Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA - 2215817 / MS
0000503-79.2017.4.03.9999
Relator(a)
DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
Órgão Julgador
SÉTIMA TURMA
Data do Julgamento
26/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e-DJF3 Judicial 1 DATA:06/09/2019
Ementa
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 475, §2º,
CPC/1973. CONSTITUCIONAL. ASSISTÊNCIA SOCIAL. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL AO
IDOSO E À PESSOA COM DEFICIÊNCIA. ART. 203, V, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO CONFIGURADO. BENEFÍCIO DE VALOR MÍNIMO PAGO
AO IDOSO. EXCLUSÃO. ART. 34, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI Nº 10.741/03. APLICAÇÃO
POR ANALOGIA. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS DO STJ (REPRESENTATIVO DE
CONTROVÉRSIA). STF. DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE DO § 3º DO ART. 20
DA LEI Nº 8.472/93, SEM PRONÚNCIA DE NULIDADE. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO
ISOLADA. ANÁLISE DA MISERABILIDADE EM CONJUNTO COM DEMAIS FATORES.
AFASTADA SITUAÇÃO DE RISCO. RENDA FAMILIAR PER CAPITA EQUIVALENTE A UM
SALÁRIO MÍNIMO. IRMÃ DA AUTORA, A QUAL COM ELA RESIDE, RECEBE DOIS
BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. OUTROS IRMÃOS. DEVER DE AUXÍLIO É, EM PRIMEIRO
LUGAR, DA FAMÍLIA. PLANO DE ASSISTÊNCIA MÉDICA. IMÓVEL PRÓPRIO. MÍNIMO
EXISTENCIAL GARANTIDO. HIPOSSUFICIÊNCIA ECONÔMICA NÃO DEMONSTRADA.
REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA. SENTENÇA
REFORMADA. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. REVOGAÇÃO DA TUTELA ANTECIPADA.
INVERSÃO DOS ÔNUS DE SUCUMBÊNCIA, COM SUSPENSÃO DOS EFEITOS. DEVER DE
PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA. APELO DA PARTE AUTORA
PREJUDICADO.
1 - Não cabimento de remessa necessária no presente caso. A sentença submetida à
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
apreciação desta Corte foi proferida em 14/08/2015, sob a égide, portanto, do Código de
Processo Civil de 1973. No caso, houve condenação do INSS na concessão e no pagamento
dos atrasados de benefício assistencial, no valor de um salário mínimo, desde a data da
citação, ocorrida em 15/12/2011 (fl. 75).
2 - Constata-se, portanto, que desde o termo inicial do benefício (15/12/2011) até a data da
prolação da sentença - 14/08/2015 - passaram-se pouco mais de 44 (quarenta e quatro) meses,
totalizando assim 44 (quarenta e quatro) prestações no valor de um salário mínimo, que,
mesmo que devidamente corrigidas e com a incidência dos juros de mora e verba honorária,
ainda se afigura inferior ao limite de alçada estabelecido na lei processual.
3 - O art. 203, V, da Constituição Federal instituiu o benefício de amparo social, assegurando o
pagamento de um salário mínimo mensal à pessoa com deficiência e ao idoso que comprovem
não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família.
4 - A Lei nº 8.742/93 e seus decretos regulamentares estabeleceram os requisitos para a
concessão do benefício, a saber: pessoa deficiente ou idoso com 65 anos ou mais e que
comprove possuir renda familiar per capita inferior a ¼ do salário mínimo.
5 - Pessoa com deficiência é aquela incapacitada para o trabalho, em decorrência de
impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em
interação com uma ou mais barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na dicção do art. 20, §2º, com a
redação dada pela Lei nº 13.146, de 06 de julho de 2015.
6 - A Lei Assistencial, ao fixar a renda per capita, estabeleceu uma presunção da condição de
miserabilidade, não sendo vedado comprovar a insuficiência de recursos para prover a
manutenção do deficiente ou idoso por outros meios de prova. Precedente jurisprudencial do
Superior Tribunal de Justiça em sede de recurso representativo de controvérsia.
7 - No que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo para
comprovar a condição de miserabilidade, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no
julgamento da Reclamação nº 4374/PE, reapreciou a decisão proferida em sede de controle
concentrado de constitucionalidade (ADI nº 1.232-1/DF), declarando a inconstitucionalidade
parcial, sem pronúncia de nulidade, do art. 20, § 3º, da Lei nº 8.742/93.
8 - Pleiteia a autora a concessão do benefício assistencial, uma vez que, segundo alega, é
incapaz e não possui condições de manter seu próprio sustento ou de tê-lo provido por sua
família.
9 - A requerente encontra-se interditada civilmente, conforme cópia da sentença acostada às
fls. 23/23-verso dos autos, de modo que incontroverso seu impedimento de longo prazo.
Todavia, não restou demonstrada a hipossuficiência econômica.
10 - O estudo social, elaborado com base em visita realizada na residência da demandante, em
09 de maio 2013 (fls. 124/128), informou que o núcleo familiar é formado por esta e sua irmã.
Residem em casa própria, em estado de conservação ruim, e "composta por 03 quartos, sala,
cozinha e banheiro. Para ampliação da residência, onde foram construídos a cozinha, um
quarto e a varanda, foi preciso realizar um empréstimo, o qual ainda está sendo quitado. Assim
como a mobília, os eletrodomésticos também são escassos e simples: 01 geladeira, 01
televisão, 01 fogão, 01 televisão 14 polegadas e 01 máquina de lavar roupas (tanquinho)".
11 - A renda do núcleo familiar decorria, na época do estudo, da pensão por morte percebida
pela irmã da requerente, NEUSA JARDIM DE SOUZA, no valor de um salário mínimo. Todavia,
informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS e do Sistema Único
de Benefícios/DATAPREV, as quais seguem em anexo, dão conta que a irmã da autora, em
verdade, percebia outro benefício previdenciário, qual seja, de aposentadoria por idade,
também no mínimo legal.
12 - As despesas, envolvendo gastos com alimentação, gás, energia elétrica, água, fármacos,
vestuário, plano de assistência familiar e parcelas de financiamento, cingiam a
aproximadamente R$895,00.
13 - Portanto, a renda per capita familiar na época do estudo era de 1 salário mínimo, superior
ao parâmetro jurisprudencial de miserabilidade (1/2 do salário mínimo), além de, na sua
integralidade (R$1.356,00), ser suficiente para com todos os gastos.
14 - Alie-se, como elemento de convicção, a afastar a vulnerabilidade alegada, o fato de que
despendem valores com plano de assistência familiar.
15 - Quando da cessação do beneplácito da autora, na via administrativa, consta que esta
residia, naquele momento (23/10/2006), com mais 3 (três) irmãos (fl. 31). Embora estes, de fato,
não fazem mais parte do núcleo familiar daquela, destaca-se que o benefício assistencial de
prestação continuada existe para auxiliar a sobrevivência das pessoas portadoras de
incapacidade, por idade avançada, ou outras restrições físicas ou psíquicas para o trabalho e
que não possuam parentes próximos em condições de lhes prover o sustento. O dever,
portanto, é, em primeiro lugar, da família.
16 - O imóvel em que a família reside, a despeito de não estar nas melhores condições de
conservação, é próprio e foi ampliado pelos seus integrantes.
17 - Por todo o exposto, em minuciosa análise do conjunto fático probatório, verifica-se que o
núcleo familiar não se enquadra na concepção legal de hipossuficiência econômica, não
fazendo, portanto, a autora, jus ao beneplácito assistencial.
18 - O benefício assistencial de prestação continuada é auxílio que deve ser prestado pelo
Estado, portanto, por toda a sociedade, in extremis, ou seja, nas específicas situações que
preencham os requisitos legais estritos, bem como se e quando a situação de quem o pleiteia
efetivamente o recomende, no que se refere ao pouco deixado pelo legislador para a livre
interpretação do Poder Judiciário.
19 - Ainda que o magistrado sensibilize-se com a situação apresentada pela parte autora e
compadeça-se com a horripilante realidade a que são submetidos os trabalhadores em geral,
não pode determinar à Seguridade a obrigação de pagamento de benefício, que independe de
contribuição, ou seja, cujo custeio sairá da receita do órgão pagador - contribuições
previdenciárias e sociais - e cujos requisitos mínimos não foram preenchidos, sob pena de criar
perigoso precedente que poderia causar de vez a falência do já cambaleado Instituto
Securitário.
20 - O benefício em questão, que independe de custeio, não se destina à complementação da
renda familiar baixa e a sua concessão exige do julgador exerça a ingrata tarefa de distinguir
faticamente entre as situações de pobreza e de miserabilidade, eis que tem por finalidade
precípua prover a subsistência daquele que o requer.
21 - Condenada a parte autora no ressarcimento das despesas processuais eventualmente
desembolsadas pela autarquia, bem como nos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez
por cento) do valor atualizado da causa, ficando a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos,
desde que inalterada a situação de insuficiência de recursos que fundamentou a concessão dos
benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto nos arts. 11, §2º, e 12, ambos da
Lei nº 1.060/50, reproduzidos pelo §3º do art. 98 do CPC.
22 - Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS provida. Sentença reformada.
Ação julgada improcedente. Revogação da tutela antecipada. Inversão dos ônus de
sucumbência, com suspensão dos efeitos. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da
justiça. Apelo da parte autora prejudicado.
Acórdao
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima
Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa
necessária e dar provimento à apelação do INSS para reformar a r. sentença de 1º grau de
jurisdição e, com isso, julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, restando prejudicado o
apelo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do
presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA.
