Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2017290 / SP
0003677-86.2013.4.03.6103
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
09/09/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:19/09/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. MOTORISTA. PERÍODO DE LABOR
EXERCIDO APÓS A EDIÇÃO DA LEI Nº 9.032/95. INSALUBRIDADE NÃO COMPROVADA.
RUIDO. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. REVISÃO DEVIDA. TERMO INICIAL. DATA
DO PRIMEIRO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE
MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TERMO FINAL PARA A SUA INCIDÊNCIA. DATA DA
PROLAÇÃO DA SENTENÇA. ISONOMIA CONSTITUCIONAL. PRECEDENTES DA TURMA.
APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS
DESPROVIDA. REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
mediante o reconhecimento da especialidade do labor desempenhado nos períodos de
29/04/1995 a 09/12/1997, 19/08/1998 a 14/12/1998 e 19/11/2003 a 02/08/2008.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
3 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - A Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida
Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº
1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o
artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a
edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997,
que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico
do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
7 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
8 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
9 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
14 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
15 - Quanto aos períodos controvertidos, todos laborados junto à empresa "Viação Real Ltda",
na função de "Motorista - condutor de ônibus de transporte coletivo", o autor coligiu aos autos o
Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, do qual é possível extrair as seguintes informações
e conclusões: 1) para o interregno de 29/04/1995 a 09/12/1997, o documento em questão não
aponta a submissão a qualquer agente agressivo, revelando, portanto, que não há
especialidade a ser admitida. De se ressaltar que a comprovação da atividade especial pelo
mero enquadramento da categoria profissional - motorista de ônibus no caso em análise -
somente é possível até a edição da Lei nº 9.032/95, em 28/04/1995 - o que já foi feito pela
Autarquia - sendo que, após tal data, deveria o autor ter comprovado a efetiva exposição a
algum agente nocivo, o que não ocorreu; 2) no interregno de 19/08/1998 a 14/12/1998, o PPP
indica a submissão a ruído de 95,6dB(A), acima, portanto, do limite de tolerância vigente à
época; 3) no interregno de 19/11/2003 a 02/08/2008, o PPP aponta a submissão a ruído de
86,4dB(A), também superior ao limite de tolerância previsto na legislação de regência.
16 - Cumpre mencionar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP em análise revela-se
como documento hábil à comprovação do labor especial questionado, na medida em que fora
devidamente preenchido, com a indicação do profissional legalmente habilitado, responsável
pelos registros ambientais nos períodos sobre os quais recai o pedido de reconhecimento da
especialidade da atividade.
17 - Enquadrados como especiais os períodos de 19/08/1998 a 14/12/1998 e 19/11/2003 a
02/08/2008.
18 - Procedendo ao cômputo do labor especial reconhecido nesta demanda, acrescido dos
períodos incontroversos constantes do "resumo de documentos para cálculo de tempo de
contribuição", verifica-se que o autor, na data do requerimento administrativo formulado em
14/10/2009, perfazia 35 anos, 11 meses e 22 dias de serviço, sendo devida, portanto, a revisão
pleiteada.
19 - O termo inicial do benefício deve ser fixado, portanto, na data do requerimento
administrativo apresentado em 14/10/2009, uma vez que, naquela ocasião, o autor já havia
preenchido os requisitos necessários à obtenção da aposentadoria por tempo de contribuição,
com proventos integrais.
20 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
21 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
22 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restou perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
23 - O termo ad quem a ser considerado continua sendo a data da prolação da sentença, ainda
que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Na hipótese de
procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o
trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não
transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos
atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação
ao que foi decidido. Portanto, não se afigura lógico e razoável referido discrímen, a ponto de
justificar o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que
exercem suas funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação. Precedentes.
24 - Apelação da parte autora parcialmente provida. Apelação do INSS desprovida. Remessa
necessária parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade do labor também no período de
19/11/2003 a 02/08/2008, e para condenar a Autarquia a revisar o benefício do autor, pagando-
o, em sua modalidade integral, a partir da data do primeiro requerimento administrativo
(14/10/2009), condenando-a, ainda, no pagamento da verba honorária, fixada em 10% (dez por
cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, negar
provimento à apelação do INSS, e dar parcial provimento à remessa necessária, a fim de
estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a
promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do
IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados
de acordo com o mesmo Manual, mantendo, no mais, o julgado de 1º grau, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
