para mera reanálise das provas. Nesse sentido, confira-se precedentes desta 3ª Seção:
Dessa forma, não reconheço a ocorrência de erro de fato ou violação à literal disposição das normas que regulam o direito aos benefícios previdenciários decorrentes de incapacidade laborativa.
Ante o exposto, em iudicium rescindens, julgo improcedente a presente ação rescisória, nos termos dos artigos 269, I, do CPC/1973 e 487, I, do CPC/2015.
Custas na forma da lei.
Condeno o autor no pagamento de honorários advocatícios que fixo em R$ 1.000,00 (mil reais), devidamente atualizado e acrescido de juros de mora, conforme estabelecido no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal para as dívidas civis, conforme prescrevem os §§ 2º, 4º, III, e 8º, do artigo 85 do CPC. A exigibilidade ficará suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no artigo 98, § 3º, do CPC.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 10/08/2018 15:46:07 |
