Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2055662 / SP
0013631-40.2015.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. CERCEAMENTO DE DEFESA AFASTADO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO.
FUMOS METÁLICOS. RADIAÇÕES NÃO IONIZANTES. CONJUNTO PROBATÓRIO
PARCIALMENTE SUFICIENTE. REVISÃO DE RMI CONCEDIDA. REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE
MORA. VERBA HONORÁRIA. AGRAVO RETIDO DESPROVIDO. APELAÇÕES E REMESSA
NECESSÁRIA, TIDA POR INTERPOSTA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - O INSS foi condenado a reconhecer período de labor especial, bem como a conceder o
benefício previdenciário de aposentadoria especial. Assim, não havendo como se apurar o valor
da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do
inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula 490 do STJ.
2 - Rejeitada a preliminar de nulidade da sentença em razão do alegado cerceamento de defesa
por ausência de produção probatória, eis que a prova documental juntada aos autos mostra-se
suficiente para o julgamento da causa, sendo, portanto, desnecessária a realização da perícia
requerida.
- A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
decreto do Poder Executivo.
3 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
4 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91.
5 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
6 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
7 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
8 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
9 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização
do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento
não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C.
STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que
integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
10 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior..
11 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
12 - Os períodos de 23/05/1977 a 31/05/1984, 01/06/1984 a 19/01/1987, 20/01/1987 a
31/07/1987, 01/08/1987 a 24/03/1988, 21/06/1989 a 30/04/1992 e de 01/05/1992 a 28/04/1995
já foram considerados como laborados sob condições especiais pelo próprio INSS, conforme
Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição de fls. 83-verso e 84.
13 - A r. sentença monocrática reconheceu a especialidade do labor do autor desempenhado de
29/04/1995 a 23/03/2005. Quanto ao referido lapso, o requerente colacionou aos autos o PPP
de fls. 175/176 e o laudo técnico pericial de fls. 183/190, o qual informa que ele desempenhou a
função de soldador PO e soldador junto à Marchesan Impls e Máquinas Agrs. "Tatu" S/A.,
exposto aos seguintes agentes nocivos: -01/05/1992 a 31/12/2003 - ruído de 87dB, fumos
metálicos e radiações não ionizantes; -01/01/2004 a 31/12/2004 - ruído de 87dB, fumos
metálicos e radiações não ionizantes e de -01/01/2005 a 10/08/2005 - ruído de 87dB, fumos
metálicos e radiações não ionizantes. O referido documento faz menção, ainda, ao uso de EPI
eficaz pelo requerente. Desta feita, possível o reconhecimento do labor especial do autor nos
períodos de 29/04/1995 a 15/12/1998, devido ao agente "fumos metálicos", uma vez que se
enquadra no item 1.2.9 do Decreto nº 53.831/64 e no 1.2.11 do Anexo I do Decreto 83.080/79.
Havendo a utilização de EPI eficaz, resta afastada a especialidade do labor exposto a agentes
químicos a partir de 15/12/1998.
14 - Possível o reconhecimento, ainda, do interregno de 19/11/2003 a 23/03/2005, em razão da
exposição do autor a ruído de 87dB.
15 - Cumpre realçar que o art. 58, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91 sofreu alteração por meio da
Lei nº 9.732/98, publicada em 14/12/1998, exigindo-se, no bojo do laudo técnico, informação
acerca da existência de tecnologia de proteção - quer coletiva, quer individual - passível de
atenuar a intensidade de agentes nocivos a limites toleráveis, apartando a insalubridade da
atividade desempenhada. Portanto, a partir de 15/12/1998, nos períodos em que está
comprovada a utilização de equipamentos individuais de proteção eficazes, fica afastada a
insalubridade. Já nos períodos anteriores à edição da Lei nº 9.732/98, ainda que registrado o
uso de equipamentos individuais de proteção, tal situação não descaracteriza o trabalho
especial.
16 - No que concerne à radiação não ionizante, observa-se que, consoante a legislação
aplicável à época, no caso, os Anexos IV dos Decretos nº 2.172/97 e nº 3048/99, somente
foram previstas como agente físico insalubre as radiações ionizantes, nos termos do que aponta
o item 2.0.3 de ambas as legislações.
17 - Inviável o reconhecimento do labor especial no período de 16/12/1998 a 18/11/2003, uma
vez que o nível de pressão sonora encontrava-se abaixo do limite legal estabelecido para o
referido reconhecimento, bem como quanto aos agente químicos mencionados havia o uso de
EPI eficaz.
18 - Assim, à vista do conjunto probatório acostado aos autos, possível a conversão pretendida
apenas dos períodos de 29/04/1995 a 15/12/1998 e de 19/11/2003 a 23/03/2005.
19 - Conforme tabela anexa, considerados os períodos especiais ora admitidos com os já
reconhecidos administrativamente (Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de
Contribuição - fls. 83-verso e 84), tem a parte autora 21 anos, 08 meses e 04 dias de atividades
exercidas em condições especiais por ocasião da data da entrada do requerimento
administrativo (01/03/2007 - fl. 83 verso), não fazendo jus, portanto, à aposentadoria especial
pleiteada. Todavia, devida a revisão do RMI da aposentadoria por tempo de contribuição.
20 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da concessão da benesse em sede
administrativa (DIB 01/03/2007 - fls. 89-verso e 90), uma vez que se trata de revisão da renda
mensal inicial, observada a prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que
precede o ajuizamento da ação, conforme posicionamento majoritário desta Turma, ressalvado
o entendimento pessoal deste Relator.
21 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
22 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
23 - Esclareço que se sagrou vitoriosa a parte autora ao ver reconhecida parte da especialidade
vindicada. Por outro lado, não foi concedida a aposentadoria especial, restando vencedora
nesse ponto a autarquia. Desta feita, dou os honorários advocatícios por compensados entre as
partes, ante a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixo de condenar qualquer delas
no reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça
gratuita e o INSS delas isento.
24 - Agravo retido desprovido. Apelação do INSS desprovida e remessa necessária, tida por
interposta parcialmente provida. Apelo da parte autora prejudicado.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento ao
agravo retido da parte autora e dar parcial provimento à seu apelo para determinar que a
correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E e à apelação
do INSS para limitar o reconhecimento da especialidade do labor do autor aos períodos de
29/04/1995 a 15/12/1998 e de 19/11/2003 a 23/03/2005 e, por consequência, afastar a
condenação à implantação do benefício de aposentadoria especial, determinando tão somente
a revisão do RMI da aposentadoria por tempo de contribuição, a partir da data do requerimento
administrativo (01/03/2007), observada a prescrição quinquenal e estabelecer que os juros de
mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo
Manual e à remessa necessária, tida por interposta, por igual motivo e em maior extensão para
fixar a sucumbência recíproca, mantendo, quanto ao mais, a sentença proferida em 1º grau de
jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Referência Legislativa
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-475 INC-1 ART-21***** STJ SÚMULA DO SUPERIOR
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LEG-FED SUM-490LEG-FED LEI-5890 ANO-1973 ART-9***** LOPS-60 LEI ORGÂNICA DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-3807 ANO-1960 ART-31LEG-FED DEC-53831 ANO-1964 ITE-1.2.9***** RBPS-
79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979 ITE-1.2.11***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57 PAR-5 ART-58 PAR-1 PAR-2LEG-FED LEI-9032 ANO-
1995LEG-FED DEC-2172 ANO-1997 ITE-2.0.3LEG-FED LEI-9528 ANO-1997LEG-FED LEI-
9711 ANO-1998 ART-28LEG-FED LEI-9732 ANO-1998***** RPS-99 REGULAMENTO DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ITE-2.0.3LEG-FED LEI-11960 ANO-2009
Veja
STF RE 870.947/SE REPERCUSSÃO GERAL TEMA 810.
