Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1939310 / SP
0007013-97.2010.4.03.6105
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO. LAUDO TÉCNICO.
CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. REVISÃO DEVIDA. TERMO INICIAL DO
BENEFÍCIO E DOS ATRASADOS NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APURAÇÃO DOS VALORES NA FASE DE
LIQUIDAÇÃO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. APELAÇÃO DO INSS
DESPROVIDA. ALTERAÇAO DOS CONSECTÁRIOS, DE OFÍCIO.
1 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
mediante o reconhecimento de períodos laborados em atividade especial.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
3 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Com o advento da Lei nº 6.887/1980, ficou claramente explicitado na legislação a hipótese
da conversão do tempo laborado em condições especiais em tempo comum, de forma a
harmonizar a adoção de dois sistemas de aposentadoria díspares, um comum e outro especial,
o que não significa que a atividade especial, antes disso, deva ser desconsiderada para fins de
conversão, eis que tal circunstância decorreria da própria lógica do sistema.
7 - Posteriormente, a Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até
a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida
Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997,
modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras
veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em
06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido
por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
8 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
9 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
10 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
11 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
12 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
13 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
14 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
15 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
16 - Sustenta o autor ter laborado em condições especiais nos períodos de 07/02/1972 a
15/04/1976, 03/05/1976 a 15/09/1980 e 09/03/1981 a 30/09/1992.
17 - Tendo em vista a devolutividade da matéria a este E. Tribunal, balizada pelos recursos de
apelação das partes, resta incontroversa a especialidade da atividade desenvolvida no lapso de
09/03/1981 a 30/09/1992.
18 - Quanto ao período de 07/02/1972 a 15/04/1976, trabalhado para a empresa "Singer do
Brasil Indústria e Comércio Ltda.", como "operador qualificado", no setor de "metalúrgica do pó",
o demandante coligiu formulário SB-40 e laudo pericial dando conta da exposição a ruído de
96dB(A) e a óleo mineral de corte e grafite e pó de ferro, de modo habitual e permanente (fls.
100/111).
19 - Ao contrário do alegado pelo ente autárquico, o laudo pericial de fl. 111, assinado por
engenheiro de segurança do trabalho, expressamente indica que as informações se basearam
em catálogos de avaliações ambientais elaborados por profissionais anteriores e através da
análise da função exercida na época.
20 - Relativamente ao interstício de 03/05/1976 a 15/09/1980, laborado perante a "Robert
Bosch Limitada", como "auxiliar especializado na produção/operador na produção C", o
formulário de fl. 112 e o laudo técnico de fl. 113 indicam a exposição de modo habitual e
permanente a ruído de 83dB(A).
21 - Mantida a r. sentença que enquadrou como especiais todos os períodos vindicados
(07/02/1972 a 15/04/1976, 03/05/1976 a 15/09/1980, e 09/03/1981 a 30/09/1992), eis que
desempenhados com sujeição a nível de pressão sonora superior ao limite de tolerância vigente
à época da prestação do serviço.
22 - Conforme planilha elaborada pela Contadoria Judicial de fl. 225, procedendo ao cômputo
do labor especial reconhecidos nesta demanda, acrescidos dos períodos incontroversos
(resumo de documentos para cálculo de tempo de serviço de fls. 130/131), verifica-se que a
parte autora alcançou 41 anos, 10 meses e 15 dias de tempo de contribuição, na data do
requerimento administrativo (25/05/2005), o que lhe já garantia o direito à percepção do
benefício de aposentadoria integral por tempo de contribuição.
23 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(25/05/2005- fl. 98), uma vez que se trata de revisão do coeficiente de cálculo e da renda
mensal inicial, em razão do reconhecimento de período laborado em atividade especial.
Igualmente, o pagamento dos atrasados deve ser a partir do termo inicial do beneplácito
(25/05/2005), considerando que toda a documentação fora apresentada na seara
administrativa.
24 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
25 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
26 - A apuração dos valores devidos deve ser procedida em fase de liquidação, uma vez os
cálculos judiciais de fls. 214/225, ratificados à fl. 243, foram impugnados pelo demandante (fl.
263) e em razão da modificação da data de início do pagamento e dos critérios de fixação de
correção monetária e juros de mora.
27 - Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora provida. Alteração dos
consectários legais, de ofício.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação do INSS, dar provimento à apelação da parte autora para fixar o pagamento dos
atrasados desde o termo inicial do benefício (25/05/2005), e, de ofício, estabelecer que a
correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros
de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o
mesmo Manual, e determinar que a apuração dos valores atrasados dar-se-á na fase de
liquidação, mantendo, no mais, a r. sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, nos
termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-53831 ANO-1964***** RBPS-79
REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979LEG-FED DEC-611 ANO-1992 ART-292***** LBPS-91 LEI DE
BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-8213 ANO-1991 ART-57 PAR-4 PAR-5 ART-58LEG-FED LEI-6887 ANO-
1980LEG-FED MPR-1523 ANO-1996
E REEDIÇÕES ATÉ A EDIÇÃO 13 EM 1997LEG-FED MPR-1596 ANO-1997
EDIÇÃO 14LEG-FED DEC-2172 ANO-1997LEG-FED LEI-9528 ANO-1997LEG-FED LEI-9711
ANO-1998 ART-28***** RPS-99 REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-3048 ANO-1999 ART-70LEG-FED LEI-11960 ANO-2009
Veja
STF RE 870.947/SE REPERCUSSÃO GERAL TEMA 810.
