Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2033381 / SP
0002194-49.2013.4.03.6126
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
07/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:18/10/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL.
CERCEAMENTO DE DEFESA. NÃO OCORRÊNCIA. PRELIMINAR REJEITADA. JUNTADA
DE DOCUMENTO NOVO. FASE RECURSAL. SITUAÇÃO. EXCEPCIONAL. BOA-FÉ.
RESPEITO AO CONTRADITÓRIO. POSSIBILIDADE. ATIVIDADE ESPECIAL. ENFERMAGEM.
ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. POSSIBILIDADE. EXPOSIÇÃO A AGENTE
BIOLÓGICO. CONJUNTO PROBATÓRIO. REVISÃO DEVIDA. INTELIGÊNCIA DO ART. 57,
§8º DA LEI 8.213/91. BENEFÍCIO DEVIDO DESDE A DATA DO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVO. EFEITOS FINANCEIROS. DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO
DE REVISÃO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA.
APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA E REMESSA
NECESSÁRIA PARCIALMENTE PROVIDAS.
1 - Quanto à alegação de eventual cerceamento à sua defesa, observa-se que a parte autora,
em momento algum, pugnou pela juntada dos documentos relativos ao pleito de revisão
formulado na via administrativa. Registre-se, inclusive, que se manteve inerte mesmo quando
intimada para se manifestar sobre as cópias do procedimento administrativo juntadas pela
autarquia e para especificação de provas. Precedentes do Colendo Superior Tribunal de
Justiça, no sentido de que a omissão da parte, na fase processual de indicação de provas,
geraria preclusão, inexistindo, portanto, mácula a seu direito de defesa.
2 - Quanto à possibilidade de serem aceitos os documentos juntados na fase recursal, segundo
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
entendimento do c. Superior Tribunal de Justiça, "é admissível a juntada de documentos novos,
inclusive na fase recursal, desde que não se trate de documento indispensável à propositura da
ação, inexista má-fé na sua ocultação e seja observado o princípio do contraditório" (confira-se:
STJ, 4ª Turma, AgInt/EDcl/AREsp 1395012, rel. Min. Marco Buzzi, DJe 03.06.2019).
3 - Dada a excepcionalidade do caso concreto, serão considerados os documentos
apresentados juntamente com as razões de apelação, relativos ao pleito revisional formulado na
via administrativa, conforme disposição contida no art. 397 do CPC/73. Além de se tratar de
mera cópia de documentos do procedimento administrativo, dos quais a ciência autárquica é
evidente, verifica-se que foi oportunizada a manifestação do INSS neste processo judicial,
respeitando-se o contraditório. Aliás, a boa-fé objetiva da autora já se demonstrava desde o
ajuizamento, pois juntou com sua inicial cópia integral do procedimento administrativo, da qual
não constava o requerimento revisional por motivos alheios à sua vontade, atribuíveis
unicamente à mora da autarquia.
4 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao
aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o
ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das
condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que
venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
5 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a
conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da
categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25
de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979,
ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou,
inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva
exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
6 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios,
alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição
do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e
permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A
partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da
atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a
possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
7 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria
profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de
prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação
profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e
permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de
10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de
condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico
previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação
dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que
constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
8 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
9 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível
de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso
concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
14 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do
exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º,
da Lei nº 8.213/91.
15 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99,
conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
16 - Cabível o enquadramento por atividade de enfermagem, de 04/09/1985 a 28/04/1995, e por
efetiva exposição a agentes nocivos biológicos, de modo habitual e permanente, de 29/04/1995
a 15/05/2007, de acordo com os códigos 1.3.2 e 2.1.3 do Quadro Anexo ao Decreto 53.831/64,
1.3.4 do Anexo I ao Decreto 83.080/79, 2.1.3. do Anexo II ao Decreto 83.080/79, 3.0.0. do
Anexo IV ao Decreto 2.172/97 e 3.0.0. e 3.0.1. do Anexo IV ao Decreto 3.048/99.
17 - Nos casos em que resta comprovada a exposição a agente biológico em razão de tarefas
de auxiliar de enfermagem, técnico de enfermagem e enfermeira, a natureza das atividades já
revela, por si só, que mesmo nos casos de utilização de equipamentos de proteção individual,
tido por eficazes, não é possível afastar a insalubridade a que fica sujeito o profissional.
18 - Somando-se a atividade especial ora reconhecida ao tempo já computado como especial
pelo INSS e, portanto, incontroverso, verifica-se que a autora alcançou 26 (vinte e seis) anos, 2
(dois) meses e 25 (vinte e cinco) dias de atividade desempenhada em condições especiais, por
ocasião da data da entrada do requerimento administrativo, fazendo jus, portanto, à
aposentadoria especial pleiteada.
19 - Conforme disposição expressa do § 2º, do artigo 57, da Lei n.º 8.213/91, o termo inicial da
aposentadoria especial segue a regra destinada à aposentadoria por idade, estabelecida no
artigo 49 do referido Diploma Legal.
20 - Rechaça-se a alegação do INSS no sentido de deslocar o termo inicial do benefício para o
dia posterior ao do desligamento do emprego, pois o fato de o segurado ter continuado a
exercer atividade laborativa após a data do requerimento administrativo em nada pode
prejudicá-lo, haja vista que não houve concessão do beneplácito no momento oportuno.
21 - A norma contida no art. 57, § 8º, da Lei de Benefícios, visa proteger a integridade física do
empregado, proibindo o exercício de atividade especial quando em gozo do benefício
correspondente, e não ser invocada em seu prejuízo, por conta da resistência injustificada do
INSS. Precedente desta E. Corte Regional.
22 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data da concessão da benesse em sede
administrativa (DIB 15/05/2007), uma vez que se trata de revisão da espécie de benefício e da
renda mensal inicial, em razão do reconhecimento dos períodos laborados em atividade
especial. Entretanto, os efeitos financeiros da revisão incidirão a partir da data do requerimento
administrativo de revisão (08/02/2013), momento em que consolidada a pretensão resistida,
considerando que a autora, ao pleitear o benefício na esfera administrativa, ainda não havia
apresentado a documentação apta à comprovação do seu direito, a qual foi emitida pela
empresa responsável tão somente em 11/12/2012 (PPP).
23 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da
elaboração da conta, com aplicação do IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C.
STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE) e com efeitos
prospectivos.
24 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
25 - Ante a sucumbência recíproca, a verba honorária dar-se-á por compensada, conforme
prescrito no art. 21 do CPC/73, vigente à época, deixando-se de condenar as partes no
pagamento das custas, eis que a autora é beneficiária da justiça gratuita e o INSS delas está
isento.
26 - Apelação do INSS desprovida. Apelação da parte autora e remessa necessária
parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à
apelação autárquica, dar parcial provimento à apelação da parte autora, para reconhecer a
especialidade do labor também no período de 29/04/1995 a 15/05/2007 e condenar a Autarquia
a revisar o benefício da autora, convertendo-o em aposentadoria especial, e à remessa
necessária, para estabelecer que os efeitos financeiros incidirão a partir da data do
requerimento administrativo de revisão (08/02/2013), sendo que os valores em atraso serão
corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, mantida,
no mais, a r. sentença proferida em primeiro grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto
que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
