Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
0001510-82.2012.4.03.6119
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
11/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 18/11/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º,
CPC/1973. PRELIMINAR REJEITADA. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA LEGAL.
MATÉRIAS INCONTROVERSAS. LAUDOS PERICIAIS. INCAPACIDADE TOTAL. MOTORISTA.
CEGUEIRA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. DIB. DATA DA CESSAÇÃO.
SÚMULA 576, STJ. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA INCAPACIDADE. ESTADO
DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO DIREITO CONSTITUCIONAL À
VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. DESCONTO. DESCABIMENTO.
TEMA REPETITIVO Nº 1.013/STJ. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO
DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA PARTE AUTORA PROVIDA. ALTERAÇÃO DOS
CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA CORREÇÃO MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA DE
OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em
conta o termo inicial do benefício (01.07.2016) e a data da prolação da r. sentença (06.07.2018),
ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência Social, mesmo
assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba
honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do
artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
9 - Os requisitos qualidade de segurado e carência legal restaram incontroversos, uma vez que o
INSS não impugnou o capítulo da sentença que os atestou.
10 - No que tange à incapacidade, o primeiro profissional médico indicado pelo Juízo a quo, da
área de ortopedia, com base em exame realizado em 11 de maio de 2012, quando o demandante
possuía 58 (cinquenta e oito) anos, consignou: “O periciando relata ter em 2009 foi submetido a
procedimento cirúrgico para retirada de tumor cerebral, porém não encontrado malignidade. A
partir de então relata ter afetado a visão, e falta de memória. Nega Hipertensão Arterial Sistêmica
e nega Diabetes Mellitus. Atualmente o periciando não pratica de atividade laborais habituais.
Nega prática atividades domésticas. Relata como limitação falta de memória e tontura a
exposição solar. Refere realizar acompanhamento médico com neurologista no hospital
Mandaqui. faz uso de amitriptilina, tegretol de forma continuada. (...) Não foi constatada
incapacidade laborativa para as atividades laborais habituais. Sugiro perícia oftalmológica.” Foi
apresentado laudo complementar, no qual reiterou a inexistência de incapacidade.
11 - A segunda profissional médica, da área oftalmológica, com fundamento em perícia efetivada
em 28 de novembro de 2013, relatou: “O periciando apresentou um tumor neurológico, cuja
ressecção resultou em baixa acuidade visual à esquerda permanentemente. No entanto, a visão
de 20/25 à direita, o possibilita a realizar as atividades atuais de auxiliar de motorista para a qual
foi adaptado. Logo, do ponto de vista oftalmológico, o periciando apresenta CAPACIDADE
LABORATIVA.”
12 - A terceira profissional médica, da área neurológica, com fundamento em perícia efetivada em
28 de agosto de 2014, relatou: “Na data de 28/1/2009, o autor apresentou crise convulsiva, perda
visual e hemiparesia esquerda, foi submetido a tratamento cirúrgico para retirada de lesão
expansiva localizada no lobo parietal direito – giloma cerebral. O autor apresenta hemianopsia
homônima esquerda – perda do campo visual esquerdo em decorrência de lesão expansiva em
lobo parietal direita. Conclusão: O periciando apresenta incapacidade total e permanente para o
trabalho.” Asseverou, ainda, que o estado de saúde é estável, por se tratar de doença estática
que acarretou sequela visual (resposta ao quesito nº 12 do autor). Por fim, fixou a DII em
28.01.2009.
13 - Ainda que os primeiros laudos periciais não tenham constatado qualquer incapacidade, o
último exame constatou incapacidade total e definitiva devido à perda visual. Outrossim, se me
afigura pouco crível que, quem sempre trabalhou como motorista, contando, atualmente, com
mais de 67 (sessenta e sete) anos de idade, vá conseguir, após reabilitação, capacitação e
treinamento, recolocação profissional em outras funções.
14 - Reconhecida a incapacidade permanente para o trabalho, de rigor a concessão de
aposentadoria por invalidez, nos exatos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
15 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se
dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência
(Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a persistência da incapacidade, quando da cessação do
auxílio-doença (NB: 534.430.661-6), de rigor a fixação da DIB da aposentadoria por invalidez na
data do seu cancelamento, já que desde a data de entrada do requerimento (DER) até a sua
cessação (01.07.2011), o autor efetivamente estava protegido pelo Sistema da Seguridade
Social, percebendo benefício previdenciário.
16 - Descabe o abatimento, sobre as parcelas devidas, do período em que o segurado manteve
vínculo empregatício ou verteu recolhimentos na condição de contribuinte individual. Ora,
havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra
alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento da
situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura má-fé
e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade e nada
mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser humano.
Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o sustento do
segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o incapacitado
ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela responsabilização
patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo
reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de suportar o calvário
processual.
17 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com
recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos
valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque,
nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho,
absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à
margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do
regime.
18 - A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso
representativo de controvérsia repetitiva (REsp nº 1.786.590/SP, Relator Ministro Herman
Benjamin, 1ª Seção, j. 24/06/2020, DJe 01/07/2020), fixou a “Tese nº 1.013” com o seguinte
teor:“No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou
de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao
recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua
incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente.".
19 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de Orientação
de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a
partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da
repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E,
tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
20 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
21 - Apelação do INSS desprovida. Apelação adesiva da parte autora provida. Alteração dos
critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora de ofício. Sentença reformada
em parte.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001510-82.2012.4.03.6119
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GETULIO REGINALDO DOS SANTOS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO: GILVANIA PIMENTEL MARTINS - SP260513-A
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001510-82.2012.4.03.6119
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GETULIO REGINALDO DOS SANTOS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO: GILVANIA PIMENTEL MARTINS - SP260513-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelações interpostas pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL – INSS
e por GETULIO REGINALDO DOS SANTOS, em ação ajuizada por este último, objetivando o
restabelecimento de auxílio-doença, com sua conversão em aposentadoria por invalidez.
A r. sentença julgou parcialmente procedente o pedido, condenando o INSS no
restabelecimento e no pagamento dos atrasados de auxílio-doença, desde a data da cessação,
em 01.07.2016, mantendo o benefício pelo prazo de 6 meses da data de sua prolação, devendo
o INSS submeter o autor à processo de reabilitação. Fixou a correção monetária e juros de
mora na forma prevista no Manual de Cálculos da Justiça Federal. Condenou o INSS, ainda, no
pagamento de honorários advocatícios, arbitrados no percentual mínimo, sobre o valor das
parcelas em atraso até a data de sua prolação. Por fim, determinou a imediata implantação do
benefício, deferindo o pedido de tutela antecipada (ID 33374292, p. 627-633).
Em razões recursais, o INSS pugna, inicialmente, pela submissão da sentença ao reexame
necessário. No mérito, alega a ausência de incapacidade, pugna pela fixação da DIB na data da
juntada do laudo pericial. Subsidiariamente, requer a modificação dos critérios de aplicação da
correção monetária e dos juros de mora, bem como a compensação dos valores em períodos
em que o autor exerceu atividade laborativa (ID 33374292, p. 640-652).
O demandante também interpôs recurso de apelação, na forma adesiva, ao fundamento de que
preenche os requisitos para a concessão de aposentadoria por invalidez (ID 33374284, p. 14-
20). Também apresentou contrarrazões (ID 33374283, p. 7-13).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº0001510-82.2012.4.03.6119
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: GETULIO REGINALDO DOS SANTOS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Advogado do(a) APELADO: GILVANIA PIMENTEL MARTINS - SP260513-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Inicialmente, em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação,
levando em conta o termo inicial do benefício (01.07.2016) e a data da prolação da r. sentença
(06.07.2018), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora
e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil.
Dessa forma, incabível a remessa necessária no presente caso.
Passo à análise do mérito.
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
Os requisitos qualidade de segurado e carência legal restaram incontroversos, uma vez que o
INSS não impugnou o capítulo da sentença que os atestou.
No que tange à incapacidade, o primeiro profissional médico indicado pelo Juízo a quo, da área
de ortopedia, com base em exame realizado em 11 de maio de 2012 (ID 33374291, p. 294-
309), quando o demandante possuía 58 (cinquenta e oito) anos, consignou:
“O periciando relata ter em 2009 foi submetido a procedimento cirúrgico para retirada de tumor
cerebral, porém não encontrado malignidade. A partir de então relata ter afetado a visão, e falta
de memória. Nega Hipertensão Arterial Sistêmica e nega Diabetes Mellitus. Atualmente o
periciando não pratica de atividade laborais habituais. Nega prática atividades domésticas.
Relata como limitação falta de memória e tontura a exposição solar. Refere realizar
acompanhamento médico com neurologista no hospital Mandaqui. faz uso de amitriptilina,
tegretol de forma continuada.
(...) Não foi constatada incapacidade laborativa para as atividades laborais habituais. Sugiro
perícia oftalmológica.”
Foi apresentado laudo complementar (ID 33374291, p. 355-356), no qual reiterou a inexistência
de incapacidade.
A segunda profissional médica, da área oftalmológica, com fundamento em perícia efetivada em
28 de novembro de 2013, (ID 33374291, p. 371-378), relatou:
“O periciando apresentou um tumor neurológico, cuja ressecção resultou em baixa acuidade
visual à esquerda permanentemente. No entanto, a visão de 20/25 à direita, o possibilita a
realizar as atividades atuais de auxiliar de motorista para a qual foi adaptado.
Logo, do ponto de vista oftalmológico, o periciando apresenta CAPACIDADE LABORATIVA.”
A terceira profissional médica, da área neurológica, com fundamento em perícia efetivada em
28 de agosto de 2014 (ID 33374292, p. 404-409), relatou:
“Na data de 28/1/2009, o autor apresentou crise convulsiva, perda visual e hemiparesia
esquerda, foi submetido a tratamento cirúrgico para retirada de lesão expansiva localizada no
lobo parietal direito – giloma cerebral.
O autor apresenta hemianopsia homônima esquerda – perda do campo visual esquerdo em
decorrência de lesão expansiva em lobo parietal direita.
Conclusão: O periciando apresenta incapacidade total e permanente para o trabalho.”
Asseverou, ainda, que o estado de saúde é estável, por se tratar de doença estática que
acarretou sequela visual (resposta ao quesito nº 12 do autor).
Por fim, fixou a DII em 28.01.2009.
Ainda que os primeiros laudos periciais não tenham constatado qualquer incapacidade, o último
exame constatou incapacidade total e definitiva devido à perda visual. Outrossim, se me afigura
pouco crível que, quem sempre trabalhou como motorista, contando, atualmente, com mais de
67 (sessenta e sete) anos de idade, vá conseguir, após reabilitação, capacitação e treinamento,
recolocação profissional em outras funções.
Reconhecida a incapacidade permanente para o trabalho, de rigor a concessão de
aposentadoria por invalidez, nos exatos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este se dá
na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua inexistência
(Súmula 576 do STJ).
Tendo em vista a persistência da incapacidade, quando da cessação do auxílio-doença (NB:
534.430.661-6), de rigor a fixação da DIB da aposentadoria por invalidez na data do seu
cancelamento, já que desde a data de entrada do requerimento (DER) até a sua cessação
(01.07.2011 – ID 33374291, p. 318), o autor efetivamente estava protegido pelo Sistema da
Seguridade Social, percebendo benefício previdenciário.
Passo à análise da questão envolvendo o trabalho da parte autora no período em que
reconhecida a incapacidade laborativa, ainda, com o desdobramento no pagamento das
parcelas em atraso.
Não há dúvida que os benefícios por incapacidade servem justamente para suprir a ausência da
remuneração do segurado que tem sua força de trabalho comprometida e não consegue
exercer suas ocupações profissionais habituais, em razão de incapacidade temporária ou
definitiva. Assim como não se questiona o fato de que o exercício de atividade remunerada,
após a implantação de tais benefícios, implica na sua imediata cessação. E os princípios que
dão sustentação ao raciocínio são justamente os da vedação ao enriquecimento ilícito e da
coibição de má-fé do segurado. É, inclusive, o que deixou expresso o legislador no art. 46 da
Lei nº 8.213/91, em relação à aposentadoria por invalidez.
Completamente diferente, entretanto, é a situação do segurado que se vê compelido a ter de
ingressar em juízo, diante da negativa da autarquia previdenciária em manter benefício
previdenciário, por considerar ausente algum dos requisitos necessários. Ora, havendo
pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que outra
alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de agravamento
da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto não configura
má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado de necessidade
e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e dignidade do ser
humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica, pretende que o
sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo responsabilidade sua para o
incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar sacra. Pugna pela
responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado, necessitou de tutela
jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até o fim e teve de
suportar o calvário processual.
Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com
recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado, com a impossibilidade
de concessão de benefício judicialmente, em virtude de suposta ausência de incapacidade. Até
porque, nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de
trabalho, absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que
completamente à margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao
erário e ao custeio do regime.
Neste sentido já decidiu esta Corte, conforme arestos a seguir reproduzidos:
"DIREITO PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO LEGAL. APOSENTADORIA
POR INVALIDEZ. EXERCÍCIO DE ATIVIDADE LABORATIVA APÓS A CESSAÇÃO DO
AUXÍLIO-DOENÇA. DESCONTO DOS VALORES NO PERÍODO DO SUPOSTO TRABALHO.
IMPOSSIBILIDADE. LEI 11.960/09. APLICAÇÃO COM RELAÇÃO À CORREÇÃO
MONETÁRIA. AGRAVO PARCIALMENTE PROVIDO. 1. O fato da autora ter trabalhado ou
voltado a trabalhar, por si só, não significa que tenha recuperado a capacidade laborativa, uma
vez que pode tê-lo feito por razão de extrema necessidade e de sobrevivência, ainda mais se
tratando de empregada doméstica, não obstante incapacitada para tal. 2. A autora, que deveria
ter sido aposentada por invalidez, porém continuou a contribuir após referido período, em
função de indevida negativa do benefício pelo INSS, não pode ser penalizada com o desconto
dos salários-de-contribuição sobre os quais verteu contribuições, pois, se buscou atividade
remunerada, por falta de alternativa, para o próprio sustento, em que pese a incapacidade
laborativa, no período em que a autarquia opôs-se ilegalmente ao seu direito, não cabe ao INSS
tirar proveito de sua própria conduta. 3. No que tange à correção monetária, devem ser
aplicados os índices oficiais de remuneração básica, a partir da vigência da Lei 11.960/09. 4.
Agravo parcialmente provido." (AC 0036499-51.2011.4.03.9999, 10ª Turma, Rel. Des. Fed.
Baptista Pereira, j. 05/02/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:15/02/2013)".
"PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO RESCISÓRIA. AUXÍLIO-DOENÇA. MATÉRIA PRELIMINAR.
ESPERA PELA IMPLANTAÇÃO DO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. RETORNO À ATIVIDADE
LABORATIVA. POSSIBILIDADE DE PERCEPÇÃO CONJUNTA DE BENEFÍCIO POR
INCAPACIDADE E SALÁRIO. VIOLAÇÃO À LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. INOCORRÊNCIA.
VALORAÇÃO DE TODAS AS PROVAS ACOSTADOS AOS AUTOS SUBJACENTES. ERRO
FATO. INEXISTÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
I - A matéria preliminar confunde-se com o mérito e com ele será examinada.
II - Há que prevalecer o entendimento já adotado na 10ª Turma, no sentido de que comprovada
a incapacidade laborativa e não tendo sido concedida tutela para implantação do benefício, não
se justifica a exclusão do período em que o segurado, mesmo tendo direito ao benefício, teve
que trabalhar para garantir a sua subsistência, já que não é razoável que se exija que o
segurado tenha recursos para se manter até que o seu feito seja julgado.
III - Malgrado o ora réu tenha exercido atividade remunerada desde o termo inicial do benefício
de auxílio-doença fixado pela r. decisão rescindenda (05.02.2006) até agosto de 2011,
conforme extrato do CNIS acostado aos autos, cabe ponderar que este havia sido contemplado
com benefício de auxílio-doença nos períodos de 25.06.2004 a 04.07.2005, de 16.10.2005 a
30.11.2005 e de 25.01.2006 a 05.02.2006, havendo, ainda, documentos médicos apontando a
ocorrência da mesma enfermidade constatada pela perícia oficial (epicondilite lateral do
cotovelo direito) desde agosto de 2004. Assim sendo, é razoável inferir que o ora réu teve que
buscar o mercado de trabalho mesmo sem plenas condições físicas para tal.
IV - A r. decisão rescindenda apreciou o conjunto probatório em sua inteireza, segundo o
princípio da livre convicção motivada, tendo concluído pela existência de incapacidade parcial e
temporária do réu para o trabalho, a ensejar a concessão do benefício de auxílio-doença.
V - Não se admitiu um fato inexistente ou se considerou inexistente um fato efetivamente
ocorrido, pois foram consideradas as provas acostadas aos autos originários, com
pronunciamento judicial sobre o tema, mesmo porque não constava das peças que
compuseram os aludidos autos o extrato de CNIS indicando a manutenção de atividade
laborativa após a cessação do benefício de auxílio-doença concedido na esfera administrativa.
VI - Honorários advocatícios arbitrados em R$ 700,00 (setecentos reais) a serem suportados
pelo INSS.
VII - Preliminar rejeitada. Ação rescisória cujo pedido se julga improcedente."
(AR nº 0019784-55.2011.4.03.0000, Rel. Des. Federal Sérgio Nascimento, 3ª Seção, e-DJF3
18/11/2013)”.
A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso
representativo de controvérsia repetitiva, fixou a “Tese nº 1.013”, quando do julgamento do
Recurso Especial nº 1.786.590/SP, ocorrido em 24.06.2020, com o seguinte teor:
“No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença ou
de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito ao
recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua
incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente."
Assim, descabida a alegação do INSS de que o benefício não poderia ser concedido no
presente caso, em razão do trabalho exercido pela parte autora.
A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir
as determinações legais e a jurisprudência dominante.
Ante o exposto, rejeito a preliminar,nego provimento à apelação do INSS, dou provimento à
apelação do autor, para condenar o INSS no pagamento dos atrasados de aposentadoria por
invalidez, desde a data da cessação do auxílio-doença pretérito, em 01.07.2011 e, de ofício,
estabeleço que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a
promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do
IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados
de acordo com o mesmo Manual.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA NÃO SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. ART. 496, §3º,
CPC/1973. PRELIMINAR REJEITADA. PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA.
APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE SEGURADO. CARÊNCIA LEGAL.
MATÉRIAS INCONTROVERSAS. LAUDOS PERICIAIS. INCAPACIDADE TOTAL.
MOTORISTA. CEGUEIRA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA. DIB. DATA DA
CESSAÇÃO. SÚMULA 576, STJ. PERMANÊNCIA NO TRABALHO APESAR DA
INCAPACIDADE. ESTADO DE NECESSIDADE. SOBREVIVÊNCIA. DESDOBRAMENTO DO
DIREITO CONSTITUCIONAL À VIDA. PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA.
DESCONTO. DESCABIMENTO. TEMA REPETITIVO Nº 1.013/STJ. CORREÇÃO
MONETÁRIA. JUROS DE MORA. APELAÇÃO DO INSS DESPROVIDA. APELAÇÃO DA
PARTE AUTORA PROVIDA. ALTERAÇÃO DOS CRITÉRIOS DE APLICAÇÃO DA CORREÇÃO
MONETÁRIA E DOS JUROS DE MORA DE OFÍCIO. SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
1 - Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em
conta o termo inicial do benefício (01.07.2016) e a data da prolação da r. sentença
(06.07.2018), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência
Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora
e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do
§3º do artigo 496 do Código de Processo Civil. Dessa forma, incabível a remessa necessária no
presente caso.
2 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
3 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
4 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
5 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
6 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
7 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
8 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
9 - Os requisitos qualidade de segurado e carência legal restaram incontroversos, uma vez que
o INSS não impugnou o capítulo da sentença que os atestou.
10 - No que tange à incapacidade, o primeiro profissional médico indicado pelo Juízo a quo, da
área de ortopedia, com base em exame realizado em 11 de maio de 2012, quando o
demandante possuía 58 (cinquenta e oito) anos, consignou: “O periciando relata ter em 2009 foi
submetido a procedimento cirúrgico para retirada de tumor cerebral, porém não encontrado
malignidade. A partir de então relata ter afetado a visão, e falta de memória. Nega Hipertensão
Arterial Sistêmica e nega Diabetes Mellitus. Atualmente o periciando não pratica de atividade
laborais habituais. Nega prática atividades domésticas. Relata como limitação falta de memória
e tontura a exposição solar. Refere realizar acompanhamento médico com neurologista no
hospital Mandaqui. faz uso de amitriptilina, tegretol de forma continuada. (...) Não foi constatada
incapacidade laborativa para as atividades laborais habituais. Sugiro perícia oftalmológica.” Foi
apresentado laudo complementar, no qual reiterou a inexistência de incapacidade.
11 - A segunda profissional médica, da área oftalmológica, com fundamento em perícia
efetivada em 28 de novembro de 2013, relatou: “O periciando apresentou um tumor
neurológico, cuja ressecção resultou em baixa acuidade visual à esquerda permanentemente.
No entanto, a visão de 20/25 à direita, o possibilita a realizar as atividades atuais de auxiliar de
motorista para a qual foi adaptado. Logo, do ponto de vista oftalmológico, o periciando
apresenta CAPACIDADE LABORATIVA.”
12 - A terceira profissional médica, da área neurológica, com fundamento em perícia efetivada
em 28 de agosto de 2014, relatou: “Na data de 28/1/2009, o autor apresentou crise convulsiva,
perda visual e hemiparesia esquerda, foi submetido a tratamento cirúrgico para retirada de
lesão expansiva localizada no lobo parietal direito – giloma cerebral. O autor apresenta
hemianopsia homônima esquerda – perda do campo visual esquerdo em decorrência de lesão
expansiva em lobo parietal direita. Conclusão: O periciando apresenta incapacidade total e
permanente para o trabalho.” Asseverou, ainda, que o estado de saúde é estável, por se tratar
de doença estática que acarretou sequela visual (resposta ao quesito nº 12 do autor). Por fim,
fixou a DII em 28.01.2009.
13 - Ainda que os primeiros laudos periciais não tenham constatado qualquer incapacidade, o
último exame constatou incapacidade total e definitiva devido à perda visual. Outrossim, se me
afigura pouco crível que, quem sempre trabalhou como motorista, contando, atualmente, com
mais de 67 (sessenta e sete) anos de idade, vá conseguir, após reabilitação, capacitação e
treinamento, recolocação profissional em outras funções.
14 - Reconhecida a incapacidade permanente para o trabalho, de rigor a concessão de
aposentadoria por invalidez, nos exatos termos do art. 42 da Lei 8.213/91.
15 - Acerca do termo inicial do benefício (DIB), firmou-se consenso na jurisprudência que este
se dá na data do requerimento administrativo, se houver, ou na data da citação, na sua
inexistência (Súmula 576 do STJ). Tendo em vista a persistência da incapacidade, quando da
cessação do auxílio-doença (NB: 534.430.661-6), de rigor a fixação da DIB da aposentadoria
por invalidez na data do seu cancelamento, já que desde a data de entrada do requerimento
(DER) até a sua cessação (01.07.2011), o autor efetivamente estava protegido pelo Sistema da
Seguridade Social, percebendo benefício previdenciário.
16 - Descabe o abatimento, sobre as parcelas devidas, do período em que o segurado manteve
vínculo empregatício ou verteu recolhimentos na condição de contribuinte individual. Ora,
havendo pretensão resistida e enquanto não acolhido o pleito do jurisdicionado, é óbvio que
outra alternativa não lhe resta, senão a de se sacrificar, inclusive com possibilidade de
agravamento da situação incapacitante, como única maneira de prover o próprio sustento. Isto
não configura má-fé e, muito menos, enriquecimento ilícito. A ocorrência denomina-se estado
de necessidade e nada mais é do que desdobramento dos direitos constitucionais à vida e
dignidade do ser humano. Realmente é intrigante a postura do INSS porque, ao que tudo indica,
pretende que o sustento do segurado fosse provido de forma divina, transferindo
responsabilidade sua para o incapacitado ou, então, para alguma entidade que deve reputar
sacra. Pugna pela responsabilização patrimonial daquele que teve seu direito violado,
necessitou de tutela jurisdicional para tê-lo reparado, viu sua legítima pretensão ser resistida até
o fim e teve de suportar o calvário processual.
17 - Premido a laborar, diante do direito vilipendiado e da necessidade de sobrevivência, com
recolhimentos ao RGPS, não se pode admitir a penalização do segurado com o desconto dos
valores do benefício devido no período em que perdurou o contrato de trabalho. Até porque,
nessas circunstâncias, tal raciocínio serviria de estímulo ao mercado informal de trabalho,
absolutamente censurável e ofensivo à dignidade do trabalhador, eis que completamente à
margem da fiscalização estatal, o que implicaria, inclusive, em prejuízo ao erário e ao custeio do
regime.
18 - A confirmar tal entendimento, o Colendo Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso
representativo de controvérsia repetitiva (REsp nº 1.786.590/SP, Relator Ministro Herman
Benjamin, 1ª Seção, j. 24/06/2020, DJe 01/07/2020), fixou a “Tese nº 1.013” com o seguinte
teor:“No período entre o indeferimento administrativo e a efetiva implantação de auxílio-doença
ou de aposentadoria por invalidez, mediante decisão judicial, o segurado do RPGS tem direito
ao recebimento conjunto das rendas do trabalho exercido, ainda que incompatível com sua
incapacidade laboral, e do respectivo benefício previdenciário pago retroativamente.".
19 - Correção monetária dos valores em atraso calculada de acordo com o Manual de
Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº
11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a
sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação
do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
20 - Juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, fixados de acordo com o
Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as
determinações legais e a jurisprudência dominante.
21 - Apelação do INSS desprovida. Apelação adesiva da parte autora provida. Alteração dos
critérios de aplicação da correção monetária e dos juros de mora de ofício. Sentença reformada
em parte.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a preliminar,negar provimento à apelação do INSS, dar provimento
à apelação do autor, para condenar o INSS no pagamento dos atrasados de aposentadoria por
invalidez, desde a data da cessação do auxílio-doença pretérito, em 01.07.2011 e, de ofício,
estabelecer que a correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo
com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a
promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada pelos índices de variação do
IPCA-E, e que os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, serão fixados
de acordo com o mesmo Manual, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
