Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1927739 / SP
0003937-67.2012.4.03.6114
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE COMUM. CTPS. PRESUNÇÃO DE VERACIDADE.
PERÍODO COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. CÔMPUTO DEVIDO. ATIVIDADES
CONCOMITANTES COMO CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. SOMA DOS SALÁRIOS-DE-
CONTRIBUIÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. ART. 32 DA LEI Nº 8.213/91. ATIVIDADE ESPECIAL.
RUÍDO. PPP. RECONHECIMENTO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. REVISÃO
DEVIDA. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. PRELIMINARES EM CONTRARRAZÕES REJEITADAS. APELAÇÃO DO
AUTOR PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS E REMESSA NECESSÁRIA, TIDA POR
SUBMETIDA, PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - A r. sentença condenou o INSS a revisar o benefício de aposentadoria por tempo de
contribuição, considerando tempo comum e contribuições vertidas como autônomo, bem como
a somar recolhimentos em atividades concomitantes, acrescidas as diferenças apuradas de
correção monetária e juros de mora. Assim, não havendo como se apurar o valor da
condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do
inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula 490 do STJ.
2 - Refutadas as alegações autárquicas em sede de contrarrazões de apelação, eis que, não
obstante o autor declinar que laborou em condições especiais de 21/05/1986 a 22/07/2001,
expressamente requereu o reconhecimento do labor especial "nos exatos termos da petição
inicial", donde se denota, portanto, que a controvérsia versa sobre o lapso de 21/05/1986 a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
31/10/1995.
3 - No tocante ao pleito de conversão do benefício em aposentadoria especial, inexiste
inovação recursal, considerando-se que o INSS deve, nos termos da lei, conceder o beneplácito
mais vantajoso e tendo em vista que se insurgiu quanto ao período em que se almeja a
especialidade. Assim, observado o contraditório e a ampla defesa, nenhum impedimento há
para a referida conversão, se atingido tempo suficiente.
4 - Do labor comum. O período controvertido refere-se a 01/06/1975 a 15/11/1975, trabalhado
na empresa "ENGERAL - Comércio e Representações Ltda.". A anotação do contrato de
trabalho na CTPS do autor comprova o vínculo laboral mantido com a empresa
supramencionada, no cargo de "auxiliar de escritório".
5 - É assente na jurisprudência que a CTPS constitui prova do período nela anotado, somente
afastada a presunção de veracidade mediante apresentação de prova em contrário, conforme
assentado no Enunciado nº 12 do Tribunal Superior do Trabalho. E, relativamente ao
recolhimento de contribuições previdenciárias, em se tratando de segurado empregado, essa
obrigação fica transferida ao empregador, devendo o INSS fiscalizar o exato cumprimento da
norma. Logo, eventuais omissões não podem ser alegadas em detrimento do trabalhador que
não deve ser penalizado pela inércia de outrem.
6 - Infundada a alegação no sentido de que não há outros documentos aptos a comprovar a
relação empregatícia, eis que era ônus do ente autárquico demonstrar eventuais irregularidades
existentes no registro aposto na CTPS do autor (art. 333, II, CPC/73 e art. 373, II, CPC/15),
devendo, desse modo, proceder ao recálculo do tempo de serviço com a devida inclusão do
vínculo laboral em discussão.
7 - Dos períodos de recolhimento como contribuinte individual. O autor alega que, como
empresário, efetuou contribuições sob a inscrição nº 1.043.821.543-2, não sendo computado o
interstício de 01/11/2004 a 31/12/2005.
8 - Para comprovar o alegado, anexou aos autos carta de concessão/memória de cálculo,
extratos do CNIS, dos quais se inferem três números de inscrições em seu nome (nº
1.197.517.423-7 - CI, nº 1.043.821.543-2 - CI, e nº 1.039.895.185-0 - empregado), cópia do
contrato social e "resumo de documentos para cálculo de tempo de contribuição".
9 - De fato, no cálculo do beneplácito não foram consideradas as contribuições de 01/11/2004 a
31/12/2005, devidamente comprovadas pelos documentos, relativas ao NIT de nº
1.043.821.543-2, sendo devida a revisão pleiteada com a inclusão do lapso em apreço.
10 - Da soma das contribuições. Postula o requerente a soma das contribuições feitas nas
inscrições de nº 1.197.517.423-7 e nº 1.043.821.543-2, de janeiro de 2006 a dezembro de
2007, as quais não ultrapassam o valor do teto vigente à época.
11 - Deve ser aplicado o disposto no art. 32, II, da Lei nº 8.213/91. Não obstante ter recolhido
como contribuinte individual no período, inviável a pretensão, eis que havendo números de
inscrições distintos, forçoso concluir que as atividades desempenhadas pelo autor eram
distintas, não se admitindo, em tais casos, que o salário de benefício seja calculado com base
na soma dos salários-de-contribuição vertidos como contribuinte individual.
12 - Para a aplicação da norma prevista no art. 32 da Lei nº 8.213/91, o que interessa saber é
se o serviço foi prestado a mais de um tomador, ainda que a função desempenhada tenha sido
a mesma.
13 - Logo, ainda que tenha recolhido como contribuinte individual, em regime de concomitância,
resta patente que efetuava atividades em locais distintos. Consequentemente, merece reforma
a sentença para se aplicar as regras insculpidas no art. 32 da Lei nº 8.213/91.
14 - Do labor especial. Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e
em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de
legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à
comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando
retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço
especial.
15 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
16 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
17 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos.
18 - Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes
físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria
especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos
enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
19 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
20 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
21 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
22 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
23 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
24 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
25 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
26 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
27 - Alega o autor ter laborado em condições especiais no período de 21/05/1986 a 31/10/1995,
como "engenheiro" e "coordenador de divisão", perante a empresa "Braskem S/A". Para
comprovar o alegado, anexou aos autos Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP com
indicação do responsável pelos registros ambientais, o qual dá conta de exposição a ruído de
96dB(A), superior ao limite de tolerância vigente à época da prestação do serviço.
28 - Enquadrado como especial o período vindicado, de 21/05/1986 a 31/10/1995.
29 - A ausência de informação, no Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, acerca da
habitualidade e permanência de exposição ao agente nocivo, em nada prejudica o segurado, na
medida em que tal campo específico não integra o formulário.
30 - A permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a
jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador.
31 - Procedendo ao cômputo do tempo comum (01/06/1975 a 15/11/1975), do período como
empresário (01/11/2004 a 31/12/2005) e do labor especial (21/05/1986 a 31/10/1995)
reconhecidos nesta demanda, acrescidos dos períodos incontroversos (resumo de documentos
para cálculo de tempo de serviço), verifica-se que o autor alcançou 40 anos, 06 meses e 14
dias de tempo de contribuição, na data do requerimento administrativo (17/03/2010), fazendo
jus à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição integral de sua titularidade.
32 - Acresça-se que, atingidos apenas 09 anos, 05 meses e 11 dias de tempo especial, não tem
direito à aposentadoria especial.
33 - O termo inicial deve ser mantido na data do requerimento administrativo (17/03/2010), uma
vez que se trata de revisão da renda mensal inicial, em razão do reconhecimento de tempo
comum e de período laborado em atividade especial.
34 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
35 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
36 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restou perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
37 - Preliminares suscitadas em contrarrazões do INSS rejeitadas. Apelação do autor provida.
Apelação do INSS e remessa necessária, tida por interposta, parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar as preliminares
aventadas nas contrarrazões do ente autárquico, dar provimento ao recurso de apelação do
autor e dar parcial provimento ao recurso de apelação do INSS e à remessa necessária, tida
por interposta, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
