Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 2089797 / SP
0030910-39.2015.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
21/10/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:04/11/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA ILÍQUIDA. REMESSA NECESSÁRIA TIDA POR
INTERPOSTA. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. ARTIGOS 16, II e 74 A 79 DA LEI
N.º 8.213/91. RELAÇÃO HOMOAFETIVA. UNIÃO ESTÁVEL. NÃO COMPROVADA.
SEPARAÇÃO DE FATO OCORRIDA ANTES DO ÓBITO. AUSÊNCIA DE COABITAÇÃO E
MÚTUA ASSISTÊNCIA. REMESSA NECESSÁRIA E APELAÇÕES DO INSS E DO CORRÉU
LUIZ FERNANDO PROVIDAS. SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA.
DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE.
INVERSÃO DO ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO.
GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - No caso, o INSS foi condenado a pagar à autora o benefício previdenciário de pensão por
morte, sem indicar o termo inicial dos atrasados, com juros e correção monetária. Assim, não
havendo como se apurar o valor da condenação, trata-se de sentença ilíquida e sujeita ao
reexame necessário, nos termos do inciso I do artigo 475 do CPC/73 e da Súmula nº 490 do
STJ.
2 - A pensão por morte é regida pela legislação vigente à época do óbito do segurado, por força
do princípio tempus regit actum, encontrando-se regulamentada nos arts. 16, III e 74 a 79 da Lei
nº 8.213/91. Trata-se de benefício previdenciário devido aos dependentes do segurado falecido,
aposentado ou não.
3 - O benefício independe de carência, sendo percuciente para sua concessão: a) a ocorrência
do evento morte; b) a comprovação da condição de dependente do postulante; e c) a
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
manutenção da qualidade de segurado quando do óbito, salvo na hipótese de o de cujus ter
preenchido em vida os requisitos necessários ao deferimento de qualquer uma das
aposentadorias previstas no Regime Geral de Previdência Social - RGPS.
4 - A Lei de Benefícios, no art.16, com a redação dada pela Lei nº 9.032/95, vigente à época
dos óbitos, prevê taxativamente as pessoas que podem ser consideradas dependentes: "I - o
cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição,
menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido; II - os pais; III - o irmão não emancipado, de
qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido."
5 - O §3º do art. 16 da Lei de Benefícios dispõe que: "Considera-se companheira ou
companheiro a pessoa que, sem ser casada, mantém união estável com o segurado ou com a
segurada, de acordo com o § 3º do art. 226 da Constituição Federal". Por sua vez, o Decreto nº
3.048/99, no seu art. 16, § 6º, com a redação vigente à época do óbito, considera união estável
"aquela configurada na convivência pública, contínua e duradoura entre o homem e a mulher,
estabelecida com intenção de constituição de família, observado o § 1º do art. 1.723 do Código
Civil, instituído pela Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002".
6 - Já a Lei nº 9.278/96, que regulamenta o art. 226, § 3º da Constituição Federal, dispõe que:
"É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um
homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família". Saliente-se que
referido conceito consta da atual redação do §6º do art. 16 do RPS e no art. 1.723 do CC.
7 - O evento morte da Srª. Rosemary Montanheiro, ocorrido em 30/12/2009, restou comprovado
com a certidão de óbito (fl. 13).
8 - A celeuma diz respeito à alegada união estável entre a autora e o de cujus, bem como à
qualidade de segurada da falecida na época do passamento.
9 - Segundo a narrativa delineada na petição inicial, a autora conviveu maritalmente com a
falecida a partir do ano de 2003 até a data do óbito. A fim de corroborar os fatos alegados,
foram coligidos os seguintes documentos: 1 - declaração do Covabra Supermercados,
elaborada em 27 de abril de 2010, informando que a falecida incluiu a autora como dependente
no seu cartão fidelidade emitido pelo respectivo estabelecimento comercial (fl. 14); 2 -
declaração da proprietária de lanchonete local, a Srª. Alexandra Elena Borges, elaborada em 23
de março de 2010, informando que a falecida e a autora frequentavam constantemente o
estabelecimento e conviviam publicamente como se casadas fossem (fl. 15); 3 - declaração de
proprietária de locadora local, o Sr. Antonio Fernando Metener, informando que a autora tinha
cadastrado a falecida como sua dependente (fl. 16); 4 - correspondência enviada à falecida em
2007, no endereço indicado como domicílio da parte autora (fl. 19); 5 - fotos do casal em
ambientes públicos e privados, denotando cumplicidade e afetividade entre a falecida e a autora
(fls. 23/34).
10 - Embora os documentos acima apontados constituam início razoável de prova material, eles
não foram corroborados pela prova coletada nas audiências realizadas em 10/03/2011 e
04/05/2011, na qual foram ouvidas seis testemunhas (transcrição às fls. 142/147 e 149).
11 - A prova oral demonstrou que a demandante, embora tenha se relacionado com a falecida
durante certo período, já não mais convivia maritalmente com ela na época do passamento. De
fato, as testemunhas revelaram que o de cujus voltou a residir com sua genitora, a fim de
prestar-lhe os cuidados necessários para superar a doença que lhe acometera à época. Após o
óbito de sua mãe, a falecida foi morar com uma amiga até a data do óbito, sendo amparada
materialmente pelo padrasto.
12 - Tais declarações restaram corroboradas pela certidão de óbito, que comprova que a
falecida residia em local diverso do domicílio da autora à época do passamento (fl . 13). Neste
sentido, é importante ressaltar que a correspondência apresentada pela demandante, que
indicaria, em tese, a coabitação existente entre ela e a falecida, remonta ao ano de 2007, muito
antes, portanto, do momento em que o de cujus voltou a residir com a genitora, em 2008. No
mais, as declarações ofertadas por estabelecimentos comerciais locais restaram isoladas e
contraditórias às demais provas produzidas na fase instrutória.
13 - Desta forma, à míngua da comprovação da condição de dependente da autora, deve ser
julgado improcedente o pedido deduzido na inicial. Precedente.
14 - Cabia à autora demonstrar o fato constitutivo de seu direito, nos termos preconizados pelo
art. 373, I, do Código de Processo Civil. No entanto, nos presentes autos não foram juntados
quaisquer documentos, indiciários da convivência marital do casal.
15 - Diante disso, não há nos autos elementos de convicção que apontem para a comprovação
do requisito em apreço, razão pela qual merece reforma a sentença de 1º grau de jurisdição.
16 - Invertido os ônus sucumbenciais, deve ser condenada a autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
das custas e honorários advocatícios, os quais se arbitra em 10% (dez por cento) do valor
atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada
a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos benefícios da
assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da Lei nº
1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC/2015.
17 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
18 - Remessa necessária e apelações do INSS e do corréu LUIZ FERNANDO providas.
Sentença reformada. Revogação da tutela. Devolução de valores. Juízo da execução. Ação
julgada improcedente. Inversão das verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso.
Gratuidade da justiça.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar provimento à remessa
oficial, tida por interposta, e aos recursos de apelação do INSS e do corréu LUIZ FERNANDO,
para reformar a r. sentença de 1º grau, julgar improcedente o pedido deduzido na inicial e
condenar a demandante no pagamento das custas e despesas processuais, bem como nos
honorários advocatícios, observada a Lei nº 1.060/50, com a revogação da tutela anteriormente
concedida, observando-se o acima expendido quanto à devolução dos valores recebidos a esse
título, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
