
| D.E. Publicado em 22/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento às apelações da parte autora e do INSS e dar parcial provimento à remessa necessária, tida por submetida, para estabelecer que os valores em atraso sejam corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, mantendo, no mais, a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0002951-36.2009.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas por LOURIVALDO SILVA BRASIL e pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por aquele, objetivando a conversão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição de sua titularidade em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de períodos trabalhados em atividades sujeitas a condições especiais.
A r. sentença de fls. 134/138, julgou parcialmente extinto o processo sem julgamento do mérito, em face da coisa julgada, em relação ao pedido de reconhecimento da especialidade de 14/12/1998 a 21/02/2005, e julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar o INSS a reconhecer e a averbar como tempo de serviço especial o período de 22/02/2005 a 08/05/2008, convertendo-o para tempo comum. Condenou a autarquia a pagar todas as diferenças devidas a partir do requerimento administrativo "em face da conversão do período de 22/02/2005 a 31/12/2007 até 02/07/2009 e, a partir daí converter também o período de 01/01/2008 a 08/05/2008 de comum para especial, recalculando-se novamente sua renda mensal inicial, com o pagamento das diferenças", acrescidas de correção monetária, a ser calculada nos termos do Manual de Orientação de Procedimento para os Cálculos na Justiça Federal, desde o respectivo vencimento. Fixou juros de mora de 1% ao mês, desde a citação. Consignou que a partir de 01/07/2009, haverá a incidência, um única vez, até o efetivo pagamento, dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97. Reconhecida a sucumbência recíproca. Concedida a tutela específica. Sentença não submetida ao reexame necessário.
Em razões recursais de fls. 146/150, a parte autora pugna pela reforma da sentença, ao argumento de inexistir coisa julgada, eis que "na ocasião do pedido interposto junto ao Juizado Especial Federal de Americana, fls. 113/116, não havia prova documental comprovando a existência dos ruídos e no processo objeto do apelo, o recorrente comprovou a exposição aos agentes nocivos à saúde".
Por sua vez, o INSS, às fls. 155/157, requer a reforma do decisum, eis que, no seu entender, o uso do Equipamento de Proteção Individual - EPI neutraliza a exposição aos agentes agressivos, afastando-se a especialidade. Prequestiona a matéria.
Intimados, apenas a parte autora apresentou contrarrazões (fls. 160/165).
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, constato ser cabível a remessa necessária.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 06/02/2012, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o art. 475 do CPC/73:
No caso, a r. sentença condenou o INSS a reconhecer e a averbar, em favor da parte autora, tempo de serviço exercido em condições especiais. Assim, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do inciso I, do artigo retro mencionado e da Súmula 490 do STJ.
Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, implantado em 08/05/2008, para que seja convertido em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento da especialidade do labor desempenhado no período de 14/12/1998 a 08/05/2008.
Não assiste razão ao autor no que tange a inexistência de coisa julgada.
Conforme se infere, o demandante propôs ação perante o Juizado Especial Federal Cível de Americana, autos do processo nº 2006.63.10.000299-3, objetivando a concessão do benefício de aposentadoria especial, mediante o reconhecimento da especialidade do labor no período de 27/04/1979 a 21/02/2005, ou, alternativamente, a averbação e conversão de tal interstício para implantação da aposentadoria por tempo de contribuição (fls. 17/22), sendo, ao final, julgada improcedente, "haja vista a inexistência de provas" (fls. 113/116).
Preceitua o art. 301, §§1º e 2º, do CPC/73 (reproduzidos nos mesmos parágrafos do art. 337, do CPC/2015), in verbis:
É relevante destacar que a coisa julgada constitui garantia fundamental do cidadão no nosso Estado Democrático de Direito, consoante o disposto no artigo 5º, XXXVI, da Carta da República, e origina-se da necessidade de ser conferida segurança às relações jurídicas. Tal instituto tem a finalidade de conferir imutabilidade à sentença e, consequentemente, impedir que a lide julgada definitivamente seja rediscutida em ação judicial posterior.
Desta feita, havendo sentença de mérito, ainda que de improcedência por falta de provas, relativa a especialidade no período de 27/04/1979 a 21/02/2005, sendo as mesmas partes, incabível a rediscussão da matéria nesta demanda.
Neste sentido, já decidiu este E. Tribunal Regional Federal:
Avanço no mérito.
A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por decreto do Poder Executivo.
O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos.
Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação prevê que "(...) será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei (Redação dada pela Lei nº 9.032, de 1995)". (grifos nossos)
Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial: (a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79 (presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador, independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para ruído e calor.
A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição do trabalhador às condições especiais.
Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, frise-se, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
O Quadro Anexo do Decreto nº 53.831/64, código 1.1.6, fixou o nível mínimo em 80dB. Por força do Quadro I do Anexo do Decreto nº 72.771/73, de 06/09/1973, esse nível foi elevado para 90dB.
O Quadro Anexo I do Decreto nº 83.080/79, mantido pelo Decreto nº 89.312/84, considera insalubres as atividades que expõem o segurado a níveis de pressão sonora superiores a 90 decibéis, de acordo com o Código 1.1.5. Essa situação foi alterada pela edição dos Decretos nºs 357, de 07/12/1991 e 611, de 21/07/1992, que incorporaram, a um só tempo, o Anexo I do Decreto nº 83.080, de 24/01/1979, que fixou o nível mínimo de ruído em 90dB e o Anexo do Decreto nº 53.831, de 25/03/1964, que fixava o nível mínimo de 80dB, de modo que prevalece este, por ser mais favorável.
De 06/03/1997 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 2.172/97, e de 07/05/1999 a 18/11/2003, na vigência do Decreto nº 3.048/99, o limite de tolerância voltou a ser fixado em 90 dB.
A partir de 19/11/2003, com a alteração ao Decreto nº 3.048/99, Anexo IV, introduzida pelo Decreto nº 4.882/03, o limite de tolerância do agente nocivo ruído caiu para 85 dB.
Observa-se que no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Min. Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), representativo de controvérsia, o STJ reconheceu a impossibilidade de aplicação retroativa do índice de 85 dB para o período de 06/03/1997 a 18/11/2003, devendo ser aplicado o limite vigente ao tempo da prestação do labor, qual seja, 90dB.
Assim, temos o seguinte quadro:
Importante ressaltar que o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
Saliente-se, mais, e na esteira de entendimento deste E. TRF, "a desnecessidade de que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre, em face de inexistência de previsão legal para tanto, e desde que não haja mudanças significativas no cenário laboral" (TRF-3, APELREEX 0004079-86.2012.4.03.6109, OITAVA TURMA, Rel. Des. Fed. TANIA MARANGONI, e-DJF3 Judicial 1 DATA: 15/05/2015). No mesmo sentido: TRF 3ª Região, SÉTIMA TURMA, AC - APELAÇÃO CÍVEL - 1423903 - 0002587-92.2008.4.03.6111, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO DOMINGUES, julgado em 24/10/2016, e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2016).
Por derradeiro, no que se refere ao uso de equipamento de proteção individual, verifica-se que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE 664.335/SC, em sede de repercussão geral, fixou duas teses:
Destarte, a desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
Do caso concreto.
Para comprovar a especialidade no período de 22/02/2005 a 08/05/2008, laborado perante a empresa "Goodyear do Brasil - Produtos de Borracha Ltda.", o autor anexou aos autos Perfil Profissiográfico Previdenciário (fls. 10/12 e 67/69), donde se extrai que no cargo de "vulcanizador de pneus", esteve exposto ao fator de risco ruído, nos seguintes períodos e graus de intensidade:
- de 01/01/2004 a 31/12/2004 - ruído de 87,50 dB(A);
- de 01/01/2005 a 31/12/2005 - ruído de 90,20 dB(A);
- de 01/01/2006 a 31/12/2006 - ruído de 88,80 dB(A);
- de 01/01/2007 a 31/12/2007 - ruído de 88,90 dB(A);
- de 01/01/2008 a 31/12/2008 - ruído de 87,30 dB(A).
Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputo que no interstício de 22/02/2005 a 08/05/2008 merece ser reconhecida a especialidade do labor, eis que desempenhado com sujeição a nível de pressão sonora superior ao limite de tolerância vigente à época.
Conforme planilha anexa à sentença, somando-se a atividade especial ora reconhecida ao tempo já computado como especial pelo INSS e, portanto, incontroverso (27/04/1979 a 13/12/1998 - fls. 45 e 48), verifica-se que o autor alcançou 19 anos, 10 meses e 04 dias de serviço especial, tempo insuficiente para a concessão da aposentadoria especial e, consequentemente, da conversão pleiteada; preservada, todavia, a determinação, contida no decisum, para que o INSS proceda à averbação e ao cômputo do interstício reconhecido como especial e à revisão da renda mensal inicial da aposentadoria de titularidade do autor.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da elaboração da conta, aplicando-se o IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), com efeitos prospectivos.
Ressalto que os embargos de declaração opostos contra referido acórdão tem por escopo a modulação dos seus efeitos - atribuição de eficácia prospectiva -, sendo que a concessão de efeito suspensivo não impede o julgamento do presente recurso, haja vista que o quanto lá decidido deverá ser observado apenas no momento da liquidação deste julgado.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, nego provimento às apelações da parte autora e do INSS e dou parcial provimento à remessa necessária, tida por submetida, para estabelecer que os valores em atraso sejam corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, mantendo, no mais, a r. sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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