Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5293397-97.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal GILBERTO RODRIGUES JORDAN
Órgão Julgador
9ª Turma
Data do Julgamento
08/10/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 15/10/2020
Ementa
E M E N T A
PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N.
8.742/93 E 12.435/2011. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. PREENCHIMENTO DOS
REQUISITOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Muito embora o objeto da causa verse sobre matéria de direito e de fato, "in casu", prescinde de
realização de novo estudo social ou de eventual complementação, uma vez que existem provas
material e pericial suficientes para o deslinde da causa, não se configurando hipótese de
cerceamento de defesa ou de qualquer outra violação de ordem constitucional ou legal.
- Ademais, da análise do estudo social, produzido nos autos por profissional devidamente
registrado em Conselho de Classe (CRESS), verifico que o mesmo foi conduzido de maneira
adequada, com respostas às indagações propostas, dispensando qualquer outra
complementação, restando dispensável a apresentação de registros fotográficos da moradia da
requerente, tal como requer o INSS.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove
não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
- Na hipótese dos autos, a parte autora logrou demonstrar o preenchimento do requisito da
miserabilidade.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação do réu provida em parte.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Apelação da Autora desprovida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293397-97.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ERISLEIDE ALVES FEITOSA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: ANA ROSA RIBEIRO DE MOURA - SP205565-N
Advogado do(a) APELANTE: GUSTAVO AURELIO FAUSTINO - SP264663-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ERISLEIDE ALVES FEITOSA
Advogado do(a) APELADO: GUSTAVO AURELIO FAUSTINO - SP264663-N
Advogado do(a) APELADO: ANA ROSA RIBEIRO DE MOURA - SP205565-N
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293397-97.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
APELANTE: ERISLEIDE ALVES FEITOSA, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
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R E L A T Ó R I O
Trata-se de apelação em ação ajuizada em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO
SOCIAL - INSS, objetivando a concessão do benefício assistencial previsto no art. 203, V, da
Constituição Federal.
A r. sentença (id 138192669, integrada a id 138192683) julgou procedente a ação, para condenar
o INSS a conceder à parte autora o benefício assistencial, desde a data do início da incapacidade
fixada pelo perito judicial (28.02.2018), acrescido de honorários advocatícios fixados em 10%
sobre o valor da condenação.
Em razões recursais (id 131080852) argui o INSS nulidade da r. sentença, por carecer o estudo
social de informações necessárias ao julgamento da causa, como registros fotográficos do local
habitado pela parte autora, bem por ausência de qualificação de seus familiares.
No mérito, requer a reforma da r. sentença por entender não haver demonstrado a parte autora
padecer de miserabilidade.
No caso de manutenção da concessão do benefício, requer que os honorários advocatícios sejam
limitados a 10% das prestações vencidas até a prolação da sentença, nos termos da Súmula nº
111 do STJ.
Com contrarrazões da parte autora.
Apelação da parte autora (id 138192691) em que requer a alteração do termo inicial do benefício
para a data do requerimento administrativo.
Parecer do Ministério Público Federal (id 139433753) no sentido do desprovimento do apelo do
INSS e provimento da apelação da parte autora.
É o sucinto relato.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293397-97.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 33 - DES. FED. GILBERTO JORDAN
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INSS
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ERISLEIDE ALVES FEITOSA
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V O T O
Inicialmente, tempestivos os recursos e respeitados os demais pressupostos de admissibilidade
recursais, passo ao exame da matéria objeto de devolução.
PRELIMINAR DE NULIDADE DA R. SENTENÇA
Muito embora o objeto da causa verse sobre matéria de direito e de fato, "in casu", prescinde de
realização de novo estudo social ou de eventual complementação, uma vez que existem provas
material e pericial suficientes para o deslinde da causa, não se configurando hipótese de
cerceamento de defesa ou de qualquer outra violação de ordem constitucional ou legal.
Ademais, da análise do estudo social, produzido nos autos por profissional devidamente
registrado em Conselho de Classe (CRESS), verifico que o mesmo foi conduzido de maneira
adequada, com respostas às indagações propostas, dispensando qualquer outra
complementação, restando dispensável a apresentação de registros fotográficos da moradia da
requerente, tal como requer o INSS.
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL
No mérito, a República Federativa do Brasil, conforme disposto no art. 1º, III, da Constituição
Federal, tem como um de seus fundamentos a dignidade da pessoa humana que, segundo José
Afonso da Silva, consiste em:
"um valor supremo que atrai o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem, desde o
direito à vida. 'Concebido como referência constitucional unificadora de todos os direitos
fundamentais [observam Gomes Canotilho e Vital Moreira], o conceito de dignidade da pessoa
humana obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-
constitucional e não uma qualquer idéia apriorística do homem, não podendo reduzir-se o sentido
da dignidade humana à defesa dos direitos pessoais tradicionais, esquecendo-a nos casos de
direitos sociais, ou invocá-la para construir teoria do núcleo da personalidade individual,
ignorando-a quando se trate de garantir as bases da existência humana. Daí decorre que a ordem
econômica há de ter por fim assegurar a todos existência digna (art. 170), a ordem social visará a
realização da justiça social (art. 193), a educação, o desenvolvimento da pessoa e seu preparo
para o exercício da cidadania (art. 205) etc., não como meros enunciados formais, mas como
indicadores do conteúdo normativo eficaz da dignidade da pessoa humana.'"
(Curso de Direito Constitucional Positivo. 13ª ed., São Paulo: Malheiros, 1997, p. 106-107).
Para tornar efetivo este fundamento, diversos dispositivos foram contemplados na elaboração da
Carta Magna, dentre eles, o art. 7º, IV, que dispõe sobre as necessidades vitais básicas como
moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social
e o art. 203, IV, que instituiu o benefício do amparo social.
A Lei nº 6.179/74 instituiu, em nosso ordenamento jurídico, a renda mensal vitalícia, passando a
ser amparados pela Previdência Social os maiores de 70 anos e os inválidos, definitivamente
incapacitados para o trabalho, desde que não exercessem atividades remuneradas ou não
auferissem rendimentos. O valor do benefício correspondia à metade do maior salário-mínimo
vigente no país, arredondada para a unidade de cruzeiro imediatamente superior, não podendo
ultrapassar 60% do valor do salário-mínimo do local de pagamento.
Com a promulgação da Carta Magna, em 05 de outubro de 1988, o valor do benefício foi
aumentado para 1 (um) salário-mínimo, pelo art. 203, inciso V:
"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de
contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:
V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao
idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por
sua família, conforme dispuser a lei."
Entretanto, o supracitado inciso, por ser uma norma constitucional de eficácia limitada, dependia
da edição de uma norma posterior para produzir os seus efeitos.
O art. 139 da Lei n.º 8.213/91 dispunha que a renda mensal vitalícia continuaria integrando o
elenco de benefícios da Previdência Social, até que o artigo constitucional fosse regulamentado.
A Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, deu eficácia ao inciso V do art. 203 da Constituição
Federal e extinguiu a renda mensal vitalícia em seu art. 40, resguardando, entretanto, o direito
daqueles que o requeressem até o dia 31 de dezembro de 1995, desde que preenchidos os
requisitos previstos na Lei Previdenciária.
A Lei de Assistência foi regulamentada pelo Decreto nº 1.744, de 8 de dezembro de 1995,
posteriormente, pelo Decreto nº 6.214, de 26 de setembro de 2007.
O art. 20 da Lei assistencial e o art. 1º de seu decreto regulamentar estabeleceram os requisitos
para a concessão do benefício, quais sejam: ser o requerente portador de deficiência ou idoso,
com 70 anos ou mais e que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem
tê-la provida por sua família. A idade mínima de 70 anos foi reduzida para 67 anos, a partir de 1º
de janeiro de 1998, pelo art. 1º da Lei nº 9.720/98 e, posteriormente, para 65 anos, através do art.
34 da Lei nº 10.741 de 01 de outubro de 2003, mantida, inclusive, por ocasião da edição da Lei nº
12.435, de 6 de julho de 2011.
Os mesmos dispositivos legais disciplinaram o que consideram como pessoa portadora de
deficiência, família e ausência de condições de se manter ou de ser provido pela sua família.
Pessoa portadora de deficiência é a incapacitada para a vida independente e para o trabalho, em
decorrência de impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial,
os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na
sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas, na redação dada pela Lei nº
12.470, de 31 de agosto de 2011.
O impedimento de longo prazo, a seu turno, é aquele que produz seus efeitos pelo prazo mínimo
de 2 (dois) anos (§10º).
A incapacidade para a vida independente, por sua vez, não há que ser entendida como aquela
que impeça a execução de todos os atos da vida diária, para os quais se faria necessário o
auxílio permanente de terceiros, mas a impossibilidade de prover o seu sustento sem o amparo
de alguém.
Neste sentido, o entendimento do C. Superior Tribunal de Justiça, em julgado da lavra do Ministro
Relator Gilson Dipp (5ª Turma, REsp nº 360.202, 04.06.2002, DJU 01.07.2002, p. 377),
oportunidade em que se consignou: "O laudo pericial que atesta a incapacidade para a vida
laboral e a capacidade para a vida independente, pelo simples fato da pessoa não necessitar da
ajuda de outros para se alimentar, fazer sua higiene ou se vestir, não pode obstar a percepção do
benefício, pois, se esta fosse a conceituação de vida independente, o benefício de prestação
continuada só seria devido aos portadores de deficiência tal, que suprimisse a capacidade de
locomoção do indivíduo - o que não parece ser o intuito do legislador".
No que se refere à hipossuficiência econômica, de acordo com a Medida Provisória nº 1.473-34,
de 11.08.97, transformada na Lei nº 9.720, em 30.11.98, definiu-se o conceito de família como o
conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213/91, desde que vivendo sob o mesmo
teto. Com a superveniência da Lei nº 12.435/2011, fora estabelecido, expressamente para os fins
do art. 20, caput, da Lei assistencial, ser a família composta pelo requerente, cônjuge ou
companheiro, os pais e, na ausência de um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros,
os filhos e enteados solteiros e os menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto (art.
20, §1º).
Já no que diz respeito ao limite de ¼ do salário mínimo per capita como critério objetivo, anoto
que fora ajuizada a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.232-1/DF, pelo Procurador-Geral da
República, julgada improcedente pelo Supremo Tribunal Federal, que declarou a
constitucionalidade do §3º do art. 20 da Lei nº 8.742/93.
Os debates, entretanto, não cessaram, por ser tormentosa a questão e envolver princípios
fundamentais contidos na Carta da República, situação que culminou, inclusive, com o
reconhecimento, pelo mesmo STF, da ocorrência de repercussão geral.
A Suprema Corte acabou por declarar a inconstitucionalidade do referido dispositivo legal,
inclusive por considerar defasada essa forma meramente aritmética de se apreciar a situação de
miserabilidade dos idosos ou deficientes que visam a concessão do benefício assistencial
(Plenário, RCL 4374, j. 18.04.2013, DJE de 04/09/2013).
No entanto, é preciso que se tenha a possibilidade de ao menos entrever, a partir da renda
informada, eventual quadro de pobreza em função da situação específica de quem pleiteia o
benefício, até que o Poder Legislativo estabeleça novas regras.
Para tanto, faz-se necessário o revolvimento de todo o conjunto probatório, através do qual se
possa aferir eventual miserabilidade. E assim o é diante do princípio constitucional da dignidade
da pessoa humana, já mencionado no início desta decisão, com vistas à garantia de suas
necessidades básicas de subsistência, o que leva o julgador a interpretar a normação legal de
sorte a conceder proteção social ao cidadão economicamente vulnerável, tal como assentado no
REsp 1112557 julgado sob o rito do art. 543-C do CPC/73.
Confira-se:
RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ART. 105, III, ALÍNEA C DA CF. DIREITO
PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. POSSIBILIDADE DE DEMONSTRAÇÃO DA
CONDIÇÃO DE MISERABILIDADE DO BENEFICIÁRIO POR OUTROS MEIOS DE PROVA,
QUANDO A RENDA PER CAPITA DO NÚCLEO FAMILIAR FOR SUPERIOR A 1/4 DO SALÁRIO
MÍNIMO. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.
1. A CF/88 prevê em seu art. 203, caput e inciso V a garantia de um salário mínimo de benefício
mensal, independente de contribuição à Seguridade Social, à pessoa portadora de deficiência e
ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida
por sua família, conforme dispuser a lei.
2. Regulamentando o comando constitucional, a Lei 8.742/93, alterada pela Lei 9.720/98, dispõe
que será devida a concessão de benefício assistencial aos idosos e às pessoas portadoras de
deficiência que não possuam meios de prover à própria manutenção, ou cuja família possua
renda mensal per capita inferior a 1/4 (um quarto) do salário mínimo.
3. O egrégio Supremo Tribunal Federal, já declarou, por maioria de votos, a constitucionalidade
dessa limitação legal relativa ao requisito econômico, no julgamento da ADI 1.232/DF (Rel. para o
acórdão Min. NELSON JOBIM, DJU 1.6.2001).
4. Entretanto, diante do compromisso constitucional com a dignidade da pessoa humana,
especialmente no que se refere à garantia das condições básicas de subsistência física, esse
dispositivo deve ser interpretado de modo a amparar irrestritamente a o cidadão social e
economicamente vulnerável.
5. A limitação do valor da renda per capita familiar não deve ser considerada a única forma de se
comprovar que a pessoa não possui outros meios para prover a própria manutenção ou de tê-la
provida por sua família, pois é apenas um elemento objetivo para se aferir a necessidade, ou
seja, presume-se absolutamente a miserabilidade quando comprovada a renda per capita inferior
a 1/4 do salário mínimo.
6. Além disso, em âmbito judicial vige o princípio do livre convencimento motivado do Juiz (art.
131 do CPC) e não o sistema de tarifação legal de provas, motivo pelo qual essa delimitação do
valor da renda familiar per capita não deve ser tida como único meio de prova da condição de
miserabilidade do beneficiado. De fato, não se pode admitir a vinculação do Magistrado a
determinado elemento probatório, sob pena de cercear o seu direito de julgar.
7. Recurso Especial provido.
(REsp 1112557/MG, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, TERCEIRA SEÇÃO,
julgado em 28/10/2009, DJe 20/11/2009)
Por outro lado, observo que a Lei nº 12.470, de 31 de agosto de 2011, passou a considerar como
de "baixa renda" a família inscrita no Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal
cuja renda mensal seja de até 2 (dois) salários mínimos, ainda que para os fins específicos de
custeio ali limitado. Na mesma trilha, as Leis que criaram o Bolsa Família (10.836/04), Programa
Nacional de Acesso à Alimentação (10.689/03) e o Bolsa Escola (10.219/01) estabeleceram
parâmetros mais coerentes de renda familiar mínima quanto em cotejo com aquele estabelecido
de ¼ do salário mínimo, agora declarado inconstitucional.
Por fim, o Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE nº 580.963/PR (DJe 14.11.2013),
assentou a inconstitucionalidade por omissão do artigo 34, parágrafo único, do Estatuto do Idoso,
considerando a "inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de
deficiência em relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em
relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de até um salário mínimo."
Assim, entendo que deve ser excluído do cômputo da renda per capita o valor decorrente de
benefício de valor mínimo recebido por idoso ou inválido, pertencente ao núcleo familiar.
Nesse sentido, o C. Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 1355052, submetido ao
regimento do art. 543-C do CPC, assentou que não se computa o valor de um salário mínimo
percebido por idoso a título de beneficio assistencial ou previdenciário para aferição de
hipossuficiência de núcleo familiar.
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. CONCESSÃO DE
BENEFÍCIO ASSISTENCIAL PREVISTO NA LEI N. 8.742/93 A PESSOA COM DEFICIÊNCIA.
AFERIÇÃO DA HIPOSSUFICIÊNCIA DO NÚCLEO FAMILIAR. RENDA PER CAPITA.
IMPOSSIBILIDADE DE SE COMPUTAR PARA ESSE FIM O BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO, NO
VALOR DE UM SALÁRIO MÍNIMO, RECEBIDO POR IDOSO.
1. Recurso especial no qual se discute se o benefício previdenciário, recebido por idoso, no valor
de um salário mínimo, deve compor a renda familiar para fins de concessão ou não do benefício
de prestação mensal continuada a pessoa deficiente.
2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito
do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso
(Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com
deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário
mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n.
8.742/93.
3. Recurso especial provido. Acórdão submetido à sistemática do § 7º do art. 543-C do Código de
Processo Civil e dos arts. 5º, II, e 6º, da Resolução STJ n. 08/2008.
(REsp 1355052 /SP, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
25/02/2015, DJe 05/11/2015)
Feitas essas considerações, passo à análise do conjunto probatório formado nestes autos.
DO CASO DOS AUTOS
Saliento que deixo de analisar o preenchimento do requisito referente à deficiência, tendo em
vista que não foi objeto do apelo do INSS.
A ausência de condições da parte autora de prover o seu sustento, ou tê-lo provido pela família,
restou demonstrada.
O estudo social (id 138192646) informou que a parte autora vive sozinha, “em um cômodo cedido
pela sua irmã no quintal da sua casa”.
A renda familiar advém, exclusivamente, do “beneficio do programa Bolsa Família no valor de
R$91,00”.
Concluiu a Assistente Social que “a situação sócia econômica da autora é precária”.
Assim sendo, entendo que a parte autora está submetida a risco social, restando preenchido o
requisito da miserabilidade, sendo de rigor o acolhimento do pedido inicial, nos termos da r.
sentença.
Saliento que descabe o pedido do INSS quanto à qualificação e rendimentos do cunhado da
Autora, visto que não vive sob o mesmo teto da requerente, mas em construção independente
(apesar de no mesmo terreno), com família constituída com a irmã da mesma, não podendo ser
considerado membro de seu núcleo familiar, o que em nada alteraria a situação de miserabilidade
demonstrada.
No tocante à obrigação de prestar alimentos por parte dos familiares da Autora, que possui filhos
que não integram seu núcleo familiar, não reconheço eventual afastamento da responsabilidade
estatal, apesar de subsidiária, tendo em vista a ausência de notícia nos autos de possível
recebimento ou solicitação de prestação de tal natureza.
TERMO INICIAL
O dies a quo do benefício de prestação continuada deve corresponder à data em que a Autarquia
Previdenciária tomou conhecimento do direito da parte autora e se recusou a concedê-lo.
O laudo da perícia médica (id 138192625) fixou a data de inicio da incapacidade em 28.02.2018.
Tal data, inclusive, foi ratificada pelo senhor perito em complementação ao laudo (id 138192657 –
pág. ¾), em resposta à impugnação apresentada pela parte autora.
Do conjunto probatório dos autos, verifico que não há dados suficientes que demonstrem a
existência de deficiência quando do requerimento administrativo de 29.03.2017 (id 138192610).
Assim sendo, em vista da ausência de impugnação acerca do termo inicial pelo INSS em seu
apelo e em obediência ao princípio da non reformatio in pejus, proposta a presente ação em
19.10.2018, mantenho o termo inicial do benefício conforme fixado na r. sentença (28.02.2018 –
data de início da deficiência fixada pelo experto).
Ressalto que o laudo produzido nos autos de interdição acostado à inicial não tem o condão de
demonstrar, à época, o preenchimento do requisito da deficiência para a concessão de benefício
assistencial, visto que o INSS não foi parte naquele procedimento, bem como por tal instrumento
possuir finalidade totalmente diversa da tratada na presente demanda.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS
Com o advento do novo Código de Processo Civil, foram introduzidas profundas mudanças no
princípio da sucumbência, e em razão destas mudanças e sendo o caso de sentença ilíquida, a
fixação do percentual da verba honorária deverá ser definida somente na liquidação do julgado,
com observância ao disposto no inciso II, do § 4º c.c. § 11, ambos do artigo 85, do CPC/2015,
bem como o artigo 86, do mesmo diploma legal.
Os honorários advocatícios a teor da Súmula 111 do E. STJ incidem sobre as parcelas vencidas
até a sentença de procedência.
Ante o exposto, rejeito a matéria preliminar e, no mérito, nego provimento à apelação da parte
autora e dou parcial provimento ao apelo do INSS, para ajustar a verba honorária, na forma acima
fundamentada.
É o voto.
E M E N T A
PROCESSUAL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N.
8.742/93 E 12.435/2011. MATÉRIA PRELIMINAR REJEITADA. PREENCHIMENTO DOS
REQUISITOS LEGAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.
- Muito embora o objeto da causa verse sobre matéria de direito e de fato, "in casu", prescinde de
realização de novo estudo social ou de eventual complementação, uma vez que existem provas
material e pericial suficientes para o deslinde da causa, não se configurando hipótese de
cerceamento de defesa ou de qualquer outra violação de ordem constitucional ou legal.
- Ademais, da análise do estudo social, produzido nos autos por profissional devidamente
registrado em Conselho de Classe (CRESS), verifico que o mesmo foi conduzido de maneira
adequada, com respostas às indagações propostas, dispensando qualquer outra
complementação, restando dispensável a apresentação de registros fotográficos da moradia da
requerente, tal como requer o INSS.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove
não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
- Na hipótese dos autos, a parte autora logrou demonstrar o preenchimento do requisito da
miserabilidade.
- Os honorários advocatícios deverão ser fixados na liquidação do julgado, nos termos do inciso
II, do § 4º, c.c. §11, do artigo 85, do CPC/2015.
- Matéria preliminar rejeitada.
- Apelação do réu provida em parte.
- Apelação da Autora desprovida. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Nona Turma, por
unanimidade, decidiu rejeitar a matéria preliminar, negar provimento à apelação da Autora e dar
parcial provimento ao apelo do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
