
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004730-15.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELI BATISTA DE MEDEIROS FILHO
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA CRISTINA SANTOS - SP282491-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0004730-15.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: CELI BATISTA DE MEDEIROS FILHO
Advogado do(a) APELADO: ANDREIA CRISTINA SANTOS - SP282491-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
"(...) a primeira tese objetiva que se firma é: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade não haverá respaldo constitucional à aposentadoria especial. A Administração poderá, no exercício da fiscalização, aferir as informações prestadas pela empresa, sem prejuízo do inafastável judicial review. Em caso de divergência ou dúvida sobre a real eficácia do Equipamento de Proteção Individual, a premissa a nortear a Administração e o Judiciário é pelo reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial. Isto porque o uso de EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submete
(...)
a segunda tese fixada neste Recurso Extraordinário é a seguinte: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. CONVERSÃO DO TEMPO DE SERVIÇO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS PARA COMUM. FATOR DE CONVERSÃO. INCIDÊNCIA DO DECRETO N. 4.827/2003, QUE ALTEROU O ART. 70 DO DECRETO N. 3.048/1999. MATÉRIA DECIDIDA SOB O RITO DO ART. 543-C DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. AGRAVO DESPROVIDO.
1. "A Terceira Seção desta Corte, no julgamento do REsp.1.151.363/MG, representativo da controvérsia, realizado em 23.3.2011 e de relatoria do douto Ministro JORGE MUSSI, firmou o entendimento de que, de acordo com a alteração dada pelo Decreto 4.827/2003 ao Decreto 3.048/99, a conversão dos períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época será realizada de acordo com as novas regras da tabela definida no artigo 70 que, para o tempo de serviço especial correspondente a 25 anos, utiliza como fator de conversão, para homens, o multiplicador 1,40".
(AgRg no REsp n.1.080.255/MG, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJe 15.04.2011) 2. Agravo regimental desprovido.
(AgRg no REsp 1172563/MG, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), SEXTA TURMA, julgado em 16/06/2011, DJe 01/07/2011) (grifos nossos).
PREVIDENCIÁRIO. APELAÇÃO. REMESSA NECESSÁRIA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. COMPROVAÇÃO DAS CONDIÇÕES ESPECIAIS. AGENTES QUÍMICOS. PROCESSO PRODUTIVO. DEMONSTRAÇÃO. DESNECESSIDADE. EPI EFICAZ. EXPOSIÇÃO PERMANENTE. IMPLEMENTAÇÃO DOS REQUISITOS. DIB. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO MANTIDOS. TUTELA ANTECIPADA. SUBSTITUIÇÃO IMEDIATA DO BENEFÍCIO.
(omissis)
5. Agentes químicos. Não há previsão sobre a comprovação de determinado processo produtivo, restringindo-se a prova à constatação da exposição do segurado aos elementos prejudiciais à sua saúde e integridade física.
6. O uso de EPI eficaz, no caso de exposição a agentes químicos, afasta a hipótese de insalubridade.
(omissis)
15. Sentença corrigida de ofício. Apelação do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS e remessa necessária parcialmente providas.
(Apelação/Remessa Necessária nº 2014.61.12.002415-9, Relator Des. Fed. Paulo Domingues, j. 12/11/2018, v.u., p. DJe 28/11/2018)
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento dos honorários advocatícios, os quais arbitro no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (art. 85, §2º, do CPC).
Havendo a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no §3º do artigo 98 do CPC, ficará a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que a fundamentou.
Ante o exposto,
conheço em parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dou-lhe provimento,
para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e julgar improcedente a ação, condenando a parte autora nas verbas de sucumbência, com dever de pagamento suspenso.É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVISÃO DE BENEFÍCIO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. AUSÊNCIA DE INTERESSE RECURSAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADE ESPECIAL. RUÍDO E CALOR ABAIXO DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA. AGENTE QUÍMICO. POEIRA RESPIRÁVEL E TOTAL. EPI EFICAZ. CIMENTO E CAL EM INSALUBRIDADE DE GRAU MÍNIMO E DE FORMA INTERMITENTE. IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO DO LABOR ESPECIAL. REVISÃO INDEVIDA. SENTENÇA REFORMADA. INVERSÃO DA VERBA HONORÁRIA. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. APELAÇÃO DO INSS CONHECIDA EM PARTE E PROVIDA.
1 - Inicialmente, quanto ao pleito de reconhecimento da prescrição quinquenal das parcelas vencidas antes do quinquênio finalizado no aforamento da demanda, verificada a nítida ausência de interesse recursal, eis que a questão já foi reconhecida pelo decisum
2 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, mediante o reconhecimento de períodos comuns e períodos trabalhados em atividades sujeitas a condições especiais.
3 - Inicialmente, em razão da devolutividade da matéria a este E. Tribunal (balizada pelos temas que foram ventilados pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS em seu apelo), restam incontroversos os períodos comuns de 02/02/1976 a 28/02/1976 e de 11/03/1976 a 15/05/1976 reconhecidos pelo magistrado a quo,
4 - O pedido formulado pela parte autora encontra previsão legal especificamente na Lei de Benefícios. Assim, devidamente inserido no Sistema Previdenciário, não há que se falar em ausência de custeio, desde que preenchidos os requisitos previstos na vasta legislação aplicável à matéria.
5 - Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo
tempus regit actum
, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.6 - Em período anterior ao da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
7 - A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial.
8 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais, agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os grupos profissionais.
9 - A Medida Provisória nº 1.523, de 11/10/1996, sucessivamente reeditada até a Medida Provisória nº 1.523-13, de 25/10/1997, convalidada e revogada pela Medida Provisória nº 1.596-14, de 10/11/1997, e ao final convertida na Lei nº 9.528, de 10/12/1997, modificou o artigo 58 e lhe acrescentou quatro parágrafos. A regulamentação dessas regras veio com a edição do Decreto nº 2.172, de 05/03/1997, em vigor a partir de sua publicação, em 06/03/1997, que passou a exigir laudo técnico das condições ambientais de trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
10 - Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
11 - Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
12 - Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
13 - De acordo com a NR-15, da Portaria nº 3.214/78, de observância imperativa consoante determinam os Anexos IV do Decreto nº 2.172/97 e do Decreto nº 3.048/99, a insalubridade deve levar em consideração não só o IBUTG, mas também o tipo de atividade exercida (leve, moderada ou pesada), sendo que quanto mais dinâmica for a atividade, menor a intensidade de temperatura.
14 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
15 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
16 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
17 - Saliente-se que, conforme declinado alhures, a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
18 - É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, conforme se extrai da conjugação das regras dos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
19 - O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
20 - Sustenta a parte autora ter laborado em condições especiais no período de 06/03/1997 a 31/10/2014, como “operador de manutenção de ponte rolante” e ‘operador de produção II”, na empresa “Votorantim Cimentos S/A”.
21 - Para comprovar que a atividade ocorreu em condições prejudiciais à saúde e à integridade física, coligiu aos autos Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, emitido em 12/12/2013, com indicação dos responsáveis pelos registros ambientais e monitoração biológica, no qual consta que, de 12/2011 a 30/11/2012, estava sujeito aos agentes químicos poeira total e poeira respirável, e, a partir de 1º/12/2012, aos agentes físicos ruído de 79,82dB(A) e calor de 25,71 IBUTG, e aos agentes químicos poeira total e poeira respirável, com utilização, em ambos os lapsos, de EPI/EPC eficaz.
22 - Anexou, também, laudo técnico pericial elaborado em ação trabalhista ajuizada pelo autor em face da empresa “Votorantim Cimentos S/A”, com data de perícia em 06/07/2015, no qual o
experto
de confiança do juízo concluiu que, de 16/07/1991 a 04/12/2014, havia a exposição a ruído de 80,1 dB(A), inferior ao limite de tolerância vigente à época, e a “a presença de cimento e cal nas fases de grande exposição à poeiras, nas atividades do reclamante, de modo habitual, não ocasional e intermitente”, em grau de insalubridade mínimo.23 - Neste aspecto, inviável o reconhecimento do labor especial no interregno em apreço, eis que os níveis de ruído indicados nos documentos, bem como a temperatura a que estava sujeito, considerando a atividade desempenhada, são inferiores aos limites de tolerância vigentes às épocas.
24 - Igualmente, relativamente aos agentes químicos, constata-se que o laudo pericial consignou sua exposição de forma intermitente e, ainda, em grau de insalubridade mínimo. Ademais, no PPP, o agente poeira (total e respirável) encontra-se genericamente indicado, sem alusão a (qualquer) substância correspondente, o que inviabiliza, pois, o reconhecimento da excepcionalidade, bem como há expressa informação de que havia uso de EPI eficaz.
25 - Relativamente ao tema, cumpre realçar que o art. 58, §§ 1º e 2º, da Lei nº 8.213/91 sofreu alteração por meio da Lei nº 9.732/98, publicada em 14/12/1998, exigindo-se, no bojo do laudo técnico, informação acerca da existência de tecnologia de proteção - quer coletiva, quer individual - passível de atenuar a intensidade de agentes nocivos a limites toleráveis, apartando a insalubridade da atividade desempenhada.
26 - Portanto, a partir de 15/12/1998, nos períodos em que está comprovada a utilização de equipamentos individuais de proteção eficazes, como no caso em apreço, fica afastada a insalubridade.
27 - Inversão do ônus sucumbencial, com condenação da parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (CPC, art. 85, §2º), observando-se o previsto no §3º do artigo 98 do CPC.
28 - Apelação do INSS conhecida em parte e provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu conhecer em parte da apelação do INSS e, na parte conhecida, dar-lhe provimento, para reformar a r. sentença de 1º grau de jurisdição e julgar improcedente a ação, condenando a parte autora nas verbas de sucumbência, com dever de pagamento suspenso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
