Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2055220 / SP
0002533-41.2007.4.03.6183
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
29/07/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:07/08/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. REVOGAÇÃO DOS BENEFÍCIOS DA
GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DECLARAÇÃO DE POBREZA. PRESUNÇÃO RELATIVA.
SUFICIÊNCIA DE RECURSOS. CONSTATAÇÃO. RESTABELECIMENTO DE PENSÃO POR
MORTE. BENEFÍCIO REATIVADO ADMINISTRATIVAMENTE. CARÊNCIA SUPERVENIENTE.
EXTINÇÃO PARCIAL DO PROCESSO. CESSAÇÃO INDEVIDA. AUSÊNCIA DE
CONTRADITÓRIO E AMPLA DEFESA. RESTABELECIMENTO DESDE A DATA DA
CESSAÇÃO ATÉ A REATIVAÇÃO. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL. COMPENSAÇÃO COM
PERÍODO DE RECEBIMENTO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA.
JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DE OFÍCIO, EXTINÇÃO PARCIAL DO
PROCESSO. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PARCIALMENTE PROVIDA.
1 - A presunção relativa de hipossuficiência pode ser afastada mediante verificação, pelo
magistrado, da possibilidade econômica do impugnado em arcar com as custas do processo.
Inexiste, portanto, qualquer ofensa à legislação federal invocada.
2 - Os artigos 5º e 6º da Lei nº 1.060/50 permitem ao magistrado indeferir os benefícios
inerentes à assistência judiciária gratuita no caso de "fundadas razões". Permite, em
consequência, que o Juiz que atua em contato direto com a prova dos autos, perquira acerca da
real condição econômica do demandante. Precedentes do STJ e desta Corte Regional.
3 - Informações do Sistema Único de Benefícios, anexas à sentença, revelam que a autora
recebe, de fato, dois benefícios previdenciários, tendo percebido na competência 04/2014 o
valor de R$579,84, referente à pensão por morte acidente do trabalho NB 93/057.043.099-2, e
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
R$2.853,48, referente à pensão por morte previdenciária NB 21/150.417.595-3, totalizando,
assim, uma renda de R$3.433,22.
4 - A exigência constitucional - "insuficiência de recursos" - deixa evidente que a concessão de
gratuidade judiciária atinge tão somente os "necessitados" (artigo 1º da Lei nº 1.060/50). Define
o Dicionário Houaiss de língua portuguesa, 1ª edição, como necessitado "1. que ou aquele que
necessita; carente, precisado. 2. que ou quem não dispõe do mínimo necessário para
sobreviver; indigente; pobre; miserável." Não atinge indistintamente, portanto, aqueles cujas
despesas são maiores que as receitas. Exige algo mais. A pobreza, a miserabilidade, nas
acepções linguísticas e jurídicas dos termos. Justiça gratuita é medida assistencial. É o custeio,
por toda a sociedade, das despesas inerentes ao litígio daquele que, dada a sua
hipossuficiência econômica e a sua vulnerabilidade social, não reúne condições financeiras
mínimas para defender seus alegados direitos. E demonstrado nos autos que esta não é a
situação da parte autora. mensal do brasileiro.
5 - A renda per capita média mensal do brasileiro, no ano de 2016, foi de R$1.226,00. A maior
do Brasil foi do DF, no valor de R$2.351,00. E a maior do Estado de São Paulo foi da cidade de
São Caetano do Sul, com R$2.043,74 (Fonte: IBGE-Fev/2017). A renda auferida pela autora é
duas vezes maior do que a renda per capita mensal do brasileiro.
6 - Alie-se como elemento de convicção, que o teto que a Defensoria Pública do Estado de São
Paulo adota para analisar a necessidade do jurisdicionado à justificar a sua atuação é de 3
salários mínimos, ou seja, R$2.811,00 (2017).
7 - Os valores das custas processuais integram o orçamento do Poder Judiciário (art. 98, § 2º
da CF) e, no caso da Justiça Federal, por exemplo, se prestam a custear as despesas
processuais dos beneficiários da gratuidade judiciária. As custas processuais, portanto, em
princípio antipáticas, também se destinam a permitir que os efetivamente necessitados tenham
acesso à Justiça.
8 - O acesso à Gratuidade da Justiça, direito fundamental que é, não pode se prestar, sob os
mantos da generalização e da malversação do instituto, ao fomento da judicialização
irresponsável de supostos conflitos de interesse, o que impacta negativamente na eficiência da
atuação jurisdicional, bem como na esfera de direitos da parte contrária.
9 - Mantida a revogação dos benefícios da assistência judiciária gratuita.
10 - O Sr. João Olegário Pinto Lima, ora sucedido, ingressou com a presente demanda visando
o restabelecimento do benefício previdenciário de pensão por morte acidentário (NB
93/057.043.098-4).
11 - Alegou que requereu administrativamente o beneplácito em 14/10/1993, sendo o mesmo
deferido com termo inicial em 07/04/1993 e com o valor rateado em partes iguais com a Sra.
Maria de Lourdes Lima (NB 93/057.043.099-2).
12 - Contudo, informou que o INSS, sem qualquer justificativa, encerrou o pagamento do
benefício de sua titularidade em 09/04/1994, deixando de reverter a cota parte em favor da sua
esposa.
13 - De início, depreende-se do ofício de fl. 115 e do extrato do Sistema Único de Benefícios -
DATAPREV de fl. 116, que o INSS reativou o benefício NB 93/057.043.098-4 de titularidade do
Sr. João Olegário Pinto Lima em 21/07/2009, antes até mesmo da prolação da sentença, tendo
o sucedido, naquela oportunidade, requerido o prosseguimento do feito com o pagamento dos
atrasados desde o cancelamento indevido (fl. 167).
14 - No entanto, observa-se a ocorrência de carência superveniente, dado o desaparecimento
do interesse processual, na modalidade necessidade, no que diz respeito ao pagamento do
benefício de pensão por morte após 21/07/2009 (data da reativação), devendo o processo ser
extinto parcialmente, sem análise do mérito.
15 - À parte autora resta interesse processual apenas quanto à discussão sobre o direito ao
restabelecimento do benefício, desde a data da cessação indevida 09/04/1994 até a reativação
administrativa (21/07/2009).
16 - Instado a se manifestar acerca da cessação do benefício, o ente autárquico se pronunciou
nos seguintes termos: "o motivo pelo qual o benefício foi cessado parece-nos ser o não
comparecimento do segurado ao banco por três meses consecutivos para saque do valor,
conforme anotação constante da ficha (doc. 04)" - destaquei (fl. 67).
17 - Na mencionada ficha (fl. 71), há indicação: "relatório bancário comunica o não recebimento
da competência 12/93, 01/94 e 02/94". Todavia, referido documento não serve para comprovar
a alegada inexistência de saque por parte do Sr. João Olegário, uma vez que, igualmente, traz
o nome da Sra. Maria Lourdes como beneficiária.
18 - Ademais, infere-se a inobservância do contraditório e da ampla defesa do procedimento
que culminou com a suspensão do benefício previdenciário do autor, ora sucedido, de modo
que se tem que a cessação foi indevida.
19 - Acresça-se inexistir nos autos comprovação de que a renda foi revertida à esposa do
beneficiário; ao contrário, os dados do Sistema Único de Benefícios de fl. 24 dá conta de que o
benefício correspondia a R$109,69, sendo pago o valor de R$54,84 ao qual foi recebido pela
Sra. Maria de Lourdes Lima em valores inferiores e equivalentes, nas competências
subsequentes à cessação (fl. 26).
20 - Desta forma, tem a autora, na qualidade de sucessora, direito ao restabelecimento do
benefício de pensão por morte acidentária, desde a cessação indevida (09/04/1994 - fl. 24) até
a reativação administrativa do benefício (21/07/2009), observada a prescrição das parcelas
vencidas anteriormente ao quinquênio que precede o ajuizamento da ação (20/04/2007).
21 - Devem ser compensados os valores pagos ao Sr. João Olegário Pinto Lima a título de
amparo assistencial em período concomitante (fl. 210), já que este é inacumulável com
qualquer outro benefício previdenciário, a teor do disposto no art. 20, §4º, da Lei 8.742/93.
22 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
23 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
24 - Quanto aos honorários advocatícios, é inegável que as condenações pecuniárias da
autarquia previdenciária são suportadas por toda a sociedade, razão pela qual a referida verba
deve, por imposição legal, ser fixada moderadamente - conforme, aliás, preconizava o §4º, do
art. 20 do CPC/73, vigente à época do julgado recorrido - o que restará perfeitamente atendido
com o percentual de 10% (dez por cento), devendo o mesmo incidir sobre o valor das parcelas
vencidas até a data da prolação da sentença, consoante o verbete da Súmula 111 do Superior
Tribunal de Justiça.
25 - O termo ad quem a ser considerado continua sendo a data da prolação da sentença, ainda
que reformada. E isso se justifica pelo princípio constitucional da isonomia. Explica-se. Na
hipótese de procedência do pleito em 1º grau de jurisdição e sucumbência da autarquia
previdenciária, o trabalho do patrono, da mesma forma que no caso de improcedência, perdura
enquanto não transitada em julgado a decisão final. O que altera são, tão somente, os papéis
exercidos pelos atores judicias que, dependendo da sorte do julgamento, ocuparão polos
distintos em relação ao que foi decidido. Portanto, não se considera lógico e razoável referido
discrímen, a ponto de justificar o tratamento diferenciado, agraciando com maior remuneração
profissionais que exercem suas funções em 1º e 2º graus com o mesmo empenho e dedicação.
26 - Por tais razões, imperiosa a fixação do termo final, para a incidência da verba honorária, na
data da prolação da sentença.
27 - Isenção da Autarquia Securitária do pagamento de custas processuais.
28 - Extinção parcial do processo, de ofício. Carência superveniente. Apelação da parte autora
parcialmente provida.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, julgar extinto
parcialmente o processo, sem análise do mérito, ante a superveniente carência da ação, nos
termos do artigo 485, VI, do CPC, e dar parcial provimento à apelação da parte autora, para
condenar o INSS no restabelecimento do benefício de pensão por morte acidentário desde a
data da cessação indevida (09/04/1994) até a reativação administrativa (21/07/2009),
observada a prescrição quinquenal e compensados os valores pagos a título de amparo
assistencial em período concomitante, sendo que os valores em atraso serão corrigidos
monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, bem como para
condenar a autarquia no pagamento de honorários advocatícios fixados no percentual de 10%
(dez por cento), incidentes sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da
sentença, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
