
| D.E. Publicado em 01/12/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação da autarquia previdenciária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 0006447-09.2010.4.03.6119/SP
RELATÓRIO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de apelação interposta pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS (fls. 220/228) em face da r. sentença (fls. 203/209) que julgou parcialmente procedente pedido para reconhecer a especialidade do labor desempenhado entre 31/05/1979 e 26/06/1979, entre 08/08/1979 e 08/01/1980, entre 09/01/1980 e 15/01/1980, entre 17/02/1992 e 01/06/1992, entre 19/07/1995 e 05/02/1996, entre 02/02/1999 e 18/11/1999, entre 05/06/2000 e 30/11/2000, entre 01/08/2001 e 04/10/2001, entre 22/09/2004 e 04/01/2005, entre 16/11/2006 e 10/07/2007 e entre 14/08/2009 e 19/01/2010, determinando que o autor arque com verba honorária em 10% do valor da causa (cuja exigibilidade encontra-se suspensa em razão do deferimento dos benefícios de Justiça Gratuita).
Sustenta o ente autárquico que a parte autora não comprovou o exercício de atividade especial nos interregnos assentados pelo Ilustre Magistrado sentenciante.
Subiram os autos sem contrarrazões.
É o relatório.
VOTO
O Senhor Desembargador Federal FAUSTO DE SANCTIS:
Trata-se de ação originariamente intentada com o escopo de deferimento de aposentadoria por tempo de contribuição à parte autora mediante o reconhecimento de labor especial, cabendo considerar que a r. sentença apenas assentou o exercício de atividade especial nos lapsos controvertidos (rechaçando a concessão do benefício), tendo apenas o ente autárquico apelado do r. provimento judicial. Nesse contexto, cumpre tão somente analisar se os períodos reconhecidos pela r. sentença devem mesmo ser tidos como de atividade especial.
DO TEMPO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS
O tempo de serviço prestado sob condições especiais poderá ser convertido em tempo de atividade comum independente da época trabalhada (art. 70, § 2º, do Decreto nº 3.048/99). Desta forma, não prevalece mais qualquer tese de limitação temporal de conversão, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887/80, seja em períodos posteriores à Lei nº 9.711/98, sendo certo que o art. 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91, foi elevado à posição de Lei Complementar pelo art. 15, da Emenda Constitucional nº 20/98, de modo que somente por Lei Complementar poderá ser alterado.
Importante ser consignado que, na conversão do tempo especial em comum, aplica-se a legislação vigente à época da prestação laboral; na ausência desta e na potencial agressão à saúde do trabalhador, deve ser dado o mesmo tratamento para aquele que hoje tem direito à concessão da aposentadoria (STF, RE 392.559/RS, Rel. Min. Gilmar Mendes, DJ de 07.02.06).
Cumpre salientar que a conversão do tempo de trabalho em atividades especiais era concedida com base na categoria profissional classificada de acordo com os anexos dos Decretos nº 53.831/64 e 83.080/79, sendo que, a partir da Lei nº 9.032/95, faz-se necessário comprovar o exercício da atividade prejudicial à saúde por meios de formulários ou de laudos. É pacífico o entendimento jurisprudencial de que o rol de atividades consideradas insalubres, perigosas ou penosas é meramente exemplificativo (portanto, não exaustivo), motivo pelo qual a ausência do enquadramento da atividade tida por especial não é óbice à concessão de aposentadoria especial, consoante o entendimento da Súmula 198, do extinto TFR: "Atendidos os demais requisitos, é devida a aposentadoria especial, se perícia judicial constata que a atividade exercida pelo segurado é perigosa, insalubre ou penosa, mesmo não inscrita em Regulamento".
Portanto, o reconhecimento de outras atividades insalubres, penosas e perigosas é admissível, caso exercidas sob ditas condições especiais; porém, tais especialidades não se presumem (como ocorre com aquelas categorias arroladas na legislação pertinente).
A partir de 10 de dezembro de 1997, com a edição da Lei nº 9.528, passou-se a ser necessária a apresentação de laudo técnico para a comprovação de atividade insalubre, documento este que deve demonstrar efetiva exposição do segurado ao agente nocivo, mediante formulário estabelecido pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, com base em laudo técnico do ambiente de trabalho, expedido por médico do trabalho ou por engenheiro de segurança do trabalho, com exceção de ruído (que sempre exigiu a apresentação de referido laudo para caracterizá-lo como agente agressor). Registro, por oportuno, que o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP substitui o laudo técnico em comento, sendo, assim, documento suficiente para aferição das atividades nocivas a que esteve sujeito o trabalhador.
Destaque-se que a extemporaneidade do documento (formulário, laudo técnico ou Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP) não obsta o reconhecimento de tempo de trabalho sob condições especiais, pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual à constatada na data de elaboração de tais documentos (tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho somente melhoram com a evolução tecnológica).
Saliente-se que os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79 têm aplicação simultânea até 05 de março de 1997, de modo que, verificada divergência entre tais diplomas, deve prevalecer a regra mais benéfica (como, por exemplo, ocorre na constatação de insalubridade em razão de ruído com intensidade igual ou superior a 80 dB, que atrai a incidência do Decreto nº 53.831/64).
Especificamente com relação ao agente agressivo ruído, importante ser dito que até 05 de março de 1997 entendia-se insalubre a atividade desempenhada exposta a 80 dB ou mais. Posteriormente, o Decreto nº 2.172/97 revogou os Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, passando a considerar insalubre o labor desempenhado com nível de ruído superior a 90 dB. Mais tarde, em 18 de novembro de 2003, o Decreto nº 4.882/03 reduziu tal patamar para 85 dB. Ressalte-se que o C. Superior Tribunal de Justiça, quando do julgamento do REsp 1.398.260/PR (representativo da controvérsia - Rel. Min. Herman Benjamin, 1ª Seção, DJe de 05/12/2014), firmou entendimento no sentido da impossibilidade de retroação do limite de 85 dB para alcançar fatos praticados sob a égide do Decreto nº 2.172/97.
O E. Supremo Tribunal Federal, quando do julgamento do Agravo em RE nº 664.335/RS (com repercussão geral da questão constitucional reconhecida), pacificou o entendimento de que, havendo prova da real eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI (vale dizer, efetiva capacidade de neutralizar a nocividade do labor), não há que se falar em respaldo constitucional à concessão de aposentadoria especial. Todavia, em caso de dúvida em relação à neutralização da nocividade, assentou que a Administração e o Poder Judiciário devem seguir a premissa do reconhecimento do direito ao benefício da aposentadoria especial, pois o uso do EPI, no caso concreto, pode não se afigurar suficiente para descaracterizar completamente a relação nociva a que o empregado se submeteu - destaque-se que se enfatizou, em tal julgamento, que a mera informação da empresa sobre a eficácia do EPI não é suficiente para descaracterizar a especialidade do tempo de serviço para fins de aposentadoria. Ainda em indicado precedente, analisando a questão sob a ótica do agente agressivo ruído, o Supremo estabeleceu que não se pode garantir a eficácia real do EPI em eliminar os efeitos agressivos ao trabalhador, destacando que são inúmeros os fatores que influenciam na sua efetividade, não abrangendo apenas perdas auditivas, pelo que é impassível de controle, seja pelas empresas, seja pelos trabalhadores.
Por fim, no tocante à alegada necessidade de prévia fonte de custeio, em se tratando de empregado, sua filiação ao sistema previdenciário é obrigatória, bem como o recolhimento das contribuições respectivas, cabendo ao empregador vertê-las, nos termos do art. 30, I, da Lei nº 8.212/91. Dentro desse contexto, o trabalhador não pode ser penalizado se tais recolhimentos não foram efetuados corretamente, porquanto a autarquia previdenciária possui meios próprios para receber seus créditos.
DO CONJUNTO PROBATÓRIO DOS AUTOS
Da atividade especial: Pugna a parte autora pelo reconhecimento como especial do labor exercido entre 31/05/1979 e 26/06/1979, entre 08/08/1979 e 08/01/1980, entre 09/01/1980 e 15/01/1980, entre 17/02/1992 e 01/06/1992, entre 19/07/1995 e 05/02/1996, entre 02/02/1999 e 18/11/1999, entre 05/06/2000 e 30/11/2000, entre 01/08/2001 e 04/10/2001, entre 22/09/2004 e 04/01/2005, entre 16/11/2006 e 10/07/2007 e entre 14/08/2009 e 19/01/2010. Cumpre analisar cada interregno separadamente:
- Período de 31/05/1979 a 26/06/1979: Verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 77, que a parte autora laborava na função de operador de tratores. Com efeito, embora não esteja elencada nos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, se devidamente comprovado o exercício da profissão de tratorista pela parte autora, é de se reconhecer a especialidade do labor em razão do enquadramento da atividade por analogia nos itens 2.4.4, do Decreto nº 53.831/64, e 2.4.2, do Decreto nº 83.080/79. Ademais, a Circular nº 08/83, do antigo INPS, equiparou a atividade de tratorista com a de motorista, dispondo: "Face ao pronunciamento da Secretaria de Segurança e Medicina do Trabalho proferido no processo Mtb - 113.064/80 cabe ser considerada a atividade de tratorista para fins de aposentadoria especial, como enquadramento, por analogia, no código 2.4.2 do quadro II anexo ao Decreto nº 83.080/79". Desta forma, reconheço a especialidade vindicada (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 08/08/1979 a 08/01/1980: Verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 78, que a parte autora laborava na função de operador de tratores, atividade passível de ser enquadrada, por analogia, nos itens 2.4.4, do Decreto nº 53.831/64, e 2.4.2, do Decreto nº 83.080/79, nos termos anteriormente tecidos. Desta forma, reconheço a especialidade vindicada (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 09/01/1980 a 15/01/1980: Verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 79, que a parte autora laborava na função de operador de equipamentos pesados (algo equiparado a tratores), atividade passível de ser enquadrada, por analogia, nos itens 2.4.4, do Decreto nº 53.831/64, e 2.4.2, do Decreto nº 83.080/79, nos termos anteriormente tecidos. Desta forma, reconheço a especialidade vindicada (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 17/02/1992 a 01/06/1992: Verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 67, que a parte autora laborava na função de operador de tratores, atividade passível de ser enquadrada, por analogia, nos itens 2.4.4, do Decreto nº 53.831/64, e 2.4.2, do Decreto nº 83.080/79, nos termos anteriormente tecidos. Desta forma, reconheço a especialidade vindicada (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 19/07/1995 a 05/02/1996: Verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 88, bem como do laudo de fls. 89/91, que a parte autora laborava exposta ao agente agressivo ruído em intensidade acima de 90 dB, limite este superior ao tolerado pela legislação de regência aplicável à época, motivo pelo qual faz jus ao reconhecimento vindicado (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 02/02/1999 a 18/11/1999: Verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 80, bem como do laudo de fls. 81/83, que a parte autora laborava exposta ao agente agressivo ruído em intensidade acima de 90 dB, limite este superior ao tolerado pela legislação de regência aplicável à época, motivo pelo qual faz jus ao reconhecimento vindicado (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 05/06/2000 a 30/11/2000: Verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 21 e 92, bem como do laudo de fls. 22/36 e 93/107, que a parte autora laborava exposta ao agente ruído em intensidade equivalente de 89 dB, limite este abaixo do necessário para que a atividade pudesse ser considerada especial, motivo pelo qual não faz jus ao reconhecimento vindicado.
- Período de 01/08/2001 a 04/10/2001: Verifica-se, de acordo com o formulário de fls. 84, bem como do laudo de fls. 85/87, que a parte autora laborava exposta ao agente agressivo ruído em intensidade de 104 dB, limite este superior ao tolerado pela legislação de regência aplicável à época, motivo pelo qual faz jus ao reconhecimento vindicado (com a consequente conversão em tempo comum).
- Período de 22/09/2004 a 04/01/2005: Verifica-se que o PPP de fls. 108/109 não está preenchido corretamente na justa medida em que não constam o carimbo e a qualificação da pessoa que o preencheu. Desta forma, a despeito de indicar submissão a ruído na casa de 93 dB, entendo que tal documento não pode ser acolhido para fins de reconhecimento da especialidade do labor, cabendo considerar que não mais se mostra possível o acolhimento da pretensão com base no mero enquadramento da categoria profissional ante o advento da Lei nº 9.032/95. Assim, a parte autora não faz jus ao reconhecimento de atividade especial no interregno em análise.
- Período de 16/11/2006 a 10/07/2007: Verifica-se que o PPP de fls. 110/111 sequer indica a presença de agente agressivo no exercício do trabalho desempenhado pela parte autora, cabendo considerar que não mais se mostra possível o acolhimento da pretensão com base no mero enquadramento da categoria profissional ante o advento da Lei nº 9.032/95. Desta forma, a parte autora não faz jus ao reconhecimento de atividade especial no interregno em análise.
- Período de 14/08/2009 a 19/01/2010: Verifica-se que o PPP de fls. 112 não está preenchido corretamente na justa medida em que não constam o carimbo e a qualificação da pessoa que o preencheu, cabendo considerar que não mais se mostra possível o acolhimento da pretensão com base no mero enquadramento da categoria profissional ante o advento da Lei nº 9.032/95. Assim, a parte autora não faz jus ao reconhecimento de atividade especial no interregno em análise.
Sucumbente, a parte autora deve ser condenada ao pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa, devendo-se observar o disposto no art. 12, da Lei nº 1.060/50. Nesse sentido é o julgado da E. Suprema Corte:
DISPOSITIVO
Ante o exposto, voto por DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso de apelação da autarquia previdenciária (apenas para afastar o reconhecimento de atividade especial entre 05/06/2000 e 30/11/2000, entre 22/09/2004 e 04/01/2005, entre 16/11/2006 e 10/07/2007 e entre 14/08/2009 e 19/01/2010), nos termos anteriormente expendidos.
Fausto De Sanctis
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
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| Data e Hora: | 22/11/2016 10:51:21 |
