
| D.E. Publicado em 10/11/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Oitava Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, de ofício, julgar extinto o processo sem julgamento de mérito no tocante ao pedido de reconhecimento do labor rural e dar parcial provimento à apelação da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1105045-31.1998.4.03.6109/SP
RELATÓRIO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de ação ajuizada em 13/10/98 em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, visando à concessão de aposentadoria por tempo de serviço a partir da data em que o autor preencheu todos os requisitos para a concessão do referido benefício, mediante a declaração do labor rural exercido no período de 1º/1/60 a 1º/1/68, bem como o reconhecimento da especialidade das atividades exercidas nos períodos de 31/5/72 a 10/1/73, 16/11/76 a 12/2/77, 1º/6/77 a 31/5/78, 1º/3/79 a 10/10/79, 9/11/79 a 28/10/80, 1º/12/80 a 13/3/81, 23/6/81 a 18/9/81, 7/10/81 a 29/6/82, 16/8/82 a 21/2/83, 22/2/83 a 15/8/83, 15/9/83 a 30/11/83, 2/1/84 a 31/10/85, 6/2/86 a 21/12/86, 23/1/87 a 31/12/89, 17/5/90 a 3/6/95, 13/11/95 a 17/12/96 e 3/2/97 a 25/3/98.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
O Juízo a quo julgou improcedente o pedido de reconhecimento do labor rural, por ausência de início de prova material, ficando prejudicados os demais pedidos.
Inconformada, apelou a parte autora, alegando em breve síntese:
a) No mérito:
- o direito ao reconhecimento do labor rural exercido no período de 1º/1/60 a 1º/1/68, comprovado por início de prova material e prova testemunhal idônea;
- "que o Apelante trabalhou na construção civil, o que o enquadra nos códigos 1.2.10 (contato com a poeira do cimento) e 2.3.3 (trabalho na construção de edifícios), ambos do Decreto no. 53.831/64. (...) Por sua vez, no que importa aos trabalhos executados na Vega Sopave (17.05.90 a 03.06.95); Construtora Guimarães (03.02.97 a 25.03.98) e Marcos Dedini (13.11.95 a 17.12.96), se a insalubridade, decorrente respectivamente do contato com lixo urbano (Anexo 14 da NR-15), e do trabalho com capinação (NR-15), indica a atividade especial, e se o recebimento do adicional respectivo, que especifica o NR-15, item 15.2, está demonstrado nas fls. 24 e 25 dos autos, mostra-se obrigatória a conversão do tempo de serviço correspondente. O trabalho realizado como servente na Usina Santa Helena, e também na Usina Monte Alegre, por serem idênticas as funções executadas pelo Apelante nessas duas empresas, e iguais os ambientes de trabalho, o que se nota pelas anotações de fls. 13 e 20 desse processo, também deve ser objeto de conversão de tempo especial para comum, notadamente porque, em todas as áreas de trabalho foi constatado pela perícia, fl. 82, a presença de ruído de no mínimo 90 dB (...) Ademais, a atividade de foguista, fl. 77, também desenvolvida na Usina Santa Helena, está descrita como especial pelo Decreto no. 83.080/79, no código 2.5.3" (fls. 139/140) e
- o direito à concessão da aposentadoria por tempo de serviço, acrescida de correção monetária, juros de mora, custas processuais e honorários advocatícios.
Com contrarrazões, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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APELAÇÃO CÍVEL Nº 1105045-31.1998.4.03.6109/SP
VOTO
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): No que tange ao reconhecimento de tempo de serviço rural, dispõe o § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, in verbis:
"A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação administrativa ou judicial, conforme o disposto no Art. 108, só produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento." |
Da simples leitura do referido dispositivo legal, bem como da análise da legislação pertinente e da observância da jurisprudência dominante, depreende-se que para o reconhecimento do tempo de serviço é indispensável a existência de início de prova material, contemporânea à época dos fatos, corroborado por coerente e robusta prova testemunhal. Outrossim, nos termos da Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito da obtenção de benefício previdenciário." |
O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14). O E. Relator, em seu voto, deixou consignada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Nessa linha de compreensão, mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob o contraditório."
Ressalto, adicionalmente, que o C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo, mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova testemunhal robusta, conforme ementas a seguir transcritas:
Anoto que o convencimento da verdade de um fato ou de uma determinada situação jurídica raramente decorre de circunstância isoladamente considerada. Os indícios de prova material, singularmente analisados, talvez não fossem, por si sós, suficientes para formar a convicção do magistrado. Nem tampouco as testemunhas provavelmente o seriam. Mas a conjugação de ambos os meios probatórios - todos juridicamente idôneos para formar a convicção do juiz - torna inquestionável a comprovação da atividade laborativa rural.
Com relação às contribuições previdenciárias, dispõe o §2º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 que o tempo de serviço do segurado trabalhador rural, "anterior à data de início de vigência desta Lei, será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes, exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento." Havendo período posterior ao advento da Lei de Benefícios, sem o recolhimento das contribuições, o mesmo somente poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios. Quadra mencionar que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.352.791/SP, adotou o entendimento de que o período de atividade rural registrado em carteira profissional deve ser computado como carência.
No que se refere ao reconhecimento da atividade especial, a jurisprudência é pacífica quanto à aplicação da lei vigente à época em que exercido o trabalho, à luz do princípio tempus regit actum (Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.310.034-PR).
Quanto aos meios de comprovação do exercício da atividade em condições especiais, até 28/4/95, bastava a constatação de que o segurado exercia uma das atividades constantes dos anexos dos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. O rol dos referidos anexos é considerado meramente exemplificativo (Súmula nº 198 do extinto TFR).
Com a edição da Lei nº 9.032/95, a partir de 29/4/95 passou-se a exigir por meio de formulário específico a comprovação da efetiva exposição ao agente nocivo perante o Instituto Nacional do Seguro Social.
A Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, ao incluir o § 1º ao art. 58 da Lei nº 8.213/91, dispôs sobre a necessidade da comprovação da efetiva sujeição do segurado a agentes nocivos à saúde do segurado por meio de laudo técnico, motivo pelo qual considerava necessária a apresentação de tal documento a partir de 11/10/96.
No entanto, a fim de não dificultar ainda mais o oferecimento da prestação jurisdicional, passei a adotar o posicionamento no sentido de exigir a apresentação de laudo técnico somente a partir 6/3/97, data da publicação do Decreto nº 2.172, de 5/3/97, que aprovou o Regulamento dos Benefícios da Previdência Social. Nesse sentido, quadra mencionar os precedentes do C. Superior Tribunal de Justiça: Incidente de Uniformização de Jurisprudência, Petição nº 9.194/PR, Relator Ministro Arnaldo Esteves Lima, 1ª Seção, j. em 28/5/14, v.u., DJe 2/6/14; AgRg no AREsp. nº 228.590, Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, 1ª Turma, j. em 18/3/14, v.u., DJe 1º/4/14; bem como o acórdão proferido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais no julgamento do Pedido de Uniformização de Interpretação de Lei Federal nº 0024288-60.2004.4.03.6302, Relator para Acórdão Juiz Federal Gláucio Ferreira Maciel Gonçalves, j. 14/2/14, DOU 14/2/14.
Por fim, observo que o art. 58 da Lei nº 8.213/91, com a redação dada pela Medida Provisória nº 1.523 de 11/10/96, a qual foi convertida na Lei nº 9.528 de 10/12/97, em seu § 4º, instituiu o Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), sendo que, com a edição do Decreto nº 4.032/01, o qual alterou a redação dos §§ 2º e 6º e inseriu o § 8º ao art. 68 do Decreto nº 3048/99, passou-se a admitir o referido PPP para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos. Ademais, verifico que, com o advento do Decreto nº 8.123/13, o referido artigo assim dispôs:
Devo salientar também que o laudo (ou PPP) não contemporâneo ao exercício das atividades não impede a comprovação de sua natureza especial, desde que não tenha havido alteração expressiva no ambiente de trabalho.
Ademais, se em data posterior ao trabalho realizado foi constatada a presença de agentes nocivos, é de bom senso imaginar que a sujeição dos trabalhadores à insalubridade não era menor à época do labor, haja vista os avanços tecnológicos e a evolução da segurança do trabalho que certamente sobrevieram com o passar do tempo.
Com relação à conversão de tempo especial em comum, parece de todo conveniente traçar um breve relato de sua evolução histórica na ordenação jurídica brasileira.
Inicialmente, observo que a aposentadoria especial foi instituída pelo art. 31 da Lei nº 3.807, de 26/8/60 (Lei Orgânica da Previdência Social).
A Lei nº 6.887/80 acrescentou o § 4º ao art. 9º, da Lei nº 5.890/73, dispondo: "O tempo de serviço exercido alternadamente em atividades comuns e em atividades que, na vigência desta Lei, sejam ou venham a ser consideradas penosas, insalubres ou perigosas, será somado, após a respectiva conversão segundo critérios de equivalência a serem fixados pelo Ministério da Previdência Social, para efeito de aposentadoria de qualquer espécie."
Após diversas alterações legislativas, a Lei nº 8.213/91 dispôs sobre a aposentadoria especial em seus artigos 57 e 58.
A possibilidade de conversão do tempo especial em comum havia sido revogada pela edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98. No entanto, o referido dispositivo legal foi suprimido quando da conversão na Lei nº 9.711/98, razão pela qual, forçoso reconhecer que permanece em vigor a possibilidade dessa conversão. Ademais, a questão ficou pacificada com a edição do Decreto nº 4.827, de 3/9/03, que incluiu o § 2º ao art. 70 do Decreto nº 3.048/99, estabelecendo que "As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período." Nesse sentido, cabe ressaltar que o C. Superior Tribunal de Justiça firmou posicionamento no sentido de ser possível a conversão de tempo especial em comum no período anterior a 1º/1/81, bem como posterior à edição do art. 28, da Medida Provisória nº 1.663 de 28/5/98.
A questão relativa ao fator de conversão foi objeto de julgamento pelo C. Superior Tribunal de Justiça no Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.151.363/MG (2009/0145685-8). O E. Relator Ministro Jorge Mussi, em seu voto, bem explicitou a regra que se deve adotar ao asseverar: "Importa notar que a legislação em vigor na ocasião da prestação do serviço regula a caracterização e a comprovação da atividade sob condições especiais, conforme dispõe o § 1º supra. Ou seja, observa-se o regramento da época do trabalho para a prova da exposição aos agentes agressivos à saúde: se pelo mero enquadramento da atividade nos anexos dos Regulamentos da Previdência, se mediante as anotações de formulários do INSS ou, ainda, pela existência de laudo assinado por médico do trabalho. Diversamente, no tocante aos efeitos da prestação laboral vinculada ao Sistema Previdenciário, a obtenção de benefício fica submetida às regras da legislação em vigor na data do requerimento. Por essa razão, o § 2º deixa expresso que as regras de conversão do art. 70 aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período. Isso é possível porque a adoção deste ou daquele fator de conversão depende, tão somente, do tempo de contribuição total exigido em lei para a aposentadoria integral, ou seja, deve corresponder ao valor tomado como parâmetro, numa relação de proporcionalidade, o que corresponde a um mero cálculo matemático. Explica-se: O fator de conversão é o resultado da divisão do numero máximo de tempo comum (35 para homem e 30 para mulher) pelo número máximo de tempo especial (15, 20 e 25). Ou seja, o fator a ser aplicado ao tempo especial laborado pelo homem para convertê-lo em comum será 1,40, pois 35/25=1,40. Se o tempo for trabalhado por uma mulher, o fator será de 1,20, pois 30/25=1,20. Se o tempo especial for de 15 ou 20 anos, a regra será a mesma. Trata-se de regra matemática pura e simples e não de regra previdenciária. Observando-se os Decretos ns. 53.831/1964 e 83.080/1979, os quais traziam a lista de agentes nocivos e atividades insalubres, extrai-se a informação de que, em ambos os decretos, o tempo máximo de exposição aos agentes a que esteve exposto o recorrido (ruído e frio) era de 25 anos. Todavia, o tempo de serviço comum, para efeito de aposentadoria, constante daqueles decretos, era de, no máximo, 30 anos; portanto, o fator de conversão utilizado nessa hipótese era de 1,2. Destarte, o índice de 1,2 para conversão de tempo especial em aposentadoria comum com 30 anos de contribuição e o índice de 1,4 em relação à aposentadoria com 35 anos têm a mesma função. Converter para comum o tempo de serviço especial relativo à atividade com limite de 25 anos utilizando o fator de 1,2 seria prejudicial ao segurado (homem), porquanto a norma de regência exige, como tempo de contribuição, os 35 anos, como é de notório conhecimento.(...) Nesse contexto, com a alteração dada pelo Decreto n. 4.827/2003 ao Decreto n. 3.048/99, a Previdência Social, na via administrativa, passou a converter os períodos de tempo especial desenvolvidos em qualquer época pelas novas regras da tabela definida no artigo 70, que, para o tempo de serviço especial correspondente a 25 anos utiliza como fator de conversão, para homens, o multiplicador 1, 40. É o que se denota do artigo 173 da Instrução Normativa n. 20/2007". (grifos meus)
Quanto à aposentadoria por tempo de contribuição, para os segurados que cumpriram os requisitos anteriormente à vigência da Emenda Constitucional nº 20/98, devem ser observadas as disposições dos artigos 52 e 53, da Lei nº 8.213/91, em atenção ao princípio tempus regit actum:
Havendo a necessidade de utilização do período posterior à referida Emenda, deverão ser observadas as alterações realizadas pela referida Emenda aos artigos 201 e 202 da Constituição Federal de 1988, que extinguiu a aposentadoria proporcional por tempo de serviço no âmbito do regime geral de previdência social.
Transcrevo o §7º do art. 201 da Carta Magna com a nova redação:
Por sua vez, o art. 9º de referida Emenda criou uma regra de transição, ao estabelecer:
Contudo, no que tange à aposentadoria integral, cumpre ressaltar que, na redação do Projeto de Emenda à Constituição, o inciso I do §7º do art. 201, da Constituição Federal, associava tempo mínimo de contribuição (35 anos, para homem e 30 anos, para mulher) à idade mínima de 60 anos e 55 anos, respectivamente. Não sendo aprovada a exigência da idade mínima quando da promulgação da Emenda nº 20, a regra de transição para a aposentadoria integral restou inócua, uma vez que, no texto permanente (art. 201, §7º, inc. I), a aposentadoria integral será concedida levando-se em conta somente o tempo de contribuição.
Quadra mencionar que, havendo o cômputo do tempo de serviço posterior a 28/11/99, devem ser observados os dispositivos constantes da Lei nº 9.876/99 no que se refere ao cálculo do valor do benefício, consoante o julgamento realizado, em 10/9/08, pelo Tribunal Pleno do C. Supremo Tribunal Federal, na Repercussão Geral reconhecida no Recurso Extraordinário nº 575.089, de Relatoria do Exmo. Ministro Ricardo Lewandowski.
Passo à análise do caso concreto.
Relativamente ao reconhecimento de tempo de serviço rural do autor, nascido em 14/5/46 (fls. 33), encontram-se acostadas aos autos as cópias dos seguintes documentos:
Os documentos acima mencionados não podem ser reconhecidos como início de prova material.
A declaração do item "4" reduz-se a simples manifestação por escrito de prova meramente testemunhal, sem o crivo do contraditório. Por sua vez, os documentos dos itens "3" e "7" são extemporâneos ao período cujo reconhecimento se pleiteia. Por fim, as certidões constantes nos itens "1", "2", "5" e "6" não indicam o exercício de atividade rural pelo demandante.
No julgamento do Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.352.721-SP, o C. Superior Tribunal de Justiça firmou o entendimento de que "A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa".
Dessa forma, no tocante ao pedido de reconhecimento do labor rural exercido no período de 1º/1/60 a 1º/1/68, deve ser extinto o processo sem julgamento do mérito, com fulcro no art. 485, inc. IV, do CPC/15.
Passo à análise do pedido de reconhecimento de tempo de serviço especial:
1) Período: 31/5/72 a 10/1/73.
Empresa: Usina Monte Alegre S/A.
Atividade/função: serviços gerais da usina.
Prova: Atestado do procurador da empresa (fls. 13) e Laudo Pericial (fls. 71/93), datado de 5/7/01.
Conclusão: Não é possível o reconhecimento da especialidade do labor no período de 31/5/72 a 10/1/73, tendo em vista que não há informação de que o requerente esteve exposto a agentes nocivos e que a atividade de "serviços gerais da usina" não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas nos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79. Segundo o perito judicial, "[n]as funções de serviços gerais envolvendo a Usina Monte Alegre S/A, torna-se difícil comentar em função de não existir documentações e outras orientações que realmente comprovem as atividades do requerente" (fls. 88). Ademais, não ficou comprovado que as atividades e o ambiente de trabalho da Usina Monte Alegre e da Usina Santa Helena eram semelhantes.
2) Períodos: 16/11/76 a 12/2/77, 1º/6/77 a 31/5/78, 1º/3/79 a 10/10/79, 9/11/79 a 28/10/80, 1º/12/80 a 13/3/81, 23/6/81 a 18/9/81, 7/10/81 a 29/6/82, 16/8/82 a 21/2/83, 22/2/83 a 15/8/83 e 2/1/84 a 10/6/85.
Empresa: Obra S/A - Projetos e Construções, Sopec Construções Ltda., Sovias Construções Ltda., H. Guedes - Engenharia S/A e Construtora Fagundes Ltda.
Atividade/função: servente na construção civil.
Agente(s) nocivo(s): poeira e ruído (16/8/82 a 21/2/83) e enquadramento por categoria profissional.
Enquadramento legal: código 2.3.3 do Decreto 53.831/64.
Prova: CTPS (fls. 15/19 e 21), Formulário (fls. 96), datado de 3/7/01, e Laudo Pericial (fls. 71/93), datado de 5/7/01.
Conclusão: Ficou comprovada a especialidade do labor nos períodos de 16/11/76 a 12/2/77, 1º/6/77 a 31/5/78, 1º/3/79 a 10/10/79, 9/11/79 a 28/10/80, 1º/12/80 a 13/3/81, 23/6/81 a 18/9/81, 7/10/81 a 29/6/82, 16/8/82 a 21/2/83, 22/2/83 a 15/8/83 e 2/1/84 a 10/6/85, por enquadramento na categoria profissional de "trabalhadores em edifícios na construção civil". Afirmou o perito judicial que, embora a exposição aos agentes ruído e poeira não ocorra de modo habitual e permanente, a atividade do requerente na construção civil enquadra-se no código 2.3.3 do Decreto 53.831/64, pois "o perigo para o trabalhador na construção civil, faz sentido, em se considerando a atividade como serviço, ou seja, exercício de funções obrigatórias ou desempenho de um trabalho, onde a integridade física pode estar exposta a perigo, ou seja, estado em que se receia alguma coisa, risco, gravidade" (fls. 90).
3) Períodos: 15/9/83 a 30/11/83, 10/6/85 a 31/10/85, 6/2/86 a 21/12/86 e 23/1/87 a 31/12/89.
Empresa: Usina Santa Helena S/A.
Atividade/função: servente de usina.
Agente(s) nocivo(s): ruído de 90 a 101 dB.
Enquadramento legal: código 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 (acima de 80 decibéis), Decreto nº 2.172/97 (acima de 90 decibéis) e Decreto nº 4.882/03 (acima de 85 decibéis).
Prova: CTPS (fls. 20/22) e Laudo Pericial (fls. 71/93), datado de 5/7/01.
Conclusão: Ficou devidamente comprovado nos autos o exercício de atividade especial nos períodos de 15/9/83 a 30/11/83, 10/6/85 a 31/10/85, 6/2/86 a 21/12/86 e 23/1/87 a 31/12/89, em decorrência da exposição, de forma habitual e permanente, a ruído acima dos limites de tolerância.
No tocante à comprovação da exposição ao agente nocivo ruído, há a exigência de apresentação de laudo técnico ou PPP para comprovar a efetiva exposição a ruídos acima de 80 dB, nos termos do Decreto nº 53.831/64. Após 5/3/97, o limite foi elevado para 90 dB, conforme Decreto nº 2.172/97. A partir de 19/11/03 o referido limite foi reduzido para 85 dB, nos termos do Decreto nº 4.882/03. Quadra mencionar, ainda, que o C. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Recurso Especial Repetitivo Representativo de Controvérsia nº 1.398.260/PR (2013/0268413-2), firmou posicionamento no sentido da impossibilidade de aplicação retroativa do Decreto nº 4.882/03, uma vez que deve ser aplicada a lei em vigor no momento da prestação do serviço.
4) Período: 17/5/90 a 3/6/95.
Empresa: Vega - Sopave S/A.
Atividade/função: servente.
Descrição das atividades: "o requerente segundo informações efetuava limpeza de guias e sarjetas, capinação e roçadas de terrenos, varrição e limpeza de vias públicas" (fls. 77).
Prova: CTPS (fls. 23) e Laudo Pericial (fls. 71/93), datado de 5/7/01.
Conclusão: Não é possível o reconhecimento da especialidade do labor no período de 17/5/90 a 3/6/95, tendo em vista que a atividade de "servente" não se enquadra em nenhuma das hipóteses previstas nos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, que não ficou comprovada a exposição a agentes nocivos.
5) Período: 13/11/95 a 17/12/96.
Empresa: Marcos Dedini Ricciardi.
Atividade/função: jardineiro.
Descrição das atividades: "efetuando serviços de limpeza de jardim, aparar gramados, recolher sobras das capinações e roçadas" (fls. 77).
Prova: CTPS (fls. 27) e Laudo Pericial (fls. 71/93), datado de 5/7/01.
Conclusão: Não é possível o reconhecimento da especialidade do labor no período de 13/11/95 a 17/12/96, tendo em vista que não ficou comprovada a exposição a agentes nocivos.
6) Período: 3/2/97 a 25/3/98.
Empresa: Construtora Guimarães Castro Ltda.
Atividade/função: capinador.
Agente(s) nocivo(s): calor, frio, chuva e poeira.
Descrição das atividades: "o requerente trabalhava nas ruas e avenidas da cidade, varrendo e limpando calçadas, guias e sarjetas e, efetuava roçadas em terrenos e capinação" (fls. 77).
Prova: Formulário (fls. 37), datado de 24/4/98, e Laudo Pericial (fls. 71/93), datado de 5/7/01.
Conclusão: Não ficou comprovada a especialidade do labor no período de 3/2/97 a 25/3/98, tendo em vista que, não obstante haver a informação de que o requerente esteve exposto a calor e frio, não é possível aferir, pela documentação juntada aos autos, os respectivos níveis a que o demandante esteve efetivamente exposto no ambiente de trabalho. Outrossim, o agente "chuva" não encontra previsão nos Decretos nºs 53.831/64 e 83.080/79, tampouco a menção genérica a "poeira", sem indicação de sua composição química, permite aferir o caráter especial da atividade exercida.
Segundo o perito judicial, "[q]uanto ao trabalho como capinador e servente de limpeza pública (varrição, roçadas de terreno, limpeza de guias) não são observados agentes prejudiciais a saúde do Autor e o adicional de insalubridade foi instituído por convenção coletiva dos trabalhadores" (fls. 88). Quadra ressaltar, ainda, que o fato de o requerente ter percebido adicional de insalubridade não é suficiente para o reconhecimento da especialidade do labor exercido, pois o C. STJ já decidiu que "O percebimento de adicional de insalubridade, por si só, não é prova conclusiva das circunstâncias especiais do labor e do conseqüente direito à conversão do tempo de serviço especial para comum, tendo em vista serem diversas as sistemáticas do direito trabalhista e previdenciário." (EAResp. n.º 1005028, Rel. Des. Convocado do TJ/SP Celso Limongi, 6ª Turma, v.u., DJe de 2/3/09).
Quanto ao tempo de atividade, observo que, somando os períodos especiais reconhecidos nos presentes autos aos demais períodos trabalhados, perfaz o requerente o total de 23 anos, 10 meses e 15 dias de tempo de serviço até 13/10/98 (data do ajuizamento da ação), insuficiente para a concessão do benefício.
Com relação aos honorários advocatícios, os mesmos devem ser fixados nos termos do art. 21, caput, do CPC/73 tendo em vista que ambos foram simultaneamente vencedores e vencidos.
Ante o exposto, de ofício, julgo extinto o processo sem julgamento de mérito no tocante ao pedido de reconhecimento do labor rural, com fulcro no art. 485, inc. IV, do CPC e dou parcial provimento à apelação da parte autora para reconhecer o caráter especial das atividades exercidas nos períodos de 16/11/76 a 12/2/77, 1º/6/77 a 31/5/78, 1º/3/79 a 10/10/79, 9/11/79 a 28/10/80, 1º/12/80 a 13/3/81, 23/6/81 a 18/9/81, 7/10/81 a 29/6/82, 16/8/82 a 21/2/83, 22/2/83 a 15/8/83, 15/9/83 a 30/11/83, 2/1/84 a 10/6/85, 10/6/85 a 31/10/85, 6/2/86 a 21/12/86 e 23/1/87 a 31/12/89 e fixar a sucumbência recíproca.
É o meu voto.
Newton De Lucca
Desembargador Federal Relator
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