
| D.E. Publicado em 11/03/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária, negar provimento à apelação do INSS e, de ofício, estabelecer que os valores em atraso sejam corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, deferindo-se, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0040502-78.2013.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
Trata-se de remessa necessária e apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada por MARIA DE LOURDES PAES DE BARROS, objetivando a concessão dos benefícios de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença.
A r. sentença, de fls. 112/115, julgou procedente pedido deduzido na inicial, condenando o INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de aposentadoria por invalidez, desde a data da citação. Fixou correção monetária nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal e juros de mora consoante o disposto no art. 1º-F da Lei 9.494/97, com a redação dada pela Lei 11.960/09. Condenou o INSS, ainda, no pagamento dos honorários advocatícios, arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em atraso até a data de sua prolação.
Em razões recursais de fls. 120/123, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a parte autora não preenche os requisitos para a concessão do benefício ora vindicado.
Contrarrazões da parte autora às fls. 128/131.
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
VOTO
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO (RELATOR):
De início, destaco o não cabimento da remessa necessária no presente caso.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 26/06/2013, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de 1973.
De acordo com o artigo 475, §2º, do CPC/1973:
No caso, houve condenação do INSS na concessão e no pagamento dos atrasados de benefício de aposentadoria por invalidez, desde a data da citação, que se deu em 04/08/2010 (fl. 20).
Pois bem, haja vista que a autora foi considerada, pelo decisum, segurada especial, o valor do benefício será de um salário mínimo, nos termos do art. 39, I, da Lei 8.213/91.
Constata-se, portanto, que desde a data do termo inicial do benefício (04/08/2010) até a data da prolação da sentença - 26/06/2013 - passaram-se pouco mais de 34 (trinta e quatro) meses, totalizando assim 34 (trinta e quatro) prestações no valor de um salário mínimo, que, mesmo que devidamente corrigidas e com a incidência dos juros de mora e verba honorária, ainda se afigura inferior ao limite de alçada estabelecido na lei processual.
Passo à análise do mérito recursal.
A cobertura do evento invalidez é garantia constitucional prevista no Título VIII, Capítulo II da Seguridade Social, no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário da aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que tiver cumprido o período de carência exigido de 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência, que tiver cumprido o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
O ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença deve, sempre que possível, fixar o prazo estimado de duração, e, na sua ausência, será considerado o prazo de 120 (cento e vinte) dias, findo o qual cessará o benefício, salvo se o segurado postular a sua prorrogação (§11 do art. 60 da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Independe de carência a concessão dos benefícios nas hipóteses de acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime, não impede o deferimento dos benefícios se tiver decorrido a inaptidão de progressão ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a sua situação, nos termos do art. 15 da Lei, a saber:
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo supra prorroga por 24 (vinte e quatro) meses tal lapso de graça aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses.
Por fim, saliente-se que havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar com 12 (doze) contribuições mensais, a partir da nova filiação à Previdência Social, para efeitos de carência, para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez (art. 27-A da Lei nº 8.213/91, incluído pela Medida Provisória nº 767, de 2017).
Do caso concreto.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em exame pericia realizado em 06 de outubro de 2011 (fls. 78/80), diagnosticou a autora como portadora de "aneurisma cerebral", estando totalmente incapacitada para o labor desde meados de 2005, "quando surgiram cefaleias acentuadas com perda da consciência".
Consignou, ainda, que se trata de incapacidade permanente, "pois inclusive na Angiografia realizada em 2010 constatou outro aneurisma conforme Laudo anexo ao Processo" (sic).
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
Passo a analisar, agora, os requisitos da carência e da qualidade de segurado.
O art. 55, § 3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal.
Nesse sentido foi editada a Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça:
A exigência de documentos comprobatórios do labor para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Esse o raciocínio que prevalece nesta Eg. 7ª Turma e no Colendo STJ:
Observo, ainda, que tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
Consigne-se, também, que o C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea. Por analogia, se aplica também tal entendimento ao tempo de pesca artesanal.
Nessa senda, quanto ao reconhecimento da atividade pesqueira exercida em regime de economia familiar, o segurado especial é conceituado na Lei nº 8.213/91 em seu artigo 11, inciso VII, nos seguintes termos:
Para fazer prova da qualidade de segurada especial, na condição de cônjuge de pescador artesanal, colacionou aos autos carteira de pescador profissional de seu esposo, LUIZ ANTONIO PAES DE BARROS, expedida no ano de 2007, pela Secretaria Especial de Aquicultura e Pesca vinculada à Presidência da República - SEAP/PR, com validade até 28/09/2009 (fl. 11).
Informações extraídas do Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS, e acostadas aos autos à fl. 38, dão conta que o esposo da autora mantém a qualidade de segurado especial (pescador artesanal), ao menos, desde 14/11/1997.
Realizada audiência de instrução e julgamento, em 12 de março de 2013 (fls. 99/105), foram colhidos o depoimento pessoal da autora e de 2 (duas) testemunhas por ela arroladas.
O depoimento de VALENTIM MANTOVANI foi transcrito às fls. 103/104, nos seguintes termos:
"J: De onde o senhor conhece a senhora Maria de Lourdes?
D: Eu conheço ela desde a cidade de Sabino.
J: O senhor chegou a morar lá também?
D: Morei lá em Sabino, Sales.
J: O senhor conhece eles da cidade mesmo?
D: Eu conheci eles da beirada do rio, porque eles pescavam e eu também sou pescador, então eu encontrava com eles na beirada do rio.
J: O senhor sempre via a senhora Maria de Lourdes pescando?
D: Sempre via ela e o marido dela no rio, eu sempre encontrava eles.
J: O senhor ficou em Sabino até quando?
D:Como Sabino e Sales são duas cidades próximas, eu ficava lá e cá e, eu morei em Sabino cinco anos, depois eles mudaram, depois eu mudei para Panorama e reencontrei eles aqui.
J: Aqui em Panorama o senhor continuou vendo ela e o marido dela pescando?
D: Eu continuei, porque eu encontrei eles aqui no rio e voltamos a ter amizade.
J: Até quando ela trabalhou como pescadora?
D: De quando eu conheci ela lá em Sabino, eles sempre foram do rio.
J: E aqui em Panorama, ela pescou até quando?
D: Ela parou depois que ela começou ter uns problemas, ela fez cirurgia.
J: O senhor sabe, mais ou menos, à época?
D: Não sei direito, mas está com uns cinco anos que ela foi operada" (sic).
O testemunho de LIDIANE PAULA ARAÚJO MENDONÇA, por sua vez, restou transcrito às fls. 107/108, nos seguintes termos:
"J: De onde a senhora conhece a senhora Maria de Lourdes?
D: Eu conheci ela em Sabino, ela pescava lá com o marido dela, aí eu vim para cá e depois ela veio também, aí a gente se reencontrou aqui de novo e nesse meio tempo ela teve um problema de saúde, de lá para cá ela tentou pescar algumas vezes, mas ela várias vezes passou mal na ilha e eu e meu marido chegamos até a socorrer ela.
J: Esse que depôs antes da senhora é o marido da senhora?
D: Não.
J: Mas a senhora ainda pesca?
D: Pesco.
J: Quando a senhora começou a ver ela pescando?
D: Mais ou menos, em noventa e cinco.
J: Aí eles ficaram quanto tempo lá?
D: Uns cinco anos lá e depois eu vim para cá.
J: Aqui a senhora reencontrou ela de novo?
D: Foi.
J: A senhora sabe até quando ela pescou aqui?
D: Aqui eu vi ela menos vezes, porque eu morava na ilha, mas a gente sabia que ela pescava, mas depois ela fez uma cirurgia e não pescou mais, agora ela é doente, ela às vezes passa mal" (sic).
Note-se que os depoimentos ampliam a eficácia probatória dos documentos indicativos do labor, de modo que é possível concluir que a autora desempenhou, ou ao menos tentou desempenhar, em regime de economia familiar, atividade pesqueira até o início da incapacidade.
Impende salientar que o fato de a autora ter informado ao expert, no momento da perícia, em 06/10/2011, que era "do lar" (fl. 79), não contraria os testemunhos, eis que o laudo indica como data do início da incapacidade o ano de 2005. Em outros termos, é nessa época que os testemunhos demonstraram que a autora exercia a atividade pesqueira com o seu marido.
Cumpridos, a meu julgar, os requisitos carência e qualidade de segurado, quando do surgimento da incapacidade total e definitiva, de rigor a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez (art. 42 da Lei 8.213/91).
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente quando da elaboração da conta, aplicando-se o IPCA-E nos moldes do julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), com efeitos prospectivos.
Ressalto que os embargos de declaração opostos contra referido acórdão tem por escopo a modulação dos seus efeitos - atribuição de eficácia prospectiva -, sendo que a concessão de efeito suspensivo não impede o julgamento do presente recurso, haja vista que o quanto lá decidido deverá ser observado apenas no momento da liquidação deste julgado.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Por derradeiro, a hipótese da ação comporta a outorga de tutela específica nos moldes do art. 497 do Código de Processo Civil. Dessa forma, em atenção a expresso requerimento da parte autora, visando assegurar o resultado concreto buscado na demanda e a eficiência da prestação jurisdicional, independentemente do trânsito em julgado, determino seja enviado e-mail ao INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, instruído com os documentos da parte autora, a fim de serem adotadas as providências cabíveis ao cumprimento desta decisão, para a implantação do benefício no prazo máximo de 20 (vinte) dias.
Ante o exposto, não conheço da remessa necessária, nego provimento à apelação do INSS e, de ofício, estabeleço que os valores em atraso sejam corrigidos monetariamente e acrescidos de juros de mora na forma da fundamentação, deferindo-se, ainda, a antecipação dos efeitos da tutela.
É como voto.
CARLOS DELGADO
Desembargador Federal
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