Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2000128 / SP
0009879-66.2010.4.03.6109
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
07/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTES QUÍMICOS. RUÍDO. EXTINÇÃO DO
FEITO SEM ANÁLISE DO MÉRITO QUANTO AO PEDIDO DE RECONHECIMENTO DE
ESPECIALIDADE DO LABOR DESEMPENHADO COMO PROFESSOR PARA O GOVERNO
DO ESTADO DE SÃO PAULO. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO INSS. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. ISENÇÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. APELAÇÃO DO
INSS PARCIALMENTE PROVIDA. REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - No caso, o INSS foi condenado a reconhecer períodos de labor especial e a revisar o
benefício de aposentadoria por tempo de contribuição do autor, a partir da data da citação.
2 - Assim, não havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e
sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula
490 do STJ.
3 - Cumpre destacar ter a r. sentença incorrido em erro material ao determinar, no dispositivo, a
averbação dos períodos como se fossem efetivamente trabalhados em "condições urbanas
comuns", quando o correto, de acordo com a fundamentação, seria "condições urbanas
especiais".
4 - Verifica-se que o pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal,
especificamente na Lei de Benefícios.
5 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial (STJ, AgRg no REsp
493.458/RS e REsp 491.338/RS; Súmula nº 13 TR-JEF-3ªR; artigo 70, § 1º, Decreto nº
3.048/1999).
6 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão
do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria
profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março
de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo
art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de
Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes
agressivos, exceto para ruído e calor.
7 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
8 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
9 - Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese
da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
10 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada
até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
11 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
12 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
13 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
14 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
15 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
16 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
17 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
18 - Acresça-se, ainda, ser possível a conversão do tempo especial em comum,
independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da
conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
19 - Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do
Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
20 - A r. sentença reconheceu a especialidade do labor nos períodos de 15/03/1966 a
17/08/1966, de 15/06/1970 a 06/03/1972, de 13/04/1976 a 30/09/1980 e de 20/07/1994 a
21/08/1995, e condenou o INSS a revisar o benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição do autor, a partir da data da citação.
21 - Conforme formulários, laudos técnicos e Certidão de tempo de serviço: no período de
15/03/1966 a 17/08/1966, laborado na empresa Shervin Willians do Brasil Ind. Com. Ltda, o
autor esteve exposto a ruído de 82 dB(A) - formulário de fl. 21 e laudo técnico pericial de fls.
22/23; no período de 15/06/1970 a 06/03/1972, o autor laborou como professor para o Governo
do Estado de São Paulo - certidão de tempo de serviço de fl. 27; no período de 13/04/1976 a
30/09/1980, laborado na empresa OPP Polietilenos S/A (Sucessora de Poliolefinas S/A), o autor
esteve exposto a cloro, acetato de vinila e soda cáustica, agentes químicos enquadrados no
código 1.2.9 do Anexo do Decreto nº 53.831/61 e no código 1.2.11 do Anexo I, do Decreto nº
83.080/79, no período de 13/04/1976 a 09/01/1978, em que exerceu a função de chefe de
departamento de controle de qualidade; e a ruído de 55 dB, no período de 09/01/1978 a
30/09/1980, em que exerceu a função de Gerente de Divisão Técnica e Desenvolvimento -
formulário de fl. 32 e laudo técnico de fls. 32/36; e no período de 20/07/1994 a 21/08/1995,
laborado na empresa Electro Plastic S/A, o autor esteve exposto a ruído de 90 a 92 dB(A) -
formulário de fl. 75 e laudo técnico pericial de fl. 76.
22 - Possível, portanto, o reconhecimento da especialidade do labor nos períodos de
15/03/1966 a 17/08/1966, de 13/04/1976 a 09/01/1978, e de 20/07/1994 a 21/08/1995.
23 - Ressalte-se que o fato do laudo técnico, referente ao período de 15/03/1966 a 17/08/1966,
ter sido realizado em endereço diverso do labor não impede o reconhecimento da
especialidade, pois como mencionado no referido documento, a empresa foi desativada no
endereço da prestação do serviço.
24 - Impossível o reconhecimento do labor especial no período de 10/01/1978 a 30/09/1980, eis
que o autor esteve exposto a ruído inferior a 80 dB(A) exigidos à época.
25 - No que concerne ao lapso de 15/06/1970 a 06/03/1972, no qual o autor exercera atividades
junto ao Governo do Estado de São Paulo, na condição de professor II, não pode ser
reconhecido como especial, porquanto sob regime jurídico estatutário, contribuindo para
Regime Próprio de Previdência Social - RPPS, de forma que a responsabilidade pelo
reconhecimento da especialidade das atividades e a respectiva conversão pertencem ao órgão
emissor da certidão, sendo o INSS parte ilegítima para figurar no pólo passivo no que pertine ao
referido período.
26 - O termo inicial da revisão do benefício deve ser mantido na data da citação (18/04/2013 - fl.
143), diante da ausência de recurso da parte autora.
27 - A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob
a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de
variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
28 - Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de
acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por
refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
29 - No que se refere às custas processuais, delas está isenta a autarquia, a teor do disposto
no §1º do art. 8º da Lei n. 8.620/93.
30 - Apelação INSS parcialmente provida. Remessa necessária parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, corrigir o erro
material presente na r. sentença, para que os períodos mencionados no dispositivo sejam
considerados como tempo de labor especial, dar parcial provimento à apelação do INSS, para
julgar extinto o feito, sem análise do mérito, quanto ao pedido de reconhecimento do labor
especial no período de 15/06/1970 a 06/03/1972, em que o autor laborou como professor para o
Governo do Estado de São Paulo e para afastar o reconhecimento da especialidade do labor no
período de 10/01/1978 a 30/09/1980 e dar parcial provimento à remessa necessária, tida por
interposta, esta em maior extensão, para também estabelecer que sobre os valores em atraso
incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será
apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício
requisitório, de acordo com o mesmo Manual, além de isentar a autarquia das custas
processuais; mantendo-se, no mais, o julgado proferido em 1º grau de jurisdição, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
