Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0005158-60.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
13/05/2021
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 25/05/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º,
CPC. NOVA PERÍCIA. DESNECESSIDADE. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA LEGAL.
MATÉRIAS INCONTROVERSAS. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. LAUDO PERICIAL.
INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS CONCLUSÕES
PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE JURÍDICA.
AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO. VALORAÇÃO DO
CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. AUXÍLIO-DOENÇA DEVIDO.
DIB. DATA DA ALTA MÉDICA ADMINISTRATIVA. SÚMULA 576, STJ. DCB. IMPOSSIBILIDADE
DE FIXAÇÃO NO CASO CONCRETO. AFERIÇÃO DA CONTINUIDADE DO QUADRO
INCAPACITANTE. PRERROGATIVA DO INSS. SUJEIÇÃO DO CANCELAMENTO DA BENESSE
À NOVA DECISÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE
MORA. PRELIMINARES REJEITADAS. APELAÇÕES DA PARTE E DO INSS PARCIALMENTE
PROVIDAS. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em
conta o termo inicial do benefício (09.11.2016) e a data da prolação da r. sentença (22.09.2017),
ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência Social, mesmo
assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba
honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - Desnecessária nova prova técnica, eis que presente laudo pericial suficiente à formação da
convicção do magistrado a quo.
3 - A perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu
aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise do histórico da parte e de
exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que entendeu
pertinentes.
4 - A realização de nova perícia não é direito subjetivo da parte, mas sim faculdade do juízo,
quando não se sentir convencido dos esclarecimentos técnicos prestados, conforme
expressamente dispõe o art. 480 do CPC.
5 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
6 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
7 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
8 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
9 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
10 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
11 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
12 - Os requisitos qualidade de segurado e carência restaram incontroversos, na medida em que
o INSS não impugnou o capítulo da sentença que os reconheceu, nem esta foi submetida à
remessa necessária.
13 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame efetivado em 14 de dezembro de 2016 (ID 107072629, p. 36-44), quando a demandante
possuía 45 (quarenta e cinco) anos, consignou o seguinte: “Periciada apresenta quadro
psicopatológico compatível com diagnóstico de Transtorno de Personalidade Emocionalmente
Instável (F60.3 de acordo com a CID10) e Transtorno Depressivo Recorrente (F33 - CID10) (...) O
quadro foi avaliado em fase de agravamento no momento da avaliação pericial, considerando-se
em conjunto a avaliação pericial de suas várias funções psíquicas (anotado em Avaliação
Psíquica), a análise crítica da documentação médica apresentada, bem como do relato fornecido
através da anamnese. Desta forma, considero incapacitada para seu trabalho habitual e neste
momento para qualquer atividade laboral renumerada, sendo a data de início da incapacidade
(DII) estabelecida em 9/11/2016, quando comprovou ter evoluído com piora sintomatológica após
evento estressor. A incapacidade é temporária, sendo sugerida manutenção do afastamento
laboral por um período de 3 (três) meses a partir da data desta avaliação, quando, a persistir a
percepção de incapacidade, será reavaliada em perícia junto à autarquia”.
14 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames ou
quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal aptidão,
salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso concreto. Por ser
o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto probatório trazido a
exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis Felipe Salomão, DJE:
26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
15 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o
qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de histórico
da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises
que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório, referida prova técnica
merece confiança e credibilidade.
16 - Reconhecida a incapacidade total e temporária para o trabalho, acertado o deferimento de
auxílio-doença, nos exatos termos do art. 59 da Lei 8.213/91.
17 - Quanto à possibilidade de cancelamento do auxílio sem a necessidade de nova decisão
judicial, as alegações autárquicas prosperam.
18 - Uma vez concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-
doença pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou
aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do
segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia,
conforme previsão contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91.
19 - Assim, resta evidente a impossibilidade, em razão de expressa disposição em Lei, de que a
benesse somente seja cancelado por decisão do magistrado a quo. Trata-se de prerrogativa legal
do ente autárquico, além do que, caso tal procedimento fosse adotado, ocorreria a eternização da
presente lide.
20 - No que concerne ao estabelecimento pelo ente autárquico de uma DCB prévia para auxílio-
doença, verifica-se inexistir óbice para tanto, eis que a previsão de alta é feita com supedâneo em
perícia médica e, ainda, se oportuniza ao segurado, nos termos do RPS, a possibilidade de
solicitar a realização de novo exame pericial, com consequente pedido de prorrogação do
benefício, na forma estabelecida pelo INSS (geralmente, nos 15 dias anteriores à data
preestabelecida).
21 - Frisa que tal sistemática de “alta programada”, também denominada de COPES (Cobertura
Previdenciária Estimada), era prevista apenas no art. 78, §1º, do Regulamento da Previdência
Social (Decreto nº 3.048/99), encontrando, atualmente, guarida no art. 60, §§8º e 9º, da Lei nº
8.213/91, alterado pela MP 739/2016 (que perdeu vigência) e pela MP 767/2017, que, por sua,
vez foi convertida na Lei 13.457/2017.
22 - Se possível a fixação da data de alta pelo INSS, com fundamento em perícia administrativa,
com mais razão o magistrado pode também assim o determinar, já que sua decisão é lastreada
em prova médica elaborada por profissional equidistante das partes. Não por outra razão todas as
modificações legislativas, que trataram sobre a COPES, admitiam e admitem a possibilidade de o
próprio Juízo fixar na sentença a data da alta do postulante.
23 - O §8º do art. 60 da Lei 8.213/91, já mencionado, em sua atual redação, prescreve que,
“sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença, judicial ou
administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício”.
24 - No presente caso, contudo, não era e ainda não é possível estabelecer uma data específica
para a cessação da benesse da autora.
25 - Diferentemente do alegado pelo INSS, o vistor oficial afirma que o prazo de 3 (três) meses, a
contar da data do exame, é para reavaliação do quadro de saúde da demandante e não que ela
estará apta para laborar após tal interregno. Ademais, como dito supra, é pouco provável que isso
ocorreu, uma vez que as patologias psiquiátricas incapacitantes já existiam mais de 8 (oito) anos
antes da perícia, desde ao menos o ano de 2008.
26 - Como se tanto não bastasse, documentos que acompanham a exordial revelam ter a
requerente sido submetida a pelo menos duas internações psiquiátricas nos anos de 2009 e 2010
(ID 107072626, p. 38), e que voltou a ter crises alucinatórias em 2016, como se verá a seguir,
sendo de todo temerária a fixação de uma DCB diante de tal qual quadro.
27 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se
dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência
(Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a persistência da incapacidade, quando da cessação do
auxílio-doença (NB: 533.450.597-7), de rigor a fixação da DIB na data do seu cancelamento
indevido, já que desde a data de entrada do requerimento (DER) até a sua cessação (27.04.2016
- ID 107072626, p. 19), a autora efetivamente estava protegida pelo Sistema da Seguridade
Social, percebendo benefício previdenciário.
28 - Não se nega que o laudo fixou a DII em novembro de 2016 e o cancelamento da benesse foi
efetivado em abril daquele mesmo ano (ID 107371614, p. 12), contudo, a diferença entre tais
momentos é muito pequena, de pouco mais de 6 (seis) meses, não podendo ser tomada em
termos matemáticos exatos, exigindo a necessária temperança decorrente dos fatos da vida por
parte do julgador (art. 375, CPC). Em outros termos, é de se concluir que o impedimento persistiu
após a alta programada, sobretudo porque é portadora de males psiquiátricos que remontam,
repisa-se, ao ano de 2008.
29 - De mais a mais, consta de seu prontuário médico acostado aos autos, que em abril de 2016,
mesmo mês da alta médica administrativa, voltou a ter “alucinações visuais e auditivas” e “chorou
compulsivamente (...), quase gritando”, em face da psiquiátrica que a acompanha (ID 107072628,
p. 41).
30 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
31 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
32 - Preliminares rejeitadas. Apelações da parte autora e do INSS parcialmente providas.
Sentença reformada em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005158-60.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: ANDREA DOS SANTOS MACHADO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
APELADO: ANDREA DOS SANTOS MACHADO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005158-60.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: ANDREA DOS SANTOS MACHADO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
APELADO: ANDREA DOS SANTOS MACHADO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas por ANDRÉA DOS SANTOS MACHADO e pelo INSTITUTO
NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em ação ajuizada pela primeira, objetivando o
restabelecimento de benefício de auxílio-doença e, caso preenchidas as condições legais, sua
conversão em aposentadoria por invalidez.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS na concessão e no pagamento
dos atrasados de auxílio-doença, desde a data do início da incapacidade apontada pelo perito
médico judicial, ou seja, desde 09.11.2016 (ID 107072629, p. 36-44), condicionando, ainda, sua
cessação futura à decisão judicial. Fixou correção monetária nos termos do Manual de
Orientação de Procedimentos para os cálculos da Justiça Federal e juros de mora consoante o
disposto na Lei 11.960/09. Condenou o INSS no pagamento de honorários advocatícios,
arbitrados em 10% (dez por cento) sobre o valor das parcelas em atraso, contabilizadas até a
data da sua prolação. Por fim, confirmou a antecipação dos efeitos da tutela (ID 107072629, p.
94-95).
Em razões recursais, a parte autora pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que
está total e permanentemente incapacitada para o labor, fazendo jus à aposentadoria por
invalidez. Em sede subsidiária, requer a realização de nova perícia por profissional médico
distinto daquele já nomeado em sede de 1º grau, bem como seja fixada a DIB do auxílio-doença
na data da alta médica administrativa efetivada em 27.04.2016 (ID 107072629, p. 102-111).
O INSS também interpôs apelação, no qual pleiteia, preliminarmente, a submissão da sentença
à remessa necessária. No mérito, requer seja afastada a imposição de que o auxílio-doença
somente possa ser cessada após determinação judicial, bem como para que a DCB da benesse
seja fixada após 3 (três) meses contados da data da perícia judicial (ID 107072629, p. 119-126).
Apenas a demandante apresentou contrarrazões (ID 107072629, p. 130-137)
Devidamente processados os recursos, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional
Federal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0005158-60.2018.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: ANDREA DOS SANTOS MACHADO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
Advogado do(a) APELANTE: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
APELADO: ANDREA DOS SANTOS MACHADO, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
Advogado do(a) APELADO: ANTONIO DE PADUA BERTELLI - SP116370
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação,
levando em conta o termo inicial do benefício (09.11.2016) e a data da prolação da r. sentença
(22.09.2017), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora
e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
Ainda em sede preliminar, observo ser desnecessária nova prova técnica, eis que presente
laudo pericial suficiente à formação da convicção do magistrado a quo.
A perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual respondeu
aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise do histórico da parte e de
exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises que
entendeu pertinentes.
Por fim, cumpre lembrar que a realização de nova perícia não é direito subjetivo da parte, mas
sim faculdade do juízo, quando não se sentir convencido dos esclarecimentos técnicos
prestados, conforme expressamente dispõe o art. 480 do CPC.
Passo à análise do mérito.
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
Os requisitos qualidade de segurado e carência restaram incontroversos, na medida em que o
INSS não impugnou o capítulo da sentença que os reconheceu, nem esta foi submetida à
remessa necessária.
No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em
exame efetivado em 14 de dezembro de 2016 (ID 107072629, p. 36-44), quando a demandante
possuía 45 (quarenta e cinco) anos, consignou o seguinte:
“Periciada apresenta quadro psicopatológico compatível com diagnóstico de Transtorno de
Personalidade Emocionalmente Instável (F60.3 de acordo com a CID10) e Transtorno
Depressivo Recorrente (F33 - CID10)
(...)
O quadro foi avaliado em fase de agravamento no momento da avaliação pericial,
considerando-se em conjunto a avaliação pericial de suas várias funções psíquicas (anotado
em Avaliação Psíquica), a análise crítica da documentação médica apresentada, bem como do
relato fornecido através da anamnese.
Desta forma, considero incapacitada para seu trabalho habitual e neste momento para qualquer
atividade laboral renumerada, sendo a data de início da incapacidade (DII) estabelecida em
9/11/2016, quando comprovou ter evoluído com piora sintomatológica após evento estressor.
A incapacidade é temporária, sendo sugerida manutenção do afastamento laboral por um
período de 3 (três) meses a partir da data desta avaliação, quando, a persistir a percepção de
incapacidade, será reavaliada em perícia junto à autarquia”.
Assevero que da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu
do que dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre
convencimento motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou
científica que refoge à controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos
robustos nos autos em sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto.
Atestados médicos, exames ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas
partes não possuem tal aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se
vislumbra no caso concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração
do conjunto probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000,
Rel. Luis Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo
Esteves Lima, DJE. 12/11/2010.
Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o
qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de
histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando
demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
Reconhecida a incapacidade total e temporária para o trabalho, acertado o deferimento de
auxílio-doença, nos exatos termos do art. 59 da Lei 8.213/91.
Quanto à possibilidade de cancelamento do auxílio sem a necessidade de nova decisão judicial,
as alegações autárquicas prosperam.
Uma vez concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-
doença pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou
aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do
segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia,
conforme previsão contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91, senão vejamos:
"Art. 101. O segurado em gozo de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e o pensionista
inválido estão obrigados, sob pena de suspensão do benefício, a submeter-se a exame médico
a cargo da Previdência Social, processo de reabilitação profissional por ela prescrito e
custeado, e tratamento dispensado gratuitamente, exceto o cirúrgico e a transfusão de sangue,
que são facultativos."
Assim, resta evidente a impossibilidade, em razão de expressa disposição em Lei, de que a
benesse somente seja cancelado por decisão do magistrado a quo. Trata-se de prerrogativa
legal do ente autárquico, além do que, caso tal procedimento fosse adotado, ocorreria a
eternização da presente lide.
No que concerne ao estabelecimento pelo ente autárquico de uma DCB prévia para auxílio-
doença, comungo da opinião daqueles que entendem inexistir óbice para tanto, eis que a
previsão de alta é feita com supedâneo em perícia médica e, ainda, se oportuniza ao segurado,
nos termos do RPS, a possibilidade de solicitar a realização de novo exame pericial, com
consequente pedido de prorrogação do benefício, na forma estabelecida pelo INSS
(geralmente, nos 15 dias anteriores à data preestabelecida).
Frisa que tal sistemática de “alta programada”, também denominada de COPES (Cobertura
Previdenciária Estimada), era prevista apenas no art. 78, §1º, do Regulamento da Previdência
Social (Decreto nº 3.048/99), encontrando, atualmente, guarida no art. 60, §§8º e 9º, da Lei nº
8.213/91, alterado pela MP 739/2016 (que perdeu vigência) e pela MP 767/2017, que, por sua,
vez foi convertida na Lei 13.457/2017.
Se possível a fixação da data de alta pelo INSS, com fundamento em perícia administrativa,
com mais razão o magistrado pode também assim o determinar, já que sua decisão é lastreada
em prova médica elaborada por profissional equidistante das partes. Não por outra razão todas
as modificações legislativas, que trataram sobre a COPES, admitiam e admitem a possibilidade
de o próprio Juízo fixar na sentença a data da alta do postulante.
O §8º do art. 60 da Lei 8.213/91, já mencionado, em sua atual redação, prescreve que, “sempre
que possível, o ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença, judicial ou administrativo,
deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício” (grifos nossos).
No presente caso, contudo, não era e ainda não é possível estabelecer uma data específica
para a cessação da benesse da autora.
Diferentemente do alegado pelo INSS, o vistor oficial afirma que o prazo de 3 (três) meses, a
contar da data do exame, é para reavaliação do quadro de saúde da demandante e não que ela
estará apta para laborar após tal interregno. Ademais, como dito supra, é pouco provável que
isso ocorreu, uma vez que as patologias psiquiátricas incapacitantes já existiam mais de 8 (oito)
anos antes da perícia, desde ao menos o ano de 2008.
Como se tanto não bastasse, documentos que acompanham a exordial revelam ter a
requerente sido submetida a pelo menos duas internações psiquiátricas nos anos de 2009 e
2010 (ID 107072626, p. 38), e que voltou a ter crises alucinatórias em 2016, como se verá a
seguir, sendo de todo temerária a fixação de uma DCB diante de tal qual quadro.
Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá
na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência
(Súmula 576 do STJ).
Tendo em vista a persistência da incapacidade, quando da cessação do auxílio-doença (NB:
533.450.597-7), de rigor a fixação da DIB na data do seu cancelamento indevido, já que desde
a data de entrada do requerimento (DER) até a sua cessação (27.04.2016 - ID 107072626, p.
19), a autora efetivamente estava protegida pelo Sistema da Seguridade Social, percebendo
benefício previdenciário.
Não se nega que o laudo fixou a DII em novembro de 2016 e o cancelamento da benesse foi
efetivado em abril daquele mesmo ano (ID 107371614, p. 12), contudo, a diferença entre tais
momentos é muito pequena, de pouco mais de 6 (seis) meses, não podendo ser tomada em
termos matemáticos exatos, exigindo a necessária temperança decorrente dos fatos da vida por
parte do julgador (art. 375, CPC). Em outros termos, é de se concluir que o impedimento
persistiu após a alta programada, sobretudo porque é portadora de males psiquiátricos que
remontam, repisa-se, ao ano de 2008.
De mais a mais, consta de seu prontuário médico acostado aos autos, que em abril de 2016,
mesmo mês da alta médica administrativa, voltou a ter “alucinações visuais e auditivas” e
“chorou compulsivamente (...), quase gritando”, em face da psiquiátrica que a acompanha (ID
107072628, p. 41).
Passo, por fim, a análise dos consectários legais, por se tratar de matéria de ordem pública.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, rejeito as preliminares, dou parcial provimento às apelações da parte autora e
do INSS para fixar a DIB do auxílio-doença na data da alta médica administrativa, que se deu
em 27.04.2016, bem como para que seja afastada a necessidade de que, somente mediante
determinação judicial, possa ser cessada a referida benesse, e, por fim, de ofício, estabeleço
que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual
de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei
nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do IPCA-E, e que os
juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados de acordo com o
mesmo Manual.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º,
CPC. NOVA PERÍCIA. DESNECESSIDADE. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA LEGAL.
MATÉRIAS INCONTROVERSAS. INCAPACIDADE TOTAL E TEMPORÁRIA. LAUDO
PERICIAL. INTERPRETAÇÃO A CONTRARIO SENSU. ART. 479, CPC. ADOÇÃO DAS
CONCLUSÕES PERICIAIS. MATÉRIA NÃO ADSTRITA À CONTROVÉRSIA MERAMENTE
JURÍDICA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS QUE INFIRMEM O PARECER DO EXPERTO.
VALORAÇÃO DO CONJUNTO PROBATÓRIO. CONVICÇÕES DO MAGISTRADO. AUXÍLIO-
DOENÇA DEVIDO. DIB. DATA DA ALTA MÉDICA ADMINISTRATIVA. SÚMULA 576, STJ.
DCB. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO NO CASO CONCRETO. AFERIÇÃO DA
CONTINUIDADE DO QUADRO INCAPACITANTE. PRERROGATIVA DO INSS. SUJEIÇÃO DO
CANCELAMENTO DA BENESSE À NOVA DECISÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE.
CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. PRELIMINARES REJEITADAS. APELAÇÕES
DA PARTE E DO INSS PARCIALMENTE PROVIDAS. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em
conta o termo inicial do benefício (09.11.2016) e a data da prolação da r. sentença
(22.09.2017), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora
e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - Desnecessária nova prova técnica, eis que presente laudo pericial suficiente à formação da
convicção do magistrado a quo.
3 - A perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente, o qual
respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise do histórico da
parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando demais análises
que entendeu pertinentes.
4 - A realização de nova perícia não é direito subjetivo da parte, mas sim faculdade do juízo,
quando não se sentir convencido dos esclarecimentos técnicos prestados, conforme
expressamente dispõe o art. 480 do CPC.
5 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
6 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
7 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
8 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
9 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
10 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e
quatro) meses o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120
(cento e vinte) meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua
vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
11 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
12 - Os requisitos qualidade de segurado e carência restaram incontroversos, na medida em
que o INSS não impugnou o capítulo da sentença que os reconheceu, nem esta foi submetida à
remessa necessária.
13 - No que tange à incapacidade, o profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base
em exame efetivado em 14 de dezembro de 2016 (ID 107072629, p. 36-44), quando a
demandante possuía 45 (quarenta e cinco) anos, consignou o seguinte: “Periciada apresenta
quadro psicopatológico compatível com diagnóstico de Transtorno de Personalidade
Emocionalmente Instável (F60.3 de acordo com a CID10) e Transtorno Depressivo Recorrente
(F33 - CID10) (...) O quadro foi avaliado em fase de agravamento no momento da avaliação
pericial, considerando-se em conjunto a avaliação pericial de suas várias funções psíquicas
(anotado em Avaliação Psíquica), a análise crítica da documentação médica apresentada, bem
como do relato fornecido através da anamnese. Desta forma, considero incapacitada para seu
trabalho habitual e neste momento para qualquer atividade laboral renumerada, sendo a data
de início da incapacidade (DII) estabelecida em 9/11/2016, quando comprovou ter evoluído com
piora sintomatológica após evento estressor. A incapacidade é temporária, sendo sugerida
manutenção do afastamento laboral por um período de 3 (três) meses a partir da data desta
avaliação, quando, a persistir a percepção de incapacidade, será reavaliada em perícia junto à
autarquia”.
14 - Da mesma forma que o juiz não está adstrito ao laudo pericial, a contrario sensu do que
dispõe o art. 436 do CPC/73 (atual art. 479 do CPC) e do princípio do livre convencimento
motivado, a não adoção das conclusões periciais, na matéria técnica ou científica que refoge à
controvérsia meramente jurídica depende da existência de elementos robustos nos autos em
sentido contrário e que infirmem claramente o parecer do experto. Atestados médicos, exames
ou quaisquer outros documentos produzidos unilateralmente pelas partes não possuem tal
aptidão, salvo se aberrante o laudo pericial, circunstância que não se vislumbra no caso
concreto. Por ser o juiz o destinatário das provas, a ele incumbe a valoração do conjunto
probatório trazido a exame. Precedentes: STJ, 4ª Turma, RESP nº 200802113000, Rel. Luis
Felipe Salomão, DJE: 26/03/2013; AGA 200901317319, 1ª Turma, Rel. Arnaldo Esteves Lima,
DJE. 12/11/2010.
15 - Saliente-se que a perícia médica foi efetivada por profissional inscrito no órgão competente,
o qual respondeu aos quesitos elaborados e forneceu diagnóstico com base na análise de
histórico da parte e de exames complementares por ela fornecidos, bem como efetuando
demais análises que entendeu pertinentes, e, não sendo infirmado pelo conjunto probatório,
referida prova técnica merece confiança e credibilidade.
16 - Reconhecida a incapacidade total e temporária para o trabalho, acertado o deferimento de
auxílio-doença, nos exatos termos do art. 59 da Lei 8.213/91.
17 - Quanto à possibilidade de cancelamento do auxílio sem a necessidade de nova decisão
judicial, as alegações autárquicas prosperam.
18 - Uma vez concedido e dada sua natureza essencialmente transitória, o benefício de auxílio-
doença pode ser cessado, prorrogado, ou mesmo convertido em processo de reabilitação ou
aposentadoria por invalidez, sendo necessária, para tanto, a aferição das condições clínicas do
segurado, o que se dá por meio da realização de perícias periódicas por parte da autarquia,
conforme previsão contida no art. 101 da Lei nº 8.213/91.
19 - Assim, resta evidente a impossibilidade, em razão de expressa disposição em Lei, de que a
benesse somente seja cancelado por decisão do magistrado a quo. Trata-se de prerrogativa
legal do ente autárquico, além do que, caso tal procedimento fosse adotado, ocorreria a
eternização da presente lide.
20 - No que concerne ao estabelecimento pelo ente autárquico de uma DCB prévia para auxílio-
doença, verifica-se inexistir óbice para tanto, eis que a previsão de alta é feita com supedâneo
em perícia médica e, ainda, se oportuniza ao segurado, nos termos do RPS, a possibilidade de
solicitar a realização de novo exame pericial, com consequente pedido de prorrogação do
benefício, na forma estabelecida pelo INSS (geralmente, nos 15 dias anteriores à data
preestabelecida).
21 - Frisa que tal sistemática de “alta programada”, também denominada de COPES (Cobertura
Previdenciária Estimada), era prevista apenas no art. 78, §1º, do Regulamento da Previdência
Social (Decreto nº 3.048/99), encontrando, atualmente, guarida no art. 60, §§8º e 9º, da Lei nº
8.213/91, alterado pela MP 739/2016 (que perdeu vigência) e pela MP 767/2017, que, por sua,
vez foi convertida na Lei 13.457/2017.
22 - Se possível a fixação da data de alta pelo INSS, com fundamento em perícia
administrativa, com mais razão o magistrado pode também assim o determinar, já que sua
decisão é lastreada em prova médica elaborada por profissional equidistante das partes. Não
por outra razão todas as modificações legislativas, que trataram sobre a COPES, admitiam e
admitem a possibilidade de o próprio Juízo fixar na sentença a data da alta do postulante.
23 - O §8º do art. 60 da Lei 8.213/91, já mencionado, em sua atual redação, prescreve que,
“sempre que possível, o ato de concessão ou de reativação do auxílio-doença, judicial ou
administrativo, deverá fixar o prazo estimado para a duração do benefício”.
24 - No presente caso, contudo, não era e ainda não é possível estabelecer uma data
específica para a cessação da benesse da autora.
25 - Diferentemente do alegado pelo INSS, o vistor oficial afirma que o prazo de 3 (três) meses,
a contar da data do exame, é para reavaliação do quadro de saúde da demandante e não que
ela estará apta para laborar após tal interregno. Ademais, como dito supra, é pouco provável
que isso ocorreu, uma vez que as patologias psiquiátricas incapacitantes já existiam mais de 8
(oito) anos antes da perícia, desde ao menos o ano de 2008.
26 - Como se tanto não bastasse, documentos que acompanham a exordial revelam ter a
requerente sido submetida a pelo menos duas internações psiquiátricas nos anos de 2009 e
2010 (ID 107072626, p. 38), e que voltou a ter crises alucinatórias em 2016, como se verá a
seguir, sendo de todo temerária a fixação de uma DCB diante de tal qual quadro.
27 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este
se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua
inexistência (Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a persistência da incapacidade, quando da
cessação do auxílio-doença (NB: 533.450.597-7), de rigor a fixação da DIB na data do seu
cancelamento indevido, já que desde a data de entrada do requerimento (DER) até a sua
cessação (27.04.2016 - ID 107072626, p. 19), a autora efetivamente estava protegida pelo
Sistema da Seguridade Social, percebendo benefício previdenciário.
28 - Não se nega que o laudo fixou a DII em novembro de 2016 e o cancelamento da benesse
foi efetivado em abril daquele mesmo ano (ID 107371614, p. 12), contudo, a diferença entre tais
momentos é muito pequena, de pouco mais de 6 (seis) meses, não podendo ser tomada em
termos matemáticos exatos, exigindo a necessária temperança decorrente dos fatos da vida por
parte do julgador (art. 375, CPC). Em outros termos, é de se concluir que o impedimento
persistiu após a alta programada, sobretudo porque é portadora de males psiquiátricos que
remontam, repisa-se, ao ano de 2008.
29 - De mais a mais, consta de seu prontuário médico acostado aos autos, que em abril de
2016, mesmo mês da alta médica administrativa, voltou a ter “alucinações visuais e auditivas” e
“chorou compulsivamente (...), quase gritando”, em face da psiquiátrica que a acompanha (ID
107072628, p. 41).
30 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
31 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
32 - Preliminares rejeitadas. Apelações da parte autora e do INSS parcialmente providas.
Sentença reformada em parte. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar as preliminares, dar parcial provimento às apelações da parte
autora e do INSS para fixar a DIB do auxílio-doença na data da alta médica administrativa, que
se deu em 27.04.2016, bem como para que seja afastada a necessidade de que, somente
mediante determinação judicial, possa ser cessada a referida benesse, e, por fim, de ofício,
estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a
promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do
IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados
de acordo com o mesmo Manual, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
