Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / MS
5006265-83.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
17/12/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 08/01/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REVISÃO DO ATO CONCESSÓRIO DO BENEFÍCIO.
DECADÊNCIA. ART. 103-A DA LEI Nº 8.213/91. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42,
CAPUT E § 2º DA LEI 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE
TOTAL E PERMANENTE. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO.
- É de dez anos o prazo decadencial para o INSS proceder à revisão do ato concessório do
benefício. Art. 103-A da Lei nº 8.213/91.
- Concedida a aposentadoria por invalidez na via administrativa em 01/10/1999, incabível
proceder-se à revisão dos requisitos de concessão do benefício, como pretende o INSS em seu
recurso.
- Comprovada a incapacidade total e permanente para o trabalho, bem como presentes os
demais requisitos previstos nos artigos 42, caput e §2º da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão
do benefício de aposentadoria por invalidez.
- Apelação do INSS não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006265-83.2020.4.03.9999
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARILDA SANTANA DE SOUZA NASCIMENTO
Advogado do(a) APELADO: ALEX CEOLIN ANTONIO - MS20086-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006265-83.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARILDA SANTANA DE SOUZA NASCIMENTO
Advogado do(a) APELADO: ALEX CEOLIN ANTONIO - MS20086-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento
de natureza previdenciária, objetivando o restabelecimento de aposentadoria por invalidez,
sobreveio sentença de procedência do pedido, condenando-se a autarquia a restabelecer o
benefício, desde a indevida cessação (31/05/2018), bem como a pagar os valores atrasados com
correção monetária e juros de mora, além de custas processuais e honorários advocatícios, estes
fixados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a prolação da sentença, nos termos da
Súmula 111 do STJ. Foi concedida a antecipação da tutela, para implantação do benefício no
prazo de 30 dias, sob pena de ulterior imposição de medida coercitiva.
A sentença não foi submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma
da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, uma vez que não preenchidos os
requisitos para restabelecimento da aposentadoria por invalidez, considerando-se que a doença
incapacitante seria preexistente à filiação da demandante no RGPS.
Com as contrarrazões, nas quais a parte autora alega a decadência do direito da autarquia de
rever o ato concessório do benefício e postula a manutenção da sentença,os autos foram
remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5006265-83.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: MARILDA SANTANA DE SOUZA NASCIMENTO
Advogado do(a) APELADO: ALEX CEOLIN ANTONIO - MS20086-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Recebo o recurso de apelação
do INSS, nos termos do artigo 1.010 do Código de Processo Civil, haja vista que tempestivo.
Os requisitos para a concessão da aposentadoria por invalidez, de acordo com o artigo 42, caput
e § 2.º, da Lei n.º 8.213/91, são os que seguem: 1) qualidade de segurado; 2) cumprimento da
carência, quando for o caso; 3) incapacidade insuscetível de reabilitação para o exercício de
atividade que garanta a subsistência; 4) não serem a doença ou a lesão existentes antes da
filiação à Previdência Social, salvo se a incapacidade sobrevier por motivo de agravamento
daquelas.
No caso em comento, verifica-se que a autarquia concedeu administrativamente à autora o
benefício de aposentadoria por invalidez NB 1002757875 em 01/10/1999 (Id 142141400 - Pág.
18), por considerar que esta cumprira os requisitos legais para tal. Em 31/05/2018 (com
mensalidades de recuperação até 03/03/2020) foi cessado o benefício, sob o argumento de que a
demandante recuperara a capacidade laborativa. Em face da cessação do benefício foi interposta
a presente ação, a qual foi julgada procedente pelo MM. Juiz a quo. Em sede de recurso, a
autarquia se insurge contra a concessão do benefício, sustentado a ausência dos requisitos
legais, posto que a doença incapacitante seria preexistente ao ingresso da segurada no Regime
Geral da Previdência Social.
Ora, é prerrogativa da autarquia submeter o segurado à perícia médica a fim de verificar a
persistência da incapacidade laborativa e, uma vez não verificada, proceder à cessação do
benefício, nos termos do art. 101 da Lei nº 8.213/91. Ocorre que, neste caso, o que pretende o
INSS é, por vias indiretas, a revisão das condições de concessão do benefício de aposentadoria
por invalidez, ocorrida em 1999.
Neste passo, dispõe o artigo 69 da Lei nº 8.212/91:
"Art. 69. O Ministério da Previdência e Assistência Social e o Instituto Nacional do Seguro Social -
INSS manterão programa permanente de revisão da concessão e da manutenção dos benefícios
da Previdência Social, a fim de apurar irregularidades e falhas existentes."
No mesmo sentido, reza a Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal:
"A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais,
porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência e oportunidade,
respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial."
Assim, constatada eventual ilegalidade na concessão, deve a autarquia tomar as providências
cabíveis para o seu cancelamento, respeitado o devido processo legal.
Nesse sentido, foi editada a Súmula 160 do extinto Tribunal Federal de Recursos:
"Súmula 160 - A suspeita de fraude na concessão de benefício previdenciário não enseja, de
plano, a sua suspensão ou cancelamento, mas dependerá de apuração em processo
administrativo."
Como visto, o INSS não está tolhido de corrigir ato concessório de benefício editado com
flagrante vício que constitua burla a legislação previdenciária, mas deverá assegurar ampla
defesa e contraditório antes de suspender ou cancelar o benefício. Todavia, diante do princípio da
segurança jurídica, o poder de autotutela do Estado encontra-se limitado por prazos decadenciais
previstos na legislação previdenciária.
A previsão do prazo decadencial de todo e qualquer direito ou ação para a revisão do ato de
concessão de benefício, adveio com a 9ª reedição da MP nº 1.523, de 27/06/1997, convertida na
Lei nº 9.528, de 10/12/97, que veio a fixar em seu artigo 103, o prazo decadencial de 10 (dez)
anos, verbis:
"Art. 103. É de dez anos o prazo de decadência de todo e qualquer direito ou ação do segurado
ou beneficiário para a revisão do ato de concessão de benefício, a contar do dia primeiro do mês
seguinte ao do recebimento da primeira prestação ou, quando for o caso, do dia em que tomar
conhecimento da decisão indeferitória definitiva no âmbito administrativo."
Posteriormente, a Lei nº 9.784, de 29/01/99, em seu artigo 54 disciplinou o prazo decadencial
quinquenal para anulação dos atos administrativos.
"Art. 53. A Administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade,
e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos
adquiridos.
Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos
favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados,
salvo comprovada má-fé.
§1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção
do primeiro pagamento.
§2º Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que
importe impugnação à validade do ato."
Com o advento da MP nº 138, de 19/11/2003, foi introduzido no regramento previdenciário - Lei n.
8.213/91 - o artigo 103-A, que trata da hipótese de revisão dos atos administrativos, convolando-
se tal MP na Lei nº 10.839/04, cujo teor transcrevo:
"Art. 103-A. O direito da Previdência Social de anular os atos administrativos de que decorram
efeitos favoráveis para os seus beneficiários decai em dez anos, contados da data em que foram
praticados, salvo comprovada má-fé."
No presente caso, o benefício da autora foi concedido em 01/10/1999, de forma que o prazo
decenal para revisão do ato concessório do referido benefício já se encerrou há muito.
Nesse sentido, jurisprudência desta Décima Turma:
“PREVIDENCIÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. REVISÃO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO.
DECADÊNCIA PARA A ADMINISTRAÇÃO. ART. 103-A, DA LEI N. 8.213/91.
1. O INSS tem o prazo decadencial de 10 anos para rever os seus atos de que decorram efeitos
favoráveis a seus beneficiários. Aplicação do Art. 103-A, da Lei 8.213/91.
2. Concedida a aposentadoria em 26/11/1999, decaiu a autarquia do direito de rever o ato
administrativo de concessão do benefício, que gerou vantagem ao segurado.
3. Remessa oficial desprovida.
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, RemNecCiv - REMESSA NECESSáRIA CíVEL - 5000110-
19.2019.4.03.6113, Rel. Desembargador Federal PAULO OCTAVIO BAPTISTA PEREIRA,
julgado em 20/05/2020, Intimação via sistema DATA: 22/05/2020)”
Cumpre ressaltar, ainda, que a autarquia não comprovoumá-fé da segurada. Incabível, assim,
proceder-se à revisão dos requisitos de concessão da aposentadoria por invalidez, como
pretende o INSS em seu recurso.
De rigor, portanto, o cômputo da aposentadoria por invalidez já recebida para fins de aferição da
manutenção da qualidade de segurado e do período de carência neste feito. Assim, a qualidade
de segurado da parte autora e o cumprimento da carência prevista no inciso I do artigo 25 da Lei
nº 8.213/91 restaram comprovadas, uma vez que ela esteve em gozo de aposentadoria por
invalidez, benefício este que lhe foi concedido e cessado administrativamente em 31/05/2018
(com mensalidades de recuperação até 03/03/2020). Dessa forma, estes requisitos foram
reconhecidos pela autarquia por ocasião da concessão do benefício. Proposta a ação em
26/07/2019, não há falar em perda da qualidade de segurado.
Para a solução da lide, ainda, é de substancial importância a prova técnica produzida. Neste
passo, a incapacidade para o exercício de trabalho que garanta a subsistência foi atestada pelo
laudo pericial (Id 142141400 - Pág. 68/74). De acordo com referido laudo, a parte autora,
portadora de retinite pigmentar, glaucoma e cegueira legal, está incapacitada de forma total e
permanente para o trabalho que lhe garantia o sustento.
Diante do quadro relatado pelo perito judicial e considerando as condições pessoais da autora,
tornam-se praticamente nulas as chances de ela se inserir novamente no mercado de trabalho,
não havendo falar em possibilidade de reabilitação.
Assim, uma vez preenchidos os requisitos legais, faz jus a parte autora ao restabelecimento da
aposentadoria por invalidez, nos termos da r. sentença.
Diante do exposto, NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, nos termos da
fundamentação.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. REVISÃO DO ATO CONCESSÓRIO DO BENEFÍCIO.
DECADÊNCIA. ART. 103-A DA LEI Nº 8.213/91. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. ART. 42,
CAPUT E § 2º DA LEI 8.213/91. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA. INCAPACIDADE
TOTAL E PERMANENTE. REQUISITOS PRESENTES. BENEFÍCIO DEVIDO.
- É de dez anos o prazo decadencial para o INSS proceder à revisão do ato concessório do
benefício. Art. 103-A da Lei nº 8.213/91.
- Concedida a aposentadoria por invalidez na via administrativa em 01/10/1999, incabível
proceder-se à revisão dos requisitos de concessão do benefício, como pretende o INSS em seu
recurso.
- Comprovada a incapacidade total e permanente para o trabalho, bem como presentes os
demais requisitos previstos nos artigos 42, caput e §2º da Lei n.º 8.213/91, é devida a concessão
do benefício de aposentadoria por invalidez.
- Apelação do INSS não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento a apelacao do INSS, nos termos do relatório e voto que
ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
