Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2015080 / SP
0000148-32.2013.4.03.6112
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
26/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/09/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO. VERBA HONORÁRIA. CARÁTER PERSONALÍSSIMO. ILEGITIMIDADE DA
PARTE AUTORA. ATIVIDADE RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA
TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. IDADE MÍNIMA DE 12 ANOS. POSSIBILIDADE.
ATIVIDADE ESPECIAL. RUIDO. COMPROVAÇÃO DO LABOR SUBMETIDO A CONDIÇÕES
ESPECIAIS. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. REVISÃO DEVIDA. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. RECURSO ADESIVO DA PARTE AUTORA NÃO
CONHECIDO. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE
PROVIDAS.
1 - No caso, a r. sentença condenou o INSS a recalcular a RMI do benefício de aposentadoria
por tempo de contribuição do autor, bem como no pagamento das diferenças apuradas,
acrescidas de correção monetária e juros de mora. Assim, não havendo como se apurar o valor
da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do
inciso I, do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula 490 do STJ.
2 - A verba honorária (tanto a contratual como a sucumbencial) possui caráter personalíssimo,
detendo seu titular, exclusivamente, a legitimidade para pleiteá-los, vedado à parte fazê-lo, na
medida em que a decisão não lhe trouxe prejuízo. Em outras palavras, não tendo a parte autora
experimentado qualquer sucumbência com a prolação da decisão impugnada, ressente-se,
nitidamente, de interesse recursal. Versando o recurso insurgência referente, exclusivamente, a
honorários advocatícios, patente a ilegitimidade da parte autora no manejo do apelo.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
3 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
mediante o reconhecimento de labor rural, no período de 08/12/1968 a 31/12/1974. Além disso,
pretende ver reconhecida a especialidade do trabalho desempenhado no período de 06/08/1975
a 23/01/1991.
4 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
5 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
6 - O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP,
adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento
de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior
àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material,
desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
7 - Quanto ao reconhecimento da atividade rural exercida em regime de economia familiar, o
segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII.
8 - É pacífico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições
para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se
desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91. Precedentes jurisprudenciais.
9 - As pretensas provas materiais juntadas aos autos, a respeito do labor no campo do autor,
são: a) Título Eleitoral, datado de 27/01/1975, na qual o autor é qualificado como lavrador; b)
Certificado de Dispensa de Incorporação, constando que o autor "foi dispensado do Serviço
Militar Inicial em 1974 por residir em zona rural", tendo sido qualificado à época como lavrador;
c) Certidão emitida pela Justiça Eleitoral do Estado de São Paulo, atestando que o autor, "em
22 de setembro de 1975 (...) DECLAROU por ocasião de seu alistamento eleitoral (...) que sua
ocupação principal era a de LAVRADOR"; d) Certificado de conclusão do "curso primário em 14
de dezembro de 1968", emitido pela Escola Mista da Fazenda Pagador.
10 - A prova oral reforça o labor no campo e amplia a eficácia probatória dos documentos
carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino no período questionado
na exordial (08/12/1968 a 31/12/1974), nos moldes já assentados pela r. sentença de 1º grau,
cabendo ressaltar que o interregno compreendido entre 01/01/1975 a 05/08/1975 foi
reconhecido pela Autarquia por ocasião do requerimento administrativo (período incontroverso).
11 - A respeito da idade mínima para o trabalho rural do menor, é histórica a vedação do
trabalho infantil. Com o advento da Constituição de 1967, a proibição passou a alcançar apenas
os menores de 12 anos, em nítida evolução histórica quando em cotejo com as Constituições
anteriores, as quais preconizavam a proibição em período anterior aos 14 anos.
12 - Já se sinalizava, então, aos legisladores constituintes, como realidade incontestável, o
desempenho da atividade desses infantes na faina campesina, via de regra ao lado dos
genitores. Corroborando esse entendimento, se encontrava a realidade brasileira das duas
décadas que antecederam a CF/67, época em que a população era eminentemente rural (64%
na década de 1950 e 55% na década de 1960).
13 - Antes dos 12 anos, porém, ainda que acompanhasse os pais na lavoura e eventualmente
os auxiliasse em algumas atividades, não se mostra razoável supor pudesse o menor exercer
plenamente a atividade rural, inclusive por não contar com vigor físico suficiente para uma
atividade tão desgastante.
14 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
15 - Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
16 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
17 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
18 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
19 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
20 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
21 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
22 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
23 - A apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento
da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia
tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima
do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos
anos anteriores, referido nível era superior.
24 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
25 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
26 - Para comprovar que o trabalho exercido na "Cia Industrial de Conservas Alimentícias
'Cica'", no período de 06/08/1975 a 23/01/1991, ocorreu em condições prejudiciais à saúde e à
integridade física, o autor coligiu aos autos o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP. Consta
do referido documento que o demandante exerceu as funções de "Servente Serv. Diversos"
(06/08/1975 a 01/01/1978), "Ajudante Geral" (02/01/1978 a 01/08/1979), "Op. Concentrador"
(02/08/1979 a 01/05/1989) e "Encarregado Produção" (02/05/1989 a 23/01/1991), com
exposição a ruído nas intensidades de 85db(A) - de 06/08/1975 a 01/05/1989 - e de 81dB(A) -
de 02/05/1989 a 23/01/1991.
27 - Restou consignado, ainda, no PPP (campo observações): "A empresa não possui
levantamentos ambientais da época de labor do segurado referente ao exato local de sua
prestação de serviços. Desta forma, foram consideradas as avaliações dos agentes químicos,
físicos e biológicos da unidade da empresa existente em Patos de Minas, Minas Gerais. Neste
local, as atividades, equipamentos e ambiente de trabalho eram muito similares àqueles em que
laborou o segurado, mesmo porque ali se processava o mesmo tipo de produto. Responsável
técnico pelo levantamento ambiental 1999/2000: Eng. Miriam Terezinha V. Silveira - TEM
0122948. Existe ainda Dirben 8030 emitido em 25/02/2004 por Cícero Ricciardi, CREA
0600566209, que cita laudos de locais de trabalho similares onde consta valor de Leq=85dB(A),
avaliado na área de Produção, valor este que confirma o utilizado na elaboração do presente
PPP."
28 - No caso em apreço, considerando as informações prestadas pela empresa - lembrando
que o PPP apresentado contém a advertência de responsabilização criminal, no caso de não
serem verídicas as informações prestadas pelo subscritor - sobretudo no que diz respeito ao
levantamento das condições ambientais, o qual foi efetuado por profissional legalmente
habilitado em unidade da empresa onde "se processava o mesmo tipo de produto", resta
viabilizado o reconhecimento pretendido, na medida em que o nível de pressão sonora
encontrado mostra-se superior ao limite de tolerância vigente à época da prestação dos
serviços.
29 - Somando-se o labor rural (08/12/1968 a 31/12/1974) e a atividade especial (06/08/1975 a
23/01/1991) reconhecidos nesta demanda, aos períodos incontroversos constantes do "resumo
de documentos para cálculo de tempo de contribuição", constata-se que, na data do
requerimento administrativo (DER 03/10/2012), o autor contava com 47 anos e 08 meses de
serviço, sendo devida, portanto, a revisão pleiteada.
30 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
31 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
32 - Recurso adesivo da parte autora não conhecido. Apelação do INSS e remessa necessária
parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do recurso
adesivo da parte autora, e dar parcial provimento à apelação do INSS, assim como à remessa
necessária, tida por interposta, a fim de estabelecer que a correção monetária dos valores em
atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os
Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será
apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a
expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no
mais, íntegra a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
