
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0004221-09.2015.4.03.6102
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ANTONIO RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARIZA MARQUES FERREIRA HENTZ - SP277697-A
APELADO: ANTONIO RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: MARIZA MARQUES FERREIRA HENTZ - SP277697-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0004221-09.2015.4.03.6102
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ANTONIO RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARIZA MARQUES FERREIRA HENTZ - SP277697-A
APELADO: ANTONIO RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação objetivando a revisão da RMI da aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a consideração das verbas trabalhistas reconhecidas em ação reclamatória transitada em julgado, nos salários de contribuição. Requer, ainda, a soma das contribuições referentes às atividades concomitantes, bem como a aplicação do fator previdenciário sobre a média de tais contribuições.
A sentença, proferida em 30.08.16, julgou parcialmente procedente o pedido para determinar que o INSS promova a revisão do benefício do autor, considerando o salário apurado pela Justiça do Trabalho e condená-lo ao pagamento das parcelas devidas desde a DIB, respeitada a prescrição quinquenal. Os valores serão corrigidos monetariamente pelos índices que reflitam a inflação acumulada do período (INPC) e acrescidos de juros de mora a partir da citação, de acordo com os percentuais aplicáveis às cadernetas de poupança. Ante a sucumbência recíproca, cada litigante responderá pelos honorários da parte contrária, fixados em 10% sobre o valor atualizado da causa.
Sentença submetida ao reexame necessário.
Apela a parte autora, arguindo, que não foi apreciado referente ao pedido de a soma das contribuições referentes às atividades concomitantes, bem como bem como a aplicação do fator previdenciário sobre a média de tais contribuições. Pugna, também, pelo afastamento da prescrição quinquenal, vez que a ação foi proposta no prazo de 05 anos contados do trânsito em julgado da reclamação trabalhista e pela condenação do INSS ao pagamento dos honorários advocatícios que devem ser fixados em 20% sobre o valor da condenação.
Por sua vez, apela o INSS alegando que o termo inicial das diferenças decorrentes da revisão da RMI deve ser fixada na data da citação. Subsidiariamente, pugna pela reforma da sentença no tocante aos critérios de atualização do débito.
Com contrarrazões, vieram os autos a esta Corte Regional.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0004221-09.2015.4.03.6102
RELATOR: Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: ANTONIO RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: MARIZA MARQUES FERREIRA HENTZ - SP277697-A
APELADO: ANTONIO RODRIGUES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: MARIZA MARQUES FERREIRA HENTZ - SP277697-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Inicialmente, verifico que a sentença decidiu pretensão aquém daquela pleiteada nos presentes autos. Verifica-se, da leitura da petição inicial, que o autor formulou pedido no sentido de obter a revisão da RMI de sua aposentadoria por tempo de contribuição, mediante a consideração das verbas trabalhistas reconhecidas em ação reclamatória transitada em julgado, nos salários de contribuição. Requereu, ainda, a soma das contribuições referentes às atividades concomitantes, bem como a aplicação do fator previdenciário sobre a média de tais contribuições.
Ocorre que, o Magistrado a quo cuidou tão somente de apreciar a questão relativa a inclusão das verbas salarias reconhecidas em reclamação trabalhista para fins de revisão da RMI da aposentadoria por tempo de contribuição, deixando de apreciar os pedidos relativos a a soma das contribuições das atividades concomitantes e a aplicação do fator previdenciário sobre a média dessa soma.
Dessa forma, reconheço a ocorrência de julgamento citra petita e, de ofício, diante da afronta ao artigo 492 do Código de Processo Civil/2015, declaro nula a sentença.
Entretanto, estando o processo em condições de imediato julgamento, aplico a regra do artigo 1.013, § 3º, III, da norma processual e passo ao exame do mérito.
Passo ao exame:
Da sentença trabalhista para fins previdenciários
A sentença proferida no âmbito da Justiça do Trabalho não configura prova absoluta do período de trabalho, nos casos em que ação termina em acordo homologado. Nem o INSS, nem o Judiciário Federal, devem ser obrigados a acolher sem ressalvas esse tipo de documento, uma vez que tal procedimento serve, em muitos casos, tão somente como instrumento de simulações por meio da utilização da Justiça do Trabalho. Afinal, uma ação dessa natureza acaba por ter efeito semelhante ao que teria uma declaração do empregador - apenas, tem também uma homologação de um Juiz. Porém, essa sentença serve como início de prova do exercício de atividade urbana, na condição de empregado.
Por outro lado, nos casos em que há análise de controvérsia em juízo, com julgamento do mérito, aumenta a força probante da sentença trabalhista transitada em julgado. Não perde ela, contudo, o caráter de início de prova material, devendo ser analisada em consonância com o conjunto probatório, para reconhecimento da atividade laboral. É de se atentar, inclusive, para as dificuldades decorrentes das hipóteses em que na sentença constar expressamente determinação para regularização dos recolhimentos previdenciários, tendo em vista a não participação do INSS no conflito.
Neste sentido:
"PROCESSUAL CIVIL. AUSÊNCIA DE VÍCIOS NO JULGADO. INCONFORMAÇÃO COM A TESE ADOTADA PELA SEGUNDA TURMA. 1. O embargante, inconformado, busca efeitos modificativos com a oposição destes embargos declaratórios, uma vez que pretende ver reexaminada e decidida a controvérsia de acordo com sua tese. 2. A omissão, contradição e obscuridade suscetíveis de serem afastadas por meio de embargos declaratórios são as contidas entre os próprios termos do dispositivo ou entre a fundamentação e a conclusão do acórdão embargado, o que não ocorre neste caso. 3. O STJ entende que a sentença trabalhista, por se tratar de uma verdadeira decisão judicial, pode ser considerada como início de prova material para a concessão do benefício previdenciário, bem como para revisão da Renda Mensal Inicial, ainda que a Autarquia não tenha integrado a contenda trabalhista. 4. A alegada existência de contradição não procede, uma vez que ficou demasiadamente comprovado o exercício da atividade na função e os períodos alegados na ação previdenciária. Embargos de declaração rejeitados."
(EAARESP 201200102256, Rel. Min. HUMBERTO MARTINS, STJ - Segunda Turma, DJE 30/10/2012)
"PREVIDENCIÁRIO. SEGURADO EMPREGADO. RECOLHIMENTO DE CONTRIBUIÇÃO. RESPONSABILIDADE. EMPREGADOR. REVISÃO DE BENEFÍCIO. INCLUSÃO DE VERBAS RECONHECIDAS EM RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. TERMO INICIAL. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DECRETO N. 3.048/1999, ARTIGO 144. VIOLAÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. 1. Em se tratando de segurado empregado, cumpre assinalar que a ele não incumbe a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições. Nessa linha de raciocínio, demonstrado o exercício da atividade vinculada ao Regime Geral da Previdência, nasce a obrigação tributária para o empregador. 2. Uma vez que o segurado empregado não pode ser responsabilizado pelo não recolhimento das contribuições na época própria, tampouco pelo recolhimento a menor, não há falar em dilatação do prazo para o efetivo pagamento do benefício por necessidade de providência a seu cargo. 3. A interpretação dada pelas instâncias ordinárias, no sentido de que o segurado faz jus ao recálculo de seu benefício com base nos valores reconhecidos na justiça obreira desde a data de concessão não ofende o Regulamento da Previdência Social. 4. Recurso especial improvido."
(RESP 200802791667, Rel. Min. JORGE MUSSI, STJ - Quinta Turma, DJE 03.08.2009.)
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO. ART. 557, §1º, DO CPC. AUXÍLIO-RECLUSÃO. SENTENÇA TRABALHISTA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL DA ATIVIDADE REMUNERADA. QUALIDADE DE SEGURADO.
I - É assente o entendimento esposado pelo E. STJ no sentido de que a sentença trabalhista constitui início de prova material de atividade remunerada para a concessão do benefício previdenciário.
II - No caso dos autos, o último contrato de trabalho foi registrado em CTPS em decorrência de acordo judicial homologado pela Justiça do Trabalho de Birigui/SP, pelo qual restou reconhecido o vínculo empregatício com o empregador Revital Ind. e Com., período compreendido entre 01.02.2009 e 30.10.2009, com valor correspondente a R$ 600,00.
III - Realizado o recolhimento das contribuições previdenciárias na demanda trabalhista, pertinentes ao período reconhecido na Justiça do Trabalho, mantem-se o equilíbrio atuarial e financeiro previsto no art. 201 da Constituição da República, não existindo justificativa para a resistência do INSS em reconhecê-los para fins previdenciários, ainda que não tenha integrado aquela lide.
IV - Agravo do INSS desprovido (art. 557, §1º, do CPC)".
(TRF 3ª Região, 10ª Turma, Rel. Des. Fed. Sergio Nascimento, Proc. n.º 0050235-05.2012.4.03.9999/SP, DJ 13/08/2013)
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO LEGAL. ART. 557, § 1º, CPC/1973. REVISÃO DE BENEFÍCIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CÁLCULO DE RENDA MENSAL. INCLUSÃO DE VERBAS RECONHECIDAS EM RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. AGRAVO IMPROVIDO.
1. A decisão agravada está em consonância com o disposto no art. 557 do CPC/1973, visto que supedaneada em jurisprudência consolidada.
2. Inexiste óbice para que a sentença prolatada em sede trabalhista, transitada em julgado, constitua início razoável de prova material atinente à referida atividade laboral, de modo que o período ali reconhecido possa ser utilizado, inclusive, para fins previdenciários, ainda mais quando da referida sentença constar obrigação para regularização dos recolhimentos previdenciários devidos.
3. E no que concerne ao pagamento das respectivas contribuições, relativamente ao interregno do labor reconhecido, é de se ressaltar que compete ao empregador a arrecadação e o recolhimento do produto aos cofres públicos, a teor do artigo 30, inciso I, "a" e "b" da Lei 8.212/91 e ao Instituto Nacional da Seguridade Social a arrecadação, fiscalização, lançamento e recolhimento de contribuições, consoante dispõe o artigo 33 do aludido diploma legal, não podendo ser penalizado o empregado pela ausência de registro em CTPS, quando deveria ter sido feito em época oportuna, e muito menos pela ausência das contribuições respectivas, quando não deu causa.
4. E, no caso dos autos, houve a determinação de recolhimento das contribuições previdenciárias devidas, conforme observado dos termos da cópia da reclamação trabalhista apresentada pela parte autora, com a exordial.
5. Observa-se que nos termos do inciso I, art. 28, da Lei nº 8.212/91, o salário-de-contribuição é remuneração efetivamente recebida ou creditada a qualquer título, inclusive ganhos habituais sob a forma de utilidades, ressalvando o disposto no § 8º e respeitados os limites dos §§ 3º, 4º e 5º deste artigo. Assim, para o cálculo da renda mensal inicial, respeitados os limites estabelecidos, as horas-extras decorrentes de decisão trabalhista devem integrar os salários-de-contribuição que foram utilizados no período básico de cálculo.
6. Destarte, em suma, as verbas reconhecidas em sentença trabalhista após concessão do benefício devem integrar os salários-de-contribuição utilizados no período base de cálculo da aposentadoria por tempo de contribuição, para fins de apuração de nova renda mensal inicial. Ademais, verifica-se que a autora verteu a contribuição ao RGPS relativa à competência de janeiro/2005, devendo ser confirmada a sua inclusão no período básico de cálculo, conforme reconhecido pela r. sentença.
7. Todavia, cumpre fixar a data de início dos pagamentos da revisão de benefício previdenciário a partir da data da citação (21/05/2008), ocasião em que a autarquia tomou conhecimento da pretensão ora deduzida, cabendo determinar a reforma da r. sentença, neste ponto.
8. Anote-se, na espécie, a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora na esfera administrativa.
9. As razões recursais não contrapõem tais fundamentos a ponto de demonstrar o desacerto do decisum.
10. Agravo legal improvido."
(TRF 3ª Região, AC nº 0003027-61.2008.4.03.6120, Sétima Turma, Rel. Des. Fed. TORU YAMAMOTO, j. 08/08/16)
Acresça-se que, em julgamento ocorrido em 17/08/16, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU) decidiu que a ação reclamatória trabalhista será válida como início de prova material em duas situações: quando for fundamentada em documentos que comprovem o exercício da atividade na função com os períodos alegados, satisfatoriamente complementado por prova testemunhal; e quando o seu ajuizamento seja contemporâneo ao término do pacto laboral(Processo nº 2012.50.50.002501-9).
Comprovado o vínculo empregatício, o empregado não pode ser penalizado pela ausência de registro em CTPS, que deveria ter sido feito em época oportuna, e muito menos pela ausência das contribuições respectivas ou seu recolhimento a menor, quando não deu causa, competindo ao empregador a arrecadação e o recolhimento das contribuições aos cofres públicos, a teor do artigo 30, inciso I, "a" e "b" da Lei 8.212/91, bem como art. 276 do Decreto nº 3.048/99 e ao Instituto Nacional da Seguridade Social a arrecadação e fiscalização.
Caso concreto - elementos probatórios
No caso dos autos, verifica-se que o autor ajuizou em 2010, reclamação trabalhista em face das empresas Sociedade TV Comunitária Cultural e Educacional Oswaldo Cruz, Sistema Thathi de Comunicação S/C Ltda. e Rádio Ribeirão Preto Ltda., alegando que foi admitido em 01.06.04 pelas reclamadas, que fazem parte de um mesmo grupo financeiro, na função de operador de áudio e rádio e demitido sem justa causa em 19.03.10, sendo que não lhe foram pagas verbas a que fazia jus, tais como: pagamento de salário referente a cada uma das reclamadas; adicional por acúmulo de funções, horas extras e reflexos e indenização por danos morais.
Após a citação das reclamadas, apresentação de contestação e audiência de instrução com oitiva de testemunhas, foi proferida sentença de mérito que julgou parcialmente procedentes os pedidos, condenando as reclamadas ao pagamento de: adicional de 40% sobre o salário do reclamante e reflexos, horas extra e reflexos, multa convencional e honorários advocatícios. A sentença determinou, ainda, o recolhimento das contribuições previdenciárias referentes ao adicional de 40% e horas extras e seus respectivos reflexos.
Em sede recursal a sentença foi mantida e transitou em julgado em 04.04.14, tendo sido homologado por sentença o cálculo de liquidação, com a discriminação mês a mês das contribuições previdenciárias.
Dessa forma, considerando o teor da reclamação trabalhista e sua robustez na discussão acerca do cabimento do direito, as verbas lá reconhecidas devem integrar os salários-de-contribuição utilizados no período base de cálculo do benefício, para fins de apuração de nova renda mensal inicial.
Ademais, no tocante a soma dos salários de contribuição das atividades concomitantes, dispõe o art. 32 da Lei 8.213/91 que:
"Art. 32. O salário-de-benefício do segurado que contribuir em razão de atividades concomitantes será calculado com base na soma dos salários-de-contribuição das atividades exercidas na data do requerimento ou do óbito, ou no período básico de cálculo, observado o disposto no art. 29 e as normas seguintes:
I - quando o segurado satisfizer, em relação a cada atividade, as condições do benefício requerido, o salário-de-beneficio será calculado com base na soma dos respectivos salários-de-contribuição;
II - quando não se verificar a hipótese do inciso anterior, o salário-de-benefício corresponde à soma das seguintes parcelas:
a) o salário-de-benefício calculado com base nos salários-de-contribuição das atividades em relação às quais são atendidas as condições do benefício requerido;
b) um percentual da média do salário-de-contribuição de cada uma das demais atividades, equivalente à relação entre o número de meses completo de contribuição e os do período de carência do benefício requerido;
III - quando se tratar de benefício por tempo de serviço, o percentual da alínea "b" do inciso II será o resultante da relação entre os anos completos de atividade e o número de anos de serviço considerado para a concessão do benefício.
§ 1º O disposto neste artigo não se aplica ao segurado que, em obediência ao limite máximo do salário-de-contribuição, contribuiu apenas por uma das atividades concomitantes.
§ 2º Não se aplica o disposto neste artigo ao segurado que tenha sofrido redução do salário-de-contribuição das atividades concomitantes em respeito ao limite máximo desse salário."
Não obstante a literalidade do texto legal, impende realizar uma interpretação sistemática de toda a legislação, constitucional e infraconstitucional, que rege a matéria:
De início, observa-se que toda a ordem social firma-se sobre o primado do trabalho (art. 193, CF), de modo que o segurado que percebe remuneração e recolhe contribuições previdenciárias pelo exercício de duas atividades concomitantes não pode ser prejudicado em relação ao segurado que, pelo exercício de uma só atividade, recolhe o mesmo valor.
Considerando um sistema previdenciário contributivo, o texto legal que impede a inclusão dos salários de contribuições vertidas em razão de atividades concomitantes fere o princípio constitucional da isonomia.
A regra insculpida no art. 32 da Lei 8.213/91 tinha o claro - e justo - objetivo de evitar que o segurado que estivesse próximo a se aposentar passasse repentinamente a recolher contribuições mais altas, no intuito de aumentar sua RMI - renda mensal inicial, tendo em vista que o período básico para o cálculo dos benefícios levava em conta os últimos 36 (trinta e seis) salários de contribuições, nos termos da redação original do art. 29 da LBPS.
Ocorre que, com a edição da Lei 9.876/99, a forma de cálculo passou a levar em consideração todo o período de trabalho do segurado. Assim, o período básico de cálculo passou a ser composto pela média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo período contributivo. Isso alargou sobremaneira o PBC - período básico de cálculo, tornando mais complexa a definição, entre as atividades exercidas, de qual seria a principal, e tornou inócua a prevenção do art. 32.
O art. 32 só tinha razão de ser antes da entrada em vigor da Lei 9.876/99. A partir daí, não faz mais sentido impedir a utilização dos valores sobre os quais se contribuiu para fins de cálculo do salário de contribuição, dentro do teto.
A Lei 8.870/94, ao alterar o artigo 29 da Lei 8.213/91, estabeleceu, anteriormente, no parágrafo 3º desse dispositivo que: "Serão considerados para o cálculo do salário de benefício os ganhos habituais do segurado empregado, a qualquer título, sob a forma de moeda corrente ou de utilidades, sobre os quais tenha incidido contribuições previdenciárias, exceto o décimo terceiro salário (gratificação natalina)."
Além disso, a redação do artigo 201 da Constituição Federal, dada pela EC nº 20/98, estabelece em seu parágrafo 11 que: "Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados para efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios, na forma da lei".
Neste contexto, objetivando o INSS fazer incidir contribuições previdenciárias sobre toda e qualquer remuneração do segurado empregado, clara a incongruência gerada pela interpretação literal do art. 32 da Lei 8.213/91, notadamente em relação ao conceito de sistema contributivo, ao desprezar certas contribuições, no caso de atividades concomitantes.
A contribuição vertida deve ser levada em consideração em favor do segurado.
A aplicação pura e simples do art. 32, nesse caso de atividades concomitantes, despreza tanto o trabalho realizado como a contribuição vertida, tornando injusto o cálculo do benefício justamente para segurado que trabalhou mais, de modo que somente deve ser aplicado o caput do regramento que estabelece a soma dos salários de contribuição vertidos durante o exercício de todas as atividades.
Portanto, assiste razão ao autor. O INSS deverá proceder à averbação dos salários de contribuições relativos as atividades concomitantes, bem como ao cálculo de novo salário de benefício da aposentadoria concedida à parte autora,
observando-se, obviamente, o teto constitucional e a incidência do fator previdenciário sobre a média de tais contribuições somadas.
O Autor faz jus às diferenças devidas desde a data da concessão do benefício, sob pena de enriquecimento indevido do INSS, ante o recolhimento das contribuições previdenciárias, o qual compete ao empregador.
Considerando que a ação foi ajuizada dentro do prazo de 5 anos contado trânsito em julgado da reclamação trabalhista, não há que se falar em prescrição quinquenal.
As parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Condeno o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS ao pagamento de honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
Ante o exposto, com fulcro no caput do artigo 492 do CPC/2015, de ofício, declaro nula a sentença e, de acordo com o seu artigo 1.013, § 3º, III, julgo procedente o pedido formulado na inicial nos termos explicitados.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA CITRA PETITA. NULIDADE. ARTIGO 1.013, §3º, III, DO CPC/2015. JULGAMENTO DO MÉRITO. POSSIBILIDADE. REVISÃO DE BENEFÍCIO. INCLUSÃO DAS VERBAS RECONHECIDAS EM RECLAMATÓRIA TRABALHISTA NO CÁLCULO DO BENEFÍCIO. SOMA DOS SALÁRIOS DE CONTRIBUIÇÃO. ATIVIDADES CONCOMITANTES. POSSIBILIDADE. ART. 32, DA LEI 8.213/91. INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. TETO LEGAL. PRESCRIÇÃO QUINQUENAL AFASTADA. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA. MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL. HONORÁRIOS DE ADVOGADO.
1. Sentença que julgou aquém do pedido inicial. Citra petita. Nulidade na forma do caput do artigo 492 do CPC/2015.
2. Condições de imediato julgamento. Aplicação da regra do inciso III do §3º do artigo 1.013 do Código de Processo Civil/2015. Exame do mérito.
3. A sentença proferida no âmbito da Justiça do Trabalho não configura prova absoluta do período de trabalho, devendo ser analisada em consonância com o conjunto probatório, para reconhecimento da atividade laboral. Precedentes.
4. Considerando o teor da reclamação trabalhista e sua robustez na discussão acerca do cabimento do direito, as verbas lá reconhecidas devem integrar os salários-de-contribuição utilizados no período base de cálculo do benefício, para fins de apuração de nova renda mensal inicial.
5. Não obstante a literalidade do Art. 32 da Lei 8.213/91, impende realizar uma interpretação sistemática de toda a legislação, constitucional e infraconstitucional.
6. A ordem social firma-se sobre o primado do trabalho (art. 193, CF), de modo que o segurado que percebe remuneração e recolhe contribuições previdenciárias pelo exercício de duas atividades concomitantes não pode ser prejudicado em relação ao segurado que, pelo exercício de uma só atividade, recolhe o mesmo valor, de modo que, considerando um sistema previdenciário contributivo, o texto legal que impede a inclusão dos salários de contribuições vertidas em razão de atividades concomitantes fere o princípio constitucional da isonomia.
7. Com a edição da Lei 9.876/99, o período básico de cálculo passou a ser composto pela média aritmética simples dos maiores salários de contribuição correspondentes a oitenta por cento de todo período contributivo, o que alargou sobremaneira o PBC - período básico de cálculo, tornando mais complexa a definição, entre as atividades exercidas, de qual seria a principal, tornando inócua a prevenção do art. 32.
8. A redação do artigo 201, §11 da Constituição Federal, dada pela EC nº 20/98 estabelece que: "Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados para efeito de contribuição previdenciária e consequente repercussão em benefícios, na forma da lei".
9. Objetivando o INSS fazer incidir contribuições previdenciárias sobre toda e qualquer remuneração do segurado empregado, clara a incongruência gerada pela interpretação literal do art. 32 da Lei 8.213/91, notadamente em relação ao conceito de sistema contributivo, ao desprezar certas contribuições, no caso de atividades concomitantes.
10. São devidas as diferenças decorrentes do recálculo da RMI desde a data da concessão do benefício. Considerando que a ação foi ajuizada dentro do prazo de 5 anos contado trânsito em julgado da reclamação trabalhista, não há que se falar em prescrição quinquenal
11. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
12. Honorários de advogado fixados em 10% do valor da condenação, consoante o entendimento desta Turma e o disposto §§ 2º e 3º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça.
13. Sentença declarada nula de oficio. Pedido inicial procedente.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu de ofício, declarar nula a sentença e, de acordo com o seu artigo 1.013, § 3º, III, julgar procedente o pedido formulado na inicial, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
