Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5002452-26.2017.4.03.6128
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
30/07/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 05/08/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. ATIVIDADE COMUM. NÃO
COMPROVAÇÃO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES DEVIDA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
MAJORADOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA.
1 - Até o advento da Lei nº 9.784/99 não havia previsão no ordenamento jurídico de prazo de
caducidade, de modo que os atos administrativos praticados até 01/02/1999 (data de vigência da
Lei) poderiam ser revistos pela Administração a qualquer tempo. Já com a vigência da indicada
legislação, o prazo decadencial para as revisões passou a ser de 05 (cinco) anos e, com a
introdução do art. 103-A, foi estendido para 10 (dez) anos.
2 - O lapso de 10 (dez) anos extintivo do direito de o ente público previdenciário rever seus atos
somente pode ser aplicado a partir de fevereiro de 1999, conforme restou assentado pelo C.
Superior Tribunal de Justiça, por meio da sistemática dos recursos repetitivos, quando do
julgamento do REsp 1.114.938/AL.
3 - Sendo o benefício previdenciário concedido em data anterior à Lei nº 9.784/99, o ente
autárquico tem até 10 (dez) anos, a contar da data da publicação de tal Lei, para proceder à
revisão do ato administrativo (inicio do prazo decadencial em 01 de fevereiro de 1991, vindo a
expirar em 01 de fevereiro de 2009); por sua vez, para os benefícios concedidos após a vigência
da Lei em tela, a contagem do prazo em comento se dará a partir da concessão da prestação.
4 - No caso dos autos, foi concedido benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com
data de início em 05/06/2002 (ID 4132552 – p. 20). O INSS, em 31/12/2009 (ID 4132552 – p. 29),
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
apontou a existência de irregularidades na aposentadoria concedida, em razão de sua concessão
por servidora demitida a bem do serviço público (ID 4132557 – p. 01). Assim, de rigor o
reconhecimento de que, naquela ocasião, não se havia operado a decadência do direito de
revisão da benesse, nos moldes do entendimento acima esposado.
5 - É expressa a redação do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que não se
admite a prova exclusivamente testemunhal para a comprovação do tempo de serviço para a
aquisição do benefício vindicado, exigindo-se ao menos o denominado início de prova material
para a sua comprovação.
6 - Alega a parte autora que trabalhou junto à empresa Nadir Salvador e que o INSS teria
extraviado uma das três CTPS apresentadas no procedimento administrativo. No entanto,
conforme o Resumo de Documentos para Cálculos (ID 4132552 – p. 7) e Termo de Retenção de
Documentos (ID 4132552 – p. 38) a autarquia só recebeu duas CTPS.
7 - A parte autora junta como prova do labor exercido a declaração de uma testemunha (ID
4132552 – p. 40), o que não configura início de prova material apto a ensejar o reconhecimento
do período em questão.
8 - Na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores pagos
indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II, da Lei
8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99.
9 - Ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador
reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas
alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
10 - Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o
enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício
ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio financeiro
e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais segurados e
em risco à continuidade dessa rede de proteção.
11 - Ainda que tenha restado comprovado na seara administrativa que o servidor teve
participação na concessão irregular do benefício, quem usufruiu da vantagem decorrente do ato
ilícito foi a autora, razão pela qual não há como dissociar o desfalque ao erário público do
recebimento de aposentadoria indevida.
12 - Em decorrência, constatado o nexo de causalidade entre o dano aos cofres públicos e o ato
ilícito praticado, a restituição dos valores recebidos pela autora indevidamente, a título de
aposentadoria por tempo de contribuição, é medida que se impõe, nos termos do artigo 927 do
Código Civil.
13 - Majoração dos honorários advocatícios nos termos do artigo 85, §11, CPC, respeitados os
limites dos §§2º e 3º do mesmo artigo.
14 - Apelação da parte autora desprovida.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002452-26.2017.4.03.6128
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: RAQUEL MARQUES DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: SAMARA REGINA JACITTI - SP276354-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002452-26.2017.4.03.6128
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: RAQUEL MARQUES DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: SAMARA REGINA JACITTI - SP276354-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta por RAQUEL MARQUES DA SILVA, em ação previdenciária
ajuizada contra o INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando o
restabelecimento de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de
período de trabalho urbano comum.
A r. sentença de ID 4132636 julgou improcedente o pedido. A parte autora foi condenada no
pagamento de custas e honorários advocatícios fixados em 10% do valor da causa, restando
suspensa a execução em virtude da concessão dos benefícios da Justiça Gratuita.
Em razões recursais de ID 4132638, a parte autora sustenta que a prova testemunhal deve ser
aceita para a comprovação do vínculo empregatício junto à empresa Nadir Salvador, no período
de 01/03/1970 a 02/01/1971, uma vez que a autarquia haveria extraviado uma das CTPS
apresentadas no procedimento administrativo e que a referida empregadora não mais exerce
atividade. Sustenta, ainda, que a autarquia não poderia revisar o benefício, pois consumado o
prazo decadencial e que os valores recebidos não devem ser devolvidos, pois não comprovada
má-fé da segurada.
Devidamente processado o recurso, sem contrarrazões, foram os autos remetidos a este
Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5002452-26.2017.4.03.6128
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: RAQUEL MARQUES DA SILVA
Advogado do(a) APELANTE: SAMARA REGINA JACITTI - SP276354-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXMO. SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Do prazo decadencial para a revisão de atos administrativos
Pretende a parte autora obter a cassação do processo administrativo que determinou a
suspensão/cancelamento do seu benefício, com o seu restabelecimento imediato.
No ponto, destaco que, anteriormente à vigência da Lei nº 9.784/99, a Administração podia
rever seus atos a qualquer tempo.
Em sua vigência, importante destacar que a Lei do Processo Administrativo em comento
estabelecia, em seu art. 54, que "o direito da Administração de anular os atos administrativos
que decorram efeitos favoráveis para os destinatários, decai em cinco anos, contados da data
em que foram praticados, salvo comprovada má-fé". Porém, antes de decorridos os 05 (cinco)
anos previstos na citada Lei, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela
Medida Provisória nº 138 (de 19/11/2003), convertida na Lei nº 10.839/04, que acrescentou o
art. 103-A a Lei nº 8.213/91, fixando em 10 (dez) anos o prazo decadencial para o Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS rever os seus atos de que decorram efeitos favoráveis a seus
beneficiários. O referido art. 103-A, da Lei nº 8.213/91, encontra-se assim redigido:
"O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram efeitos
favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram
praticados, salvo comprovada má-fé. § 1º. No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo
decadencial contar-se-á da percepção do primeiro pagamento (...)".
Cumpre ressaltar que até o advento da Lei nº 9.784/99 não havia previsão no ordenamento
jurídico de prazo de caducidade, de modo que os atos administrativos praticados até
01/02/1999 (data de vigência da Lei) poderiam ser revistos pela Administração a qualquer
tempo. Já com a vigência da indicada legislação, o prazo decadencial para as revisões passou
a ser de 05 (cinco) anos e, com a introdução do art. 103-A, foi estendido para 10 (dez) anos.
Destaque-se que o lapso de 10 (dez) anos extintivo do direito de o ente público previdenciário
rever seus atos somente pode ser aplicado a partir de fevereiro de 1999, conforme restou
assentado pelo C. Superior Tribunal de Justiça, por meio da sistemática dos recursos
repetitivos, quando do julgamento do REsp 1.114.938/AL, cuja ementa segue abaixo transcrita:
"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA A DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DA RENDA MENSAL INICIAL DOS BENEFÍCIOS
PREVIDENCIÁRIOS CONCEDIDOS EM DATA ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI 9.787/99.
PRAZO DECADENCIAL DE 5 ANOS, A CONTAR DA DATA DA VIGÊNCIA DA LEI 9.784/99.
RESSALVA DO PONTO DE VISTA DO RELATOR. ART. 103-A DA LEI 8.213/91,
ACRESCENTADO PELA MP 19.11.2003, CONVERTIDA NA LEI 10.839/2004. AUMENTO DO
PRAZO DECADENCIAL PARA 10 ANOS. PARECER DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PELO DESPROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO, NO ENTANTO.
1. A colenda Corte Especial do STJ firmou o entendimento de que os atos administrativos
praticados antes da Lei 9.784/99 podem ser revistos pela Administração a qualquer tempo, por
inexistir norma legal expressa prevendo prazo para tal iniciativa. Somente após a Lei 9.784/99
incide o prazo decadencial de 5 anos nela previsto, tendo como termo inicial a data de sua
vigência (01.02.99). Ressalva do ponto de vista do Relator. 2. Antes de decorridos 5 anos da
Lei 9.784/99, a matéria passou a ser tratada no âmbito previdenciário pela MP 138, de
19.11.2003, convertida na Lei 10.839/2004, que acrescentou o art. 103-A à Lei 8.213/91 (LBPS)
e fixou em 10 anos o prazo decadencial para o INSS rever os seus atos de que decorram
efeitos favoráveis a seus beneficiários. 3. Tendo o benefício do autor sido concedido em
30.7.1997 e o procedimento de revisão administrativa sido iniciado em janeiro de 2006, não se
consumou o prazo decadencial de 10 anos para a Autarquia Previdenciária rever o seu ato. 4.
Recurso Especial do INSS provido para afastar a incidência da decadência declarada e
determinar o retorno dos autos ao TRF da 5a. Região, para análise da alegada inobservância
do contraditório e da ampla defesa do procedimento que culminou com a suspensão do
benefício previdenciário do autor"
(REsp 1114938/AL, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 14/04/2010, DJe 02/08/2010).
Desta forma, sendo o benefício previdenciário concedido em data anterior à Lei nº 9.784/99, o
ente autárquico tem até 10 (dez) anos, a contar da data da publicação de tal Lei, para proceder
à revisão do ato administrativo (inicio do prazo decadencial em 01 de fevereiro de 1991, vindo a
expirar em 01 de fevereiro de 2009); por sua vez, para os benefícios concedidos após a
vigência da Lei em tela, a contagem do prazo em comento se dará a partir da concessão da
prestação.
No caso dos autos, foi concedido benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, com
data de início em 05/06/2002 (ID 4132552 – p. 20).
O INSS, em 31/12/2009 (ID 4132552 – p. 29), apontou a existência de irregularidades na
aposentadoria concedida, em razão de sua concessão por servidora demitida a bem do serviço
público (ID 4132557 – p. 01). Assim, de rigor o reconhecimento de que, naquela ocasião, não
se havia operado a decadência do direito de revisão da benesse, nos moldes do entendimento
acima esposado.
Do período de labor urbano comum
No que diz respeito ao pleito de reconhecimento do suposto labor urbano exercido sem prova
de registro formal, cumpre verificar a dicção da legislação afeta ao tema em questão, qual seja,
a aposentadoria por tempo de contribuição, tratado nos artigos 52 e seguintes da Lei nº
8.213/1991.
A esse respeito, é expressa a redação do artigo 55, § 3º, do diploma citado, no sentido de que
não se admite a prova exclusivamente testemunhal para a comprovação do tempo de serviço
para a aquisição do benefício vindicado, exigindo-se ao menos o denominado início de prova
material para a sua comprovação.
No mesmo sentido é o posicionamento da jurisprudência pátria:
"PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TRABALHO URBANO. DECLARAÇÃO DO
EMPREGADOR. AUSÊNCIA DE PROVA MATERIAL.
1. A declaração da empresa quanto à prestação de serviço no período em que se pleiteia o
reconhecimento não pode ser admitida como início de prova material, servindo de prova
testemunhal, como já decidiu o e. Superior Tribunal de Justiça em situações análogas.
2. A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação de atividade laboral, sendo
imprescindível um início razoável de prova material.
3. Apelação desprovida.
(AC 00076488620124036112, DESEMBARGADOR FEDERAL BAPTISTA PEREIRA, TRF3 -
DÉCIMA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:03/03/2017 ..FONTE_REPUBLICACAO:.)"
Do período pretendido: 01/03/1970 a 02/01/1971
Alega a parte autora que trabalhou nesse período junto à empresa Nadir Salvador e que o INSS
teria extraviado uma das três CTPS apresentadas no procedimento administrativo.
No entanto, conforme o Resumo de Documentos para Cálculos (ID 4132552 – p. 7) e Termo de
Retenção de Documentos (ID 4132552 – p. 38) a autarquia só recebeu duas CTPS.
A parte autora junta como prova do labor exercido a declaração de uma testemunha (ID
4132552 – p. 40), o que não configura início de prova material apto a ensejar o reconhecimento
do período em questão.
Da devolução dos valores recebidos
Discute-se a exigibilidade dos valores pagos indevidamente à parte autora, a título de
aposentadoria por tempo de contribuição, na seara administrativa.
O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na equidade, constitui alicerce
do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente disciplinado pelo
artigo 884 do Código Civil de 2002, in verbis:
"Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a
restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários."
Desse modo, todo acréscimo patrimonial obtido por um sujeito de direito que acarrete
necessariamente o empobrecimento de outro, deve possuir um motivo juridicamente legítimo,
sob pena de ser considerado inválido e seus valores serem restituídos ao anterior proprietário.
Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão, o ordenamento jurídico disponibiliza à
parte lesada os instrumentos processuais denominados ações in rem verso, a fim de assegurar
o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação de repetição de indébito.
A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a
Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por
ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de
vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no
Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores
pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II,
da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99, in verbis:
"Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
(...)
II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou
além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão
judicial, nos termos do disposto no Regulamento. (Redação dada pela Medida Provisória nº
871, de 2019)"
Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador
reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas
alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
Neste sentido, deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e
o enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de
benefício ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o
equilíbrio financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os
demais segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
Ora, ainda que tenha restado comprovado na seara administrativa que o servidor teve
participação na concessão irregular do benefício, quem usufruiu da vantagem decorrente do ato
ilícito foi a autora, razão pela qual não há como dissociar o desfalque ao erário público do
recebimento de aposentadoria indevida.
Em decorrência, constatado o nexo de causalidade entre o dano aos cofres públicos e o ato
ilícito praticado, a restituição dos valores recebidos pela autora indevidamente, a título de
aposentadoria por tempo de contribuição, é medida que se impõe, nos termos do artigo 927 do
Código Civil.
Neste sentido, reporto-me aos seguintes precedentes desta Corte Regional:
"PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. BENEFÍCIO DE AUXÍLIO-
DOENÇA. PAGAMENTO INDEVIDO. PREVISÃO DO ART. 37, § 5º, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL LIMITADA ÀS AÇÕES PARA APURAÇÃO DE ATOS DE IMPROBIDADE. PRAZO
PRESCRICIONAL DO DECRETO Nº 20.910/32. INOCORRÊNCIA. AFASTADA A BOA-FÉ.
DANO AO ERÁRIO. RESSARCIMENTO DEVIDO.
- Inaplicável, in casu, a aplicação da regra do art. 37, § 5º, da Constituição Federal, tendo em
vista que o seu campo de aplicação se limita às ações decorrentes de atos de improbidade.
- Tendo em vista o disposto no Decreto nº 20.910/32, que preceitua o prazo prescricional de
cinco anos para as pretensões ressarcitórias exercidas contra a Fazenda Pública, e, à míngua
de previsão legal e em respeito aos princípios da isonomia e da simetria, deve o mesmo prazo
ser aplicado nas hipóteses em que a Fazenda Pública é a autora da ação. Ajuizada a ação em
23.11.2015 e findo o processo administrativo em 2011, não há que se falar em prescrição.
- Consta dos autos do processo administrativo que, em auditoria, o Instituto Nacional do Seguro
Social-INSS identificou indício de irregularidade na concessão e manutenção do benefício de
auxílio-doença que consistiu na inserção de vínculo falso no CNIS que possibilitou o
reconhecimento da qualidade de segurado para a concessão indevida.
- É assegurada à Administração Pública a possibilidade de revisão dos atos por ela praticados,
com base no seu poder de autotutela, conforme se observa, respectivamente, das Súmulas n.º
346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
- Oportunizada administrativamente a demonstração dos vínculos excedentes, quedou-se a
requerida inerte.
- O Relatório Conclusivo Individual contido no processo administrativo de cobrança é claro ao
apontar que a concessão do benefício somente foi possível considerando-se os vínculos de
trabalho inexistentes, que foram irregularmente inseridos no sistema somente para concessão
do benefício.
- Conquanto a boa-fé se presuma, esta presunção é juris tantum e, por meio do cotejo das
provas coligidas aos autos, restou amplamente comprovada a má-fé do requerido.
- Presentes os pressupostos à condenação da requerida ao ressarcimento do dano advindo do
recebimento indevido de benefício em razão de fraude, porquanto comprovados o dano e o
nexo causal, a conduta ilícita e dolosa e elidida a presunção juris tantum de boa-fé.
- Honorários advocatícios majorados ante a sucumbência recursal, observando-se o limite legal,
nos termos do §§ 2º e 11 do art. 85 do CPC/2015, observada a gratuidade da justiça.
- Apelação da ré desprovida.”
(TRF 3ª Região, 9ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5009330-02.2018.4.03.6105, Rel.
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN, julgado em 05/09/2019, e - DJF3
Judicial 1 DATA: 09/09/2019)
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO. RENDA MENSAL VITALÍCIA.
PAGAMENTO INDEVIDO. DECLARAÇÃO FALSA. REVISÃO ADMINISTRATIVA.
NECESSIDADE DE DEVOLUÇÃO. ARTIGOS 884 DO CÓDIGO CIVIL E 115, II, DA LBPS.
CONTROLE ADMINISTRATIVO. AUSÊNCIA DE BOA-FÉ. DESCONTO DE 30% POSSÍVEL.
PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. ALTERAÇÃO DO PEDIDO EM SEDE RECURSAL.
INVIABILIDADE. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.
- No caso, a parte autora percebeu renda mensal vitalícia indevidamente, desde 08/6/1995
(carta de concessão à f. 26). Isso porque já recebia pensão por morte desde 05/8/1982 (NB
21/070.260.812-2) e declarou ao INSS não possuir qualquer renda. Ela declarou que "não
possuo bens, não recebo pensão e nenhum tipo de aposentadoria" (f. 40). Trata-se de
declaração ideologicamente falsa, que gerou efeitos jurídicos assaz relevantes.
- Em revisão administrativa, o INSS considerou ilegal a percepção do benefício assistencial por
ultrapassar, muito, a renda familiar per capita prevista no § 3º, do artigo 20 da LOAS. Assim, o
INSS passou a efetuar a cobrança de R$ 113.324,18 (f. 41), a título de pagamento indevido,
passando a efetuar descontos de 30% na renda mensal ad pensão por morte.
- A Administração Pública tem o dever de fiscalização dos seus atos administrativos, pois goza
de prerrogativas, entre as quais o controle administrativo, sendo dado rever os atos de seus
próprios órgãos, anulando aqueles eivados de ilegalidade, bem como revogando os atos cuja
conveniência e oportunidade não mais subsista.
- Quando patenteado o pagamento a maior de benefício, o direito de a Administração obter a
devolução dos valores é inexorável, ainda que tivessem sido recebidos de boa-fé, à luz do
disposto no artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91. Trata-se de norma cogente, que obriga o
administrador a agir, sob pena de responsabilidade.
- O presente caso constitui hipótese de enriquecimento ilícito (ou enriquecimento sem causa ou
locupletamento). O Código Civil estabelece, em seu artigo 876, que, tratando-se de pagamento
indevido, "Todo aquele que recebeu o que não era devido fica obrigado a restituir".
- O princípio da moralidade administrativa, conformado no artigo 37, caput, da Constituição da
República, obriga a autarquia previdenciária a efetuar a cobrança dos valores indevidamente
pagos, na forma do artigo 115, II, da Lei nº 8.213/91.
- A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Resp 1.401.560/MT,
submetido à sistemática dos recursos repetitivos, pacificou o entendimento de que é possível a
restituição de valores percebidos a título de benefício previdenciário, em virtude de decisão
judicial precária posteriormente revogada, independentemente da natureza alimentar da verba e
da boa-fé do segurado.
- No caso, a devolução é imperativa porquanto se apurou a ausência de boa-fé objetiva (artigo
422 do Código Civil).
- Por fim, não há possibilidade de reconhecimento da prescrição no presente caso. Conquanto
matéria de ordem pública, não há pedido nesse sentido, o seu reconhecimento implicando
violação da regra do artigo 264, § único, do CPC/73. Inviável, assim, a alteração do pedido
(limitado à redução dos descontos de 30% para 5%) em sede recursal.
- Quanto à regra do artigo 46, § 1º, da Lei nº 8112/91, não se pode aplicá-la nas relações
previdenciárias do Regime Geral, por ausência de lacunas, haja vista trazer a Lei nº 8.213/91
regra própria em seu artigo 115 e §§.
- Agravo legal desprovido."
(TRF 3ª Região, NONA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 2142041 - 0007899-
57.2014.4.03.6105, Rel. JUIZ CONVOCADO RODRIGO ZACHARIAS, julgado em 07/03/2018,
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/03/2018)
Em atenção ao disposto no artigo 85, §11, do CPC, ficam os honorários advocatícios majorados
em 2%, respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
Diante do exposto, nego provimento à apelação da parte autora e majoro os honorários
advocatícios em 2%, nos termos do art. 85, §11, do CPC, mantendo, no mais, a r. sentença
proferida em 1º grau de jurisdição.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. DECADÊNCIA. NÃO OCORRÊNCIA. ATIVIDADE COMUM.
NÃO COMPROVAÇÃO. DEVOLUÇÃO DOS VALORES DEVIDA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS MAJORADOS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA DESPROVIDA.
1 - Até o advento da Lei nº 9.784/99 não havia previsão no ordenamento jurídico de prazo de
caducidade, de modo que os atos administrativos praticados até 01/02/1999 (data de vigência
da Lei) poderiam ser revistos pela Administração a qualquer tempo. Já com a vigência da
indicada legislação, o prazo decadencial para as revisões passou a ser de 05 (cinco) anos e,
com a introdução do art. 103-A, foi estendido para 10 (dez) anos.
2 - O lapso de 10 (dez) anos extintivo do direito de o ente público previdenciário rever seus atos
somente pode ser aplicado a partir de fevereiro de 1999, conforme restou assentado pelo C.
Superior Tribunal de Justiça, por meio da sistemática dos recursos repetitivos, quando do
julgamento do REsp 1.114.938/AL.
3 - Sendo o benefício previdenciário concedido em data anterior à Lei nº 9.784/99, o ente
autárquico tem até 10 (dez) anos, a contar da data da publicação de tal Lei, para proceder à
revisão do ato administrativo (inicio do prazo decadencial em 01 de fevereiro de 1991, vindo a
expirar em 01 de fevereiro de 2009); por sua vez, para os benefícios concedidos após a
vigência da Lei em tela, a contagem do prazo em comento se dará a partir da concessão da
prestação.
4 - No caso dos autos, foi concedido benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
com data de início em 05/06/2002 (ID 4132552 – p. 20). O INSS, em 31/12/2009 (ID 4132552 –
p. 29), apontou a existência de irregularidades na aposentadoria concedida, em razão de sua
concessão por servidora demitida a bem do serviço público (ID 4132557 – p. 01). Assim, de
rigor o reconhecimento de que, naquela ocasião, não se havia operado a decadência do direito
de revisão da benesse, nos moldes do entendimento acima esposado.
5 - É expressa a redação do artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/1991, no sentido de que não se
admite a prova exclusivamente testemunhal para a comprovação do tempo de serviço para a
aquisição do benefício vindicado, exigindo-se ao menos o denominado início de prova material
para a sua comprovação.
6 - Alega a parte autora que trabalhou junto à empresa Nadir Salvador e que o INSS teria
extraviado uma das três CTPS apresentadas no procedimento administrativo. No entanto,
conforme o Resumo de Documentos para Cálculos (ID 4132552 – p. 7) e Termo de Retenção
de Documentos (ID 4132552 – p. 38) a autarquia só recebeu duas CTPS.
7 - A parte autora junta como prova do labor exercido a declaração de uma testemunha (ID
4132552 – p. 40), o que não configura início de prova material apto a ensejar o reconhecimento
do período em questão.
8 - Na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores pagos
indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II, da Lei
8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99.
9 - Ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador
reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas
alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
10 - Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o
enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício
ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio
financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais
segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
11 - Ainda que tenha restado comprovado na seara administrativa que o servidor teve
participação na concessão irregular do benefício, quem usufruiu da vantagem decorrente do ato
ilícito foi a autora, razão pela qual não há como dissociar o desfalque ao erário público do
recebimento de aposentadoria indevida.
12 - Em decorrência, constatado o nexo de causalidade entre o dano aos cofres públicos e o
ato ilícito praticado, a restituição dos valores recebidos pela autora indevidamente, a título de
aposentadoria por tempo de contribuição, é medida que se impõe, nos termos do artigo 927 do
Código Civil.
13 - Majoração dos honorários advocatícios nos termos do artigo 85, §11, CPC, respeitados os
limites dos §§2º e 3º do mesmo artigo.
14 - Apelação da parte autora desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação da parte autora e majorar os honorários
advocatícios em 2%, nos termos do art. 85, §11, do CPC, mantendo, no mais, a r. sentença
proferida em 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
