
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0031631-20.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ALDENORA VIEIRA XIMENES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
APELADO: MARIA ALDENORA VIEIRA XIMENES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0031631-20.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ALDENORA VIEIRA XIMENES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
APELADO: MARIA ALDENORA VIEIRA XIMENES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e por MARIA ALDENORA VIEIRA XIMENES, em ação ajuizada pela última, objetivando a concessão de auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez, ou ainda, benefício assistencial previsto no art. 203, V, da Constituição Federal.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados da benesse assistencial, desde a data do início da incapacidade, estabelecida em 03.09.2010. Fixou correção monetária nos termos do Manual de Orientações para os Cálculos na Justiça Federal. Condenou o INSS, ainda, no pagamento de custas processuais e honorários advocatícios, estes arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação (ID 144613493, p. 29-32).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a demandante não demonstrou ser hipossuficiente para fins de concessão de benefício assistencial de prestação continuada. Subsidiariamente, requer a fixação da DIB na data da juntada do estudo social aos autos, bem como a alteração dos critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora e, por fim, seja declarada sua isenção quanto ao pagamento de custas processuais (ID 144613495, p. 05-21).
A autora também interpôs recurso de apelação, na forma adesiva, na qual sustenta que provou ser segurada da Previdência quando do início da incapacidade total e definitiva para o trabalho, fazendo jus a aposentadoria por invalidez ou, ao menos, a auxílio-doença. Em sede subsidiária, também requer a modificação da DIB, porém, para que esta seja estabelecida na data da apresentação de requerimento administrativo, e dos consectários legais, assim como seja majorada a verba honorária (ID 144613495, p. 33-34, e ID 144613496, p. 01-07).
As partes apresentaram contrarrazões (ID 144613496, p. 08-11 e 13).
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
Parecer do Ministério Público Federal (ID 144613496, p. 23-32), no sentido da conversão do julgamento em diligência, a fim de se oportunizar à parte autora a chance de demonstrar sua situação de desemprego após seu último vínculo empregatício. Caso não acolhida a preliminar, opina pelo parcial provimento do apelo autárquico no que toca ao pedido de alteração dos consectários.
É o relatório.
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 0031631-20.2017.4.03.9999
RELATOR: Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: MARIA ALDENORA VIEIRA XIMENES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
APELADO: MARIA ALDENORA VIEIRA XIMENES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: JOSE ANTONIO SOARES NETO - MS8984-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em conta o termo inicial do benefício (03.09.2010) e a data da prolação da r. sentença (02.05.2016), sendo a renda mensal inicial do benefício de 1 salário-mínimo, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
Ainda em sede preliminar, o
parquet
requer o retorno dos autos ao primeiro grau de jurisdição, a fim de que seja oportunizada à demandante a chance de provar situação de desemprego após o encerramento de seu último vínculo empregatício.Contudo, vejo que a autora teve a possibilidade de juntar diversos documentos aos autos que comprovariam tal situação e não o fez, deixando de cumprir com o seu ônus probatório (art. 373, I, do CPC). Aliás, se limitou a juntar diversos documentos médicos que dizem respeito apenas ao requisito incapacidade. Não interpôs, outrossim, recurso de agravo de instrumento, medica cabível, contra despacho saneador que determinou a realização somente de prova médica (ID 144613492, p. 104-105).
Por fim, malgrado não tenha sido proferido despacho oportunizando às partes a chance de produzir novas provas, bem como para que apresentassem alegações finais, fato é que fora exaurida a fase instrutória, com a produção de duas perícias médicas e um estudo social, tudo a ensejar a prolação de sentença de mérito. Foge à razoabilidade, portanto, reabrir-se a instrução processual na hipótese em que aperfeiçoados todos os atos probatórios, situação que, em boa medida, desprestigiaria o princípio da duração razoável do processo, alçado, inclusive, a preceito constitucional.
Passo à análise do mérito e, por primeiro, ao pedido de benefício previdenciário por incapacidade
.A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o primeiro profissional médico indicado pelo Juízo
a quo
, especialista em perícias médicas, com base em exame efetuado em 14 de setembro de 2012 (ID 144613492, p. 114-117), quando a demandante possuía 34 (trinta e quatro) anos, a diagnosticou como portadora de “episódios depressivos
”.Assim sintetizou o laudo:
“
Não há incapacidade e nem redução da capacidade laborativa, de acordo com a análise dos documentos apresentados e exame físico atual
”.Determinada a realização de nova perícia, dessa vez por médico psiquiatra, a qual se efetivou em 21 de junho de 2014 (ID 144613492, p. 156-157), tendo o laudo atestado que a autora possui “
transtorno depressivo recorrente (CID10 - F33)
”.Disse que a “
a doença é progressiva onde a pericianda se torna incapaz
”, tendo fixado a DII em meados de 2009.Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.Saliente-se que as perícias médicas foram efetivadas por profissionais inscritos no órgão competente, os quais responderam aos quesitos elaborados e forneceram diagnósticos com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entenderam pertinentes, e, não sendo infirmados pelo conjunto probatório, referidas provas técnicas merecem confiança e credibilidade.
A despeito do trabalho satisfatório desenvolvido por ambos os peritos como dito
supra
, é certo que o experto psiquiatra possui maior conhecimento sobre o caso da autora, a qual é portadora justamente de transtorno mental, devendo prevalecer, portanto, a sua conclusão acerca da configuração da incapacidade da demandante, bem como sobre o seu início no ano de 2009.Contudo, referido documento não especifica a natureza do impedimento, se definitivo ou temporário. Ora, diante do conjunto probatório formado nos autos, e à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), tenho que o quadro da autora caracteriza uma situação de incapacidade temporária, eis que a depressão é uma patologia passível de remissão completa, desde que realizado acompanhamento contínuo com médico psiquiátrica, se valendo de medicações específicas e em doses adequadas, em conjunto com sessões de psicoterapia.
Aliás, consta ao longo de todo o processo que a requerente tem o apoio de diversos médicos junto à rede pública de saúde, em especial, aqueles vinculados à Prefeitura Municipal de Mundo Novo/MS.
Destaca-se, ainda, o fato de que é relativamente jovem, possui hoje 42 (quarenta e dois) anos e, em 2009, data de início do impedimento, contava com apenas 31 (trinta e um), sendo certo que era, e ainda é, possível a recuperação completa do seu quadro de saúde, podendo voltar às suas atividades habituais ou mesmo, após reabilitação, capacitação e treinamento, recolocação profissional em outras funções
Informações extraídas da sua Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, cujas cópias estão acostadas aos autos (ID 144613492, p. 11-12), dão conta que manteve vínculo empregatício, junto à DIMATEX INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CONFECÇÕES LTDA, de 20.10.2007 a 28.10.2008. Portanto, teria permanecido como filiada ao RGPS, contabilizada a prorrogação legal de 12 (doze) meses da manutenção da qualidade de segurado, até 15.12.2009 (art. 30, II, da Lei 8.212/91 c/c arts. 13, II, e 14, do Dec. 3.048/99, em sua redação original).
Implementou, outrossim, o requisito carência de 12 (doze) contribuições (art. 25, I, da Lei 8.213/91).
Cumpridos, portanto, os requisitos qualidade de segurado e carência, quando do início do impedimento total e temporário para o trabalho, de rigor a concessão de auxílio-doença, nos termos do art. 59 da Lei 8.213/91.
No que se refere à necessidade de reabilitação, destaca-se que esta só tem vez quando o segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação profissional, nos exatos termos do
caput
do art. 62 da Lei 8.213/91.Nessa senda, uma vez concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia, conforme previsão expressa contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91.
Bem por isso, descabe cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a realização de procedimento reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da capacidade laboral para o trabalho habitual, uma vez que esse dever decorre de imposição de Lei. Eventual alegação de agravamento do quadro de saúde e concessão de nova benesse, por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou judicial, sob pena de eternização desta lide.
Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (Súmula 576 do STJ).
Tendo em vista a ausência de requerimento administrativo específico de benefício por incapacidade, fixo a DIB na data da citação.
As parcelas em atraso deverão ser compensadas com as quantias já pagas a título de benefício assistencial, concedido nestes autos em virtude da antecipação dos efeitos da tutela, sob pena de violação ao disposto no §4º do art. 20 da Lei 8.742/93, devendo este, ainda, ser cessado quando da implantação daquele.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Arbitro os honorários advocatícios no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada moderadamente.
No que tange às custas processuais, em se tratando de processo com tramitação perante a Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, deve ser observado o disposto na Lei Estadual n.º 3.779, de 11/11/2009, que em seu artigo 24, §1º, dispõe que a isenção do recolhimento da taxa judiciária não se aplica ao INSS.
Ante o exposto,
não conheço
da remessa necessária,rejeito a matéria preliminar
edou provimento
à apelação da parte autora para julgar procedente o pedido e, com isso, condenar o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde a data da citação, compensando-se os valores em atraso com as quantias já pagas a título de benefício assistencial, sendo que sobre eles incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, além de condená-lo no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença de 1º grau de jurisdição, restando, por fim,prejudicado
o apelo autárquico.É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º, CPC. CONVERSÃO DO JULGAMENTO EM DILIGÊNCIA. DESNECESSIDADE. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO DEMONSTRADA. CUMPRIMENTO DA CARÊNCIA LEGAL. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. LAUDOS MÉDICOS. INTERPRETAÇÃO
A CONTRARIO SENSU
. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM OS PARECERES DOS EXPERTOS. VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO. DIB. DATA DA CITAÇÃO. SÚMULA 576, STJ. ATRASADOS. COMPENSAÇÃO COM AS QUANTIAS JÁ PAGAS A TÍTULO DE BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 20, §4º, LEI 8.742/93. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. SÚMULA 111, STJ. CUSTAS PROCESSUAIS DEVIDAS. MATO GROSSO DO SUL. LEI ESTADUAL Nº 3.779/2009. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. SENTENÇA REFORMADA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE. APELO DO INSS PREJUDICADO.1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em conta o termo inicial do benefício (03.09.2010) e a data da prolação da r. sentença (02.05.2016), sendo a renda mensal inicial do benefício de 1 salário-mínimo, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
2 - Ainda em sede preliminar, o
parquet
requer o retorno dos autos ao primeiro grau de jurisdição, a fim de que seja oportunizada à demandante a chance de provar situação de desemprego após o encerramento de seu último vínculo empregatício.3 - Contudo, vê-se que a autora teve a possibilidade de juntar diversos documentos aos autos que comprovariam tal situação e não o fez, deixando de cumprir com o seu ônus probatório (art. 373, I, do CPC). Aliás, se limitou a juntar diversos documentos médicos que dizem respeito apenas ao requisito incapacidade. Não interpôs, outrossim, recurso de agravo de instrumento, medica cabível, contra despacho saneador que determinou a realização somente de prova médica (ID 144613492, p. 104-105).
4 - Malgrado não tenha sido proferido despacho oportunizando às partes a chance de produzir novas provas, bem como para que apresentassem alegações finais, fato é que fora exaurida a fase instrutória, com a produção de duas perícias médicas e um estudo social, tudo a ensejar a prolação de sentença de mérito. Foge à razoabilidade, portanto, reabrir-se a instrução processual na hipótese em que aperfeiçoados todos os atos probatórios, situação que, em boa medida, desprestigiaria o princípio da duração razoável do processo, alçado, inclusive, a preceito constitucional.
5 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
6 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
7 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da
legis
).8 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
9 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da moléstia.
10 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
11 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez.
12 - No que tange à incapacidade, o primeiro profissional médico indicado pelo Juízo
a quo
, especialista em perícias médicas, com base em exame efetuado em 14 de setembro de 2012 (ID 144613492, p. 114-117), quando a demandante possuía 34 (trinta e quatro) anos, a diagnosticou como portadora de “episódios depressivos”. Assim sintetizou o laudo: “Não há incapacidade e nem redução da capacidade laborativa, de acordo com a análise dos documentos apresentados e exame físico atual”.13 - Determinada a realização de nova perícia, dessa vez por médico psiquiatra, a qual se efetivou em 21 de junho de 2014 (ID 144613492, p. 156-157), tendo o laudo atestado que a autora possui “transtorno depressivo recorrente (CID10 - F33)”. Disse que a “a doença é progressiva onde a pericianda se torna incapaz”, tendo fixado a DII em meados de 2009.
14 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial,
a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.15 - Saliente-se que as perícias médicas foram efetivadas por profissionais inscritos no órgão competente, os quais responderam aos quesitos elaborados e forneceram diagnósticos com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entenderam pertinentes, e, não sendo infirmados pelo conjunto probatório, referidas provas técnicas merecem confiança e credibilidade.
16 - A despeito do trabalho satisfatório desenvolvido por ambos os peritos como dito
supra
, é certo que o experto psiquiatra possui maior conhecimento sobre o caso da autora, a qual é portadora justamente de transtorno mental, devendo prevalecer, portanto, a sua conclusão acerca da configuração da incapacidade da demandante, bem como sobre o seu início no ano de 2009.17 - Contudo, referido documento não especifica a natureza do impedimento, se definitivo ou temporário. Ora, diante do conjunto probatório formado nos autos, e à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), tem-se que o quadro da autora caracteriza uma situação de incapacidade temporária, eis que a depressão é uma patologia passível de remissão completa, desde que realizado acompanhamento contínuo com médico psiquiátrica, se valendo de medicações específicas e em doses adequadas, em conjunto com sessões de psicoterapia.
18 - Aliás, consta ao longo de todo o processo que a requerente tem o apoio de diversos médicos junto à rede pública de saúde, em especial, aqueles vinculados à Prefeitura Municipal de Mundo Novo/MS.
19 - Destaca-se, ainda, o fato de que é relativamente jovem, possui hoje 42 (quarenta e dois) anos e, em 2009, data de início do impedimento, contava com apenas 31 (trinta e um), sendo certo que era, e ainda é, possível a recuperação completa do seu quadro de saúde, podendo voltar às suas atividades habituais ou mesmo, após reabilitação, capacitação e treinamento, recolocação profissional em outras funções.
20 - Informações extraídas da sua Carteira de Trabalho e Previdência Social - CTPS, cujas cópias estão acostadas aos autos (ID 144613492, p. 11-12), dão conta que manteve vínculo empregatício, junto à DIMATEX INDÚSTRIA E COMÉRCIO DE CONFECÇÕES LTDA, de 20.10.2007 a 28.10.2008. Portanto, teria permanecido como filiada ao RGPS, contabilizada a prorrogação legal de 12 (doze) meses da manutenção da qualidade de segurado, até 15.12.2009 (art. 30, II, da Lei 8.212/91 c/c arts. 13, II, e 14, do Dec. 3.048/99, em sua redação original).
21 - Implementou, outrossim, o requisito carência de 12 (doze) contribuições (art. 25, I, da Lei 8.213/91).
22 - Cumpridos, portanto, os requisitos qualidade de segurado e carência, quando do início do impedimento total e temporário para o trabalho, de rigor a concessão de auxílio-doença, nos termos do art. 59 da Lei 8.213/91.
23 - No que se refere à necessidade de reabilitação, destaca-se que esta só tem vez quando o segurado for tido por incapacitado total e definitivamente para o exercício da sua ocupação habitual, mas não para o trabalho que lhe permita o sustento, quando então, após a constatação, haverá a obrigação da autarquia de reabilitá-lo ao exercício de nova ocupação profissional, nos exatos termos do
caput
do art. 62 da Lei 8.213/91. Nessa senda, uma vez concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-doença pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia, conforme previsão expressa contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91. Bem por isso, descabe cogitar-se da impossibilidade de cessação do benefício, sem a realização de procedimento reabilitatório, caso a perícia administrativa constate o restabelecimento da capacidade laboral para o trabalho habitual, uma vez que esse dever decorre de imposição de Lei. Eventual alegação de agravamento do quadro de saúde e concessão de nova benesse, por se tratar de situação fática diversa, deve ser objeto de novo pedido administrativo ou judicial, sob pena de eternização desta lide.24 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência (Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a ausência de requerimento administrativo específico de benefício por incapacidade, fixa-se a DIB na data da citação.
25 - As parcelas em atraso deverão ser compensadas com as quantias já pagas a título de benefício assistencial, concedido nestes autos em virtude da antecipação dos efeitos da tutela, sob pena de violação ao disposto no §4º do art. 20 da Lei 8.742/93, devendo este, ainda, ser cessado quando da implantação daquele.
26 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos
ex tunc
do mencionado pronunciamento.27 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
28 - Honorários advocatícios arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor da condenação, após a devida liquidação, consideradas as parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula 111, STJ), uma vez que, sendo as condenações pecuniárias da autarquia previdenciária suportadas por toda a sociedade, a verba honorária deve, por imposição legal (art. 85, §2º, do CPC), ser fixada moderadamente.
29 - No que tange às custas processuais, em se tratando de processo com tramitação perante a Justiça Estadual do Mato Grosso do Sul, deve ser observado o disposto na Lei Estadual n.º 3.779, de 11/11/2009, que em seu artigo 24, §1º, dispõe que a isenção do recolhimento da taxa judiciária não se aplica ao INSS.
30 - Remessa necessária não conhecida. Preliminar rejeitada. Apelação da parte autora provida. Sentença reformada. Ação julgada procedente. Apelo do INSS prejudicado.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por unanimidade, decidiu não conhecer da remessa necessária, rejeito a matéria preliminar e dou provimento à apelação da parte autora para julgar procedente o pedido e, com isso, condenar o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde a data da citação, compensando-se os valores em atraso com as quantias já pagas a título de benefício assistencial, sendo que sobre eles incidirá correção monetária de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e juros de mora até a expedição do ofício requisitório, de acordo com o mesmo Manual, além de condená-lo no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, estes na ordem de 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença de 1º grau de jurisdição, restando, por fim, prejudicado o apelo autárquico, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
