Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5919872-75.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
06/02/2020
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 10/02/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E/OU AUXÍLIO
DOENÇA. PRELIMINAR. FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.
RECURSO PREJUDICADO NO MÉRITO. REVOGADA A TUTELA ANTECIPADA. DEVOLUÇÃO
DOS VALORES DA TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. JUÍZO DA EXECUÇÃO.
CONSECTÁRIOS.
- Ação ajuizada em janeiro de 2018, sem demonstração de prévio requerimento administrativo,
buscando a conversão do benefício de auxílio doença em aposentadoria por invalidez, sendo
inaplicável a regra de transição do RE 631.240/MG.
- Ausência de interesse processual, nos termos da atual jurisprudência do C. STF. Extinção do
feito sem resolução de mérito.
- Revogação da antecipação dos efeitos da tutela.
- A devolução dos valores recebidos a título de tutela antecipada revogada deve ser decidida pelo
juízo da execução. Artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015 e Julgamento do Tema 692,
pelo C. STJ.
- Honorários advocatícios fixados em conformidade com o §8º do art. 85 do CPC/2015.
- Preliminar acolhida. Apelação do INSS prejudicada no mérito.
Acórdao
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5919872-75.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ANTONIO FERNANDES
Advogados do(a) APELADO: MATHEUS GUSTAVO ALAN CHAVES - SP300821-N, ANTONIO
MANOEL RAMOS JUNIOR - SP308568-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5919872-75.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ANTONIO FERNANDES
Advogados do(a) APELADO: MATHEUS GUSTAVO ALAN CHAVES - SP300821-N, ANTONIO
MANOEL RAMOS JUNIOR - SP308568-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação interposta em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO
SEGURO SOCIAL - INSS, objetivando a conversão do benefício de auxílio doença em
aposentadoria por invalidez.
A r. sentença, proferida 16.10.2018, julgou parcialmente procedente o pedido e condenou o INSS
a conceder o benefício de auxílio doença, a partir da data da sentença (16.10.2018), pelo período
de 12 (doze) meses, a contar da data da sentença. Condenou o INSS, ainda, ao pagamento da
verba honorária, arbitrada em R$ 1.500,00. Tutela antecipada concedida. Sem remessa oficial.
(ID 84605855).
Em suas razões recursais, o INSS requer, preliminarmente, a extinção do processo sem
julgamento do mérito, pela falta de carência de ação da parte autora, em razão da inexistência de
requerimento administrativo, com demonstração da pretensão resistida. Pede também o
reconhecimento da prescrição quinquenal. No mérito, pugna pela improcedência do pedido, ao
argumento da ausência de comprovação da qualidade de segurado e carência no momento do
risco social. Eventualmente, requer a isenção das custas processuais. Por fim, suscita o
prequestionamento legal para fins de interposição de recursos. (ID 84605861).
Com contrarrazões (ID 84605867), subiram os autos a este Eg. Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5919872-75.2019.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JOSE ANTONIO FERNANDES
Advogados do(a) APELADO: MATHEUS GUSTAVO ALAN CHAVES - SP300821-N, ANTONIO
MANOEL RAMOS JUNIOR - SP308568-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passo ao exame da
matéria objeto de devolução.
INTERESSE DE AGIR
A Carta Magna de 1988, em seu art. 5º, XXXV, insculpe o princípio da universalidade da
jurisdição, ao assegurar ao jurisdicionado a faculdade de postular em Juízo sem percorrer,
previamente, a instância administrativa.
O extinto Tribunal Federal de Recursos, após reiteradas decisões sobre o tema, editou a Súmula
nº 213, com o seguinte teor:
"O exaurimento da via administrativa não é condição para a propositura de ação de natureza
previdenciária."
Trilhando a mesma senda, esta Corte trouxe à lume a Súmula nº 09, que ora transcrevo:
"Em matéria previdenciária, torna-se desnecessário o prévio exaurimento da via administrativa,
como condição de ajuizamento da ação."
Nota-se que a expressão exaurimento consubstancia-se no esgotamento de recursos por parte
do segurado junto à Administração, o que significa que, ao postular a concessão ou revisão de
seu benefício, o requerente não precisa se utilizar de todos os meios existentes na seara
administrativa antes de recorrer ao Poder Judiciário. Porém, na ausência, sequer, de pedido
administrativo, não resta aperfeiçoada a lide, vale dizer, inexiste pretensão resistida que justifique
a tutela jurisdicional e, por consequência, o interesse de agir.
É bem verdade que, nos casos de requerimento de benefício previdenciário, a prática tem
demonstrado que a Autarquia Previdenciária, por meio de seus agentes, por vezes, ao se negar a
protocolizar os pedidos, sob o fundamento de ausência de direito ou de insuficiência de
documentos, fere o direito de petição aos órgãos públicos (art. 5º, XXXIV, "a", CF e art. 105 da
Lei 8.213/91). Mas, não é menos verdade que muitas vezes os pedidos são rapidamente
analisados, cumprindo o INSS com o seu dever institucional.
Por isso, correto determinar a comprovação do prévio requerimento na via administrativa, pois
incumbe ao INSS analisar,prima facie, os pleitos de natureza previdenciária, e não ao Poder
Judiciário, o qual deve agir quando a pretensão do segurado for resistida ou na ausência de
decisão por parte da Autarquia, legitimando o interessado ao exercício daactio.
Aceitar que o Juiz, investido na função estatal de dirimir conflitos, substitua o INSS em seu múnus
administrativo, significa permitir seja violado o princípio constitucional da separação dos poderes,
insculpido no art. 2º daLex Major,pois, embora os mesmos sejam harmônicos, são, igualmente,
independentes, devendo cada qual zelar por sua função típica que o ordenamento constitucional
lhes outorgou.
Tanto isso é verdade que o próprio legislador, quando da edição da Lei nº 8.213/91, concedeu à
autoridade administrativa, em seu art. 41, § 6º, o prazo de 45 (quarenta e cinco) dias para efetuar
o pagamento da primeira renda mensal do benefício, após a apresentação da documentação
necessária por parte do segurado. Na ausência de apreciação por parte da Autarquia ou se o
pleito for indeferido, aí sim, surgirá o interesse de agir, condição necessária à propositura de ação
judicial.
Entender de maneira diversa equivale, a um só tempo, em contribuir para a morosidade do Poder
Judiciário, devido ao acúmulo de um sem-número de ações e prejudicar a vida do segurado que,
tendo direito ao benefício, aguardará por anos a fio o deslinde final de sua causa, onerando,
inclusive, os cofres do INSS com o pagamento de prestações atrasadas e respectivas verbas
acessórias decorrentes de condenação judicial.
Por fim, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, em recente julgamento de Recurso
Extraordinário, sob regime de Repercussão Geral, pronunciou-se quanto à matéria, inclusive
modulando os efeitos da decisão:
"RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL.PRÉVIO REQUERIMENTO
ADMINISTRATIVOE INTERESSE EM AGIR.
1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art.
5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver
necessidade de ir a juízo.
2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se
caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou
se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio
requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas.
3. A exigência deprévio requerimento administrativonão deve prevalecer quando o entendimento
da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado.
4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício
anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação
mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender
da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez
que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da
pretensão.
5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo
Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em
curso, nos termos a seguir expostos.
6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que
tenha havidoprévio requerimento administrativonas hipóteses em que exigível, será observado o
seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de
anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha
apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à
pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas,
observando-se a sistemática a seguir.
7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30
dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será
intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia
deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for
acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis
ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir
e o feito deverá prosseguir.
8. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial
deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para
todos os efeitos legais.
9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para
determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega
ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de
extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias,
colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada
do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será
comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir.
(R.E. 631.240/MG - Relator: Min. Luis Roberto Barroso - Data do Julgamento: 03/09/2014 - Data
da Publicação: 10/11/2014).
DO CASO DOS AUTOS
Da análise dos autos, verifica-se que a parte autora ajuizou a demanda em 12.01.2018 (consulta
processual), buscando a conversão do benefício de auxílio doença em aposentadoria por
invalidez, e não juntou aos autos o comprovante de indeferimento e/ou deferimento do seu
requerimento administrativo de auxílio doença realizado antes do ingresso da ação.
Vale ressaltar que a sentença fixou o início do benefício na data da prolação da decisão
(16.10.2018), justamente pela ausência de requerimento administrativo, conforme segue:
“(...)
Como não houve comprovação de pedido administrativo, o benefício será devido a partir da data
dessa sentença.
(...)” (ID 84605855 – pág. 02).
De se observar que a solicitação, na via administrativa, de benefício de amparo social a pessoa
portadora de deficiência, requerido em 19.11.2013 (ID 84605847 e ID 84605848 – págs. 06 e 11),
não afasta a necessidade do prévio requerimento administrativo na modalidade do benefício ora
pleiteado, pois há exigência de requisitos legais distintos para ambos os benefícios.
Esclareça-se que à data do requerimento do LOAS (19.11.2013 - ID 84605847 e ID 84605848 –
págs. 06 e 11), o requerente ainda não comprovava a recuperação do requisito legal carência
(CNIS – ID 84605848 – págs. 02-07), situação fática só demonstrada a partir da sentença na
ação trabalhista n° 0002270-36.2013.5.15.0054 em 21.08.2014 (ID 84605853), quando o
demandante deveria ter protocolado seu requerimento administrativo do benefício de auxílio
doença a fim de comprovar a eventual resistência da sua pretensão.
Dessa forma, em razão de o ajuizamento da demanda haver ocorrido após a data de publicação
do julgamento proferido pelo STF no Recurso Extraordinário 631.240/MG, com repercussão geral
reconhecida (03.09.2014), é imprescindível a exigência da comprovação do prévio requerimento
administrativo, com demonstração da pretensão resistida, não havendo como se aplicar a regra
de transição nele referida, sendo de rigor a extinção do feito sem resolução de mérito por falta de
interesse de agir.
Prejudicada a apelação do INSS no mérito.
Por fim, tendo em vista a situação fática delineada nos autos, cabe a revogação da antecipação
dos efeitos da tutela.
DEVOLUÇÃO DOS VALORES RECEBIDOS POR FORÇA DE TUTELA ANTECIPADA
REVOGADA
No que tange àdevolução de valores, é de se atentar a superveniência do acolhimento da
questão de ordem nos REsp n. 1.734.627/SP, 1.734.641/SP, 1.734.647/SP, 1.734.656/SP,
1.734.685/SP e 1.734.698/SP, que deu ensejo ao reexame, pelo Superior Tribunal de Justiça, do
entendimento anteriormente firmado no julgamento do REsp 1.401.560/MT (Tema 692), no qual
se estabeleceu a possibilidade de devolução de valores recebidos pela parte autora do Regime
Geral da Previdência Social – RGPS, em virtude de decisão judicial precária, que venha a ser
posteriormente revogada.
Anote-se que foi determinada a suspensão, em todo o país, dos processos que discutem a
matéria, até que se decida pela aplicação, revisão ou distinção do Tema 692/STJ.
Considerando a revogação da tutela antecipada, assinalo que eventual devolução dos valores
recebidos a este título deverá ser analisada e decidida em sede de execução, nos termos do
artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015, e de acordo com o que restar decidido no
julgamento do Tema 692, pelo C. Superior Tribunal de Justiça.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Condeno a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios no valor de R$ 1.000,00, a teor
do disposto no art. 85, §8, do CPC/2015, observado os benefícios da Justiça Gratuita.
DISPOSITIVO
Ante o exposto, acolho a preliminar, para julgar extinto o processo, sem resolução de mérito, nos
termos do artigo 485, VI do CPC/2015, e, no mérito, julgo prejudicada a apelação do INSS,
observados os honorários advocatícios, nos termos da fundamentação. Tutela antecipada
revogada.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ E/OU AUXÍLIO
DOENÇA. PRELIMINAR. FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL. AUSÊNCIA DE
REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. EXTINÇÃO DO FEITO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.
RECURSO PREJUDICADO NO MÉRITO. REVOGADA A TUTELA ANTECIPADA. DEVOLUÇÃO
DOS VALORES DA TUTELA ANTECIPADA REVOGADA. JUÍZO DA EXECUÇÃO.
CONSECTÁRIOS.
- Ação ajuizada em janeiro de 2018, sem demonstração de prévio requerimento administrativo,
buscando a conversão do benefício de auxílio doença em aposentadoria por invalidez, sendo
inaplicável a regra de transição do RE 631.240/MG.
- Ausência de interesse processual, nos termos da atual jurisprudência do C. STF. Extinção do
feito sem resolução de mérito.
- Revogação da antecipação dos efeitos da tutela.
- A devolução dos valores recebidos a título de tutela antecipada revogada deve ser decidida pelo
juízo da execução. Artigo 302, I, e parágrafo único, do CPC/2015 e Julgamento do Tema 692,
pelo C. STJ.
- Honorários advocatícios fixados em conformidade com o §8º do art. 85 do CPC/2015.
- Preliminar acolhida. Apelação do INSS prejudicada no mérito. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu acolher a preliminar, para julgar extinto o processo, sem resolução de
mérito, nos termos do artigo 485, VI do CPC/2015 e, no mérito, julgar prejudicada a apelação do
INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
