Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 1917429 / SP
0039768-30.2013.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
27/05/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:05/06/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. DOCUMENTO NOVO.
DESCONSIDERAÇÃO. NULIDADE. CERCEAMENTO DE DEFESA. PRECLUSÃO.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA
ESPECIAL. ATIVIDADE ESPECIAL. AGROPECUÁRIA. CANA-DE-AÇÚCAR.
ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. CONJUNTO PROBATÓRIO SUFICIENTE. TEMPO
INSUFICIENTE PARA A CONCESSÃO DA APOSENTADORIA ESPECIAL. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA
PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - De início, consigna-se que não serão considerados os documentos apresentados às fls.
228/233, fls. 262/286, fl. 288 e fls. 309/311-verso - laudo pericial e prova testemunhal
emprestados, assim como Perfis Profissiográficos Previdenciários -, uma vez que, em fase
recursal, a demonstração de fatos já existentes à época do aforamento judicial não se inclui na
regra excepcional que admite a juntada de documentos em momento diverso ao do ingresso
com a demanda. Com efeito, de todo imprópria a juntada dos documentos nesta avançada fase
processual, na medida em que os mesmos não se destinam a fazer prova de fatos ocorridos
depois dos articulados, ou mesmo para contrapô-los aos que foram produzidos, a contento do
disposto nos artigos 396 e 397 e do CPC/73 (arts. 434 e 435 CPC).
2 - No que concerne à preliminar de nulidade da instrução por cerceamento de defesa,
encontra-se preclusa a oportunidade para suscitá-la. Isto porque, caberia à parte impugnar a
decisão de primeiro grau que indeferiu a produção de prova técnica (fls. 167 e verso) na
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
primeira oportunidade que tivesse para se manifestar nos autos, consoante preleciona o art.
245 do CPC/73, mediante a interposição de agravo, medida que não adotou. Rejeita-se a
preliminar.
3 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal, especificamente na Lei de
Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em
ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação
aplicável à matéria.
4 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei n. 3.807, de 26.08.1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
7 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06.03.1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
8 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por
demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
9 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima
de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
10 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
11 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
12 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
13 - A apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento
da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia
tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima
do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos
anos anteriores, referido nível era superior.
14 - Sustenta o demandante ter laborado em condições especiais de 05/04/1973 a 15/12/1973,
16/12/1973 a 31/03/1974, 02/05/1974 a 31/10/1974, 04/11/1974 a 15/04/1975, 05/05/1975 a
31/10/1975, 05/05/1976 a 30/11/1976, 01/12/1976 a 31/03/1977, 18/04/1977 a 30/11/1977,
01/12/1977 a 15/04/1978, 02/05/1978 a 31/10/1978, 03/11/1978 a 31/03/1979, 01/09/1979 a
21/12/1979, 02/01/1980 a 31/03/1980, 02/05/1980 a 31/10/1980, 03/11/1980 a 31/03/1981,
22/04/1981 a 23/09/1981, 01/10/1981 a 15/04/1982, 03/05/1982 a 23/10/1982, 18/04/1983 a
30/11/1983, 01/12/1983 a 31/03/1984, 23/04/1984 a 14/11/1984, 19/11/1984 a 13/04/1985,
02/05/1985 a 31/10/1985, 11/11/1985 a 15/05/1986, 27/05/1986 a 29/11/1986, 01/12/1986 a
15/04/1987, 21/04/1987 a 06/11/1987, 09/11/1987 a 05/01/1988, 09/01/1988 a 30/04/1988,
06/05/1988 a 29/11/1988, 09/12/1988 a 30/04/1989, 08/05/1989 a 01/11/1989, 07/11/1989 a
26/04/1990, 02/05/1990 a 26/11/1990, 03/12/1990 a 30/04/1991, 08/05/1991 a 27/11/1991,
08/01/1997 a 30/04/1997, 05/05/1997 a 06/12/1997 e 28/01/1998 a 17/10/2009.
15 - Para comprovar a especialidade nos intervalos compreendidos entre 05/04/1973 a
05/01/1988, laborado como trabalhador rural, na "Agropecuária Monte Sereno S.A.", no setor
"Agro Pastoril", o autor anexou aos autos cópia da CTPS (fls. 20/29) e Perfil Profissiográfico
Previdenciário (fls. 95/97), o qual dá conta de que "executava serviços de corte de canas cruas
ou queimadas, catação de canas, capina e arranque de pragas utilizando facão, enxada e
enxadão".
16 - Durante o trabalho para "Açucareira Conora S/A", nos interstícios entre 09/01/1988 a
27/11/1991, como "rurícola", foi coligida cópia da CTPS (fls. 29/33) e PPP's de fls. 65/80, donde
se extrai que o autor laborava no corte e carpa de cana-de-açúcar.
17 - Quanto aos períodos de 08/01/1997 a 30/04/1997 e 05/05/1997 a 06/12/1997, trabalhados
em prol da "Agro-Pecuária Gino Bellodi Ltda.", consta da CTPS (fls. 34/35) que o requerente
exerceu o encargo de "rurícola", cujas atividades são descritas nos formulários de fls. 82 e 83
como "limpeza de caminhões, retirando palha, cana e terra, engata e desengata julietas durante
o plantio e faz a catação da cana, etc".
18 - No aspecto, é possível o enquadramento das atividades exercidas na lavoura de cana-de-
açúcar no item 2.2.1 do Decreto nº 53.831/64 ("trabalhadores na agropecuária"), classificando-
as como especiais.
19 - Com efeito, a insalubridade do corte e cultivo de cana-de-açúcar é inquestionável, eis que,
conhecidamente, a atividade envolve desgaste físico excessivo, sujeita a horas de exposição ao
sol e a produtos químicos, além do contato direto com os malefícios da fuligem, exigindo-se,
inclusive, alta produtividade dos trabalhadores e em lamentáveis condições antiergonômicas de
trabalho. Esse também é o entendimento desta Sétima Turma: APEL 0026846-
88.2012.4.03.9999/SP, 7ª Turma, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, v. u., julgado em 13/02/2017.
20 - No tocante ao período de 28/01/1998 a 17/10/2009, laborado para "Usina Santa Adélia
S/A", como "servente de lavoura", foi coligida cópia da CTPS (fl. 35) e formulário (fl. 84), donde
se extrai que as tarefas eram exercidas no setor de "segurança do trabalho", exposto aos
agentes nocivos "condições climática diversas, tais como: chuva, vento, sol, calor, etc.", sendo
inviável o reconhecimento da especialidade.
21 - A atividade exercida não se encontra nos róis dos Decretos vigentes à época, não há
descrição de quais intempéries o autor estava sujeito, sendo incabível o reconhecimento pelo
agente "calor", eis que, como dito alhures, este nunca prescindiu de laudo ambiental ou
documento equivalente para sua comprovação.
22 - Assim, possível o reconhecimento da especialidade nos períodos de 05/04/1973 a
15/12/1973, 16/12/1973 a 31/03/1974, 02/05/1974 a 31/10/1974, 04/11/1974 a 15/04/1975,
05/05/1975 a 31/10/1975, 05/05/1976 a 30/11/1976, 01/12/1976 a 31/03/1977, 18/04/1977 a
30/11/1977, 01/12/1977 a 15/04/1978, 02/05/1978 a 31/10/1978, 03/11/1978 a 31/03/1979,
01/09/1979 a 21/12/1979, 02/01/1980 a 31/03/1980, 02/05/1980 a 31/10/1980, 03/11/1980 a
31/03/1981, 22/04/1981 a 23/09/1981, 01/10/1981 a 15/04/1982, 03/05/1982 a 23/10/1982,
18/04/1983 a 30/11/1983, 01/12/1983 a 31/03/1984, 23/04/1984 a 14/11/1984, 19/11/1984 a
13/04/1985, 02/05/1985 a 31/10/1985, 11/11/1985 a 15/05/1986, 27/05/1986 a 29/11/1986,
01/12/1986 a 15/04/1987, 21/04/1987 a 06/11/1987, 09/11/1987 a 05/01/1988, 09/01/1988 a
30/04/1988, 06/05/1988 a 29/11/1988, 09/12/1988 a 30/04/1989, 08/05/1989 a 01/11/1989,
07/11/1989 a 26/04/1990, 02/05/1990 a 26/11/1990, 03/12/1990 a 30/04/1991, 08/05/1991 a
27/11/1991, 08/01/1997 a 30/04/1997 e 05/05/1997 a 06/12/1997.
23 - Logo, somando-se a especialidade reconhecida nesta demanda, verifica-se que o autor
contava com 17 anos, 4 meses e 3 dias de atividade desempenhada em condições especiais no
momento do requerimento administrativo (17/10/2009 - fls. 98), não fazendo jus ao benefício de
aposentadoria especial.
24 - Sagrou-se vitorioso o autor ao ver reconhecida parte da especialidade vindicada. Por outro
lado, não foi concedida a aposentadoria especial pretendida, restando vencedora nesse ponto a
autarquia. Desta feita, dá-se os honorários advocatícios por compensados entre as partes, ante
a sucumbência recíproca (art. 21 do CPC/73), e deixa-se de condenar qualquer delas no
reembolso das custas e despesas processuais, por ser a parte autora beneficiária da justiça
gratuita e o INSS delas isento.
25 - Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar e, no
mérito, dar parcial provimento à apelação da parte autora, para declarar como especiais os
períodos de 05/04/1973 a 15/12/1973, 16/12/1973 a 31/03/1974, 02/05/1974 a 31/10/1974,
04/11/1974 a 15/04/1975, 05/05/1975 a 31/10/1975, 05/05/1976 a 30/11/1976, 01/12/1976 a
31/03/1977, 18/04/1977 a 30/11/1977, 01/12/1977 a 15/04/1978, 02/05/1978 a 31/10/1978,
03/11/1978 a 31/03/1979, 01/09/1979 a 21/12/1979, 02/01/1980 a 31/03/1980, 02/05/1980 a
31/10/1980, 03/11/1980 a 31/03/1981, 22/04/1981 a 23/09/1981, 01/10/1981 a 15/04/1982,
03/05/1982 a 23/10/1982, 18/04/1983 a 30/11/1983, 01/12/1983 a 31/03/1984, 23/04/1984 a
14/11/1984, 19/11/1984 a 13/04/1985, 02/05/1985 a 31/10/1985, 11/11/1985 a 15/05/1986,
27/05/1986 a 29/11/1986, 01/12/1986 a 15/04/1987, 21/04/1987 a 06/11/1987, 09/11/1987 a
05/01/1988, 09/01/1988 a 30/04/1988, 06/05/1988 a 29/11/1988, 09/12/1988 a 30/04/1989,
08/05/1989 a 01/11/1989, 07/11/1989 a 26/04/1990, 02/05/1990 a 26/11/1990, 03/12/1990 a
30/04/1991, 08/05/1991 a 27/11/1991, 08/01/1997 a 30/04/1997 e 05/05/1997 a 06/12/1997,
mantendo, no mais, a r. sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Referência Legislativa
***** CPC-73 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973
LEG-FED LEI-5869 ANO-1973 ART-396 ART-397 ART-245 ART-21***** CPC-15 CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL DE 2015
LEG-FED LEI-13105 ANO-2015 ART-434 ART-435LEG-FED LEI-5890 ANO-1973 ART-9*****
LOPS-60 LEI ORGÂNICA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED LEI-3807 ANO-1960 ART-31***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA
PREVIDÊNCIA SOCIAL
LEG-FED DEC-83080 ANO-1979LEG-FED LEI-9032 ANO-1995LEG-FED DEC-2172 ANO-
1997LEG-FED LEI-9528 ANO-1997LEG-FED DEC-53831 ANO-1964 ITE-2.2.1
Precedentes
PROC: APCIV 0026846-88.2012.4.03.9999/SP ÓRGÃO: SÉTIMA TURMA JUIZ:
DESEMBARGADOR FEDERAL TORU YAMAMOTO AUD: 13/02/2017
DATA: 24/02/2017
