
| D.E. Publicado em 11/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, anular, de ofício, a sentença, e julgar parcialmente procedente o pedido, restando prejudicada a apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0021840-61.2016.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a concessão da aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento de atividade urbana, com e sem anotação em CTPS, bem assim de natureza especial, sobreveio sentença de improcedência do pedido, condenando-se a parte autora ao pagamento da verba honorária, observada sua condição de beneficiária da assistência judiciária.
Inconformada, a parte autora interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma da sentença, para que seja julgado totalmente procedente o pedido, sustentando o cumprimento dos requisitos legais para o reconhecimento da atividade urbana anotada em CTPS, bem assim da atividade especial nos períodos alegados, fazendo jus à concessão do benefício.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): O autor requereu em juízo o reconhecimento da atividade urbana, com e sem anotação em CTPS, e da atividade especial, com a condenação da autarquia à concessão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição.
Observo que houve o julgamento de improcedência em relação ao pedido de enquadramento da atividade especial nos períodos alegados e de concessão da aposentadoria por tempo de serviço.
Verifico que a sentença não procedeu ao exame e julgamento do pedido de reconhecimento da atividade anotada em CTPS, não computada pela autarquia, bem assim da atividade laborada sem a respectiva anotação, configurando julgamento "citra petita", ao deixar de julgar pedido formulado pela parte autora na sua petição inicial, nos termos dos artigos 141 e 492 do novo Código de Processo Civil.
Todavia, não é o caso de se restituir os autos à primeira instância para que outra seja prolatada, podendo as questões ventiladas nos autos ser imediatamente apreciadas pelo Tribunal, incidindo, na espécie, a regra do inciso III do § 3º do art. 1.013 do novo Código de Processo Civil.
Passa-se, então, à apreciação das questões que a demanda efetivamente suscita.
No caso em análise, restou comprovado o exercício de trabalho urbano nos períodos de 01/04/1978 a 30/04/1980, 04/01/1983 a 03/01/1984 e de 02/05/1985 a 12/11/1985, de acordo com a exigência legal, tendo sido apresentada cópia da CTPS da parte autora (fls. 27/32 e 35/36).
A CTPS é documento obrigatório do trabalhador, nos termos do art. 13 da CLT, e gera presunção "juris tantum" de veracidade, constituindo-se em meio de prova do efetivo exercício da atividade profissional, produzindo efeitos previdenciários (art. 62, § 2º, I, do Dec. 3.048/99). Sendo assim, o INSS não se desincumbiu do ônus de provar que as anotações efetuadas na CTPS do autor são inverídicas, de forma que não podem ser desconsideradas.
Ressalte-se que o fato de o Instituto não localizar registro da anotação no Cadastro Nacional de Informações Sociais (CNIS) não transfere ao empregado a obrigação de comprovar os recolhimentos das contribuições do período laborativo anotado na carteira profissional, uma vez que é de responsabilidade exclusiva do empregador a anotação do contrato de trabalho na CTPS, o desconto e o recolhimento das contribuições devidas à Previdência Social, não podendo o segurado ser prejudicado pela conduta negligente cometida por seu empregador, que efetuou as anotações dos vínculos empregatícios, mas não recolheu as contribuições. Precedente do STJ: REsp 566405/MG, Relatora Ministra Laurita Vaz, j.18/11/03, DJ 15/12/03, p 394.
Depreende-se da petição inicial, ainda, que a parte autora requer o reconhecimento da atividade urbana, sem registro em CTPS, nos períodos de 01/05/1980 a 11/02/1981, 01/02/1982 a 03/01/1983, 19/09/1984 a 01/05/1985 e de 13/11/1985 a 08/03/1988.
O art. 55, caput, da Lei nº 8.213/91, dispõe que o tempo de serviço será comprovado na forma estabelecida no Regulamento, sendo que, de acordo com o parágrafo 3º desse dispositivo, essa comprovação só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito.
Conquanto a referida lei não especifique a natureza do início razoável de prova material, quer em sua potencialidade, quer em sua eficácia, a prerrogativa de decidir sobre a validade dos documentos e concluir pela sua aceitação ou não, cabe ao julgador. Assim, qualquer que seja a prova, particularmente a escrita, deve levar à convicção sobre o fato probando, isto é, além de pertencer à época dos fatos, deve fornecer indicações seguras de que houve o evento que se pretende provar.
O início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade laborativa, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade à prova testemunhal para demonstração do labor exercido sem o devido registro em carteira profissional. O raciocínio é diverso, bastando para o reconhecimento do tempo de serviço que se produza alguma prova documental perante a Previdência Social, contemporânea ao lapso temporal que se pretende comprovar, aliada à prova oral que indique, com segurança, o exercício da atividade em todo o período discutido pelas partes.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica questionada, desde que associada a outros dados probatórios.
Entretanto, no caso dos autos, não restou demonstrado que a parte autora tenha efetivamente exercido atividade urbana pelo período alegado.
Mesmo se entendendo constituir início de prova material, dentre outros documentos, a cópia da certidão de casamento, na qual o autor está qualificado como pedreiro (fl. 26) e as demais anotações lançadas em CTPS (fls. 27/37), verifica-se que o início de prova material apresentado, por si só, não é o bastante para se concluir acerca do exercício de atividade urbana por todo período pleiteado pelo autor. Para tanto era necessária a produção de prova testemunhal. Contudo, não houve a produção da prova oral, uma vez que a parte autora, devidamente intimada para a audiência de instrução, debates e julgamento (fls. 190/191), deixou de arrolar as testemunhas que pretendia ouvir em Juízo.
Assim, conclui-se ter ocorrido a preclusão, uma vez que transcorreu in albis o prazo para a apresentação do rol de testemunhas pela parte autora, que não foi apresentado na peça inicial nem na fase em que o juízo oportunizou a produção de provas.
Nesse sentido:
Quanto à alegada atividade especial, é firme a jurisprudência no sentido de que a legislação aplicável para a caracterização do denominado trabalho em regime especial é a vigente no período em que a atividade a ser considerada foi efetivamente exercida.
Para a verificação do tempo de serviço em regime especial, no caso, deve ser levada em conta a disciplina estabelecida pelos Decretos nºs 83.080/79 e 53.831/64.
Salvo no tocante aos agentes físicos ruído e calor, a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser obrigatória a partir de 05/03/1997, data da publicação do Decreto nº 2.172/97, que regulamentou a Lei nº 9.032/95 e a MP 1.523/96, convertida na Lei nº 9.528/97.
Contudo, acompanhando posicionamento adotado nesta 10ª Turma, no sentido de que em se tratando de matéria reservada à lei, tal decreto somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10/12/1997, entendo que a exigência de laudo técnico para a comprovação das condições adversas de trabalho somente passou a ser exigência legal a partir de 11/12/1997, nos termos da referida lei, que alterou a redação do § 1º do artigo 58 da Lei nº 8.213/91. Neste sentido, precedentes do Superior Tribunal de Justiça: REsp nº 422616/RS, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 02/03/2004, DJ 24/05/2004, p. 323; REsp nº 421045/SC, Relator Ministro Jorge Scartezzini, j. 06/05/2004, DJ 28/06/2004, p. 382.
O artigo 201, § 1º, da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, passou a exigir a definição das atividades exercidas sob condições especiais mediante lei complementar, com a ressalva contida no art. 15 da referida EC nº 20/98, no sentido de que os artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213/91 mantêm a sua vigência até que seja publicada a lei complementar exigida. Assim, dúvidas não há quanto à plena vigência, do artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, no tocante à possibilidade da conversão do tempo trabalhado em condições especiais em tempo de serviço comum.
A propósito, quanto à plena validade das regras de conversão de tempo de serviço especial em comum, de acordo com o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91, traz-se à colação trecho de ementa de aresto: "Mantida a redação do § 5º do art. 57 da Lei 8.213/91, em face da superveniência da Lei 9.711 de novembro de 1998 que converteu a MP 1.663/15ª sem acolher abolição da possibilidade de soma de tempo de serviço especial com o comum que a medida provisória pretendia instituir, e ainda persistindo a redação do caput desse mesmo art. 57 tal como veiculada na Lei 9.032/95 (manutenção essa ordenada pelo expressamente no art. 15 da Emenda Constitucional nº 20 de 15.12.98) de modo que o regramento da aposentadoria especial continuou reservado a"lei", não existe respiradouro que dê sobrevida às Ordens de Serviço ns. 600, 612 e 623, bem como a aspectos dos D. 2.782/98 e 3.048/99 (que restringiam âmbito de apreciação de aposentadoria especial), já que se destinavam justamente a disciplinar administrativamente o que acabou rejeitado pelo Poder Legislativo. Art. 28 da Lei 9.711/98 - regra de transição - inválido, posto que rejeitada pelo Congresso Nacional a revogação do § 5º do art. 57 do PBPS." (TRF - 3ª Região; AMS nº 219781/SP, 01/04/2003, Relator Desembargador Federal JOHONSOM DI SALVO, j. 01/04/2003, DJU 24/06/2003, p. 178).
Além disso, conforme se extrai do texto do § 1º do art. 201 da Constituição Federal, o trabalhador que se sujeitou a trabalho em atividades consideradas prejudiciais à saúde ou à integridade física tem direito a obter a inatividade de forma diferenciada.
A presunção da norma é de que o trabalhador que exerceu atividades em condições especiais teve um maior desgaste físico ou teve sua saúde ou integridade submetidas a riscos mais elevados, sendo merecedor da aposentação em tempo inferior àquele que exerceu atividades comuns, com o que se estará dando tratamento equânime aos trabalhadores. Assim, se em algum período de sua vida laboral o trabalhador exerceu alguma atividade classificada como insalubre ou perigosa, porém não durante tempo suficiente para obter aposentadoria especial, esse tempo deverá ser somado ao tempo de serviço comum, com a devida conversão, ou seja, efetuando-se a correspondência com o que equivaleria ao tempo de serviço comum, sob pena de não se fazer prevalecer o ditame constitucional que garante ao trabalhador que exerceu atividades em condições especiais atingir a inatividade em menor tempo de trabalho.
É indubitável que o trabalhador que exerceu atividades perigosas, insalubres ou penosas teve ceifada com maior severidade a sua higidez física do que aquele trabalhador que nunca exerceu atividade em condições especiais, de sorte que suprimir o direito à conversão prevista no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 significa restringir o alcance da vontade das normas constitucionais que pretenderam dar tratamento mais favorável àquele que labutou em condições especiais.
Assim, o disposto no § 5º do art. 57 da Lei nº 8.213/91 tem por escopo garantir àquele que exerceu atividade laborativa em condições especiais a conversão do respectivo período, o qual, depois de somado ao período de atividade comum, deverá garantir ao segurado direito à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
Todavia, não se exige que a profissão do segurado seja exatamente uma daquelas descritas nos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, sendo suficiente para reconhecimento da atividade especial que o trabalhador esteja sujeito, em sua atividade, aos agentes agressivos descritos em referido anexo, na esteira de entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica dos fragmentos de ementas a seguir transcritos:
No presente caso, a parte autora demonstrou haver laborado em atividade especial nos períodos de 12/02/1981 a 30/01/1982, 04/01/1983 a 18/08/1984, 09/03/1988 a 23/12/1996, 07/11/2000 a 11/01/2001 e de 19/03/2002 a 06/10/2010. É o que comprova o laudo pericial elaborado em juízo (fls. 177/185), trazendo a conclusão de que a parte autora desenvolveu sua atividade profissional, com exposição a ruído e a agentes químicos (cal e cimento). Referidos agentes agressivos são classificados como especiais, conforme os códigos 1.1.6 e 1.2.10 do Decreto nº 53.831/64 e os códigos 1.1.5 e 1.2.12 do Anexo I do Decreto 83.080/1979, em razão da habitual e permanente exposição aos agentes ali descritos.
Todavia, é indevido o reconhecimento da atividade especial nos períodos de 22/04/1997 a 13/12/1997, 06/04/1998 a 14/12/1998, 01/04/1999 a 08/12/1999, 09/05/2000 a 31/10/2000, 16/05/2001 a 27/11/2001 e de 18/04/2002 a 18/11/2003, em razão de constar do laudo pericial produzido em juízo (fls. 177/185) que a parte autora encontrava-se exposta a níveis de ruído inferiores aos limites de tolerância estabelecidos à época.
Por outro lado, o período em que a parte autora trabalhou com registro em CTPS e recolheu contribuições previdenciárias (fls. 27/49) é suficiente para garantir-lhe o cumprimento do período de carência de 174 (cento e setenta e quatro) meses de contribuição, na data do requerimento administrativo (06/10/2010), nos termos do art. 142 da Lei nº 8.213/91.
Contudo, o somatório do tempo de serviço do autor, considerando as atividades comum e especial ora reconhecidas, e o tempo de serviço computado administrativamente (fls. 96/101), na data da publicação da EC 20/98, é inferior a 30 (trinta) anos, totalizando 19 (dezenove) anos, 07 (sete) meses e 21 (vinte e um) dias, de maneira que é aplicável ao caso dos autos a regra de transição prevista no artigo 9º da referida Emenda Constitucional, pois a parte autora não possuía direito adquirido ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço na data da sua publicação, em 16/12/1998.
Entretanto, computando-se o tempo de serviço posterior a 15/12/1998, devidamente registrado em CTPS, o somatório do tempo de serviço totaliza 32 (trinta e dois) anos, 09 (nove) meses e 25 (vinte e cinco) dias, na data do requerimento administrativo, não restando comprovado o cumprimento do acréscimo do tempo de serviço (pedágio) exigido pela Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, que no presente caso perfaz 34 (trinta e quatro) anos, 01 (um) mês e 20 (vinte) dias, nem tampouco o requisito etário de 53 (cinquenta e três) anos.
Portanto, a parte autora não faz jus à concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço postulado.
Diante do exposto, ANULO, DE OFÍCIO, A SENTENÇA, em face de sua natureza "citra petita", e, aplicando o disposto no inciso III do § 3º do artigo 1.013 do novo Código de Processo Civil, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO DA PARTE AUTORA para reconhecer a atividade urbana anotada em CTPS nos períodos de 01/04/1978 a 30/04/1980, 04/01/1983 a 03/01/1984 e de 02/05/1985 a 12/11/1985 e a atividade especial nos períodos de 12/02/1981 a 30/01/1982, 04/01/1983 a 18/08/1984, 09/03/1988 a 23/12/1996, 07/11/2000 a 11/01/2001 e de 19/03/2002 a 06/10/2010, fixada a sucumbência recíproca, restando prejudicada a apelação da parte autora, nos termos da fundamentação.
LUCIA URSAIA
Desembargadora Federal
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