Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5000865-45.2016.4.03.6114
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
12/05/2021
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 14/05/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO. PROVA
TESTEMUNHAL. DESNECESSIDADE.
I- O inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal dispõe que "aos litigantes, em processo judicial
ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes".
II- O princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o
direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar os
fatos que amparam o direito disputado em juízo. Segundo Eduardo Couture, "A lei instituidora de
uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de fazer valer seu
direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo de Oliveira;
Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e Internacional, vol.
62, p. 135, Jan/2008).
III- Não obstante os documentos acostados aos autos, é impositiva a anulação da sentença para
que seja produzida a prova pericial nas respectivas empregadoras ou em empresas similares,
caso as primeiras não estejam mais em funcionamento, a fim de aferir o caráter especial das
atividades desenvolvidas nos períodos indicados na inicial.
IV- Preliminar acolhida. Apelações do INSS e da parte autora prejudicadas, no mérito.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000865-45.2016.4.03.6114
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: DANIEL ROMEU RIBEIRO
Advogados do(a) APELANTE: FILIPE HENRIQUE ELIAS DE OLIVEIRA - SP342765-A,
RAFAEL LUSTOSA PEREIRA - SP353867-A, HILARIO BOCCHI JUNIOR - SP90916-A,
MATEUS GUSTAVO AGUILAR - SP175056-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000865-45.2016.4.03.6114
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: DANIEL ROMEU RIBEIRO
Advogados do(a) APELANTE: FILIPE HENRIQUE ELIAS DE OLIVEIRA - SP342765-A,
RAFAEL LUSTOSA PEREIRA - SP353867-A, HILARIO BOCCHI JUNIOR - SP90916-A,
MATEUS GUSTAVO AGUILAR - SP175056-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em 25/11/2016, em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à
concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, com exclusão do fator previdenciário,
desde a data do requerimento administrativo (08/10/2015), mediante o reconhecimento do
caráter especial das atividades exercidas nos períodos indicados na inicial.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido para reconhecer a especialidade dos
períodos de 06/10/1977 a 25/02/1981, 08/07/1985 a 11/12/1985, 04/03/1986 a 02/06/1986,
03/06/1986 a 23/12/1986, 20/05/1987 a 14/08/1987, 08/02/1994 a 28/04/1995, 10/03/1998 a
21/08/2001 e de 28/04/2011 a 08/10/2015 e para determinar a concessão do benefício NB
165.656.457-0, com DIB em 08/10/2015. As parcelas em atraso deverão ser acrescidas de
correção monetária e juros de mora. Honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da
condenação, até a sentença.
Inconformada, apelou autarquia, sustentando a improcedência do pedido.
O autor também recorreu alegando, preliminarmente, a nulidade da r. sentença, por
cerceamento de defesa, em face do indeferimento da prova pericial. No mérito, pugna pelo
reconhecimento da especialidade de todos os períodos indicados na inicial, bem como pela
concessão do benefício.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5000865-45.2016.4.03.6114
RELATOR:Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: DANIEL ROMEU RIBEIRO
Advogados do(a) APELANTE: FILIPE HENRIQUE ELIAS DE OLIVEIRA - SP342765-A,
RAFAEL LUSTOSA PEREIRA - SP353867-A, HILARIO BOCCHI JUNIOR - SP90916-A,
MATEUS GUSTAVO AGUILAR - SP175056-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Conforme
dispõe o inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal: "aos litigantes, em processo judicial ou
administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com
os meios e recursos a ela inerentes" (grifei).
Por sua vez, o art. 370 do CPC/15 dispõe:
"Caberá ao juiz, de ofício ou a requerimento da parte, determinar as provas necessárias ao
julgamento do mérito.
Parágrafo único. O juiz indeferirá, em decisão fundamentada, as diligências inúteis ou
meramente protelatórias."
É de se recordar que o princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda
aos litigantes o direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se
possa comprovar os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Eduardo Couture,
revelando profunda visão sobre o aspecto constitucional do direito processual, enunciou que "A
lei instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade
de fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José
Alfredo de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional
e Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).
Sobre o direito à prova, esclarece Cândido Rangel Dinamarco:
"Direito à prova é o conjunto de oportunidades oferecidas à parte pela Constituição e pela lei,
para que possa demonstrar no processo a veracidade do que afirmam em relação aos fatos
relevantes para o julgamento. (...)
A imensa importância da prova na experiência do processo erigiu o direito à prova em um dos
mais respeitados postulados inerentes à garantia política do devido processo legal, a ponto de
se constituir em um dos fundamentais pilares do sistema processual contemporâneo. Sem sua
efetividade não seria efetiva a própria garantia constitucional do direito ao processo. (...)
No plano infraconstitucional o direito à prova está indiretamente afirmado pelo art. 332 do
Código de Processo Civil (...)
Na Constituição, o direito à prova é inerência do conjunto de garantias do justo processo, que
ela oferece ao enunciar os princípios do contraditório e ampla defesa, culminando por assegurar
a própria observância destes quando garante a todos o due processo of law (art. 5º, incs. LIV e
LV - supra, nn. 94 e 97). Pelo aspecto constitucional, direito à prova é a liberdade de acesso às
fontes e meios segundo o disposto em lei e sem restrições que maculem ou descaracterizem o
justo processo." (Instituições de Direito Processual Civil, vol. III, 6ª ed., Malheiros : São Paulo,
2009, pp. 46/47, grifos meus)
Com efeito, incabível impedir que o segurado possa comprovar por perícia que efetivamente
houve a exposição a fatores de risco. A legislação previdenciária colocou a cargo da empresa
empregadora a elaboração do laudo técnico comprobatório da especialidade. Se a empresa,
porém, deixa de elaborar o laudo, e, ao mesmo tempo, é negado ao segurado o direito de fazer
prova do fator de risco, a ação proposta por este estará fatalmente fadada ao insucesso. Não
por não fazer o segurado jus ao direito material reclamado; mas simplesmente por ter sido
privado dos meios capazes de comprovar que o labor se deu em condições nocivas.
Devido registrar, outrossim, que o C. STJ também admite que o caráter especial do trabalho
exercido seja comprovado por meio de prova pericial por similaridade, realizada em empresa
com características semelhantes àquela em que se deu a prestação da atividade, caso a
mesma não esteja mais em funcionamento. Neste sentido, os seguintes precedentes:
"PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR
TEMPO DE SERVIÇO/CONTRIBUIÇÃO. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC. SÚMULA
284/STF. CÔMPUTO DE TEMPO ESPECIAL. PROVA TÉCNICA. PERÍCIA POR
SIMILARIDADE. CABIMENTO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E NESSA
PARTE PROVIDO.
(...)
2. A tese central do recurso especial gira em torno do cabimento da produção de prova técnica
por similaridade, nos termos do art. 429 do CPC e do art. 55, § 3º, da Lei 8.213/1991.
3. A prova pericial é o meio adequado e necessário para atestar a sujeição do trabalhador a
agentes nocivos à saúde para seu enquadramento legal em atividade especial. Diante do
caráter social da previdência, o trabalhador segurado não pode sofrer prejuízos decorrentes da
impossibilidade de produção da prova técnica.
4. Quanto ao tema, a Segunda Turma já teve a oportunidade de se manifestar, reconhecendo
nos autos do Recurso Especial 1.397.415/RS, de Relatoria do Ministro Humberto Martins, a
possibilidade de o trabalhador se utilizar de perícia produzida de modo indireto, em empresa
similar àquela em que trabalhou, quando não houver meio de reconstituir as condições físicas
do local onde efetivamente prestou seus serviços.
5. É exatamente na busca da verdade real/material que deve ser admitida a prova técnica por
similaridade. A aferição indireta das circunstâncias de labor, quando impossível a realização de
perícia no próprio ambiente de trabalho do segurado é medida que se impõe.
6. A perícia indireta ou por similaridade é um critério jurídico de aferição que se vale do
argumento da primazia da realidade, em que o julgador faz uma opção entre os aspectos
formais e fáticos da relação jurídica sub judice, para os fins da jurisdição.
7. O processo no Estado contemporâneo tem de ser estruturado não apenas consoante as
necessidades do direito material, mas também dando ao juiz e à parte a oportunidade de se
ajustarem às particularidades do caso concreto.
8. Recurso especial conhecido em parte e nessa parte provido."
(REsp nº 1.370.229, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, v.u., j. 25/02/14, DJe
11/03/14, grifos meus)
"PREVIDENCIÁRIO. ATIVIDADE ESPECIAL. CONFIGURAÇÃO. PERÍCIA INDIRETA EM
EMPRESA SIMILAR. LOCAL DE TRABALHO ORIGINÁRIO INEXISTENTE. POSSIBILIDADE.
1. 'Mostra-se legítima a produção de perícia indireta, em empresa similar, ante a
impossibilidade de obter os dados necessários à comprovação de atividade especial, visto que,
diante do caráter eminentemente social atribuído à Previdência, onde sua finalidade primeira é
amparar o segurado, o trabalhador não pode sofrer prejuízos decorrentes da impossibilidade de
produção, no local de trabalho, de prova, mesmo que seja de perícia técnica'. (REsp
1.397.415/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 20.11.2013).
2. Agravo Regimental não provido."
(AgRg no REsp nº 1.422.399, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, v.u., j. 18/03/14,
DJe 27/03/14, grifos meus)
Não obstante os documentos acostados aos autos, é impositiva a anulação da sentença para
que seja produzida a prova pericial nas respectivas empregadoras ou em empresas similares,
caso as primeiras não estejam mais em funcionamento, a fim de aferir o caráter especial das
atividades desenvolvidas nos períodos indicados na inicial.
Ante o exposto, acolho a preliminar para anular a sentença recorrida, determinando o retorno
dos autos à Vara de Origem para fins de produção da prova pericial e julgo prejudicadas, no
mérito, as apelações das partes.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. PROVA PERICIAL. CERCEAMENTO DE DEFESA CONFIGURADO.
PROVA TESTEMUNHAL. DESNECESSIDADE.
I- O inciso LV, do art. 5º, da Constituição Federal dispõe que "aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla
defesa, com os meios e recursos a ela inerentes".
II- O princípio constitucional do devido processo legal impõe que se conceda aos litigantes o
direito à produção de provas, devendo facultar-se amplos meios para que se possa comprovar
os fatos que amparam o direito disputado em juízo. Segundo Eduardo Couture, "A lei
instituidora de uma forma de processo não pode privar o indivíduo de razoável oportunidade de
fazer valer seu direito, sob pena de ser acoimada de inconstitucional" (BARACHO, José Alfredo
de Oliveira; Teoria Geral do Processo Constitucional in Revista de Direito Constitucional e
Internacional, vol. 62, p. 135, Jan/2008).
III- Não obstante os documentos acostados aos autos, é impositiva a anulação da sentença
para que seja produzida a prova pericial nas respectivas empregadoras ou em empresas
similares, caso as primeiras não estejam mais em funcionamento, a fim de aferir o caráter
especial das atividades desenvolvidas nos períodos indicados na inicial.
IV- Preliminar acolhida. Apelações do INSS e da parte autora prejudicadas, no mérito.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu acolher a preliminar para anular a sentença recorrida, determinando o
retorno dos autos à Vara de Origem para fins de produção da prova pericial e julgar
prejudicadas, no mérito, as apelações das partes., nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA