Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 1892630 / SP
0003982-92.2011.4.03.6183
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
12/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:21/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. ATIVIDADE
ESPECIAL. RUIDO VARIÁVEL. ADMISSÃO. VALOR DE MAIOR INTENSIDADE. AGENTES
QUÍMICOS. HABITUALIDADE E PERMANÊNCIA. ATIVIDADE DE ORDEM INTELECTUAL.
RECONHECIMENTO PARCIAL. TEMPO INSUFICIENTE PARA A CONCESSÃO DA
APOSENTADORIA ESPECIAL. REVISÃO DA RMI. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE
MORA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E REMESSA NECESSÁRIA PARCIALMENTE
PROVIDAS.
1 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
implantado em 07/08/2008, para que seja convertido em aposentadoria especial, mediante o
reconhecimento da especialidade do labor desempenhado nos períodos de 09/11/1973 a
16/04/1979, 05/01/1981 a 02/05/1981, 01/11/1984 a 02/10/1986 e 11/09/1997 a 07/08/2008.
2 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
3 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
4 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
5 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
6 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
7 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
8 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
9 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
10 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
11 - Quanto ao período de 09/11/1973 a 16/04/1979, laborado junto à empresa "Novartis
Biociências S/A" (Indústria Química), o formulário SB - 40 aponta que o autor, ao desempenhar
a função de "Laboratorista", "exercia as atividades no Laboratório de Pigmentos e Corantes,
realizando testes de aplicação de produtos no papel", com exposição aos seguintes agentes
agressivos: "Corantes sintéticos, Sulfato de sódio, Eletrólitos (cloreto e sulfato de sódio),
pigmentos, alvejantes óticos (branqueadores), Sulfato de Alumínio". Possível, no caso, o
reconhecimento pretendido, de acordo com a previsão contida no Decreto nº 53.831/64, código
1.2.9 do Quadro Anexo, e Decreto nº 83.080/79, código 2.1.2 do Anexo II.
12 - No que diz respeito ao período de 05/01/1981 a 02/05/1981, trabalhado junto à "Sherwin
Williams do Brasil Ind. Com. Ltda", o formulário DSS - 8030 e o Laudo Técnico Pericial revelam
que o autor, ao desempenhar a função de "Auxiliar Laboratório" (Setor Laboratório
Desenvolvimento), esteve exposto a ruído de 58 a 91 dB(A).
13 - Nesse particular, é certo que, até então, aplicava-se o entendimento no sentido da
impossibilidade de reconhecimento da especialidade da atividade, na hipótese de submissão do
empregado a nível de pressão sonora de intensidade variável, em que aquela de menor valor
fosse inferior ao limite estabelecido pela legislação vigente.
14 - Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, percebe-se nova reflexão
jurisprudencial, que se passa a adotar, para admitir a possibilidade de se considerar, como
especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida
em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a
presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo
setor.
15 - Registre-se, a esse respeito, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo o
qual "não sendo possível aferir a média ponderada, deve ser considerado o maior nível de ruído
a que estava exposto o segurado, motivo pelo qual deve ser reconhecida a especialidade do
labor desenvolvido pelo segurado no período, merecendo reforma, portanto, a decisão
agravada que considerou equivocadamente que o labor fora exercido pelo segurado com
exposição permanente a ruído abaixo de 90dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003" (AgRg no
REsp nº 1.398.049/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão monocrática, DJe
13/03/2015). Esta 7ª Turma, em caso análogo, decidiu nesse mesmo sentido.
16 - Dessa forma, possível enquadrar como especial os interregnos mencionados, eis que o
maior ruído atestado é de 91 dB (A), considerando a legislação aplicável ao caso.
17 - Anote-se, ainda, que não há qualquer óbice ao acolhimento do laudo em questão - sob o
fundamento da divergência entre os endereços apontados nos documentos comprobatórios -
uma vez que a perícia foi realizada na antiga sede da empresa - desativada em 30/08/1997 -
conforme esclarecimento constante do próprio formulário, em seu item 1.
18 - Por fim, no tocante ao interregno de 11/09/1997 a 07/08/2008, laborado junto à empresa
"Basf S/A", o autor coligiu aos autos o formulário e o Laudo Pericial, os quais indicam a
submissão de modo habitual, não permanente e ocasional, aos agentes químicos
"Hidrocarbonetos aromáticos, óleos vegetais, cargas minerais, solventes, pigmentos
orgânicos/inorgânicos, amoníaco" ao exercer a função de "Analista de Controle de Cores Sr.".
19 - Com efeito, da descrição das atividades desenvolvidas ("suas tarefas consistem em:
correção e aprovação de cores das tintas produzidas na fábrica III. Faz relatórios para o setor
produtivo; faz gráfico/relatórios e painéis a serem enviados ao cliente; trabalha em sala
administrativa, fazendo uso de microcomputador, impressora, calculadora, espectrômetro e
equipamento denominado markbet para verificação de cores. Eventualmente desloca-se até o
setor produtivo para a retirada de amostra e encaminhamento dos relatórios das cores.)
depreende-se que os afazeres do autor não o retinham num único lugar, obrigando-o a circular
em pontos diversificados da fábrica para cumprimento de múltiplas tarefas, havendo
prevalência, todavia, daquelas de ordem intelectual, das quais não se deduz envolvimento
mínimo com agentes ofensivos e, sobretudo, com habitualidade e permanência. E a conclusão
pericial, ainda, apontara ruído inferior a 80 db(A) nas tarefas avaliadas, nível aquém do limite
legalmente aceito, para configuração da insalubridade em atividades profissionais.
20 - Importante ser dito que o PPP juntado aos autos, não obstante indicar a submissão a
outros agentes agressivos - diversos daqueles constantes do laudo técnico - em nada altera o
quanto acima expendido, na medida em que, repise-se, do cotejo das provas carreadas aos
autos, mormente das descrições das atividades desenvolvidas pelo autor, factível concluir que,
durante a jornada de trabalho, o mesmo não ficava habitual e permanentemente exposto aos
agentes nocivos indicados.
21 - Somando-se a atividade especial reconhecida nesta demanda (09/11/1973 a 16/04/1979,
05/01/1981 a 02/05/1981 e 01/11/1984 a 02/10/1986) ao tempo já computado como especial
pelo INSS e, portanto, incontroverso (fls. 254/256), verifica-se que o autor alcançou, na data do
requerimento administrativo, 16 anos, 11 meses e 04 dias de atividade desempenhada em
condições especiais, tempo nitidamente insuficiente para a concessão aposentadoria pleiteada
na inicial, restando improcedente a demanda quanto à conversão da aposentadoria por tempo
de contribuição em aposentadoria especial.
22 - Por sua vez, merece ser acolhido o pedido do autor no sentido de que a autarquia
previdenciária seja compelida a revisar a renda mensal inicial de seu benefício (aposentadoria
por tempo de contribuição, NB 42/143.783.286-2, DIB 07/08/2008), reconhecendo como tempo
especial de labor, com a consequente conversão em tempo comum, os períodos de 09/11/1973
a 16/04/1979, 05/01/1981 a 02/05/1981 e 01/11/1984 a 02/10/1986.
23 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
24 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
25 - Apelação da parte autora e remessa necessária parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação da parte autora, para reconhecer a especialidade do labor também nos períodos de
09/11/1973 a 16/04/1979 e 05/01/1981 a 02/05/1981, e dar parcial provimento à remessa
necessária, a fim de estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser
calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos
índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício
requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, mantida, no mais, a r. sentença de
1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
