Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2027358 / SP
0000029-79.2015.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. SENTENÇA ILÍQUIDA. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. CONVERSÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. RUÍDO
COMUM E ESPECIAL. SAFRA E ENTRESSAFRA. COMPROVAÇÃO DO LABOR SUBMETIDO
A CONDIÇÕES ESPECIAIS. RECONHECIMENTO PARCIAL DOS PERÍODOS.
APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO INSUFICIENTE. REVISÃO DA APOSENTADORIA
POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. DIB NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. SUCUMBÊNCIA RECÍPROCA. REMESSA
NECESSÁRIA, TIDA POR SUBMETIDA, E APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE
PROVIDAS.
1 - A r. sentença reconheceu período especial e condenou o INSS a revisar o benefício de
aposentadoria por tempo de contribuição do autor, concedendo aposentadoria especial, desde
o requerimento administrativo (05/10/2009), bem como no pagamento das diferenças apuradas
com correção monetária e juros de mora. Assim, não havendo como se apurar o valor da
condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao reexame necessário, nos termos do
inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula 490 do STJ.
2 - Pretende a parte autora a revisão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição,
para que seja convertida em aposentadoria especial, mediante o reconhecimento de período
laborado em atividade especial, ou, alternativamente, a revisão daquela.
3 - Trata-se, em suma, de pedido de conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em
aposentadoria especial.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
4 - A aposentadoria especial foi instituída pelo artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26/08/1960 (Lei
Orgânica da Previdência Social, LOPS). Sobreveio a Lei n. 5.890, de 08.06.1973, que revogou
o artigo 31 da LOPS, e cujo artigo 9º passou regrar esse benefício. A benesse era devida ao
segurado que contasse 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade
profissional, de serviços para esse efeito considerados penosos, insalubres ou perigosos, por
decreto do Poder Executivo.
5 - O Decreto nº 53.831/64 foi o primeiro a trazer a lista de atividades especiais para efeitos
previdenciários, tendo como base a atividade profissional ou a exposição do segurado a
agentes nocivos. Já o Decreto nº 83.080/79 estabeleceu nova lista de atividades profissionais,
agentes físicos, químicos e biológicos presumidamente nocivos à saúde, para fins de
aposentadoria especial, sendo que, o Anexo I classificava as atividades de acordo com os
agentes nocivos enquanto que o Anexo II trazia a classificação das atividades segundo os
grupos profissionais.
6 - Atualmente, a aposentadoria especial encontra previsão no art. 57 da Lei nº 8.213/91.
7 - Logo, até a edição da Lei nº 9.032/95, era possível o reconhecimento da atividade especial:
(a) com base no enquadramento na categoria profissional, desde que a atividade fosse indicada
como perigosa, insalubre ou penosa nos anexos dos Decretos nº 53.831/64 ou 83.080/79
(presunção legal); ou (b) mediante comprovação da submissão do trabalhador,
independentemente da atividade ou profissão, a algum dos agentes nocivos, por qualquer meio
de prova, exceto para ruído e calor.
8 - A apresentação de laudo pericial, Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ou outro
formulário equivalente para fins de comprovação de tempo de serviço especial, somente passou
a ser exigida a partir de 06/03/1997 (Decreto nº. 2.172/97), exceto para os casos de ruído e
calor, em que sempre houve exigência de laudo técnico para verificação do nível de exposição
do trabalhador às condições especiais.
9 - O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com
base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição,
substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo
laborado em condições especiais.
10 - Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que
exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
11 - A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva
neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do
equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese
consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que,
ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
12 - Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o
reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução
da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas.
13 - Sustenta o demandante ter laborado em condições especiais de 06/03/1997 a 05/10/2009,
perante a empresa "Irmãos Malosso Ltda.". Para comprovar o alegado, anexou aos autos Perfis
Profissiográficos Previdenciários - PPP's, emitidos em 12/09/2005 e 21/09/2009, os quais dão
conta de que, no cargo de "destilador", de 1º/01/2004 até a data da emissão dos documentos,
estava exposto, nos períodos de safra (maio a outubro) e de entressafra (novembro a abril), a
ruídos de 88,6dB(A) e 84,5dB(A), respectivamente.
14 - Coligiu também laudo técnico de condições ambientais referente ao período de safra,
emitido em julho/2005, o qual denota a existência de ruído de 88,6dB(A), e laudo de riscos
ambientais, datado em 19/01/1998, constando ruídos que variam de 83 a 92dB(A), na safra, e
90 a 102dB(A), na entressafra.
15 - Ao revisitar os julgados sobre o tema, tormentoso, percebe-se nova reflexão
jurisprudencial, que se passa a adotar, para admitir a possibilidade de se considerar, como
especial, o trabalho desempenhado sob sujeição a ruído em sua maior intensidade, na medida
em que esta acaba por mascarar a de menor intensidade, militando em favor do segurado a
presunção de que uma maior pressão sonora prevalecia sobre as demais existentes no mesmo
setor.
16 - Registre-se, a esse respeito, precedente do C. Superior Tribunal de Justiça, segundo o
qual "não sendo possível aferir a média ponderada, deve ser considerado o maior nível de ruído
a que estava exposto o segurado, motivo pelo qual deve ser reconhecida a especialidade do
labor desenvolvido pelo segurado no período, merecendo reforma, portanto, a decisão
agravada que considerou equivocadamente que o labor fora exercido pelo segurado com
exposição permanente a ruído abaixo de 90dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003" (AgRg no
REsp nº 1.398.049/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, decisão monocrática, DJe
13/03/2015). Esta 7ª Turma, em caso análogo, decidiu nesse mesmo sentido.
17 - No caso em apreço, considerados os laudos técnicos e os PPP's apresentados, visualiza-
se certa diferença de medição do ruído entre os períodos considerados como safra e
entressafra.
18 - Enquadrados como especiais os interstícios de 06/03/1997 a 19/01/1998 (safra e
entressafra) e 1º/01/2004 a 21/09/2009 - data do PPP (somente nos meses correspondentes a
safra - maio a outubro), eis que desempenhados com sujeição a nível de pressão sonora
superior ao limite de tolerância vigente à época.
19 - Inviável o reconhecimento da especialidade nos períodos de: a) 20/01/1998 a 31/12/2003,
vez que inexiste laudo técnico ou PPP para os meses de entressafra (novembro a abril), e,
relativamente a safra (maio a outubro), foi contatado nível de ruído de 88,6dB(A), inferior ao
limite de tolerância vigente à época (90 decibéis até 18/11/2003); b) 1º/01/2004 a 21/09/2009,
nos meses de entressafra (novembro a abril), eis que o índice de ruído (84,5 decibéis) era
inferior ao instituído pela legislação em vigor; e c) 22/09/2009 a 05/10/2009, pois, como
salientado pelo ente autárquico, não há documento relativo ao referido intervalo, sendo o PPP
de fls. 39/40 datado em 21/09/2009.
20 - Somando-se as atividades especiais reconhecidas nesta demanda (06/03/1997 a
19/01/1998 e 1º/01/2004 a 21/09/2009, esta última somente nos meses de maio a outubro) ao
tempo já computado como especial pelo INSS e, portanto, incontroverso, verifica-se que o autor
alcançou 20 anos, 11 meses e 10 dias de serviço especial (vide planilha em anexo), na data do
requerimento administrativo (05/10/2009), tempo insuficiente à concessão da aposentadoria
especial.
21 - Contudo, somando-se as atividades especiais reconhecidas aos períodos comuns e
especiais incontroversos, constantes no "resumo de documentos para cálculo de tempo de
contribuição", verifica-se que o demandante alcançou 38 anos, 01 mês e 21 dias de tempo de
contribuição, fazendo jus à revisão da aposentadoria por tempo de contribuição integral de sua
titularidade.
22 - Observa-se que o fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, em se tratando de segurado
do sexo masculino, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação
sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
23 - O termo inicial do benefício deve ser mantido na data do requerimento administrativo
(05/10/2009), uma vez que se trata de revisão do beneplácito em razão do reconhecimento de
período laborado em atividade especial e considerando que, naquela oportunidade, o
demandante apresentou todos os documentos necessários à comprovação do alegado.
24 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
25 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
26 - Com a publicação do acórdão referente ao Recurso Extraordinário julgado em sede de
repercussão geral, impõe-se a aplicação do quanto nele decidido a todos os casos análogos,
independentemente do trânsito em julgado.
27 - Tendo em vista que o autor visava a conversão da aposentadoria por tempo de
contribuição em aposentadoria especial e diante do não reconhecimento da especialidade em
alguns dos lapsos temporais vindicados, fixa-se a sucumbência recíproca, conforme a previsão
do art. 21 do CPC/73, vigente à época da interposição do recurso, razão pela qual cada parte
arcará com os honorários advocatícios de seus respectivos patronos, e deixa-se de condená-las
no pagamento das custas, eis que o autor é beneficiário da justiça gratuita e o INSS delas está
isento
28 - Apelação do INSS e remessa necessária, tida por submetida, parcialmente providas.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento à
apelação do INSS e à remessa necessária, tida por submetida, para afastar a especialidade no
período de 20/01/1998 a 31/12/2003, nos meses de novembro a abril entre 1º/01/2004 e
21/09/2009, e no período de 22/09/2009 a 05/10/2009, condenar a Autarquia a revisar o
benefício de aposentadoria integral, desde o requerimento administrativo (05/10/2009), sendo
que sobre os valores em atraso incidirá correção monetária de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de
mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, e fixar a
sucumbência recíproca, nos termos do art. 21 do CPC/73, vigente à época, mantendo, no mais,
a r. sentença de 1º grau, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
