Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5104367-14.2018.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA
Órgão Julgador
10ª Turma
Data do Julgamento
15/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 21/08/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL E URBANA. REQUISITOS.
INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. NECESSIDADE. SENTENÇA
ANULADA.
- Cabível a comprovação do exercício de atividade rural e urbana, por meio de início de prova
material corroborado por prova testemunhal.
- Não houve a produção da prova oral requerida, uma vez que não foi designada audiência de
instrução e julgamento para ampliar a eficácia probatória dos documentos referentes às
atividades rural e urbana exercidas pela parte autora nos períodos mencionados na petição
inicial.
- Em situações como estas, sendo a prova testemunhal imprescindível para o descortino da
verdade real, incumbe-se ao magistrado proceder à oitiva das testemunhas, observando o
princípio do contraditório.
- Ao decidir sem a observância de tal aspecto, houve violação ao direito da parte, atentando
inclusive contra os princípios do contraditório e da ampla defesa insculpidos no art. 5º, inciso LV,
da Constituição Federal, já que o estado do processo não permitia tal procedimento.
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
- Sentença anulada, de ofício, para determinar o retorno dos autos à Vara de Origem para o
regular prosseguimento do feito, notadamente para a oitiva das testemunhas. Apelação do INSS
prejudicada.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5104367-14.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JORGE APARECIDO DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: SELMA SUELI SANTOS DO NASCIMENTO - SP72107-N,
HAMILTON SOARES ALVES - SP283751-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5104367-14.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JORGE APARECIDO DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: SELMA SUELI SANTOS DO NASCIMENTO - SP72107-N,
HAMILTON SOARES ALVES - SP283751-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento,
de natureza previdenciária, objetivando a concessão da aposentadoria por tempo de serviço,
mediante o reconhecimento de atividade rural e urbana, sem registro em CTPS e de natureza
especial, sobreveio sentença de parcial procedência do pedido, condenando-se a autarquia
previdenciária a reconhecer a atividade rural no período de 09/10/1974 a 10/09/1986 e a
conceder o benefício de aposentadoria por tempo de serviço, desde o requerimento
administrativo, com correção monetária e juros de mora, observando-se a prescrição quinquenal,
além do pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do montante
devido, nos termos da Súmula 111 do STJ.
A r. sentença não foi submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação, pugnando pela reforma
da sentença, para que seja julgado totalmente improcedente o pedido, em razão da ausência do
preenchimento dos requisitos necessários para a concessão do benefício. Subsidiariamente,
pede a alteração da sentença quanto à correção monetária e aos juros de mora.
Com contrarrazões, os autos foram remetidos a este Tribunal.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5104367-14.2018.4.03.9999
RELATOR: Gab. 36 - DES. FED. LUCIA URSAIA
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: JORGE APARECIDO DOS SANTOS
Advogados do(a) APELADO: SELMA SUELI SANTOS DO NASCIMENTO - SP72107-N,
HAMILTON SOARES ALVES - SP283751-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Busca a parte autora o
reconhecimento de atividade rural e urbana, sem registro em CTPS, de atividade urbana, de
natureza especial e a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de serviço.
Nos termos do art. 55, caput, da Lei nº 8.213/91, dispõe que o tempo de serviço será comprovado
na forma estabelecida no Regulamento, sendo que, de acordo com o parágrafo 3º desse
dispositivo, essa comprovação só produzirá efeito quando baseada em início de prova material,
não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força
maior ou caso fortuito.
Conquanto a referida lei não especifique a natureza do início razoável de prova material, quer em
sua potencialidade, quer em sua eficácia, a prerrogativa de decidir sobre a validade dos
documentos e concluir pela sua aceitação ou não, cabe ao julgador. Assim, qualquer que seja a
prova, particularmente a escrita, deve levar à convicção sobre o fato probando, isto é, além de
pertencer à época dos fatos, deve fornecer indicações seguras de que houve o evento que se
pretende provar.
O início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não significa que o
segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício
de atividade laborativa, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse
comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade à prova testemunhal para
demonstração do labor exercido sem o devido registro em carteira profissional. O raciocínio é
diverso, bastando para o reconhecimento do tempo de serviço que se produza alguma prova
documental perante a Previdência Social, contemporânea ao lapso temporal que se pretende
comprovar, aliada à prova oral que indique, com segurança, o exercício da atividade em todo o
período discutido pelas partes.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim
começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da
situação jurídica questionada, desde que associada a outros dados probatórios.
No presente caso, não há dúvida de que foi apresentado início de prova material de trabalho rural
da parte autora, consubstanciado na certidão expedida pela Secretaria da Segurança Pública (Id
10381843, página 01) e do boletim escolar (Id 10381828, páginas 01/02), nas quais estão
constam sua qualificação profissional e a de seu genitor como lavradores.
Da mesma forma, foi apresentado início de prova material de trabalho urbano da parte autora,
sem registro em CTPS, na função de motorista, consistente na cópia da certidão de nascimento
do filho (Id 10381869, página 01) e da certidão de casamento (Id 10381864, página 01), nas quais
está qualificado profissionalmente como motorista.
Entretanto, o início de prova material não é o bastante para se concluir acerca do exercício de
atividade rural e urbana pelo período necessário. É indispensável, no caso, a produção de prova
testemunhal para que se tenha por revelada a real condição da parte autora.
Contudo, não houve a produção da prova oral, uma vez que não foi designada audiência de
instrução e julgamento para ampliar a eficácia probatória dos documentos referentes às
atividades rural e urbana exercidas pelo autor nos períodos mencionados na petição inicial.
Em situações como estas, sendo a prova testemunhal imprescindível para o descortino da
verdade real, incumbe-se ao magistrado proceder à oitiva das testemunhas, observando o
princípio do contraditório.
Ao decidir sem a observância de tal aspecto, houve violação ao direito da parte, atentando
inclusive contra os princípios do contraditório e da ampla defesa insculpidos no art. 5º, inciso LV,
da Constituição Federal, já que o estado do processo não permitia tal procedimento.
A propósito, trago os ensinamentos de Cândido Rangel Dinamarco, em sua obra Instituições de
Direito Processual Civil, volume III, verbis:
"Direito à prova é o conjunto de oportunidades oferecidas à parte pela Constituição e pela lei,
para que possa demonstrar no processo a veracidade do que afirmam em relação aos fatos
relevantes para o julgamento. Ele é exercido mediante o emprego de fontes de prova
legitimamente obtidas e a regular aplicação das técnicas representadas pelos meios de prova.
(...)
Na constituição, o direito à prova é inerência do conjunto de garantias do justo processo, que ela
oferece ao enunciar os princípios do contraditório e ampla defesa, culminando por assegurar a
própria observância destes quando garante a todos due process of law (art. 5º, incs. LIV e LV -
supra, nn.94 e 97). Pelo aspecto constitucional, direito à prova é a liberdade de acesso às fontes
e meios segundo o disposto em lei e sem restrições que maculem ou descaracterizem o justo
processo." (3ª ed., 2003, São Paulo: Malheiros, p. 47/49).
Desta forma, ocorreu cerceamento de defesa, devendo ser reconhecida a nulidade da sentença,
determinando-se a remessa dos autos ao Juízo de origem a fim de que seja produzida a prova
testemunhal e, por fim, seja prolatada nova sentença.
Neste sentido, o seguinte precedente:
"1. Havendo apenas início de prova material em relação ao tempo de serviço prestado sem
registro profissional, mister se faz a sua complementação pela prova testemunhal, conforme exige
o artigo 55, § 3º, da Lei nº 8.213/91, a fim de que possa o Julgador formar a sua convicção,
extreme de dúvidas, sobre o direito alegado, o qual, "in casu", por se tratar de direito indisponível,
não está suscetível de sofrer qualquer espécie de transação pelas partes, principalmente pelo
ente autárquico, tendo em vista ser pessoa pública que nem sequer está autorizado a transigir.
2. Entretanto, atualmente, pela moderna sistemática processual, independentemente de se
indagar a quem compete o "onus probandi", é dever do Julgador, como princípio corolário do
Direito, zelar, precipuamente, pela busca da verdade real, ainda mais versando o litígio sobre
direito indisponível, como é a situação específica dos presentes autos de processo, cabendo ao
juiz, nesse caso, determinar, inclusive de ofício, a produção de provas necessárias à elucidação
dos fatos constitutivos da demanda, a teor do que reza o artigo 130 do Código de Processo Civil.
3. Assim, forçoso é reconhecer ter sido indevido o julgamento antecipado da lide, dando pela
improcedência da ação com fundamento na ausência de provas, bem como a ocorrência de
cerceamento de defesa, eis que o autor protestou pela produção da prova oral caso fosse
considerada necessária, e declarar-se nula a decisão final, a fim de que seja determinada a
abertura da instrução probatória para que os fatos narrados na inicial possam ser apurados
convenientemente de acordo com a legislação reguladora da matéria.
4. Recurso do autor a que se dá provimento, para, acolhendo a preliminar suscitada, reconhecer
a ocorrência de cerceamento de defesa, e anular a sentença recorrida." (TRF 3ª Região; AC nº
768776/SP, Relatora Desembargadora Federal SUZANA CAMARGO j. 06/08/2002, DJU
03/12/2002, p. 758).
Diante do exposto, ANULO A SENTENÇA, DE OFÍCIO, e determino o retorno dos autos à Vara
de Origem para prosseguir com a instrução do feito, notadamente para a produção de prova
testemunhal, e, após, ser proferido novo julgamento, restando prejudicada a análise da apelação
do INSS.
É o voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE ATIVIDADE RURAL E URBANA. REQUISITOS.
INÍCIO DE PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL. NECESSIDADE. SENTENÇA
ANULADA.
- Cabível a comprovação do exercício de atividade rural e urbana, por meio de início de prova
material corroborado por prova testemunhal.
- Não houve a produção da prova oral requerida, uma vez que não foi designada audiência de
instrução e julgamento para ampliar a eficácia probatória dos documentos referentes às
atividades rural e urbana exercidas pela parte autora nos períodos mencionados na petição
inicial.
- Em situações como estas, sendo a prova testemunhal imprescindível para o descortino da
verdade real, incumbe-se ao magistrado proceder à oitiva das testemunhas, observando o
princípio do contraditório.
- Ao decidir sem a observância de tal aspecto, houve violação ao direito da parte, atentando
inclusive contra os princípios do contraditório e da ampla defesa insculpidos no art. 5º, inciso LV,
da Constituição Federal, já que o estado do processo não permitia tal procedimento.
- Sentença anulada, de ofício, para determinar o retorno dos autos à Vara de Origem para o
regular prosseguimento do feito, notadamente para a oitiva das testemunhas. Apelação do INSS
prejudicada. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Decima Turma, por
unanimidade, decidiu anular, de oficio, a sentenca, determinando o retorno dos autos a Vara de
origem a fim de que seja realizada prova testemunhal, restando prejudicada a analise da
apelacao do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
