Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5247188-07.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal CARLOS EDUARDO DELGADO
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
10/12/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 20/12/2021
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. SÚMULA 490, STJ.
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE
SEGURADO E CARÊNCIA DEMONSTRADAS. ART. 15, I, LEI 8.213/91. LAUDO MÉDICO.
INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. VISÃO MONOCULAR. RISCO DE CEGUEIRA COMPLETA.
IDADE RELATIVAMENTE AVANÇADA. RURÍCOLA. ANALFABETO. INVIABILIDADE DE
PROCESSO REABILITATÓRIO. ANÁLISE DO CONTEXTO SOCIOECONÔMICO E HISTÓRICO
LABORAL. SÚMULA 47, TNU. PRECEDENTE DO STJ. INCAPACIDADE ABSOLUTA E
PERMANENTE CONFIGURADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA.
AFASTAMENTO DA ALTA PROGRAMADA. ART. 47, LEI 8.213/91. INAPLICABILIDADE IN
CASU. REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDA E DESPROVIDA. APELAÇÃO DO INSS
DESPROVIDA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
1 - Cabimento da remessa necessária no presente caso. A sentença submetida à apreciação
desta Corte foi proferida em 23.10.2018, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de
2015. No caso, houve condenação do INSS na manutenção da aposentadoria por invalidez para
além da data prevista para seu cancelamento administrativo (10.10.2019).
2 - Ante a inequívoca iliquidez do decisum (inexiste qualquer condenação no pagamento de
valores em atraso), cabível a remessa necessária, nos termos da Súmula 490 do STJ.
3 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
4 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de
auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
5 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o tempo
supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou ocupação
habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
6 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado que,
após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
7 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
8 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do art.
15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses o
lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte) meses,
sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º estabelece
que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12 (doze) meses
para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo registro no órgão
próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
9 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
10 - Os requisitos qualidade de segurado e carência restam incontroversos, na medida em que o
autor vinha recebendo aposentadoria por invalidez até a data do ajuizamento da ação
(17.07.2018), e, nos termos do art. 15, I, da Lei 8.213/91, “mantém a qualidade de segurado,
independentemente de contribuições: sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício”.
Tinha-se ciência, inclusive, de que a benesse perduraria ao menos até 10.10.2019, com redução
progressiva do seu valor mensal, na forma do art. 47 da Lei 8.213/91. Em verdade, o que se
discute nos autos é se esta alta programada é legítima.
11 - O profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em exame realizado em 23 de
agosto de 2018, quando o demandante possuía 50 (cinquenta) anos, consignou o seguinte: “O
requerente comprovou através de relatórios médicos o diagnóstico de glaucoma. Em decorrência
de sua doença, o requerente perdeu o olho direito e vem apresentando agravamento na visão do
olho esquerdo (...) Segundo relatório juntado às fls 20 do processo, o requerente apresenta
glaucoma em olho esquerdo e passou por cirurgia em Abril de 2018 (tabelectomia). A acuidade
visual do olho esquerdo, apesar da doença, estava normal (20/25). O requerente ainda vai passar
por novo procedimento cirúrgico no olho esquerdo. Assim, o quadro atual do requerente leva a
limitações para suas atividades laborais habituais. Apesar da doença do requerente ser incurável,
pode ter melhora com o tratamento cirúrgico, sendo assim sua incapacidade é temporária.
Podemos definir a data da incapacidade como sendo Abril de 2018 (data da cirurgia anterior) (...)
Sugere-se 180 dias de afastamento a partir da data desta perícia”.
12 - Ainda que o laudo tenha apontado pelo impedimento temporário do autor, se afigura pouco
crível que, quem sempre trabalhou na lide campesina (CTPS), com perda da visão do olho direito
e riscos de perder a do esquerdo, contando, atualmente, com quase 55 (cinquenta e cinco) anos
de idade, e analfabeto, vá conseguir retornar a seu mister habitual, ou mesmo após reabilitação,
capacitação e treinamento, recolocação em outras funções.
13 - Alie-se, como elemento de convicção, o fato de que há quase 10 (dez) anos encontra-se
afastado do mercado de trabalho, em virtude da percepção de benefício por incapacidade, de
modo que, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece
no dia a dia (art. 375, CPC), é mesmo de se concluir pelo seu impedimento total e definitivo.
14 - Como bem sintetizou o magistrado sentenciante, “não se pode acreditar, assim, que ele
tenha condições de se reinserir no mercado de trabalho, ou mesmo voltar a exercer a atividade
rural (para a qual é essencial a visão), de modo que o considero total e definitivamente
incapacitado para o trabalho para além de 10.10.2019”.
15 - Dessa forma, tem-se que o demandante é incapaz e totalmente insusceptível de reabilitação
para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência ou mesmo de retorno a sua atividade
costumeira, sobretudo, em virtude do seu contexto socioeconômico, histórico laboral e da
patologia de que é portador, o que enseja a manutenção da aposentadoria por invalidez para
além de 10.10.2019, restando, portanto, afastada a alta programada administrativa fixada para
este momento.
16 - Análise do contexto social e econômico, com base na Súmula 47 da Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais e da jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça: STJ - AgRg no Ag: 1270388 PR 2010/0010566-9, Relator: Ministro JORGE MUSSI, Data
de Julgamento: 29/04/2010, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2010.
17 - Remessa necessária conhecida e desprovida. Apelação do INSS desprovida. Manutenção da
sentença. Ação julgada procedente.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5247188-07.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EVERALDO VIEIRA DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: TAIS MARIA HELLU FALEIROS - SP229306-N, MARCELA
CRISTINA NASCIMENTO LEITE TORRES - SP307749-N
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5247188-07.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EVERALDO VIEIRA DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: TAIS MARIA HELLU FALEIROS - SP229306-N, MARCELA
CRISTINA NASCIMENTO LEITE TORRES - SP307749-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
Trata-se de apelação interposta pelo INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, em
ação ajuizada por EVERALDO VIEIRA DA SILVA, objetivando o restabelecimento de
aposentadoria por invalidez em sua integralidade, com o consequente afastamento da alta
programada prevista e do regime de redução de valores do art. 47 da Lei 8.213/91.
A r. sentença julgou procedente o pedido, condenando o INSS a manter a aposentadoria por
invalidez para além de 10.10.2019, data da alta programada (ID 32760615). Condenou o INSS,
ainda, no pagamento de honorários advocatícios, arbitrados em R$1.000,00 (mil reais) (ID
32760756).
Em razões recursais, o INSS pugna pela reforma da sentença, ao fundamento de que a prova
médica constatou apenas o impedimento temporário do requerente, devendo-lhe ser concedido
auxílio-doença e não aposentadoria por invalidez. Assim, no seu entender, se mostrou acertado
o cancelamento previsto para a última benesse (ID 32760776).
O demandante apresentou contrarrazões (ID 32760825).
Devidamente processado o recurso, foram os autos remetidos a este Tribunal Regional Federal.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região7ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5247188-07.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 25 - DES. FED. CARLOS DELGADO
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: EVERALDO VIEIRA DA SILVA
Advogados do(a) APELADO: TAIS MARIA HELLU FALEIROS - SP229306-N, MARCELA
CRISTINA NASCIMENTO LEITE TORRES - SP307749-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O EXCELENTÍSSIMO SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL CARLOS DELGADO
(RELATOR):
De início, destaco o cabimento da remessa necessária no presente caso.
A sentença submetida à apreciação desta Corte foi proferida em 23.10.2018, sob a égide,
portanto, do Código de Processo Civil de 2015.
De acordo com o artigo 496, §3º do CPC/2015:
"Art. 496. Está sujeita ao duplo grau de jurisdição, não produzindo efeito senão depois de
confirmada pelo tribunal, a sentença:
I - proferida contra a União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suas respectivas
autarquias e fundações de direito público;
II - que julgar procedentes, no todo ou em parte, os embargos à execução fiscal.
§ 1º Nos casos previstos neste artigo, não interposta a apelação no prazo legal, o juiz ordenará
a remessa dos autos ao tribunal, e, se não o fizer, o presidente do respectivo tribunal avocá-los-
á.
§ 2º Em qualquer dos casos referidos no § 1o, o tribunal julgará a remessa necessária.
§ 3º Não se aplica o disposto neste artigo quando a condenação ou o proveito econômico
obtido na causa for de valor certo e líquido inferior a:
I - 1.000 (mil) salários-mínimos para a União e as respectivas autarquias e fundações de direito
público;
II - 500 (quinhentos) salários-mínimos para os Estados, o Distrito Federal, as respectivas
autarquias e fundações de direito público e os Municípios que constituam capitais dos Estados;
III - 100 (cem) salários-mínimos para todos os demais Municípios e respectivas autarquias e
fundações de direito público.
§ 4º Também não se aplica o disposto neste artigo quando a sentença estiver fundada em:
I - súmula de tribunal superior;
II - acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Federal ou pelo Superior Tribunal de Justiça em
julgamento de recursos repetitivos;
III - entendimento firmado em incidente de resolução de demandas repetitivas ou de assunção
de competência;
IV - entendimento coincidente com orientação vinculante firmada no âmbito administrativo do
próprio ente público, consolidada em manifestação, parecer ou súmula administrativa" (grifos
nossos).
No caso, houve condenação do INSS na manutenção da aposentadoria por invalidez para além
da data prevista para seu cancelamento administrativo (10.10.2019 - ID 32760615).
Ante a inequívoca iliquidez do decisum (inexiste qualquer condenação no pagamento de valores
em atraso), cabível a remessa necessária, nos termos da Súmula 490 do STJ.
Passo à análise do mérito.
A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de aposentadoria
por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de carência mínimo
exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo de auxílio-doença,
for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da atividade que lhe
garanta a subsistência.
Ao passo que o auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o
caso, o tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
No entanto, independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de
acidente de qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao
segurado que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das
moléstias elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
Cumpre salientar que, a patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no
Regime não impede o deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão
ou agravamento da moléstia.
Ademais, é necessário, para o implemento dos beneplácitos em tela, revestir-se do atributo de
segurado, cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar
todos os direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina
denominou "período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos
termos do art. 15 da Lei de Benefícios.
É de se observar, ainda, que o §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado.
Por sua vez, o § 2º estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será
acrescido de 12 (doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa
situação pelo registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
Por fim, saliente-se que, havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar,
a partir da nova filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas
para o cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-
doença e aposentadoria por invalidez.
Do caso concreto.
Os requisitos qualidade de segurado e carência restam incontroversos, na medida em que o
autor vinha recebendo aposentadoria por invalidez até a data do ajuizamento da ação
(17.07.2018), e, nos termos do art. 15, I, da Lei 8.213/91, “mantém a qualidade de segurado,
independentemente de contribuições: sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício”.
Tinha-se ciência, inclusive, de que a benesse perduraria ao menos até 10.10.2019, com
redução progressiva do seu valor mensal, na forma do art. 47 da Lei 8.213/91. Em verdade, o
que se discute nos autos é se esta alta programada é legítima.
O profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em exame realizado em 23 de
agosto de 2018 (ID 32760715), quando o demandante possuía 50 (cinquenta) anos, consignou
o seguinte:
“O requerente comprovou através de relatórios médicos o diagnóstico de glaucoma. Em
decorrência de sua doença, o requerente perdeu o olho direito e vem apresentando
agravamento na visão do olho esquerdo
(...)
Segundo relatório juntado às fls 20 do processo, o requerente apresenta glaucoma em olho
esquerdo e passou por cirurgia em Abril de 2018 (tabelectomia). A acuidade visual do olho
esquerdo, apesar da doença, estava normal (20/25). O requerente ainda vai passar por novo
procedimento cirúrgico no olho esquerdo.
Assim, o quadro atual do requerente leva a limitações para suas atividades laborais habituais.
Apesar da doença do requerente ser incurável, pode ter melhora com o tratamento cirúrgico,
sendo assim sua incapacidade é temporária. Podemos definir a data da incapacidade como
sendo Abril de 2018 (data da cirurgia anterior)
(...)
Sugere-se 180 dias de afastamento a partir da data desta perícia”.
Ainda que o laudo tenha apontado pelo impedimento temporário do autor, se me afigura pouco
crível que, quem sempre trabalhou na lide campesina (CTPS - ID’s 32760707 e 32760711), com
perda da visão do olho direito e riscos de perder a do esquerdo, contando, atualmente, com
quase 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, e analfabeto, vá conseguir retornar a seu mister
habitual, ou mesmo após reabilitação, capacitação e treinamento, recolocação em outras
funções.
Alie-se, como elemento de convicção, o fato de que há quase 10 (dez) anos encontra-se
afastado do mercado de trabalho, em virtude da percepção de benefício por incapacidade, de
modo que, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece
no dia a dia (art. 375, CPC), é mesmo de se concluir pelo seu impedimento total e definitivo.
Como bem sintetizou o magistrado sentenciante, “não se pode acreditar, assim, que ele tenha
condições de se reinserir no mercado de trabalho, ou mesmo voltar a exercer a atividade rural
(para a qual é essencial a visão), de modo que o considero total e definitivamente incapacitado
para o trabalho para além de 10.10.2019” (ID 32760756, p. 03).
Nessa senda, cumpre transcrever ainda o enunciado da Súmula 47, da TNU - Turma Nacional
de Uniformização dos Juizados Especiais Federais:
"Uma vez reconhecida a incapacidade parcial para o trabalho, o juiz deve analisar as condições
pessoais e sociais do segurado para a concessão de aposentadoria por invalidez".
Corroborado pela jurisprudência do Colendo Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. REQUISITOS. REEXAME. PROVA.
IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA N. 7/STJ. 1. Segundo a jurisprudência deste Colegiado, é
possível a verificação do contexto socioeconômico do segurado com a finalidade de concessão
da aposentadoria por invalidez sem ofensa à norma do art. 42 da Lei de Benefícios. 2. A
inversão do decidido pelas instâncias ordinária demanda o revolvimento do contexto fático dos
autos e desafia a Súmula n. 7/STJ. Precedente da egrégia Terceira Seção. 3. Agravo
regimental improvido. (STJ - AgRg no Ag: 1270388 PR 2010/0010566-9, Relator: Ministro
JORGE MUSSI, Data de Julgamento: 29/04/2010, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação:
DJe 24/05/2010)".
Dessa forma, tenho que o demandante é incapaz e totalmente insusceptível de reabilitação
para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência ou mesmo de retorno a sua
atividade costumeira, sobretudo, em virtude do seu contexto socioeconômico, histórico laboral e
da patologia de que é portador, o que enseja a manutenção da aposentadoria por invalidez para
além de 10.10.2019, restando, portanto, afastada a alta programada administrativa fixada para
este momento.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, esta última tida
por interposta, mantendo hígida a r. sentença de 1º grau de jurisdição.
É como voto.
E M E N T A
PROCESSUAL CIVIL. SENTENÇA SUJEITA À REMESSA NECESSÁRIA. SÚMULA 490, STJ.
PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-DOENÇA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ. QUALIDADE DE
SEGURADO E CARÊNCIA DEMONSTRADAS. ART. 15, I, LEI 8.213/91. LAUDO MÉDICO.
INCAPACIDADE TEMPORÁRIA. VISÃO MONOCULAR. RISCO DE CEGUEIRA COMPLETA.
IDADE RELATIVAMENTE AVANÇADA. RURÍCOLA. ANALFABETO. INVIABILIDADE DE
PROCESSO REABILITATÓRIO. ANÁLISE DO CONTEXTO SOCIOECONÔMICO E
HISTÓRICO LABORAL. SÚMULA 47, TNU. PRECEDENTE DO STJ. INCAPACIDADE
ABSOLUTA E PERMANENTE CONFIGURADA. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ DEVIDA.
AFASTAMENTO DA ALTA PROGRAMADA. ART. 47, LEI 8.213/91. INAPLICABILIDADE IN
CASU. REMESSA NECESSÁRIA CONHECIDA E DESPROVIDA. APELAÇÃO DO INSS
DESPROVIDA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. AÇÃO JULGADA PROCEDENTE.
1 - Cabimento da remessa necessária no presente caso. A sentença submetida à apreciação
desta Corte foi proferida em 23.10.2018, sob a égide, portanto, do Código de Processo Civil de
2015. No caso, houve condenação do INSS na manutenção da aposentadoria por invalidez
para além da data prevista para seu cancelamento administrativo (10.10.2019).
2 - Ante a inequívoca iliquidez do decisum (inexiste qualquer condenação no pagamento de
valores em atraso), cabível a remessa necessária, nos termos da Súmula 490 do STJ.
3 - A cobertura da incapacidade está assegurada no art. 201, I, da Constituição Federal.
4 - Preconiza a Lei nº 8.213/91, nos arts. 42 a 47, que o benefício previdenciário de
aposentadoria por invalidez será devido ao segurado que, cumprido, em regra, o período de
carência mínimo exigido, qual seja, 12 (doze) contribuições mensais, estando ou não em gozo
de auxílio-doença, for considerado incapaz e insusceptível de reabilitação para o exercício da
atividade que lhe garanta a subsistência.
5 - O auxílio-doença é direito daquele filiado à Previdência que tiver atingido, se o caso, o
tempo supramencionado, e for considerado temporariamente inapto para o seu labor ou
ocupação habitual, por mais de 15 (quinze) dias consecutivos (arts. 59 a 63 da legis).
6 - Independe de carência a concessão dos referidos benefícios nas hipóteses de acidente de
qualquer natureza ou causa e de doença profissional ou do trabalho, bem como ao segurado
que, após filiar-se ao Regime Geral da Previdência Social - RGPS, for acometido das moléstias
elencadas taxativamente no art. 151 da Lei 8.213/91.
7 - A patologia ou a lesão que já portara o trabalhador ao ingressar no Regime não impede o
deferimento dos benefícios, se tiver decorrida a inaptidão por progressão ou agravamento da
moléstia.
8 - Para o implemento dos beneplácitos em tela, necessário revestir-se do atributo de segurado,
cuja mantença se dá, mesmo sem recolher as contribuições, àquele que conservar todos os
direitos perante a Previdência Social durante um lapso variável, a que a doutrina denominou
"período de graça", conforme o tipo de filiado e a situação em que se encontra, nos termos do
art. 15 da Lei de Benefícios. O §1º do artigo em questão prorroga por 24 (vinte e quatro) meses
o lapso de graça constante no inciso II aos que contribuíram por mais de 120 (cento e vinte)
meses, sem interrupção que acarrete a perda da qualidade de segurado. Por sua vez, o § 2º
estabelece que o denominado "período de graça" do inciso II ou do § 1º será acrescido de 12
(doze) meses para o segurado desempregado, desde que comprovada essa situação pelo
registro no órgão próprio do Ministério do Trabalho e da Previdência Social.
9 - Havendo a perda da mencionada qualidade, o segurado deverá contar, a partir da nova
filiação à Previdência Social, com um número mínimo de contribuições exigidas para o
cumprimento da carência estabelecida para a concessão dos benefícios de auxílio-doença e
aposentadoria por invalidez.
10 - Os requisitos qualidade de segurado e carência restam incontroversos, na medida em que
o autor vinha recebendo aposentadoria por invalidez até a data do ajuizamento da ação
(17.07.2018), e, nos termos do art. 15, I, da Lei 8.213/91, “mantém a qualidade de segurado,
independentemente de contribuições: sem limite de prazo, quem está em gozo de benefício”.
Tinha-se ciência, inclusive, de que a benesse perduraria ao menos até 10.10.2019, com
redução progressiva do seu valor mensal, na forma do art. 47 da Lei 8.213/91. Em verdade, o
que se discute nos autos é se esta alta programada é legítima.
11 - O profissional médico indicado pelo Juízo a quo, com base em exame realizado em 23 de
agosto de 2018, quando o demandante possuía 50 (cinquenta) anos, consignou o seguinte: “O
requerente comprovou através de relatórios médicos o diagnóstico de glaucoma. Em
decorrência de sua doença, o requerente perdeu o olho direito e vem apresentando
agravamento na visão do olho esquerdo (...) Segundo relatório juntado às fls 20 do processo, o
requerente apresenta glaucoma em olho esquerdo e passou por cirurgia em Abril de 2018
(tabelectomia). A acuidade visual do olho esquerdo, apesar da doença, estava normal (20/25).
O requerente ainda vai passar por novo procedimento cirúrgico no olho esquerdo. Assim, o
quadro atual do requerente leva a limitações para suas atividades laborais habituais. Apesar da
doença do requerente ser incurável, pode ter melhora com o tratamento cirúrgico, sendo assim
sua incapacidade é temporária. Podemos definir a data da incapacidade como sendo Abril de
2018 (data da cirurgia anterior) (...) Sugere-se 180 dias de afastamento a partir da data desta
perícia”.
12 - Ainda que o laudo tenha apontado pelo impedimento temporário do autor, se afigura pouco
crível que, quem sempre trabalhou na lide campesina (CTPS), com perda da visão do olho
direito e riscos de perder a do esquerdo, contando, atualmente, com quase 55 (cinquenta e
cinco) anos de idade, e analfabeto, vá conseguir retornar a seu mister habitual, ou mesmo após
reabilitação, capacitação e treinamento, recolocação em outras funções.
13 - Alie-se, como elemento de convicção, o fato de que há quase 10 (dez) anos encontra-se
afastado do mercado de trabalho, em virtude da percepção de benefício por incapacidade, de
modo que, à luz das máximas da experiência, subministradas pelo que ordinariamente acontece
no dia a dia (art. 375, CPC), é mesmo de se concluir pelo seu impedimento total e definitivo.
14 - Como bem sintetizou o magistrado sentenciante, “não se pode acreditar, assim, que ele
tenha condições de se reinserir no mercado de trabalho, ou mesmo voltar a exercer a atividade
rural (para a qual é essencial a visão), de modo que o considero total e definitivamente
incapacitado para o trabalho para além de 10.10.2019”.
15 - Dessa forma, tem-se que o demandante é incapaz e totalmente insusceptível de
reabilitação para o exercício da atividade que lhe garanta a subsistência ou mesmo de retorno a
sua atividade costumeira, sobretudo, em virtude do seu contexto socioeconômico, histórico
laboral e da patologia de que é portador, o que enseja a manutenção da aposentadoria por
invalidez para além de 10.10.2019, restando, portanto, afastada a alta programada
administrativa fixada para este momento.
16 - Análise do contexto social e econômico, com base na Súmula 47 da Turma Nacional de
Uniformização dos Juizados Especiais Federais e da jurisprudência do Superior Tribunal de
Justiça: STJ - AgRg no Ag: 1270388 PR 2010/0010566-9, Relator: Ministro JORGE MUSSI,
Data de Julgamento: 29/04/2010, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 24/05/2010.
17 - Remessa necessária conhecida e desprovida. Apelação do INSS desprovida. Manutenção
da sentença. Ação julgada procedente. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação do INSS e à remessa necessária, esta
última tida por interposta, mantendo hígida a r. sentença de 1º grau de jurisdição, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
