
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0006054-81.2013.4.03.6183
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: WILSON HARUAKI MATSUOKA JUNIOR - SP210114
APELADO: LUIZ PEDRO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ARABELA ALVES DOS SANTOS - SP172396-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0006054-81.2013.4.03.6183
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: WILSON HARUAKI MATSUOKA JUNIOR - SP210114
APELADO: LUIZ PEDRO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ARABELA ALVES DOS SANTOS - SP172396-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação previdenciária ajuizada por LUIZ PEDRO DA SILVA, objetivando:
a)
o restabelecimento de “aposentadoria por invalidez” sob NB 516.023.747-6 (ID 119773197 – pág. 54) oub)
a concessão de “auxílio-acidente de qualquer natureza”;c)
a declaração de inexigibilidade de valores pagos administrativamente (a título da “aposentadoria por invalidez” cessada), porque recebedor de boa-fé;d)
a condenação da autarquia por danos morais sofridos.
A r. sentença prolatada em 12/08/2015 (ID 119773197 – pág. 91/115) julgou parcialmente procedente a ação, condenando o INSS no pagamento de “auxílio-acidente”, a partir de 03/10/2014 (data do laudo pericial), com incidência de correção monetária e juros de mora sobre os atrasados verificados, devendo ser observada a prescrição quinquenal e descontados os valores pagos anteriormente, a título de benefício inacumulável. Não houve condenação em custas processuais, em vista da isenção de que gozaria o INSS, e ante a gratuidade deferida à parte autora (ID 119773197 – pág. 41). Decretada a sucumbência recíproca, devendo cada parte arcar com os honorários de seu patrono respectivo. Determinado o reexame obrigatório. Concedida a tutela antecipada.
Em razões recursais de apelação (ID 119773197 – pág. 123/134), o INSS defende a reparação do julgado quanto à decretação de inexigibilidade dos valores anteriormente pagos ao autor, a título de “aposentadoria por invalidez”. Aduz que, tendo o segurado retornado voluntária e comprovadamente ao trabalho, houve-se a cessação do benefício, conforme previsão contida nos artigos 46 da Lei nº 8.213/91, e 48 do Decreto nº 3.048/99. Assevera, neste ponto, a necessidade de devolução dos valores percebidos a título do benefício por incapacidade, após o retorno constatado, sob pena de enriquecimento sem causa. Esclarece os termos do ressarcimento devido aos cofres previdenciários, nos moldes dos artigos 115 da Lei nº 8.213/91, e 154 do Decreto nº 3.048/99. Noutra via, quanto ao “auxílio-acidente de qualquer natureza” deferido, a autarquia requer a fixação da correção monetária e dos juros de mora nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, com a nova redação dada pela Lei nº 11.960/09, e a redução do percentual honorário para 5%.
Devidamente processado o recurso, com o oferecimento de contrarrazões recursais (ID 119773197 – pág. 139/142), vieram os autos a este Tribunal Regional Federal.
Determinado o sobrestamento do feito, sob Tema Repetitivo nº 1.013 do C. Superior Tribunal de Justiça (ID 119773197 – pág. 144).
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0006054-81.2013.4.03.6183
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: WILSON HARUAKI MATSUOKA JUNIOR - SP210114
APELADO: LUIZ PEDRO DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: ARABELA ALVES DOS SANTOS - SP172396-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Do não-cabimento da remessa necessária
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em
12/08/2015
, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, §2º, do CPC/1973:
"Art. 475. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, o Estado, o Distrito Federal, o Município, e as respectivas autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução de dívida ativa da Fazenda Pública (art. 585, VI).
§1º Nos casos previstos neste artigo, o juiz ordenará a remessa dos autos ao tribunal, haja ou não apelação; não o fazendo, deverá o presidente do tribunal avocá-los.
§2º Não se aplica o disposto neste artigo sempre que a condenação, ou o direito controvertido, for de valor certo não excedente a 60 (sessenta) salários mínimos, bem como no caso de procedência dos embargos do devedor na execução de dívida ativa do mesmo valor.
§3º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em jurisprudência do plenário do Supremo Tribunal Federal ou em súmula deste Tribunal ou do tribunal superior competente".
No caso, houve condenação do INSS no pagamento de “auxílio-acidente de qualquer natureza”, a partir de
03/10/2014
.
Constata-se, portanto, que desde o termo inicial até a data da prolação da sentença, passaram-se
10 meses
, totalizando assim10 prestações
que, ainda que com acréscimo de correção monetária e juros de mora e verba honorária, não contabilizam montante superior ao limite de alçada estabelecido na lei processual.
Da devolutividade recursal
Em vista da devolutividade da matéria a este E. Tribunal, a apreciação, nesta instância recursal, restringir-se-á ao exame do quanto acolhido em Primeiro Grau de jurisdição, à míngua de insurgência da parte autora quanto às postulações de restabelecimento de “aposentadoria por invalidez” e indenização por danos morais.
Do apelo do INSS
Não conheço de parte da apelação do INSS, em que requer a fixação honorária em parâmetros outros, por lhe faltar interesse recursal, tendo em vista que não houve condenação na r. sentença, eis que constatada a sucumbência recíproca entre as partes, autora e ré.
No que respeita à parte do apelo conhecida, prossegue-se.
Discute-se a exigibilidade dos valores pagos indevidamente à parte autora, a título de benefício previdenciário, na seara administrativa.
O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na equidade, constitui alicerce do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente disciplinado pelo artigo 884 do Código Civil de 2002,
in verbis
:
"Art. 884. Aquele que, sem justa causa, se enriquecer à custa de outrem, será obrigado a restituir o indevidamente auferido, feita a atualização dos valores monetários."
Desse modo, todo acréscimo patrimonial obtido por um sujeito de direito que acarrete necessariamente o empobrecimento de outro, deve possuir um motivo juridicamente legítimo, sob pena de ser considerado inválido e seus valores serem restituídos ao anterior proprietário. Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão, o ordenamento jurídico disponibiliza à parte lesada os instrumentos processuais denominados ações
in rem verso
, a fim de assegurar o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação de repetição de indébito.
A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
Ademais, na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II, da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99,
in verbis
:
"Art. 115. Podem ser descontados dos benefícios:
(...)
II - pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido, ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, nos termos do disposto no Regulamento. (Redação dada pela Medida Provisória nº 871, de 2019)"
Assim, ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
Neste sentido, deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
In casu
, o segurado usufruíra de “aposentadoria por invalidez” sob NB 516.023.747-6, a partir de 22/02/2006 (em verdade, benefício de “auxílio-doença” deferido sob NB 119.223.210-8, de 23/09/2000 a 21/02/2006, convertido - em “aposentadoria por invalidez” - desde então) (ID 119773197 – pág. 118, 54).
Todavia, em auditoria interna realizada, o INSS constatara irregularidades na manutenção do benefício, apurando que o segurado teria regressado às práticas laborativas voluntariamente (ID 119773197 – pág. 55/56, 116/117), nos intervalos de:
* 06/10/2006 a 29/08/2007 (empregadora Banco de Olhos de Sorocaba);
* 07/05/2007 a 16/08/2007 (empregadora Mapfre Vida S/A);
* 30/10/2007 a 01/04/2008 (empregadora Cientificalab Produtos Laboratoriais e Sistemas Ltda.);
* 21/11/2007 a 11/04/2008 (empregadora Associação Congregação de Santa Catarina);
* 06/03/2008 a 17/09/2009 (empregadora Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim);
* 05/05/2009 a 13/09/2010 (empregadora Avon Cosméticos Ltda.);
* 08/09/2010 a 17/09/2010 (empregadora Associação Congregação de Santa Catarina);
* 20/09/2010 a 08/07/2011 (empregadora Laboratórios Pfizer Ltda.);
* 26/11/2010 a 17/08/2011 (empregadora Sociedade Beneficente São Camilo);
* 13/12/2012 a junho/2015 (empregadora Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim);
* 19/06/2013 a 21/08/2013 (empregadora Autarquia Hospitalar Municipal).
Assim, tendo em vista a superação das condições que ensejaram a concessão da prestação previdenciária, o benefício foi cessado e os valores referentes aos respectivos períodos, apurados em R$ 34.360,69 (trinta e quatro mil, trezentos e sessenta reais e sessenta e nove centavos), passaram a ser cobrados do autor (ID 119773197 – pág. 20).
Historiados os fatos, deve ser acolhido o pleito autárquico, de restituição dos valores recebidos pela parte autora.
Cumpre ressaltar que é dever do segurado comunicar ao INSS o retorno voluntário ao trabalho, conforme preconiza o artigo 46 da Lei n. 8.213/91.
Ademais, até o leigo tem plena consciência de que o benefício por incapacidade visa substituir a renda do segurado, a fim de ampará-lo, e enquanto perdurar sua incapacidade para o labor. Assim, não constitui erro escusável o recebimento de prestação previdenciária sabidamente indevida, razão pela qual não pode ser acolhida a alegação de boa-fé.
Aliás, esse é o entendimento consolidado no C. Superior Tribunal de Justiça, conforme se infere dos seguintes precedentes que trago à colação firmados em casos análogos:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. SEGURADO QUE VOLTA A TRABALHAR. CUMULAÇÃO INDEVIDA. DEVOLUÇÃO. SUSTENTABILIDADE DO REGIME DE PREVIDÊNCIA. DEVER DE TODOS. CLÁUSULA GERAL DE BOA-FÉ. REPETIBILIDADE.
1. Trata-se de Recurso Especial em que a autarquia previdenciária pretende a devolução dos valores pagos a título de aposentadoria por invalidez a segurado que voltou a trabalhar.
2. A aposentadoria por invalidez consiste em benefício pago aos segurados do Regime Geral de Previdência social para a cobertura de incapacidade total e temporalmente definitiva para o trabalho, tendo, portanto, caráter substitutivo da renda. O objetivo da proteção previdenciária é, pois, garantir o sustento do segurado que não pode trabalhar.
3. O art. 42 da Lei 8.213/1991 estabelece que a aposentadoria por invalidez será paga ao segurado total e definitivamente incapacitado "enquanto permanecer nesta condição". Já o art. 46 da Lei 8.213/1991 preceitua que "o aposentado por invalidez que retornar voluntariamente à atividade terá sua aposentadoria automaticamente cancelada, a partir da data do retorno".
4. A sustentabilidade do Regime Geral de Previdência Social brasileiro é frequentemente colocada em debate, devendo, desse contexto sensível, não somente exsurgir as soluções costumeiras de redução de direitos e aumento da base contributiva. Também deve aflorar a maior conscientização social tanto do gestor, no comprometimento de não desvio dos recursos previdenciários, e do responsável tributário, pelo recolhimento correto das contribuições, quanto dos segurados do regime no respeito à cláusula geral de boa-fé nas relações jurídicas, consubstanciada na responsabilidade social de respeito aos comandos mais básicos oriundos da legislação, como o aqui debatido: quem é incapaz para o trabalho, como o aposentado por invalidez, não pode acumular o benefício por incapacidade com a remuneração do trabalho.
5. Admitir exceções a uma obrigação decorrente de comando legal expresso que define o limite de uma cobertura previdenciária, passível de compreensão pelo mais leigo dos cidadãos, significa transmitir a mensagem de que se pode sugar tudo do Erário, por mais ilegal que seja, já que para o Estado não é preciso devolver aquilo que foi recebido ilegalmente. Em uma era de debates sobre apropriação ilegal de recursos públicos e seus níveis, essa reflexão é imensamente simbólica para que se passe a correta mensagem a toda a sociedade.
6. Sobre a alegação da irrepetibilidade da verba alimentar, está sedimentado no STJ o entendimento de que a aplicação dessa compreensão pressupõe a boa-fé objetiva, concernente na constatação de que o receptor da verba alimentar compreendeu como legal e definitivo o pagamento. A propósito: MS 19.260/DF, Rel. Ministro Herman Benjamin, Corte Especial, DJe 11/12/2014.
7. Conforme fixado no precedente precitado, "descabe ao receptor da verba alegar que presumiu o caráter legal do pagamento em hipótese de patente cunho indevido, como, por exemplo, no recebimento de auxílio-natalidade (art. 196 da Lei 8.112/1990) por servidor público que não tenha filhos".
8. Tal entendimento aplica-se perfeitamente ao presente caso, pois não há como presumir, nem pelo mais leigo dos segurados, a legalidade do recebimento de aposentadoria por invalidez com a volta ao trabalho, não só pela expressa disposição legal, mas também pelo raciocínio básico de que o benefício por incapacidade é indevido se o segurado se torna novamente capaz para o trabalho.
9. No mesmo sentido do que aqui decidido: "1. Em exame, os efeitos para o segurado, do não cumprimento do dever de comunicação ao Instituto Nacional do Seguro Social de seu retorno ao trabalho, quando em gozo de aposentadoria por invalidez. 2. Em procedimento de revisão do benefício, a Autarquia previdenciária apurou que o segurado trabalhou junto à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, no período de 04/04/2001 a 30/09/2007 (fls. 379 e fls. 463), concomitante ao recebimento da aposentadoria por invalidez no período de 26/5/2000 a 27/3/2007, o que denota clara irregularidade 3. A Lei 8.213/1991 autoriza expressamente em seu artigo 115, II, que valores recebidos indevidamente pelo segurado do INSS sejam descontados da folha de pagamento do benefício em manutenção. 4. Pretensão de ressarcimento da Autarquia plenamente amparada em lei." REsp 1454163/RJ, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 18.12.2015.
10. Recurso Especial provido.
(REsp 1554318/SP, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 02/06/2016, DJe 02/09/2016)
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. PROCEDIMENTO REVISIONAL DA AUTARQUIA PREVIDENCIÁRIA. CONSTATAÇÃO DE RETORNO DO SEGURADO À ATIVIDADE LABORATIVA. DEVOLUÇÃO DE VALORES AO ERÁRIO. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO.
1. Em exame, os efeitos para o segurado, do não cumprimento do dever de comunicação ao Instituto Nacional do Seguro Social de seu retorno ao trabalho, quando em gozo de aposentadoria por invalidez.
2. Em procedimento de revisão do benefício, a Autarquia previdenciária apurou que o segurado trabalhou junto à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, no período de 04/04/2001 a 30/09/2007 (fls. 379 e fls. 463), concomitante ao recebimento da aposentadoria por invalidez no período de 26/5/2000 a 27/3/2007, o que denota clara irregularidade
3. A Lei 8.213/1991 autoriza expressamente em seu artigo 115, II, que valores recebidos indevidamente pelo segurado do INSS sejam descontados da folha de pagamento do benefício em manutenção.
4. Pretensão de ressarcimento da Autarquia plenamente amparada em lei.
5. Recurso conhecido e não provido.
(REsp 1454163/RJ, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/12/2015, DJe 18/12/2015)
No mesmo sentido, cito julgado deste Egrégio Tribunal:
PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. INEXIGIBILIDADE DE DÉBITO. RETORNO VOLUNTÁRIO AO TRABALHO. VALORES RECEBIDOS INDEVIDAMENTE. POSSIBILIDADE DE DESCONTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Compulsando os autos, verifico que foi concedida aposentadoria por invalidez ao autor, em 19/12/2003, por ser portador de "outros transtornos mentais devidos a lesão e disfunção cerebral e a doença física", CID 10 F06.
- Após revisão administrativa, no ano de 2007, o INSS constatou a cessação da incapacidade em 06/08/2004. Ademais, conforme documentos juntados aos autos, verifica-se o retorno voluntário do autor ao trabalho, atuando como advogado em inúmeros processos, no período de 2004 a 2007.
- No caso dos autos, o ora recorrente, enquanto recebia benefício por incapacidade, passou a exercer atividade remunerada na qualidade de advogado, atuando em diversos processos, conforme comprovam as consultas realizadas nos sítios eletrônicos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e do Diário Oficial do Estado de São Paulo.
- Assim, não se justifica a manutenção do benefício, cuja finalidade é a proteção social do segurado acometido de incapacidade total e permanente para o trabalho.
- Diante disso, devem ser devolvidos os valores indevidamente recebidos, sob pena de ofensa ao princípio da moralidade e a fim de evitar o enriquecimento sem causa e o locupletamento indevido do autor em prejuízo dos cofres públicos.
- Assim, tendo em vista que o autor atualmente é beneficiário de aposentadoria por tempo de contribuição, nada obsta o desconto dos pagamentos efetuados indevidamente pela Autarquia, nos termos do art. 115 da LBPS. Contudo, esse desconto deve ser efetuado em percentual que não reduza o benefício a valor inferior ao mínimo legal e tampouco supere a 30% do valor do benefício em manutenção, nos termos do artigo 154 do Decreto nº 3.048/99.
- A verba honorária deve ser fixada em 10% sobre o valor da causa.
- Apelação provida. Tutela antecipada cassada.
(TRF 3ª Região, OITAVA TURMA, Ap - APELAÇÃO CÍVEL - 1679868 - 0008542-22.2008.4.03.6106, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL TANIA MARANGONI, julgado em 03/04/2017, e-DJF3 Judicial 1 DATA:20/04/2017)
Dito isto, afigura-se legítima a condenação da parte autora na devolução dos valores indevidamente recebidos, limitando-se, entretanto, o desconto do ressarcimento a 10% (dez por cento) do valor mensal do benefício que recebe atualmente, nos termos do artigo 115, II e §1º da Lei nº 8.213/91 e artigo 154, II, § 3º do Decreto nº 3.048/99.
Nesse sentido, colaciono trecho do voto do ilustre Ministro Herman Benjamin, no julgamento pela 1ª Seção do C. STJ do REsp n. 1.401.560, representativo da controvérsia relativa à devolução dos benefícios indevidamente recebidos em decorrência de reforma da decisão que antecipa a tutela:
"Não obstante a reiteração referencial ao índice máximo de 30%, considero adequado à hipótese adotar, por simetria, o percentual mínimo de desconto aplicável aos servidores públicos referido no art. 46, § 1º, da Lei 8.112/1990. Transcrevo o citado dispositivo legal:
Art. 46. As reposições e indenizações ao erário, atualizadas até 30 de junho de 1994, serão previamente comunicadas ao servidor ativo, aposentado ou ao pensionista, para pagamento, no prazo máximo de trinta dias, podendo ser parceladas, a pedido do interessado.
§ 1o O valor de cada parcela não poderá ser inferior ao correspondente a dez por cento da remuneração, provento ou pensão.
Assim, à luz do princípio da dignidade da pessoa humana e levando-se em conta o dever do segurado de devolução dos valores recebidos por força de antecipação de tutela posteriormente revogada, deve ser observado o limite mensal de desconto de 10% (dez por cento) da renda mensal do benefício."
Desse modo, determino que seja respeitado o limite de 10% (dez por cento) do valor percebido a título de benefício, para fins de ressarcimento aos cofres da previdência.
Consectários legais
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto,
não conheço da remessa necessária, não conheço de parte do apelo do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe parcial provimento
, para:a)
determinar a restituição dos valores recebidos indevidamente pelo demandante, a título de “aposentadoria por invalidez”, a partir de 06/10/2006, limitando, contudo, o desconto do ressarcimento em seu benefício a 10% (dez por cento) do valor mensal do “auxílio-acidente de qualquer natureza” a ele concedido, eb)
estabelecer que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e,de ofício
, assento que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. RESTABELECIMENTO DE APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. CONCESSÃO. AUXÍLIO-ACIDENTE DE QUALQUER NATUREZA. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS ADMINISTRATIVAMENTE, EM VIRTUDE DE CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO. REMESSA NECESSÁRIA INCABÍVEL. DEVOLUTIVIDADE DA MATÉRIA. HONORÁRIOS. FALTA DE INTERESSE RECURSAL. RETORNO VOLUNTÁRIO AO TRABALHO. AUSÊNCIA DE COMUNICAÇÃO AO INSS. DEVOLUÇÃO DOS VALORES. POSSIBILIDADE. RESSARCIMENTO AO ERÁRIO. VEDAÇÃO AO ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA. PRESERVAÇÃO DO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL DA PREVIDÊNCIA. JUROS DE MORA. REMESSA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS NÃO CONHECIDA DE PARTE E, NA PARTE CONHECIDA, PROVIDA EM PARTE. CORREÇÃO MONETÁRIA. FIXAÇÃO DE OFÍCIO.
1 - Sentença submetida à apreciação desta Corte proferida em
12/08/2015
, sob a égide do Código de Processo Civil de 1973.2 - Houve condenação do INSS no pagamento de “auxílio-acidente de qualquer natureza”, a partir de
03/10/2014
.3 - Constata-se, portanto, que desde o termo inicial até a data da prolação da sentença, passaram-se
10 meses
, totalizando assim10 prestações
que, ainda que com acréscimo de correção monetária e juros de mora e verba honorária, não contabilizam montante superior ao limite de alçada estabelecido na lei processual.4 - Em vista da devolutividade da matéria a este E. Tribunal, a apreciação, nesta instância recursal, restringir-se-á ao exame do quanto acolhido em Primeiro Grau de jurisdição, à míngua de insurgência da parte autora quanto às postulações de restabelecimento de “aposentadoria por invalidez” e indenização por danos morais.
5 - Não se conhece de parte da apelação do INSS, em que requer a fixação honorária em parâmetros outros, por lhe faltar interesse recursal, tendo em vista que não houve condenação na r. sentença, eis que constatada a sucumbência recíproca entre as partes, autora e ré.
6 - No que respeita à parte do apelo conhecida, discute-se a exigibilidade dos valores pagos indevidamente à parte autora, a título de benefício previdenciário, na seara administrativa.
7 - O princípio da vedação ao enriquecimento sem causa, fundado na equidade, constitui alicerce do sistema jurídico desde a época do direito romano e encontra-se atualmente disciplinado pelo artigo 884 do Código Civil de 2002.
8 - Todo acréscimo patrimonial obtido por um sujeito de direito que acarrete necessariamente o empobrecimento de outro, deve possuir um motivo juridicamente legítimo, sob pena de ser considerado inválido e seus valores serem restituídos ao anterior proprietário. Em caso de resistência à satisfação de tal pretensão, o ordenamento jurídico disponibiliza à parte lesada os instrumentos processuais denominados ações
in rem verso
, a fim de assegurar o respectivo ressarcimento, das quais é exemplo a ação de repetição de indébito.9 - A propositura de demanda judicial, contudo, não constitui a única via de que dispõe a Administração Pública para corrigir o enriquecimento sem causa. Os Entes Públicos, por ostentarem o poder-dever de autotutela, podem anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, ressalvando-se ao particular o direito de contestar tal medida no Poder Judiciário, conforme as Súmulas 346 e 473 do Supremo Tribunal Federal.
10 - Na seara do direito previdenciário, a possibilidade de cobrança imediata dos valores pagos indevidamente, mediante descontos no valor do benefício, está prevista no artigo 115, II, da Lei 8.213/91, regulamentado pelo artigo 154 do Decreto n. 3.048/99.
11 - Ao estabelecer hipóteses de desconto sobre o valor do benefício, o próprio Legislador reconheceu que as prestações previdenciárias, embora tenham a natureza de verbas alimentares, não são irrepetíveis em quaisquer circunstâncias.
12 - Deve-se ponderar que a Previdência Social é financiada por toda a coletividade e o enriquecimento sem causa de algum segurado, em virtude de pagamento indevido de benefício ou vantagem, sem qualquer causa juridicamente reconhecida, compromete o equilíbrio financeiro e atuarial de todo o Sistema, importando em inequívoco prejuízo a todos os demais segurados e em risco à continuidade dessa rede de proteção.
13 -
In casu
, o segurado usufruíra de “aposentadoria por invalidez” sob NB 516.023.747-6, a partir de 22/02/2006 (em verdade, benefício de “auxílio-doença” deferido sob NB 119.223.210-8, de 23/09/2000 a 21/02/2006, convertido - em “aposentadoria por invalidez” - desde então).14 - Em auditoria interna realizada, o INSS constatara irregularidades na manutenção do benefício, apurando que o segurado teria regressado às práticas laborativas voluntariamente, nos intervalos de: * 06/10/2006 a 29/08/2007 (empregadora Banco de Olhos de Sorocaba); * 07/05/2007 a 16/08/2007 (empregadora Mapfre Vida S/A); * 30/10/2007 a 01/04/2008 (empregadora Cientificalab Produtos Laboratoriais e Sistemas Ltda.); * 21/11/2007 a 11/04/2008 (empregadora Associação Congregação de Santa Catarina); * 06/03/2008 a 17/09/2009 (empregadora Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim); * 05/05/2009 a 13/09/2010 (empregadora Avon Cosméticos Ltda.); * 08/09/2010 a 17/09/2010 (empregadora Associação Congregação de Santa Catarina); * 20/09/2010 a 08/07/2011 (empregadora Laboratórios Pfizer Ltda.); * 26/11/2010 a 17/08/2011 (empregadora Sociedade Beneficente São Camilo); * 13/12/2012 a junho/2015 (empregadora Centro de Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim); * 19/06/2013 a 21/08/2013 (empregadora Autarquia Hospitalar Municipal).
15 - Tendo em vista a superação das condições que ensejaram a concessão da prestação previdenciária, o benefício foi cessado e os valores referentes aos respectivos períodos, apurados em R$ 34.360,69 (trinta e quatro mil, trezentos e sessenta reais e sessenta e nove centavos), passaram a ser cobrados do autor.
16 - É dever do segurado comunicar ao INSS o retorno voluntário ao trabalho, conforme preconiza o artigo 46 da Lei n. 8.213/91.
17 - Até o leigo tem plena consciência de que o benefício por incapacidade visa substituir a renda do segurado, a fim de ampará-lo, e enquanto perdurar sua incapacidade para o labor. Assim, não constitui erro escusável o recebimento de prestação previdenciária sabidamente indevida, razão pela qual não pode ser acolhida a alegação de boa-fé. Precedentes.
18 - Legítima a condenação da parte autora na devolução dos valores indevidamente recebidos, limitando-se, entretanto, o desconto do ressarcimento a 10% (dez por cento) do valor mensal do benefício que recebe atualmente, nos termos do artigo 115, II e §1º da Lei nº 8.213/91 e artigo 154, II, § 3º do Decreto nº 3.048/99. Precedentes.
19 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.20 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
21 - Remessa necessária não conhecida. Apelo do INSS não conhecido em parte e, na parte conhecida, parcialmente provido. Correção fixada de ofício.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu não conhecer da remessa necessária, não conhecer de parte do apelo do INSS e, na parte conhecida, dar-lhe parcial provimento, para: a) determinar a restituição dos valores recebidos indevidamente pelo demandante, a título de "aposentadoria por invalidez", a partir de 06/10/2006, limitando, contudo, o desconto do ressarcimento em seu benefício a 10% (dez por cento) do valor mensal do "auxílio-acidente de qualquer natureza" a ele concedido, e b) estabelecer que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e, de ofício, assentarque a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
