Processo
ApelRemNec - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA / SP
0020419-65.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
13/08/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 19/08/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º,
DO CPC. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA.
PREEXISTÊNCIA DA INCAPACIDADE. PRIMEIRO RECOLHIMENTO AOS 65 (SESSENTA E
CINCO) ANOS DE IDADE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PATOLOGIAS ORTOPÉDICAS E
VASCULARES. MALES DEGENERATIVOS TÍPICOS EM PESSOAS COM IDADE AVANÇADA.
SINTOMATOLOGIA ANTIGA. ELEMENTOS SUFICIENTES QUE ATESTAM O INÍCIO DO
IMPEDIMENTO EM ÉPOCA PREGRESSA AO INGRESSO NO RGPS. FILIAÇÃO
OPORTUNISTA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 42, §2º E 59, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DA
LEI Nº 8.213/91. VEDAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA
INDEVIDOS. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO DA
EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE
SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando-se em
conta o termo inicial do benefício de auxílio-doença (23.05.2016) e a data da sua cessação, que
corresponde à data de início da aposentadoria por invalidez (16.02.2017), e a data da prolação da
r. sentença (21.08.2017), ainda que as rendas mensais iniciais dos benefícios sejam fixadas no
máximo legal (o primeiro correspondendo a 91% e o segundo a 100% do teto previdenciário),
mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do
artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com
fundamento em exame realizado em 16 de fevereiro de 2017, quando a demandante - de
profissões habituais “costureira” e “doméstica” - possuía 75 (setenta e cinco) anos de idade,
consignou o seguinte: “A periciada se encontra inapta de forma total e definitiva para qualquer
tipo de atividade laborativa a partir da data desta perícia médica judicial (...), devido ser portadora
de insuficiência vascular venosa grave nos membros inferiores, de sequela de trombose venosa
profunda no membro inferior direito, de osteoporose femoral, de osteoartrose nos joelhos,
deformidade severa na sua coluna toraco lombar (cifose severa) e nos membros inferiores - genu
varo”.
10 - O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436 do CPC/73
(atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o juiz o
destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame.
Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
11 - Embora o expert tenha fixado o início da incapacidade na data da perícia, verifica-se que ela
já estava presente em período anterior a seu ingresso no RGPS.
12 - Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cujo extrato
encontra-se acostado aos autos, dão conta que a requerente verteu seu primeiro recolhimento
para a Previdência, na condição de contribuinte individual, em janeiro de 2007, mês em que
completou 65 (sessenta e cinco) anos de idade.
13 - Se afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que
ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), que tenha se tornado incapaz somente em
fevereiro de 2017, eis que é portadora de males degenerativos ortopédicos e vasculares típicos
em pessoas com idade avançada (“osteoporose”, “osteoartrose”, “insuficiência vascular venosa
nos membros inferiores [varizes]”, dentre outras), que se caracterizam, justamente, pelo
desenvolvimento paulatino ao longo dos anos.
14 - Alie-se, como elemento de convicção, que segundo o próprio vistor oficial, em análise do seu
sistema tegumentar, constatou-se no momento do exame “cicatrizes nos membros inferiores por
cirurgia de varizes realizadas há vários anos”.
15 - Noutro giro, perícia médica administrativa efetivada na autora, obtida via SABI, e que ora
segue anexa aos autos, revela que, naquela ocasião (07.11.2012), referiu sofrer de “dores nos
quadris há muito tempo (7-8 anos)”, ou seja, desde meados de 2004 e 2005.
16 - Em suma, a demandante somente ingressou no RGPS, aos 65 (sessenta e cinco) anos de
idade, na condição de contribuinte individual, sem nunca ter vertido um único recolhimento
anterior, o que somado ao fato de que é portadora de males degenerativos ortopédicos e
vasculares típicos em pessoas com idade avançada, e que estes já haviam se manifestado de há
muito, denota que sua incapacidade é preexistente à sua filiação no RGPS, além do notório
caráter oportunista desta.
17 - Diante de tais elementos, tem-se que decidiu a parte autora se filiar ao RGPS com o objetivo
de buscar, indevidamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, conforme vedações
constantes dos artigos 42, §2º e 59, parágrafo único, ambos da Lei 8.213/91, o que inviabiliza a
concessão, seja de auxílio-doença, seja de aposentadoria por invalidez.
18 - Apesar de o INSS ter concedido benefício de auxílio-doença à requerente na via
administrativa (NB: 613.317.712-1), é certo que tal decisão não vincula o Poder Judiciário, da
mesma forma que não o faz a negativa daquele. Cabe a este Poder, autônomo, o exame de todos
os requisitos legais do ato administrativo.
19 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
20 - Inversão do ônus sucumbencial, com condenação da parte autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
dos honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (CPC,
art. 85, §2º), observando-se o previsto no §3º do artigo 98 do CPC.
21 - Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS provida. Sentença reformada.
Revogação da tutela. Devolução de valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente.
Inversão das verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0020419-65.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUSA HUNGARO SPOSITO
Advogado do(a) APELADO: EMERSOM GONCALVES BUENO - SP190192-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0020419-65.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUSA HUNGARO SPOSITO
Advogado do(a) APELADO: EMERSOM GONCALVES BUENO - SP190192-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por NEUSA HÚNGARO SPOSITO, objetivando o
restabelecimento de auxílio-doença e, caso preenchidas as condições legais, sua conversão em
aposentadoria por invalidez.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS no restabelecimento e no
pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde a data da sua cessação, ocorrida em
23.05.2016 (ID 100894550, p. 104), até a data da perícia judicial, realizada em 16.02.2017 (ID
100894550, p. 69), quando deverá ser convertido em aposentadoria por invalidez. Fixou
correção monetária e juros de mora nos termos do disposto na Lei 11.960/09. Condenou o
INSS, ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento)
sobre o valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a data da sua prolação. Por fim,
determinou a imediata implantação do benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada (ID
100894550, p. 113-117).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a
incapacidade da autora é preexistente a seu ingresso no RGPS, não fazendo jus nem à
aposentadoria por invalidez, nem ao auxílio-doença (ID 100894550, p. 122-126).
A demandante apresentou contrarrazões (ID 100894550, p. 129-133).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº0020419-65.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: NEUSA HUNGARO SPOSITO
Advogado do(a) APELADO: EMERSOM GONCALVES BUENO - SP190192-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação,
levando-se em conta o termo inicial do benefício de auxílio-doença (23.05.2016) e a data da sua
cessação, que corresponde à data de início da aposentadoria por invalidez (16.02.2017), e a
data da prolação da r. sentença (21.08.2017), ainda que as rendas mensais iniciais dos
benefícios sejam fixadas no máximo legal (o primeiro correspondendo a 91% e o segundo a
100% do teto previdenciário), mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção
monetária, juros de mora e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos,
conforme previsto no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
Passo à análise do mérito.
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com fundamento
em exame realizado em 16 de fevereiro de 2017 (ID 100894550, p. 68-90), quando a
demandante - de profissões habituais “costureira” e “doméstica” - possuía 75 (setenta e cinco)
anos de idade, consignou o seguinte:
“A periciada se encontra inapta de forma total e definitiva para qualquer tipo de atividade
laborativa a partir da data desta perícia médica judicial (...), devido ser portadora de
insuficiência vascular venosa grave nos membros inferiores, de sequela de trombose venosa
profunda no membro inferior direito, de osteoporose femoral, de osteoartrose nos joelhos,
deformidade severa na sua coluna toraco lombar (cifose severa) e nos membros inferiores -
genu varo”.
Assevero que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436 do
CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o juiz o
destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame.
Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Embora o expert tenha fixado o início da incapacidade na data da perícia, verifico que ela já
estava presente em período anterior a seu ingresso no RGPS.
Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cujo extrato
encontra-se acostado aos autos (ID 100894550, p. 104), dão conta que a requerente verteu seu
primeiro recolhimento para a Previdência, na condição de contribuinte individual, em janeiro de
2007, mês em que completou 65 (sessenta e cinco) anos de idade.
Se me afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que
ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), que tenha se tornado incapaz somente
em fevereiro de 2017, eis que é portadora de males degenerativos ortopédicos e vasculares
típicos em pessoas com idade avançada (“osteoporose”, “osteoartrose”, “insuficiência vascular
venosa nos membros inferiores [varizes]”, dentre outros), que se caracterizam, justamente, pelo
desenvolvimento paulatino ao longo dos anos.
Alie-se, como elemento de convicção, que segundo o próprio vistor oficial, em análise do seu
sistema tegumentar, constatou-se no momento do exame “cicatrizes nos membros inferiores
por cirurgia de varizes realizadas há vários anos” (ID 100894550, p. 70).
Noutro giro, perícia médica administrativa efetivada na autora, obtida via SABI, e que ora faço
anexar aos autos, revela que, naquela ocasião (07.11.2012), referiu sofrer de “dores nos
quadris há muito tempo (7-8 anos)”, ou seja, desde meados de 2004 e 2005.
Em suma, a demandante somente ingressou no RGPS, aos 65 (sessenta e cinco) anos de
idade, na condição de contribuinte individual, sem nunca ter vertido um único recolhimento
anterior, o que somado ao fato de que é portadora de males degenerativos ortopédicos e
vasculares típicos em pessoas com idade avançada, e que estes já haviam se manifestado de
há muito, denota que sua incapacidade é preexistente à sua filiação no RGPS, além do notório
caráter oportunista desta.
Diante de tais elementos, tem-se que decidiu a parte autora se filiar ao RGPS com o objetivo de
buscar, indevidamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, conforme vedações
constantes dos artigos 42, §2º e 59, parágrafo único, ambos da Lei 8.213/91, o que inviabiliza a
concessão, seja de auxílio-doença, seja de aposentadoria por invalidez.
Por oportuno, destaca-se que, apesar de o INSS ter concedido benefício de auxílio-doença à
requerente na via administrativa (NB: 613.317.712-1 - ID 100894550, p. 104), é certo que tal
decisão não vincula o Poder Judiciário, da mesma forma que não o faz a negativa daquele.
Cabe a este Poder, autônomo, o exame de todos os requisitos legais do ato administrativo.
Observo, por fim, que a sentença concedeu a tutela antecipada.
Tendo em vista que a eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela provisória
deferida neste feito, ora revogada: a) é matéria inerente à liquidação e cumprimento do julgado,
conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos do CPC; b) que é tema
cuja análise se encontra suspensa na sistemática de apreciação de recurso especial repetitivo
(STJ, Tema afetado nº 692), nos termos do § 1º do art. 1.036 do CPC; e c) que a garantia
constitucional da duração razoável do processo recomenda o curso regular do processo, até o
derradeiro momento em que a ausência de definição sobre o impasse sirva de efetivo obstáculo
ao andamento do feito; determino que a controvérsia em questão deverá ser apreciada pelo
juízo da execução, de acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ.
Ante o exposto, não conheço da remessa necessária e dou provimento à apelação do INSS
para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, com a
revogação da tutela anteriormente concedida.
Inverto, por conseguinte, o ônus sucumbencial, condenando a parte autora no ressarcimento
das despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no
pagamento dos honorários advocatícios, os quais arbitro no percentual mínimo do §3º do artigo
85 do CPC, de acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente
atualizado (art. 85, §2º, do CPC).
Havendo a concessão dos benefícios da assistência judiciária gratuita, a teor do disposto no §3º
do artigo 98 do CPC, ficará a exigibilidade suspensa por 5 (cinco) anos, desde que inalterada a
situação de insuficiência de recursos que a fundamentou.
Oficie-se ao INSS.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º,
DO CPC. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. AUXÍLIO-DOENÇA.
PREEXISTÊNCIA DA INCAPACIDADE. PRIMEIRO RECOLHIMENTO AOS 65 (SESSENTA E
CINCO) ANOS DE IDADE. CONTRIBUINTE INDIVIDUAL. PATOLOGIAS ORTOPÉDICAS E
VASCULARES. MALES DEGENERATIVOS TÍPICOS EM PESSOAS COM IDADE AVANÇADA.
SINTOMATOLOGIA ANTIGA. ELEMENTOS SUFICIENTES QUE ATESTAM O INÍCIO DO
IMPEDIMENTO EM ÉPOCA PREGRESSA AO INGRESSO NO RGPS. FILIAÇÃO
OPORTUNISTA. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 42, §2º E 59, PARÁGRAFO ÚNICO, AMBOS DA
LEI Nº 8.213/91. VEDAÇÃO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E AUXÍLIO-DOENÇA
INDEVIDOS. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS PROVIDA.
SENTENÇA REFORMADA. REVOGAÇÃO DA TUTELA. DEVOLUÇÃO DE VALORES. JUÍZO
DA EXECUÇÃO. AÇÃO JULGADA IMPROCEDENTE. INVERSÃO DAS VERBAS DE
SUCUMBÊNCIA. DEVER DE PAGAMENTO SUSPENSO. GRATUIDADE DA JUSTIÇA.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando-se em
conta o termo inicial do benefício de auxílio-doença (23.05.2016) e a data da sua cessação, que
corresponde à data de início da aposentadoria por invalidez (16.02.2017), e a data da prolação
da r. sentença (21.08.2017), ainda que as rendas mensais iniciais dos benefícios sejam fixadas
no máximo legal (o primeiro correspondendo a 91% e o segundo a 100% do teto previdenciário
), mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e
verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
9 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com
fundamento em exame realizado em 16 de fevereiro de 2017, quando a demandante - de
profissões habituais “costureira” e “doméstica” - possuía 75 (setenta e cinco) anos de idade,
consignou o seguinte: “A periciada se encontra inapta de forma total e definitiva para qualquer
tipo de atividade laborativa a partir da data desta perícia médica judicial (...), devido ser
portadora de insuficiência vascular venosa grave nos membros inferiores, de sequela de
trombose venosa profunda no membro inferior direito, de osteoporose femoral, de osteoartrose
nos joelhos, deformidade severa na sua coluna toraco lombar (cifose severa) e nos membros
inferiores - genu varo”.
10 - O juiz não está adstrito ao laudo pericial, nos termos do que dispõe o art. 436 do CPC/73
(atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado. Por ser o juiz o
destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame.
Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
11 - Embora o expert tenha fixado o início da incapacidade na data da perícia, verifica-se que
ela já estava presente em período anterior a seu ingresso no RGPS.
12 - Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, cujo extrato
encontra-se acostado aos autos, dão conta que a requerente verteu seu primeiro recolhimento
para a Previdência, na condição de contribuinte individual, em janeiro de 2007, mês em que
completou 65 (sessenta e cinco) anos de idade.
13 - Se afigura pouco crível, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que
ordinariamente acontece no dia a dia (art. 375, CPC), que tenha se tornado incapaz somente
em fevereiro de 2017, eis que é portadora de males degenerativos ortopédicos e vasculares
típicos em pessoas com idade avançada (“osteoporose”, “osteoartrose”, “insuficiência vascular
venosa nos membros inferiores [varizes]”, dentre outras), que se caracterizam, justamente, pelo
desenvolvimento paulatino ao longo dos anos.
14 - Alie-se, como elemento de convicção, que segundo o próprio vistor oficial, em análise do
seu sistema tegumentar, constatou-se no momento do exame “cicatrizes nos membros
inferiores por cirurgia de varizes realizadas há vários anos”.
15 - Noutro giro, perícia médica administrativa efetivada na autora, obtida via SABI, e que ora
segue anexa aos autos, revela que, naquela ocasião (07.11.2012), referiu sofrer de “dores nos
quadris há muito tempo (7-8 anos)”, ou seja, desde meados de 2004 e 2005.
16 - Em suma, a demandante somente ingressou no RGPS, aos 65 (sessenta e cinco) anos de
idade, na condição de contribuinte individual, sem nunca ter vertido um único recolhimento
anterior, o que somado ao fato de que é portadora de males degenerativos ortopédicos e
vasculares típicos em pessoas com idade avançada, e que estes já haviam se manifestado de
há muito, denota que sua incapacidade é preexistente à sua filiação no RGPS, além do notório
caráter oportunista desta.
17 - Diante de tais elementos, tem-se que decidiu a parte autora se filiar ao RGPS com o
objetivo de buscar, indevidamente, proteção previdenciária que não lhe alcançaria, conforme
vedações constantes dos artigos 42, §2º e 59, parágrafo único, ambos da Lei 8.213/91, o que
inviabiliza a concessão, seja de auxílio-doença, seja de aposentadoria por invalidez.
18 - Apesar de o INSS ter concedido benefício de auxílio-doença à requerente na via
administrativa (NB: 613.317.712-1), é certo que tal decisão não vincula o Poder Judiciário, da
mesma forma que não o faz a negativa daquele. Cabe a este Poder, autônomo, o exame de
todos os requisitos legais do ato administrativo.
19 - A controvérsia acerca da eventual devolução dos valores recebidos por força de tutela
provisória deferida neste feito, ora revogada, deverá ser apreciada pelo juízo da execução, de
acordo com a futura deliberação do tema pelo E. STJ, por ser matéria inerente à liquidação e
cumprimento do julgado, conforme disposição dos artigos 297, parágrafo único e 520, II, ambos
do CPC. Observância da garantia constitucional da duração razoável do processo.
20 - Inversão do ônus sucumbencial, com condenação da parte autora no ressarcimento das
despesas processuais eventualmente desembolsadas pela autarquia, bem como no pagamento
dos honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo do §3º do artigo 85 do CPC, de
acordo com o inciso correspondente ao valor atribuído à causa, devidamente atualizado (CPC,
art. 85, §2º), observando-se o previsto no §3º do artigo 98 do CPC.
21 - Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS provida. Sentença reformada.
Revogação da tutela. Devolução de valores. Juízo da execução. Ação julgada improcedente.
Inversão das verbas de sucumbência. Dever de pagamento suspenso. Gratuidade da justiça.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer da remessa necessária e dar provimento à apelação do
INSS para reformar a r. sentença e julgar improcedente o pedido deduzido na inicial, com a
revogação da tutela anteriormente concedida, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
