Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
0025228-98.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
12/11/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 19/11/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º,
CPC. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. LAUDO MÉDICO. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO
SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA
À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O
PARECER DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO
MAGISTRADO. ATIVIDADE CAMPESINA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL SUFICIENTE.
SÚMULA 149, STJ. PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO. QUALIDADE DE
SEGURADO DEMONSTRADA. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA LEGAL. AUXÍLIO-DOENÇA
DEVIDO. DIB. DATA DA CITAÇÃO. SÚMULA 576, STJ. DCB. IMPOSSIBILIDADE NO CASO
CONCRETO. COPES. APLICAÇÃO. ART. 60, §9º, LEI 8.213/91. CORREÇÃO MONETÁRIA.
JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS PROCESSUAIS. ISENÇÃO. LEI
ESTADUAL 11.608/2003. SÃO PAULO. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA.
APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em
conta o termo inicial do benefício (07.11.2013) e a data da prolação da r. sentença (04.06.2018),
ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência Social, mesmo
assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba
honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame realizado em 07 de novembro de 2013, quando a demandante possuía 41 (quarenta e um)
anos de idade, a diagnosticou com “lesões alveolares na base pulmonar esquerda, secundária à
pneumonia”. Consignou que “diante do acima exposto, conclui-se que a autora não reúne
condições para o desempenho de atividades laborativas no momento, devendo dedicar-se ao
tratamento em curso, visando melhoria do quadro respiratório”.
10 - Em sede de esclarecimento complementares, fixou a DII em 30.10.2012, data do “diagnóstico
de pneumotórax com drenagem pleural à esquerda”, não sabendo precisar “uma data de cura
para sua patologia”. Atestou que “uma vez realizado o tratamento adequado (drenagem pleural),
resta o tratamento da causa que levou à patologia pulmonar (ICC, cirrose hepática, síndrome
nefrótica, insuficiência renal crônica e inflamatória), sendo que cada uma destas tem um período
diferente para tratamento”.
11 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou
quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão,
salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser
o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a
exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
12 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o
qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico
da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises
que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica
merece confiança e credibilidade.
13 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova
exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
14 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que
se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da
7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser
contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido
produzidos de forma espontânea, no passado.
15 - Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil,
assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido
em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início
de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
16 - A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
17 - Via de regra, CTPS - com anotações de pactos laborais de natureza rural - constitui prova
plena do desempenho de tais atividades, tão somente nos lapsos temporais nela constantes, não
irradiando seus efeitos para outros períodos, sejam eles anteriores ou posteriores. No entanto,
referido entendimento cede passo, em caráter absolutamente excepcional, na hipótese de a prova
testemunhal se revelar coesa, uníssona e coerente acerca do desempenho da labuta campesina
por parte do segurado, ocasião em que se faz de rigor a expressa menção a interregnos
temporais, culturas trabalhadas, propriedades e, em especial - porque se cuida, aqui, de
concessão de benefício por incapacidade -, o momento no qual houve a cessação do labor, em
decorrência dos males incapacitantes, tudo a formar um juízo inequívoco de convicção a respeito
da efetiva condição de rurícola, seja na atividade eventual, seja em regime de economia familiar.
18 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 18 de fevereiro de 2016, foram colhidos
os depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pela demandante, os quais demonstraram o
labor campesino exercido por ela durante toda a sua vida, como confirmaram ter a mesma
interrompido o trabalho em decorrência dos males de que é portadora.
19 - Cumpridos os requisitos carência e qualidade de segurado, quando do surgimento da
incapacidade total e temporária, de rigor a concessão do benefício de auxílio-doença (art. 59 da
Lei 8.213/91).
20 - No que se refere à necessidade de reabilitação, destaca-se que esta só tem vez quando o
segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação
habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a constatação,
haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação profissional, nos
exatos termos do caput do art. 62 da Lei 8.213/91. Nessa senda, uma vez concedido e dada sua
natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença pode ser cessado, prorrogado,
ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo
necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da
realização de perícias periódicas por parte da autarquia, conforme previsão expressa contida no
art. 101 da Lei nº 8.213/91, observando-se, ainda, a sistemática da cobertura previdenciária
estimada (“COPES”), prevista no §9º do art. 62 do mesmo diploma legislativo. Descabe, ainda,
cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a realização de procedimento
reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da capacidade laboral
para o trabalho habitual, uma vez que esse dever decorre de imposição de Lei. Por fim, eventual
alegação de agravamento do quadro de saúde e concessão de nova benesse, por se tratar de
situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou judicial, sob pena de
eternização desta lide.
21 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se
dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência
(Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a inexistência de requerimento administrativo anterior à
propositura da demanda, de rigor a fixação da DIB na data da citação.
22 - Não fixada uma DCB prévia para a benesse, posto que não se visualiza uma data de
recuperação certa para a requerente. A uma, porque o perito judicial não soube precisar um
momento de alta para ela. A duas, porque não só sofre com patologias pulmonares, mas também
com vícios em álcool e outras substâncias psicoativas, vícios estes que, como é de conhecimento
notório, demandam tratamentos longos nos quais não são raras as vezes em que o dependente
sofre recaídas.
23 - Registre-se que tal ausência de estabelecimento de uma data específica não afasta a
aplicação da COPES, prevista no art. 60, §9º, da Lei 8.213/91 (prorrogações de 120 dias, desde
que efetuados requerimentos administrativos sucessivos pelo segurado e perícias administrativas
comprovem a continuidade do quadro incapacitante).
24 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
25 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
26 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação,
consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma
vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
27 - Em se tratando de processo com tramitação perante a Justiça Estadual de São Paulo, deve
ser observado o disposto na Lei Estadual nº. 11.608, de 29/12/2003, que, em seu artigo 6º,
dispõe que a isenção do recolhimento de taxa judiciária se aplica ao INSS.
28 - Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida. Sentença
reformada em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0025228-98.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIANA APARECIDA LEITE
Advogado do(a) APELADO: OLENO FUGA JUNIOR - SP182978-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0025228-98.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIANA APARECIDA LEITE
Advogado do(a) APELADO: OLENO FUGA JUNIOR - SP182978-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por ELIANA APARECIDA LEITE, objetivando a
concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento
dos atrasados de aposentadoria por invalidez, desde a data do exame pericial, ocorrido em
07.11.2013 (ID 102048481, p. 81-84). Condenou o INSS, ainda, no pagamento de custas
processuais e honorários advocatícios, os últimos arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o
valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação (ID 102048481, p. 172-
175).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que preenche
os requisitos para a concessão do benefício concedido. Em sede subsidiária, requer o
reconhecimento da prescrição das parcelas vencidas anteriormente ao quinquênio que
precedeu o ajuizamento da ação, bem como a fixação da correção monetária e dos juros de
mora de acordo com a Lei 11.960/09 e, por fim, seja afastada sua condenação no pagamento
de custas processuais (ID 102048481, p. 180-188).
A autora apresentou contrarrazões (ID 102048481, p. 193-195).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0025228-98.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: ELIANA APARECIDA LEITE
Advogado do(a) APELADO: OLENO FUGA JUNIOR - SP182978-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação,
levando em conta o termo inicial do benefício (07.11.2013) e a data da prolação da r. sentença
(04.06.2018), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora
e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
Passo à análise do mérito.
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame realizado em 07 de novembro de 2013 (ID 102048481, p. 81-84), quando a demandante
possuía 41 (quarenta e um) anos de idade, a diagnosticou com “lesões alveolares na base
pulmonar esquerda, secundária à pneumonia”.
Consignou que “diante do acima exposto, conclui-se que a autora não reúne condições para o
desempenho de atividades laborativas no momento, devendo dedicar-se ao tratamento em
curso, visando melhoria do quadro respiratório”.
Em sede de esclarecimento complementares, fixou a DII em 30.10.2012, data do “diagnóstico
de pneumotórax com drenagem pleural à esquerda”, não sabendo precisar “uma data de cura
para sua patologia”. Atestou que “uma vez realizado o tratamento adequado (drenagem
pleural), resta o tratamento da causa que levou à patologia pulmonar (ICC, cirrose hepática,
síndrome nefrótica, insuficiência renal crônica e inflamatória), sendo que cada uma destas tem
um período diferente para tratamento” (ID 102048481, p. 139).
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre
convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou
científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos
robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto.
Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas
partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se
vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração
do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000,
Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo
Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o
qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de
histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando
demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
Passo, agora, a analisar os requisitos carência e qualidade de segurado.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal.
Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para
efeito de obtenção do benefício previdenciário".
A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se
pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por
prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o
raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
"AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADORA RURAL. REQUISITOS
NÃO DEMONSTRADOS. 1. (...). 3. Não se exige que a prova material se estenda por todo o
período de carência, mas é imprescindível que a prova testemunhal faça referência à época em
que foi constituído o documento.(...)" (APELREEX - APELAÇÃO/REEXAME NECESSÁRIO nº
0008835-06.2015.4.03.9999, Rel. Des. Fed. Paulo Domingues, j. 30/11/2015, e-DJF3 Judicial 1
DATA:07/12/2015 - grifos nossos).
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO.
CÔMPUTO DE TEMPO RURAL. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR. AUSÊNCIA DE INÍCIO
DE PROVA MATERIAL. ALTERAÇÃO DO JULGADO. SÚMULA 7/STJ. DISSÍDIO
JURISPRUDENCIAL. ANÁLISE PREJUDICADA. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. (...)
2) não é imperativo que o início de prova material diga respeito a todo período de carência
estabelecido pelo artigo 143 da Lei 8.213/1991, desde que a prova testemunhal amplie sua
eficácia probatória. (...)" (AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014 - grifos nossos).
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver
comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil,
assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural
exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos
como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal
idônea.
Para fazer prova da qualidade de segurada, na condição de lavradora, a autora colacionou
cópias de sua CTPS aos autos (ID 102048481, p. 12-15), nas quais constam os seguintes
vínculos de natureza rural:
a) junto a OSDEMIR SOLDI E OUTROS, de 20.08.2001 a 19.09.2001, 08.09.2003 a
21.12.2003, e, por fim, de 09.08.2004 a 24.10.2004;
b) junto a ABD ELCARIM DIB E OUTROS, de 17.06.2002 a 17.07.2002;
c) junto à CBL CITRICULA LTDA., de 05.08.2002 a 25.11.2002;
d) junto a JOSÉ OSWALDO R. DE MENDONÇA E OUTROS, de 13.02.2007 a 12.04.2007;
e) e, por fim, junto a BRUNO A. FERREIRA JACINTHO, de 07.08.2007 a 20.09.2007.
A esse respeito, registro, porque de todo oportuno, que, via de regra, comungo do entendimento
segundo o qual a CTPS - com anotações de pactos laborais de natureza rural - constitui prova
plena do desempenho de tais atividades, tão somente nos lapsos temporais nela constantes,
não irradiando seus efeitos para outros períodos, sejam eles anteriores ou posteriores.
No entanto, referido entendimento cede passo, em caráter absolutamente excepcional, na
hipótese de a prova testemunhal se revelar coesa, uníssona e coerente acerca do desempenho
da labuta campesina por parte do segurado, ocasião em que se faz de rigor a expressa menção
a interregnos temporais, culturas trabalhadas, propriedades e, em especial - porque se cuida,
aqui, de concessão de benefício por incapacidade -, o momento no qual houve a cessação do
labor, em decorrência dos males incapacitantes, tudo a formar um juízo inequívoco de
convicção a respeito da efetiva condição de rurícola, seja na atividade eventual, seja em regime
de economia familiar.
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 18 de fevereiro de 2016 (ID 102048481, p.
123-125), foram colhidos os depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pela demandante.
CREDIVAL CAVALLINI relatou que a autora parou de trabalhar em virtude de problemas
pulmonares e relacionadas ao vício em álcool, sendo que trabalhava à época como rurícola,
nas culturas de laranja, corte de cana de açúcar, algodão. Trabalhou para Coopercitrus, dentre
outras empresas.
LEONOR PINHEIRO DE SOUZA, por sua vez, disse que conheceu a requerente há uns 6
(seis), 7 (sete) anos, sendo que ambas trabalhavam na lide campesina, nas Fazendas Santa
Rita e Paraguaçu, bem como para as empresas agrícolas Frutesp, Cutrale. O último labor juntas
se deu na Fazenda Esperança, na cultura de algodão, sem registro. Disse que ela deixou de
trabalhar por causa de patologias nos pulmões e já por internações em clínicas psiquiátricas em
razão do vício em álcool e drogas.
Como se vê, a prova testemunhal demonstrou tanto o labor campesino exercido pela autora
durante toda a sua vida, como confirmou ter a mesma interrompido o trabalho em decorrência
dos males de que é portadora.
Cumpridos, a meu julgar, os requisitos carência e qualidade de segurado, quando do
surgimento da incapacidade total e temporária, de rigor a concessão do benefício de auxílio-
doença (art. 59 da Lei 8.213/91).
No que se refere à necessidade de reabilitação, destaca-se que esta só tem vez quando o
segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação
habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a
constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação
profissional, nos exatos termos do caput do art. 62 da Lei 8.213/91.
Nessa senda, uma vez concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício
de auxílio-doença pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de
reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das
condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por
parte da autarquia, conforme previsão expressa contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91,
observando-se, ainda, a sistemática da cobertura previdenciária estimada (“COPES”), prevista
no §9º do art. 62 do mesmo diploma legislativo.
Descabe, ainda, cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a realização de
procedimento reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da
capacidade laboral para o trabalho habitual, uma vez que esse dever decorre de imposição de
Lei.
Por fim, eventual alegação de agravamento do quadro de saúde e concessão de nova benesse,
por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou
judicial, sob pena de eternização desta lide.
Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá
na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência
(Súmula 576 do STJ).
Tendo em vista a inexistência de requerimento administrativo anterior à propositura da
demanda, de rigor a fixação da DIB na data da citação.
Deixo de fixar uma DCB prévia para a benesse, posto que não visualizo uma data de
recuperação certa para a requerente. A uma, porque o perito judicial não soube precisar um
momento de alta para ela. A duas, porque não só sofre com patologias pulmonares, mas
também com vícios em álcool e outras substâncias psicoativas, vícios estes que, como é de
conhecimento notório, demandam tratamentos longos nos quais não são raras as vezes em que
o dependente sofre recaídas.
Registro que tal ausência de estabelecimento de uma data específica não afasta a aplicação da
COPES, prevista no art. 60, §9º, da Lei 8.213/91 (prorrogações de 120 dias, desde que
efetuados requerimentos administrativos sucessivos pelo segurado e perícias administrativas
comprovem a continuidade do quadro incapacitante).
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo
com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas
as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que,
sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
Por derradeiro, em se tratando de processo com tramitação perante a Justiça Estadual de São
Paulo, deve ser observado o disposto na Lei Estadual nº. 11.608, de 29/12/2003, que, em seu
artigo 6º, dispõe que a isenção do recolhimento de taxa judiciária se aplica ao INSS.
Ante o exposto, não conheço da remessa necessária e dou parcial provimento ao recurso de
apelação do INSS para condena-lo na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-
doença, desde a data da citação, sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção
monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos
índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo
com o mesmo Manual, além de condená-lo no pagamento de honorários advocatícios na ordem
de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença
de 1º grau de jurisdição, restando, por fim, dispensado do recolhimento das custas.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º,
CPC. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ.
INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. LAUDO MÉDICO. INTERPRETAÇÃO A
CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA
NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS
QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO.
CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. ATIVIDADE CAMPESINA. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
SUFICIENTE. SÚMULA 149, STJ. PROVA TESTEMUNHAL. RECONHECIMENTO.
QUALIDADE DE SEGURADO DEMONSTRADA. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA LEGAL.
AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO. DIB. DATA DA CITAÇÃO. SÚMULA 576, STJ. DCB.
IMPOSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. COPES. APLICAÇÃO. ART. 60, §9º, LEI 8.213/91.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. CUSTAS
PROCESSUAIS. ISENÇÃO. LEI ESTADUAL 11.608/2003. SÃO PAULO. REMESSA
NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em
conta o termo inicial do benefício (07.11.2013) e a data da prolação da r. sentença
(04.06.2018), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora
e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame realizado em 07 de novembro de 2013, quando a demandante possuía 41 (quarenta e
um) anos de idade, a diagnosticou com “lesões alveolares na base pulmonar esquerda,
secundária à pneumonia”. Consignou que “diante do acima exposto, conclui-se que a autora
não reúne condições para o desempenho de atividades laborativas no momento, devendo
dedicar-se ao tratamento em curso, visando melhoria do quadro respiratório”.
10 - Em sede de esclarecimento complementares, fixou a DII em 30.10.2012, data do
“diagnóstico de pneumotórax com drenagem pleural à esquerda”, não sabendo precisar “uma
data de cura para sua patologia”. Atestou que “uma vez realizado o tratamento adequado
(drenagem pleural), resta o tratamento da causa que levou à patologia pulmonar (ICC, cirrose
hepática, síndrome nefrótica, insuficiência renal crônica e inflamatória), sendo que cada uma
destas tem um período diferente para tratamento”.
11 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames
ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal
aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso
concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto
probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis
Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima,
DJE. 12/11/2010.
12 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente,
o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de
histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando
demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
13 - O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço
somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida
prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
14 - A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período
que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser
corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade
daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais
documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de
que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
15 - Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do
RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil,
assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural
exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos
como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal
idônea.
16 - A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
17 - Via de regra, CTPS - com anotações de pactos laborais de natureza rural - constitui prova
plena do desempenho de tais atividades, tão somente nos lapsos temporais nela constantes,
não irradiando seus efeitos para outros períodos, sejam eles anteriores ou posteriores. No
entanto, referido entendimento cede passo, em caráter absolutamente excepcional, na hipótese
de a prova testemunhal se revelar coesa, uníssona e coerente acerca do desempenho da
labuta campesina por parte do segurado, ocasião em que se faz de rigor a expressa menção a
interregnos temporais, culturas trabalhadas, propriedades e, em especial - porque se cuida,
aqui, de concessão de benefício por incapacidade -, o momento no qual houve a cessação do
labor, em decorrência dos males incapacitantes, tudo a formar um juízo inequívoco de
convicção a respeito da efetiva condição de rurícola, seja na atividade eventual, seja em regime
de economia familiar.
18 - Realizada audiência de instrução e julgamento, em 18 de fevereiro de 2016, foram colhidos
os depoimentos de 2 (duas) testemunhas arroladas pela demandante, os quais demonstraram o
labor campesino exercido por ela durante toda a sua vida, como confirmaram ter a mesma
interrompido o trabalho em decorrência dos males de que é portadora.
19 - Cumpridos os requisitos carência e qualidade de segurado, quando do surgimento da
incapacidade total e temporária, de rigor a concessão do benefício de auxílio-doença (art. 59 da
Lei 8.213/91).
20 - No que se refere à necessidade de reabilitação, destaca-se que esta só tem vez quando o
segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação
habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a
constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação
profissional, nos exatos termos do caput do art. 62 da Lei 8.213/91. Nessa senda, uma vez
concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença pode
ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria
por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o
que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia, conforme
previsão expressa contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91, observando-se, ainda, a sistemática
da cobertura previdenciária estimada (“COPES”), prevista no §9º do art. 62 do mesmo diploma
legislativo. Descabe, ainda, cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a
realização de procedimento reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o
restabelecimento da capacidade laboral para o trabalho habitual, uma vez que esse dever
decorre de imposição de Lei. Por fim, eventual alegação de agravamento do quadro de saúde e
concessão de nova benesse, por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo
pedido administrativo ou judicial, sob pena de eternização desta lide.
21 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este
se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua
inexistência (Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a inexistência de requerimento administrativo
anterior à propositura da demanda, de rigor a fixação da DIB na data da citação.
22 - Não fixada uma DCB prévia para a benesse, posto que não se visualiza uma data de
recuperação certa para a requerente. A uma, porque o perito judicial não soube precisar um
momento de alta para ela. A duas, porque não só sofre com patologias pulmonares, mas
também com vícios em álcool e outras substâncias psicoativas, vícios estes que, como é de
conhecimento notório, demandam tratamentos longos nos quais não são raras as vezes em que
o dependente sofre recaídas.
23 - Registre-se que tal ausência de estabelecimento de uma data específica não afasta a
aplicação da COPES, prevista no art. 60, §9º, da Lei 8.213/91 (prorrogações de 120 dias, desde
que efetuados requerimentos administrativos sucessivos pelo segurado e perícias
administrativas comprovem a continuidade do quadro incapacitante).
24 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
25 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
26 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação,
consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma
vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a
sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada
moderadamente.
27 - Em se tratando de processo com tramitação perante a Justiça Estadual de São Paulo, deve
ser observado o disposto na Lei Estadual nº. 11.608, de 29/12/2003, que, em seu artigo 6º,
dispõe que a isenção do recolhimento de taxa judiciária se aplica ao INSS.
28 - Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida. Sentença
reformada em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa necessária e dar parcial provimento ao recurso
de apelação do INSS para condena-lo na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-
doença, desde a data da citação, sendo que sobre os valores em atraso incidirá correção
monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na
Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos
índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo
com o mesmo Manual, além de condená-lo no pagamento de honorários advocatícios na ordem
de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença
de 1º grau de jurisdição, restando, por fim, dispensado do recolhimento das custas, nos termos
do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
