
| D.E. Publicado em 05/09/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação e à remessa oficial e dar parcial provimento ao recurso adesivo, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0003767-41.2006.4.03.6103/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em 7/6/06 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão de aposentadoria por tempo de serviço desde a data do requerimento administrativo (17/12/98 - fls. 44), mediante a declaração do labor rural exercido de 1º/11/69 a 30/11/73, o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas nos períodos de 16/5/74 a 21/10/87, 4/4/88 a 3/4/89, 6/11/89 a 12/6/90, 6/1/92 a 30/10/92, 23/9/93 a 19/10/94 e 1º/3/96 a 1º/12/98 e o cômputo dos períodos comuns de 1º/3/74 a 10/5/74, 18/11/91 a 20/12/91, 23/5/95 a 21/7/95 e 1º/12/95 a 28/2/96.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a atividade rural exercida no período de 1º/1/73 a 30/11/73, bem como os períodos de atividade comum de 1º/3/74 a 10/5/74 e 18/11/91 a 20/12/91 e especial de 16/5/74 a 21/10/87, 6/1/92 a 30/10/92 e 1º/3/96 a 5/3/97. Foi fixada a sucumbência recíproca.
Inconformada, apelou a autarquia, alegando em breve síntese:
a) No mérito:
- que o período de 1º/3/74 a 10/5/74 não consta no Cadastro Nacional de Informações Sociais - CNIS e, portanto, não pode ser reconhecido;
- a impossibilidade de conversão de tempo especial em comum antes de 1º/1/81;
- a necessidade de laudo técnico contemporâneo ao exercício das atividades para o reconhecimento do período especial;
- a eliminação ou redução do agente nocivo, tendo em vista a utilização e eficácia dos Equipamentos de Proteção Individual - EPI, conforme comprovam os documentos acostados aos autos;
- a ausência de prévia fonte de custeio para o direito à aposentadoria por tempo de contribuição com conversão de períodos especiais em comuns (violação aos arts. 195 e 201, da Constituição Federal) e
- a inexistência de início de prova material contemporânea aos fatos para o reconhecimento do labor rural pleiteado, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal.
- Caso não sejam acolhidas as alegações acima mencionadas, requer que esta E. Corte manifeste-se sobre eventual violação aos arts. 31 da Lei nº 3.087/60, 2º e 9º, §4º, da Lei nº 6.887/80, 55, §3º, 57, 58 e 106 da Lei nº 8.213/91, 28 da Lei nº 9.711/98 e 58 da Medida Provisória 1.523/96, para fins de prequestionamento.
Por sua vez, a parte autora recorreu adesivamente, aduzindo:
a) No mérito:
- o direito ao reconhecimento do labor rural exercido no período de 1º/11/69 a 30/11/73 e
- a procedência do pedido de aposentadoria por tempo de contribuição proporcional.
Com contrarrazões da parte autora, e submetida a sentença ao duplo grau de jurisdição, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0003767-41.2006.4.03.6103/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): No que se refere ao reconhecimento de tempo de serviço, dispõe o § 3º do artigo 55 da Lei 8.213/91, in verbis:
Da simples leitura do referido dispositivo legal, bem como da análise da legislação pertinente e da observância da jurisprudência dominante, depreende-se que para o reconhecimento do tempo de serviço é indispensável a existência de início de prova material, contemporânea à época dos fatos, corroborado por coerente e robusta prova testemunhal.
Impende salientar, por oportuno, que a Carteira de Trabalho e Previdência Social constitui prova plena do tempo de serviço referente aos vínculos empregatícios ali registrados, porquanto gozam de presunção iuris tantum de veracidade, elidida somente por suspeitas objetivas e fundadas acerca das anotações nela exaradas.
Nesse sentido, transcrevo a jurisprudência, in verbis:
O fato de o período não constar do Cadastro de Informações Sociais - CNIS não pode impedir o reconhecimento do trabalho prestado pelo segurado como tempo de serviço para fins previdenciários, especialmente quando o lapso vem regularmente registrado em sua CTPS e o INSS não demonstrou que o registro se deu mediante fraude.
No que tange ao recolhimento de contribuições previdenciárias, cumpre ressaltar que tal obrigação compete ao empregador, sendo do Instituto o dever de fiscalização do exato cumprimento da norma. Essas omissões não podem ser alegadas em detrimento do trabalhador que não deve - posto tocar às raias do disparate - ser penalizado pela inércia alheia.
No que tange ao reconhecimento de tempo de serviço rural, dispõe o § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no Art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento." |
Da simples leitura do referido dispositivo legal, bem como da análise da legislação pertinente e da observância da jurisprudência dominante, depreende-se que para o reconhecimento do tempo de serviço é indispensável a existência de início de prova material, contemporânea à época dos fatos, corroborado por coerente e robusta prova testemunhal. Outrossim, nos termos da Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário." |
O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14). O E. Relator, em seu voto, deixou consignada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Nessa linha de compreensão, mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob o contraditório."
Ressalto, adicionalmente, que o C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo, mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova testemunhal robusta, conforme ementas a seguir transcritas:
Anoto que o convencimento da verdade de um fato ou de uma determinada situação jurídica raramente decorre de circunstância isoladamente considerada. Os indícios de prova material, singularmente analisados, talvez não fossem, por si sós, suficientes para formar a convicção do magistrado. Nem tampouco as testemunhas provavelmente o seriam. Mas a conjugação de ambos os meios probatórios - todos juridicamente idôneos para formar a convicção do juiz - torna inquestionável a comprovação da atividade laborativa rural.
Com relação às contribuições previdenciárias, dispõe o §2º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 que o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, "anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento." Havendo período posterior ao advento da Lei de Benefícios, sem o recolhimento das contribuições, o mesmo somente poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios. Quadra mencionar que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.352.791/SP, adotou o entendimento de que o período de atividade rural registrado em carteira profissional deve ser computado como carência.
No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica quanto à aplicação da lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).
Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até 28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).
Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do Seguro Social.
A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico, motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.
No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei a adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a partir 6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº 9.194/PR, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14; AgRg no AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em 18/3/14, v.u., DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal nº 0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.
Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o qual alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-se a admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos. Ademais, verifico que, com o advento do Decreto nº 8.123/13, o referido artigo assim dispôs:
Devo salientar também que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no ambiente de trabalho.
Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.
Com relação à conversão de tempo especial em comum, parece de todo conveniente traçar um breve relato de sua evolução histórica na ordenação jurídica brasileira.
Inicialmente, observo que a aposentadoria especial foi instituída pelo art. 31 da Lei nº 3.807, de 26/8/60 (Lei Orgânica da Previdência Social).
A Lei nº 6.887/80 acrescentou o § 4º ao art. 9º, da Lei nº 5.890/73, dispondo: "O tempo de serviço exercido alternadamente em atividades comuns e em atividades que, na vigência desta Lei, sejam ou venham a ser consideradas penosas, insalubres ou perigosas, será somado, após a respectiva conversão segundo critérios de equivalência a serem fixados pelo Ministério da Previdência Social, para efeito de aposentadoria de qualquer espécie."
Após diversas alterações legislativas, a Lei nº 8.213/91 dispôs sobre a aposentadoria especial em seus artigos 57 e 58.
A possibilidade de conversão do tempo especial em comum havia sido revogada pela edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98. No entanto, o referido dispositivo legal foi suprimido quando da conversão na Lei nº 9.711/98, razão pela qual, forçoso reconhecer que permanece em vigor a possibilidade dessa conversão. Ademais, a questão ficou pacificada com a edição do Decreto nº 4.827, de 3/9/03, que incluiu o § 2º ao art. 70 do Decreto nº 3.048/99, estabelecendo que "As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período." Nesse sentido, cabe ressaltar que o C. Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de ser possível a conversão de tempo especial em comum no período anterior a 1º/1/81, bem como posterior à edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98.
A questão relativa ao fator de conversão foi objeto de julgamento pelo C. Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.151.363/MG (2009/0145685-8). O E. Relator Ministro Jorge Mussi, em seu voto, bem explicitou a regra que se deve adotar ao asseverar: "Importa notar que a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação da atividade sob condições especiais, conforme dispõe o § 1º supra. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho. Diversamente, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento. Por essa razão, o § 2º deixa expresso que as regras de conversão do art. 70 aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Isso é possível porque a adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático. Explica-se: O fator de conversão é o resultado da divisão do numero máximo de tempo comum (35 para homem e 30 para mulher) pelo número máximo de tempo especial (15, 20 e 25). Ou seja, o fator a ser aplicado ao tempo especial laborado pelo homem para convertê-lo em comum será 1,40, pois 35/25=1,40. Se o tempo for trabalhado por uma mulher, o fator será de 1,20, pois 30/25=1,20. Se o tempo especial for de 15 ou 20 anos, a regra será a mesma. Trata-se de regra matemática pura e simples e não de regra previdenciária. Observando-se os Decretos ns. 53.831/1964 e 83.080/1979, os quais traziam a lista de agentes nocivos e atividades insalubres, extrai-se a informação de que, em ambos os decretos, o tempo máximo de exposição aos agentes a que esteve exposto o recorrido (ruído e frio) era de 25 anos. Todavia, o tempo de serviço comum, para efeito de aposentadoria, constante daqueles decretos, era de, no máximo, 30 anos; portanto, o fator de conversão utilizado nessa hipótese era de 1,2. Destarte, o índice de 1,2 para conversão de tempo especial em aposentadoria comum com 30 anos de contribuição e o índice de 1,4 em relação à aposentadoria com 35 anos têm a mesma função. Converter para comum o tempo de serviço especial relativo à atividade com limite de 25 anos utilizando o fator de 1,2 seria prejudicial ao segurado (homem), porquanto a norma de regência exige, como tempo de contribuição, os 35 anos, como é de notório conhecimento.(...) Nesse contexto, com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/99, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pelas novas regras da tabela definida no artigo 70, que, para o tempo de serviço especial correspondente a 25 anos utiliza como fator de conversão, para homens, o multiplicador 1, 40. É o que se denota do artigo 173 da Instrução Normativa n. 20/2007". (grifos meus)
Quanto à aposentadoria por tempo de contribuição, para os segurados que cumpriram os requisitos anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, devem ser observadas as disposições dos artigos 52 e 53, da Lei nº 8.213/91, em atenção ao princípio tempus regit actum:
Havendo a necessidade de utilização do período posterior à referida Emenda, deverão ser observadas as alterações realizadas pela referida Emenda aos artigos 201 e 202 da Constituição Federal de 1988, que extinguiu a aposentadoria proporcional por tempo de serviço no âmbito do regime geral de previdência social.
Transcrevo o §7º do art. 201 da Carta Magna com a nova redação:
Por sua vez, o art. 9º de referida Emenda criou uma regra de transição, ao estabelecer:
Contudo, no que tange à aposentadoria integral, cumpre ressaltar que, na redação do Projeto de Emenda à Constituição, o inciso I do §7º do art. 201, da Constituição Federal, associava tempo mínimo de contribuição (35 anos, para homem e 30 anos, para mulher) à idade mínima de 60 anos e 55 anos, respectivamente. Não sendo aprovada a exigência da idade mínima quando da promulgação da Emenda nº 20, a regra de transição para a aposentadoria integral restou inócua, uma vez que, no texto permanente (art. 201, §7º, inc. I), a aposentadoria integral será concedida levando-se em conta somente o tempo de contribuição.
Quadra mencionar que, havendo o cômputo do tempo de serviço posterior a 28/11/99, devem ser observados os dispositivos constantes da Lei nº 9.876/99 no que se refere ao cálculo do valor do benefício, consoante o julgamento realizado, em 10/9/08, pelo Tribunal Pleno do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 575.089, de Relatoria do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski.
Passo à análise do caso concreto.
No que se refere ao reconhecimento de tempo de serviço, verifico que consta na CTPS do demandante (fls. 16 e 20) a anotação dos seguintes vínculos empregatícios: 1º/3/74 a 10/5/74 (Scarpa, Pereira & Leão Ltda.) e 18/11/91 a 20/12/91 (Gente Banco de Recursos Humanos Ltda.).
Como já ressaltado, a Carteira de Trabalho e Previdência Social constitui prova plena do tempo de serviço referente aos vínculos empregatícios ali registrados, porquanto gozam de presunção iuris tantum de veracidade, elidida somente por suspeitas objetivas e fundadas acerca das anotações nela exaradas, sendo que o fato de o período não constar do Cadastro de Informações Sociais - CNIS não pode impedir o reconhecimento do trabalho prestado pelo segurado como tempo de serviço para fins previdenciários, especialmente quando o lapso vem regularmente registrado em sua CTPS e o INSS não demonstrou que o registro se deu mediante fraude.
Assim, entendo ser possível o cômputo dos períodos comuns acima mencionados.
Relativamente ao reconhecimento de tempo de serviço rural do autor, nascido em 27/10/55 (fls. 10), encontram-se acostadas aos autos as cópias dos seguintes documentos:
Os documentos dos itens "1" a "3" e "5" a "8" não podem ser reconhecidos como início de prova material.
A declaração do item "1" não foi homologada pelo Ministério Público ou pelo INSS (art. 106 da Lei nº 8.213/91). Os documentos dos itens "2" e "3" consistem em meros testemunhos reduzidos por escrito, não submetidos ao crivo do contraditório. Por sua vez, os documentos dos itens "5" a "8" encontram-se em nome de terceiro, nada revelando a respeito da atividade rural que se pretende comprovar.
O documento do item "4" constitui início de prova material, na medida em que descreve o autor como "lavrador".
Por sua vez, passo à apreciação da prova testemunhal (fls. 130/133):
A primeira testemunha afirmou "que conhece a pessoa do autor; que o autor exercia a função de lavrador, tendo trabalhado para a pessoa de CIRO SIQUEIRA, na fazenda São Sebastião da Várzea, no período de 1972 ou 1973; que o autor foi criado nessa fazenda São Sebastião da Várzea, exercendo a atividade de retireiro, olhando gado, fazendo de tudo no local, trabalhando também como lavrador em plantações de milho" (fls. 130/131).
A segunda testemunha informou que "começou a trabalhar como lavrador na fazenda São Sebastião da Vargem, de propriedade de CIRO SIQUEIRA, no ano de 1950, tendo a dizer que o autor trabalhou do ano de 1950 até 1973, na mesma propriedade rural, como lavrador, amarrando vaca para tirar leite, trabalhando na lavoura de café, carpindo, colhendo, tudo durante o ano inteiro; que o autor morava na mesma propriedade rural; que o autor foi criado nesta fazenda, sendo que o pai do autor também trabalhava como lavrador na mesma propriedade rural, exercendo inclusive a função de capataz" (fls. 132/133).
O documento considerado como início de prova material, somado ao depoimento da primeira testemunha, forma um conjunto harmônico apto a demonstrar que a parte autora exerceu atividades no campo, no período de 1º/1/72 a 30/11/73. Ressalvo que o mencionado tempo não poderá ser utilizado para fins de carência.
Quadra ressaltar que o depoimento da segunda testemunha não merece credibilidade, tendo em vista que afirmou ter a parte autora começado a trabalhar antes mesmo de seu nascimento.
Com relação ao reconhecimento de tempo de serviço especial, pretende o autor comprovar que exerceu atividades especiais nos seguintes períodos:
1) Período: 16/5/74 a 21/10/87.
Empresa: General Motors do Brasil Ltda.
Atividade/função: ajudante de manuseio de materiais, ajudante geral e conferente de material.
Agente(s) nocivo(s): ruído de 91 dB (16/5/74 a 30/4/76) e de 88 dB (1º/5/76 a 21/10/87).
Enquadramento legal: código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (acima de 80 decibéis), Decreto nº 2.172/97 (acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (acima de 85 decibéis).
Prova: Formulários (fls. 22, 24 e 26) e Laudos Técnicos (fls. 23, 25 e 27), datados de 18/12/97.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no período de 16/5/74 a 21/10/87, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, ao agente ruído acima do limite de tolerância. Segundo o engenheiro de segurança do trabalho responsável pelos Laudos Técnicos, "as avaliações ambientais dos níveis de barulho equivalente foram realizadas em 31/05/1977 à 09/08/1977 das 8 às 16 horas com revisões efetuadas periodicamente, confirmando-se até o momento, os valores obtidos anteriormente, adicionando as medições efetuadas nas novas áreas. EXTEMPORANEIDADE: a condição ambiental relatada corresponde de forma direta/analógica (por não ter havido mudanças significativas no tipo de máquinas/equipamentos) ao período indicado acima, conforme registros disponíveis em nossos arquivos" (fls. 23, 25 e 27).
No tocante à comprovação da exposição ao agente nocivo ruído, há a exigência de apresentação de laudo técnico ou PPP para comprovar a efetiva exposição a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. Após 5/3/97, o limite foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172/97. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03. Quadra mencionar, ainda, que o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo Representativo de Controvérsia nº 1.398.260/PR (2013/0268413-2), firmou posicionamento no sentido da impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, uma vez que deve ser aplicada a lei em vigor no momento da prestação do serviço.
2) Período: 6/1/92 a 30/10/92.
Empresa: Avibrás Indústria Aeroespacial S/A.
Atividade/função: ajudante de produção.
Agente(s) nocivo(s): derivados de hidrocarbonetos (clorotene, diisocianatos - DDI, DTD e resinas PBLH).
Enquadramento legal: código 1.2.11 do Decreto nº 53.831/64 e código 1.2.10 do Decreto n.º 83.080/79 (hidrocarbonetos).
Prova: Formulário (fls. 31), datado de 16/1/98.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no período de 6/1/92 a 30/10/92, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, a hidrocarbonetos.
Em se tratando de agentes químicos, impende salientar que a constatação dos mesmos deve ser realizada mediante avalição qualitativa e não quantitativa, bastando a exposição do segurado aos referidos agentes para configurar a especialidade do labor.
Nesse sentido, colaciono a jurisprudência abaixo transcrita, in verbis:
3) Período: 1º/3/96 a 5/3/97.
Empresa: Montenge - Manutenção e Instalações Eletromecânicas.
Atividade/função: eletricista especializado.
Agente(s) nocivo(s): ruído de 85 dB e tensão elétrica de 440 V.
Enquadramento legal: código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (ruído acima de 80 decibéis), Decreto nº 2.172/97 (ruído acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (ruído acima de 85 decibéis) e código 1.1.8 do Decreto nº 53.831/64 (tensão elétrica).
Prova: Formulário (fls. 33) e Laudo Técnico (fls. 34), datados de 5/3/98.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial no período de 1º/3/96 a 5/3/97, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, aos agentes ruído e tensão elétrica acima dos limites de tolerância.
Quanto ao tempo de atividade, observo que, somando os períodos reconhecidos nos presentes autos aos demais períodos trabalhados, perfaz o requerente o total de:
Tendo em vista que o requerente não preencheu os requisitos para aposentar-se antes da vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, passo à análise dos requisitos para a concessão da aposentadoria com fulcro na regra de transição (art. 9º, da EC nº 20/98).
No presente caso, o requisito etário ficou preenchido, uma vez que o demandante, nascido em 27/10/55 (fls. 10), contava com 53 (cinquenta e três) anos à época da citação (31/10/08 - fls. 68).
O autor trabalhou 28 anos, 5 meses e 12 dias até 16/12/98. Precisaria, então, comprovar 30 anos, 7 meses e 13 dias de tempo de serviço, a título de pedágio, nos termos do art. 9º, § 1º, inc. I, alínea "b", da EC nº 20/98.
Ficou demonstrado nos autos o total de 28 anos, 8 meses e 8 dias de tempo de serviço até 28/11/99 (data da entrada em vigor da Lei nº 9.876/99, que instituiu o fator previdenciário), insuficiente à obtenção do benefício.
No entanto, comprovou 30 anos, 11 meses e 4 dias de tempo de serviço até 7/6/06 (data do ajuizamento da ação), motivo pelo qual faz jus à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição, nos termos da regra de transição.
Tratando-se de segurado inscrito na Previdência Social em momento anterior à Lei nº 8.213/91, o período de carência é o previsto na tabela do art. 142 de referido diploma, o qual, no presente caso, foi em muito superado.
O termo inicial do benefício deve ser fixado na data da citação, momento em que a parte autora cumpriu os requisitos necessários para sua concessão.
A correção monetária deve incidir desde a data do vencimento de cada prestação e os juros moratórios a partir da citação, momento da constituição do réu em mora.
Com relação aos índices de atualização monetária e taxa de juros --- não obstante o meu posicionamento de que a referida matéria deveria ser discutida na fase da execução do julgado, tendo em vista a existência da Repercussão Geral no Recurso Extraordinário nº 870.947 a ser apreciada pelo C. Supremo Tribunal Federal ---, passei a adotar o entendimento da 8ª Turma desta Corte, a fim de que seja observado o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal que estiver em vigor no momento da execução do julgado.
Com relação aos honorários advocatícios, nos exatos termos do art. 20 do CPC/73:
Assim raciocinando, a verba honorária fixada, no presente caso, à razão de 10% sobre o valor da condenação remunera condignamente o serviço profissional prestado.
No que se refere à sua base de cálculo, considerando que o direito pleiteado pela parte autora foi reconhecido somente no Tribunal, passo a adotar o posicionamento do C. STJ de que os honorários devem incidir até o julgamento do recurso nesta Corte, in verbis: "Nos termos da Súmula n. 111 do Superior Tribunal de Justiça, o marco final da verba honorária deve ser o decisum no qual o direito do segurado foi reconhecido, que no caso corresponde ao acórdão proferido pelo Tribunal a quo." (AgRg no Recurso Especial nº 1.557.782-SP, 2ª Turma, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, j. em 17/12/15, v.u., DJe 18/12/15).
Considerando que a sentença tornou-se pública, ainda, sob a égide do CPC/73, entendo não ser possível a aplicação do art. 85 do novo Estatuto Processual Civil, sob pena de afronta ao princípio da segurança jurídica, consoante autorizada doutrina a respeito da matéria e Enunciado nº 7 do C. STJ: "Somente nos recursos interpostos contra decisão publicada a partir de 18 de março de 2016 será possível o arbitramento de honorários sucumbenciais recursais, na forma do art. 85, §11, do NCPC."
Na hipótese de a parte autora estar recebendo aposentadoria, auxílio-doença ou abono de permanência em serviço, deve ser facultado ao demandante a percepção do benefício mais vantajoso, sendo vedado o recebimento conjunto, nos termos do art. 124 da Lei nº 8.213/91.
Por derradeiro, no tocante ao prequestionamento da matéria, para fins de interposição de recursos aos tribunais superiores, não merece prosperar a alegação de eventual ofensa aos dispositivos legais e constitucionais, tendo em vista que houve análise da apelação em todos os seus aspectos.
Ante o exposto, nego provimento à apelação do INSS e à remessa oficial e dou parcial provimento ao recurso adesivo da parte autora, para reconhecer o exercício de atividade rural no período de 1º/1/72 a 31/12/72, exceto para fins de carência, e conceder-lhe a aposentadoria por tempo de contribuição a partir da data da citação, acrescida de correção monetária, juros de mora e honorários advocatícios, na forma acima indicada.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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