Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1970149 / SP
0005699-54.2012.4.03.6103
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:08/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. TENSÃO ELETRICA ACIMA DE 250
VOLTS. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. REVISÃO DEVIDA. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. TERMO FINAL PARA A
SUA INCIDÊNCIA. DATA DA PROLAÇÃO DA SENTENÇA. ISONOMIA CONSTITUCIONAL.
PRECEDENTES DA TURMA. ISENÇÃO DE CUSTAS. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
PROVIDA.
1 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição
(NB 42/159.074.439-7, DIB 23/03/2012, fl. 23), mediante o reconhecimento da especialidade do
labor no período de 01/08/1991 a 31/12/2009.
2 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
3 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
4 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Em outras palavras, até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela
categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer
modalidade de prova.
7 - Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao
agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade
desempenhada pelo trabalhador. Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a
comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para
atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal
exigência na legislação anterior.
8 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
9 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
10 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
11 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatada
exposição a tensão elétrica superior a 250 volts em períodos posteriores ao laborado pelo autor,
forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
12 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei
nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
13 - Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do
Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
14 - No mais, restou superada a questão relacionada à supressão do agente "eletricidade" do
rol do Decreto n.º 2.172/97, nos termos do entendimento adotado no REsp nº 1.306.113/SC,
representativo de controvérsia, pela Primeira Seção do Colendo Superior Tribunal de Justiça.
15 - Quanto ao período controvertido (01/08/1991 a 31/12/2009), laborado junto à empresa
"Bandeirante Energias do Brasil", o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP indica que o
autor, no desempenho das funções de "Técnico em Eletricidade", "Tec. Eletricidade PL" e
"Técnico Eletrotécnica", esteve exposto ao fator de risco "Eletricidade - acima 250V ".
16 - Registre-se, por oportuno, que os requisitos de "habitualidade" e "permanência" devem ser
interpretados com granus salis. Exigir-se do trabalhador a exposição ininterrupta aos agentes
agressivos, por toda a sua jornada de trabalho, ficaria restrita somente àqueles que tivessem
sua saúde esmigalhada. Habitualidade pressupõe frequência, que, por sua vez, é atingida com
o exercício cotidiano de determinado trabalho ou função. Portanto, o conceito de moderado ou,
até mesmo, alternado não são auto-excludentes da ideia de habitualidade. A questão da
permanência deve ser encarada da mesma forma. A ideia é de que a exposição seja duradoura,
capaz de prejudicar a saúde do trabalhador. Mas não se exige seja ininterrupta, pois, a seguir
esse raciocínio, somente faria jus à aposentadoria especial o trabalhador doente. Por esta
razão, é que a situação de intermitência não afasta a especialidade do labor, desde que a
exposição se dê rotineiramente, de maneira duradoura.
17 - Dito isso, do cotejo das provas carreadas aos autos, mormente das descrições das
atividades desenvolvidas pelo autor, constantes do PPP acima mencionado, com as
informações extraídas do sítio eletrônico da ANEEL - Agência Nacional de Energia Elétrica,
anexas a este voto, factível concluir que, de fato, durante a jornada de trabalho, o mesmo ficava
habitual e permanentemente exposto à tensão elétrica superior a 250 Volts.
18 - Enquadrado como especial o período de 01/08/1991 a 31/12/2009, uma vez que as
atividades desenvolvidas encontram subsunção no Decreto nº 53.831/64 (código 1.1.8 do
Quadro Anexo), sendo devida, portanto, a revisão pleiteada.
19 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da concessão da benesse em sede
administrativa (DIB 23/03/2012), uma vez que se trata de revisão do coeficiente de cálculo e da
renda mensal inicial, em razão do reconhecimento do período laborado em atividade especial.
20 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
21 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
22 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
23 - O termo ad quem a ser considerado continua sendo a data da prolação da sentença, ainda
que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Na hipótese de
procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia previdenciária, o
trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura enquanto não
transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis exercidos pelos
atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos distintos em relação
ao que foi decidido. Portanto, não se afigura lógico e razoável referido discrímen, a ponto de
justificar o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração profissionais que
exercem suas funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação. Precedentes.
24 - Isenção da Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais.
25 - Apelação da parte autora provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à apelação
da parte autora, para reconhecer a especialidade do labor no período de 01/08/1991 a
31/12/2009, determinando ao INSS que proceda ao recálculo da RMI da aposentadoria do
autor, a partir da data do requerimento administrativo (23/03/2012), sendo que sobre os valores
em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de
Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a
expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, condenando, ainda, a
Autarquia, no pagamento da verba honorária, fixada em 10% sobre as parcelas vencidas,
contadas estas até a data da sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
