
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001758-23.2013.4.03.6116
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSIAS ALMEIDA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: RICARDO SALVADOR FRUNGILO - SP179554-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001758-23.2013.4.03.6116
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSIAS ALMEIDA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: RICARDO SALVADOR FRUNGILO - SP179554-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por JOSIAS ALMEIDA DA SILVA, objetivando a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, bem como indenização por danos morais.
A r. sentença julgou procedente o pedido deduzido, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde a data da apresentação de requerimento administrativo, que se deu em 24.11.2011 (ID 102365713, p. 42). Fixou correção monetária segundo a TR e juros de mora nos termos da Lei 11.960/09, sendo que, quanto à primeira, a partir de 25.03.2015, deverá seguir os parâmetros do IPCA-E. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor da causa. Por fim, determinou a imediata implantação do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada (ID 102367383, p. 04-12).
Em razões recursais, o INSS pugna, preliminarmente, pela submissão da sentença à remessa necessária. No mérito, sustenta que o demandante não preenche os requisitos para a concessão dos benefícios ora vindicados. Em sede subsidiária, requer a modificação da DIB, bem como o desconto das parcelas relativas aos meses em que desenvolveu atividade laborativa após tal data, e, por fim, a alteração dos critérios de aplicação da correção monetária (ID 102367383, p. 24-31).
O autor apresentou contrarrazões (ID 102367383, p. 34-44).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001758-23.2013.4.03.6116
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSIAS ALMEIDA DA SILVA
Advogado do(a) APELADO: RICARDO SALVADOR FRUNGILO - SP179554-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em conta o termo inicial do benefício (24.11.2011) e a data da prolação da r. sentença (18.07.2016), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
Passo à análise do mérito
.A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto
.No que tange à incapacidade, a profissional médica indicada pelo Juízo
a quo
, com base em exame realizado em 27 de novembro de 2014 (ID 102367686, p. 65-74), quando o demandante possuía 43 (quarenta e três) anos de idade, o diagnosticou como portador de “transtorno delirante orgânico (tipo esquizofrênico)”.Atesta que o autor se apresentou em “
bom aspecto geral e cuidados de higiene presentes, cabelo, vestes, fáscies ansiosa, porte normal, atitude ruim em relação ao investigador, ausência de adequação e colaboração do autor. Consciência: alteração no nível de consciência, não respondendo a solicitações verbais, repetitivo, desconexo, sem orientação, emitindo sons de diferentes formas e relata presença de bichos ao exame. Memória: Alterada, não respondendo a solicitações verbais. Afetividade: Agressivo. Pensamento/Discurso: Desorganizado. Psicomotricidade: agitação psicomotora, função psíquica anormal
”.Concluiu por sua incapacidade total e temporária, fixando o seu início em 13.06.2014.
Em sede de esclarecimentos complementares (ID 102367686, p. 157-158), registrou a possibilidade da recuperação laboral do requerente,
in verbis
:“
No momento desta pericia foi concluída incapacidade laborativa. Com o tratamento adequado a doença poderá manter estável e haver possibilidade de recuperação e exercer sua capacidade laborativa
”.Por fim, em novos esclarecimentos complementares, a
expert
aduziu que documentos médicos juntados aos autos indicam que a DII remonta a 2013 (ID 102367686, p. 191-194 e 196-198).Assevero que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Pois bem, a despeito de a
expert
ter fixado o início da incapacidade em meados de 2013, se me afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), que, quem percebeu benefícios de auxílio-doença praticamente de maneira ininterrupta entre 2002 e 2009, tenha recobrado sua capacidade laboral neste último ano, e retornado ao estado incapacitante em 2013, pela mesma moléstia.Ressalta-se que o autor é portador de grave patologia psiquiátrica - “transtorno delirante orgânico (tipo esquizofrênico)” -, sendo que, a meu sentir, sequer deveria ter sido concedido auxílio-doença, mas sim aposentadoria por invalidez, contudo, mantenho o deferimento daquele, em observância ao princípio da adstrição (art. 492, CPC).
A corroborar a hipótese de continuidade do quadro incapacitante, desde a data da cessação de benefício pretérito (NB: 535.752.115-4), destaco que foi acostado aos autos solicitação médica de internação do requerente em hospital psiquiátrico, em 2006 (ID 102365713, p. 139), bem como perícias médicas administrativas, as quais noticiam que ele já havia sido internado em 2003 e que tentou, ao menos por duas vezes, o suicídio (ID 102367388, p. 219-220).
Pois bem, uma vez que a alta médica do autor promovida pelo INSS, em 16.07.2009, que se adota como DII, foi equivocada, resta incontroverso que este havia preenchido os requisitos qualidade de segurado e carência legal neste instante, nos exatos termos do art. 15, I, da Lei 8.213/91.
Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (Súmula 576 do STJ).
Tendo em vista a persistência da incapacidade, quando da cessação do auxílio-doença (NB: 535.752.115-4), seria de rigor a fixação da DIB na data do seu cancelamento indevido, já que desde a data de entrada do requerimento (DER) até a sua cessação (16.07.2009 - ID 102367686, p. 176), o autor efetivamente estava protegido pelo Sistema da Seguridade Social, percebendo benefício previdenciário.
Contudo, como o demandante deduziu pedido na inicial para que o termo inicial da benesse fosse fixado em 24.11.2011 (ID 102367388, p. 24), data da apresentação de um dos requerimento administrativos apresentados, mantenho a DIB neste momento, assim como o magistrado
a quo
.Passo à análise da questão envolvendo o trabalho da parte autora no período em que reconhecida a incapacidade laborativa, com o desdobramento no pagamento das parcelas em atraso.
Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a ausência da remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não consegue exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade temporária ou definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada, após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação. E os princípios que dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador no art. 46 da Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter de ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária em manter benefício previdenciário, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado, com a impossibilidade de concessão de benefício judicialmente, em virtude de suposta ausência de incapacidade. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime.
Neste sentido já decidiu esta Corte, conforme arestos a seguir reproduzidos:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORATIVA APÓS A CESSAÇÃO DO AUXÍLIO-DOENÇA. DESCONTO DOS VALORES NO PERÍODO DO SUPOSTO TRABALHO. IMPOSSIBILIDADE. LEI 11.960/09. APLICAÇÃO COM RELAÇÃO À CORREÇÃO MONETÁRIA. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O fato da autora ter trabalhado ou voltado a trabalhar, por si só, não significa que tenha recuperado a capacidade laborativa, uma vez que pode tê-lo feito por razão de extrema necessidade e de sobrevivência, ainda mais se tratando de empregada doméstica, não obstante incapacitada para tal. 2. A autora, que deveria ter sido aposentada por invalidez, porém continuou a contribuir após referido período, em função de indevida negativa do benefício pelo INSS, não pode ser penalizada com o desconto dos salários-de-contribuição sobre os quais verteu contribuições, pois, se buscou atividade remunerada, por falta de alternativa, para o próprio sustento, em que pese a incapacidade laborativa, no período em que a autarquia opôs-se ilegalmente ao seu direito, não cabe ao INSS tirar proveito de sua própria conduta. 3. No que tange à correção monetária, devem ser aplicados os índices oficiais de remuneração básica, a partir da vigência da Lei 11.960/09. 4. Agravo parcialmente provido." (AC 0036499-51.2011.4.03.9999, 10ª Turma, Rel. Des. Fed. Baptista Pereira, j. 05/02/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/02/2013)".
"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. MATÉRIA PRELIMINAR. ESPERA PELA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RETORNO À ATIVIDADE LABORATIVA. POSSIBILIDADE DE PERCEPÇÃO CONJUNTA DE BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE E SALÁRIO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. INOCORRÊNCIA. VALORAÇÃO DE TODAS AS PROVAS ACOSTADOS AOS AUTOS SUBJACENTES. ERRO FATO. INEXISTÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - A matéria preliminar confunde-se com o mérito e com ele será examinada.
II - Há que prevalecer o entendimento já adotado na 10ª Turma, no sentido de que comprovada a incapacidade laborativa e não tendo sido concedida tutela para implantação do benefício, não se justifica a exclusão do período em que o segurado, mesmo tendo direito ao benefício, teve que trabalhar para garantir a sua subsistência, já que não é razoável que se exija que o segurado tenha recursos para se manter até que o seu feito seja julgado.
III - Malgrado o ora réu tenha exercido atividade remunerada desde o termo inicial do benefício de auxílio-doença fixado pela r. decisão rescindenda (05.02.2006) até agosto de 2011, conforme extrato do CNIS acostado aos autos, cabe ponderar que este havia sido contemplado com benefício de auxílio-doença nos períodos de 25.06.2004 a 04.07.2005, de 16.10.2005 a 30.11.2005 e de 25.01.2006 a 05.02.2006, havendo, ainda, documentos médicos apontando a ocorrência da mesma enfermidade constatada pela perícia oficial (epicondilite lateral do cotovelo direito) desde agosto de 2004. Assim sendo, é razoável inferir que o ora réu teve que buscar o mercado de trabalho mesmo sem plenas condições físicas para tal.
IV - A r. decisão rescindenda apreciou o conjunto probatório em sua inteireza, segundo o princípio da livre convicção motivada, tendo concluído pela existência de incapacidade parcial e temporária do réu para o trabalho, a ensejar a concessão do benefício de auxílio-doença.
V - Não se admitiu um fato inexistente ou se considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido, pois foram consideradas as provas acostadas aos autos originários, com pronunciamento judicial sobre o tema, mesmo porque não constava das peças que compuseram os aludidos autos o extrato de CNIS indicando a manutenção de atividade laborativa após a cessação do benefício de auxílio-doença concedido na esfera administrativa.
VI - Honorários advocatícios arbitrados em R$ 700,00 (setecentos reais) a serem suportados pelo INSS.
VII - Preliminar rejeitada. Ação rescisória cujo pedido se julga improcedente."
(AR nº 0019784-55.2011.4.03.0000, Rel. Des. Federal Sérgio Nascimento, 3ª Seção, e-DJF3 18/11/2013)”.
A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva, fixou a “Tese nº 1.013”, quando do julgamento do Recurso Especial nº 1.786.590/SP, ocorrido em 24.06.2020, com o seguinte teor:
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto,
rejeito a preliminar de conhecimento da remessa necessária
, no mérito,nego provimento
à apelação do INSS, e, por fim,de ofício
, estabeleço que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual.Em atenção ao disposto no artigo 85, §11, do CPC, ficam os honorários advocatícios majorados em 2% (dois por cento), respeitando-se os limites previstos nos §§ 2º e 3º do mesmo artigo.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º, CPC. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO DEMONSTRADA. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA LEGAL. ART. 15, I, LEI 8.213/91. CONTINUIDADE DO QUADRO INCAPACITANTE. ALTA MÉDICA INDEVIDA. LAUDO PERICIAL. ART. 479, CPC. PRINCÍPIO DO LIVRE CONVENCIMENTO MOTIVADO. MÁXIMAS DA EXPERIÊNCIA ART. 375, CPC. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO. AUSÊNCIA DE RECURSO DA PARTE INTERESSADA. ART. 492, CPC. PRINCÍPIO DA ADSTRIÇÃO. DIB. DATA DA APRESENTAÇÃO DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. SÚMULA 576, STJ. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA INCAPACIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DESCONTO. DESCABIMENTO. TEMA REPETITIVO Nº 1.013/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. ART. 85, §11, CPC. PRELIMINAR DE CONHECIMENTO DA REMESSA NECESSÁRIA REJEITADA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA DE OFÍCIO. VERBA HONORÁRIA MAJORADA. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em conta o termo inicial do benefício (24.11.2011) e a data da prolação da r. sentença (18.07.2016), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
9 - No que tange à incapacidade, a profissional médica indicada pelo Juízo
a quo
, com base em exame realizado em 27 de novembro de 2014 (ID 102367686, p. 65-74), quando o demandante possuía 43 (quarenta e três) anos de idade, o diagnosticou como portador de “transtorno delirante orgânico (tipo esquizofrênico)”. Atesta que o autor se apresentou em “bom aspecto geral e cuidados de higiene presentes, cabelo, vestes, fáscies ansiosa, porte normal, atitude ruim em relação ao investigador, ausência de adequação e colaboração do autor. Consciência: alteração no nível de consciência, não respondendo a solicitações verbais, repetitivo, desconexo, sem orientação, emitindo sons de diferentes formas e relata presença de bichos ao exame. Memória: Alterada, não respondendo a solicitações verbais. Afetividade: Agressivo. Pensamento/Discurso: Desorganizado. Psicomotricidade: agitação psicomotora, função psíquica anormal”. Concluiu por sua incapacidade total e temporária, fixando o seu início em 13.06.2014.10 - Em sede de esclarecimentos complementares (ID 102367686, p. 157-158), registrou a possibilidade da recuperação laboral do requerente,
in verbis
: “No momento desta pericia foi concluída incapacidade laborativa. Com o tratamento adequado a doença poderá manter estável e haver possibilidade de recuperação e exercer sua capacidade laborativa”. Por fim, em novos esclarecimentos complementares, aexpert
aduziu que documentos médicos juntados aos autos indicam que a DII remonta a 2013 (ID 102367686, p. 191-194 e 196-198).11 - O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
12 - A despeito de a
expert
ter fixado o início da incapacidade em meados de 2013, se afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), que, quem percebeu benefícios de auxílio-doença praticamente de maneira ininterrupta entre 2002 e 2009, tenha recobrado sua capacidade laboral neste último ano, e retornado ao estado incapacitante em 2013, pela mesma moléstia.13 - O autor é portador de grave patologia psiquiátrica - “transtorno delirante orgânico (tipo esquizofrênico)” -, sendo que sequer deveria ter sido concedido auxílio-doença, mas sim aposentadoria por invalidez, contudo, mantido o deferimento daquele, em observância ao princípio da adstrição (art. 492, CPC).
14 - A corroborar a hipótese de continuidade do quadro incapacitante, desde a data da cessação de benefício pretérito (NB: 535.752.115-4), destaca-se que foi acostado aos autos solicitação médica de internação do requerente em hospital psiquiátrico, em 2006 (ID 102365713, p. 139), bem como perícias médicas administrativas, as quais noticiam que ele já havia sido internado em 2003 e que tentou, ao menos por duas vezes, o suicídio (ID 102367388, p. 219-220).
15 - Uma vez que a alta médica do autor promovida pelo INSS, em 16.07.2009, que se adota como DII, foi equivocada, resta incontroverso que este havia preenchido os requisitos qualidade de segurado e carência legal neste instante, nos exatos termos do art. 15, I, da Lei 8.213/91.
16 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a persistência da incapacidade, quando da cessação do auxílio-doença (NB: 535.752.115-4), seria de rigor a fixação da DIB na data do seu cancelamento indevido, já que desde a data de entrada do requerimento (DER) até a sua cessação (16.07.2009 - ID 102367686, p. 176), o autor efetivamente estava protegido pelo Sistema da Seguridade Social, percebendo benefício previdenciário. Contudo, como o demandante deduziu pedido na inicial para que o termo inicial da benesse fosse fixado em 24.11.2011 (ID 102367388, p. 24), data da apresentação de um dos requerimento administrativos apresentados, mantida a DIB neste momento, assim como o magistrado
a quo
.17 - Descabe o abatimento, sobre as parcelas devidas, do período em que o segurado manteve vínculo empregatício ou verteu recolhimentos na condição de contribuinte individual. Ora, havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário processual.
18 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do regime.
19 - A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso representativo de controvérsia repetitiva (REsp nº 1.786.590/SP, Relator Ministro Herman Benjamin, 1ª Seção, j. 24/06/2020, DJe 01/07/2020), fixou a “Tese nº 1.013” com o seguinte teor: “No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente.".
20 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.21 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
22 - Majoração dos honorários advocatícios nos termos do artigo 85, §11, CPC, respeitados os limites dos §§2º e 3º do mesmo artigo.
23 - Preliminar de conhecimento da remessa necessária rejeitada. Apelação do INSS desprovida. Alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora de ofício. Verba honorária majorada. Sentença reformada em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar de conhecimento da remessa necessária, no mérito, negar provimento à apelação do INSS, e, por fim, de ofício, estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o mesmo Manual, com majoração da verba honorária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
