Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5267925-94.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal THEREZINHA ASTOLPHI CAZERTA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
14/07/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 20/07/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO.RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE PROVA
MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- Conjunto probatório insuficiente à comprovação de atividade rural no período alegado.
- Apelação a que se nega provimento.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTribunal Regional Federal da 3ª Região
8ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5267925-94.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: NILSA DA SILVA ESTEVAN BALLESTERO
Advogado do(a) APELANTE: JOAO PIRES GAVIAO NETO - SP255755-N
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5267925-94.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: NILSA DA SILVA ESTEVAN BALLESTERO
Advogado do(a) APELANTE: JOAO PIRES GAVIAO NETO - SP255755-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-R E L A T Ó R I O
Demanda proposta objetivando o reconhecimento e averbação de trabalho rural e a expedição
de certidão de tempo de serviço (Id. 134066273).
Inocorreu audiência de instrução e julgamento, tendo em vista a manifestação da autora
requerendoo julgamento antecipado do feito (Id. 134066273) e a ausência de manifestação do
INSS (Id. 134066300).
O juízo a quo julgou improcedente o pedido formulado (Id. 134066314).
Foram opostos embargos de declaração pela autora (Id. 134066317).
Em 04.11.2019, o magistrado de primeiro grau proferiu Decisão negando provimento aos
embargos de declaração “mantendo a sentença tal como lançada, por seus próprios e jurídicos
fundamentos” (Id. 134066324)
A parte autora apela, pleiteando a reforma da sentença, sustentando, em síntese, ter sido
comprovado o alegado trabalho rural, motivo pelo qual requer a procedência da Apelação (Id.
134066327).
Sem contrarrazões (Id. 134066333), subiram os autos.
Em 13.02.2020, a parte autora peticionou requerendo o regular prosseguimento do processo
(Id. 134066332), reiterado em 09.04.2021 (Id. 156631913).
É o relatório.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5267925-94.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 27 - DES. FED. THEREZINHA CAZERTA
APELANTE: NILSA DA SILVA ESTEVAN BALLESTERO
Advogado do(a) APELANTE: JOAO PIRES GAVIAO NETO - SP255755-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
-V O T O
Tempestivo o recurso e presentes os demais requisitos de admissibilidade, passa-se ao exame
da insurgência propriamente dita, considerando-se a matéria objeto de devolução.
Inicialmente, registre-se que, não se trata de declaração de tempo de serviço para fins de
contagem recíproca.
Conforme informações do CNIS, a demandante é, contribuinte facultativa, vinculada ao RGPS.
Dessa forma, não se trata de declaração de tempo de serviço para fins de contagem recíproca.
RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL
A parte autora pleiteia o reconhecimento do labor rural por ela exercido no período de setembro
de 1985 a dezembro de 2007.
O art. 55, § 3.º, da Lei n.° 8.213/91, dispõe sobre a obrigatoriedade de início de prova
documental para a comprovação de tempo de serviço, para fins previdenciários, sendo
insuficiente a produção de prova exclusivamente testemunhal, a qual, por si só, não é válida à
demonstração do desempenho do trabalho tido como realizado.
Especificamente a respeito do reconhecimento da atividade de natureza rural, a orientação de
há muito conferida pelo Superior Tribunal de Justiça acerca da imprestabilidade da prova
exclusivamente testemunhal (verbete n.º 149 da Súmula da Jurisprudência do STJ) apresenta-
se preservada, consoante se observa da ementa do acórdão tirado do julgamento do REsp
1.133.863/RN, sob a sistemática do art. 543-C do diploma processual de 1973 (3.ª Seção,
relator Desembargador Convocado do TJ/SP Celso Limongi, DJe de 15.4.2011), reafirmando-se
as premissas em questão, no pressuposto de que “prevalece o entendimento de que a prova
exclusivamente testemunhal não basta, para o fim de obtenção de benefício previdenciário, à
comprovação do trabalho rural, devendo ser acompanhada, necessariamente, de um início
razoável de prova material (art. 55, § 3º, da Lei n. 8.213/91 e Súmula 149 deste Superior
Tribunal de Justiça)”.
A Corte Superior consolidou o entendimento de que, não obstante sua indispensabilidade, o
fato de o início de prova material não abranger todo o lapso temporal pretendido não implica
violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for
complementada por prova testemunhal idônea e consistente que lhe amplie a eficácia.
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR
RURAL. TEMA STJ 554. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ABRANGÊNCIA DE TODO O
PERÍODO PRETENDIDO. DESNECESSIDADE. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA
PELA PROVA TESTEMUNHAL. POSSIBILIDADE.
REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO.IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.
(...)
3. O Recurso Especial combatia decisum da Corte a quo que considerou suficiente a prova
material dos autos para atestar o exercício da atividade rural, em caso de aposentadoria por
idade de trabalhador boia-fria.
4.O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial representativo da controvérsia,
pacificou o assunto ora tratado nos seguintes termos: "Tema STJ 554 - Aplica-se a Súmula
149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola,
para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados
'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado,
considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a
apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica
violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for
complementada por idônea e robusta prova testemunhal".
(...)
7. Ainda que assim não fosse, conforme jurisprudência do STJ, osdocumentos trazidos aos
autos pela autora, caracterizados comoinício de prova material, podem ser corroborados por
prova testemunhal firme e coesa, e estender sua eficácia tanto para períodos anteriores como
posteriores aos das provas apresentadas. Nesse sentido: REsp 1.348.633/SP, Rel. Ministro
Arnaldo EstevesLima, Primeira Seção, DJe 5/12/2014, acórdão sujeito ao regime doart. 543-C
do CPC/1973; AgRg no REsp 1.435.797/PB, Rel. MinistroBenedito Gonçalves, Primeira Turma,
DJe 10/11/2016, AgInt no AREsp 673.604/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma,
DJe 14/2/2017.
9. Agravo conhecido para conhecer parcialmente do Recurso Especial, apenas no tocante à
citada violação do art. 1.022 do CPC/2015, e, nessa parte, não provido.
(AREsp 1550603/PR, Segunda Turma, Min. Herman Benjamin, DJe 11/10/2019)
Por fim, ainda sob o rito do referido art. 543-C do Código de Processo Civil, o Superior Tribunal
de Justiça apreciou o REsp 1.348.633/SP, de relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima (DJe
de 05/12/2014), pacificando a possibilidade de reconhecimento de trabalho rural desenvolvido
anteriormente ao documento mais antigo apresentado como início de prova material, desse
entendimento resultando a Súmula 577/STJ:
“É possível reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo
apresentado, desde que amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o
contraditório”.
Com relação ao recolhimento de contribuições previdenciárias, o art. 55, § 2.º, da Lei n.°
8.213/91 preceitua que a atividade rural desempenhada em data anterior a novembro de 1991
pode ser considerada para averbação do tempo de serviço, sem necessidade de recolhimento
de contribuições previdenciárias, exceto para fins de carência.
A partir do advento da Lei n.º 8.213/91, cabe ao segurado especial o recolhimento de
contribuições previdenciárias facultativas, se pretender o cômputo do tempo de serviço rural
para fins de obtenção de outros benefícios que não os arrolados no inciso I do art. 39.
DO CASO DOS AUTOS
A parte autora alega ter desenvolvido atividade rural com registro de 15/08/1985 a 24/01/2008,
requerendo a averbação do período de setembro de 1985 a dezembro de 2007 e a expedição
de certidão de tempo de serviço para fins de aposentadoria.
Para comprovar as alegações foram juntados, como elementos de prova:
- Comunicação de Dispensa – CD do Ministério do Trabalho e Emprego, em nome da autora,
constando como empregador “AMANCIO ESTEVÃO – FAZENDA TRES RANCHOS”, com data
de saída em 24/01/2008;
- Extrato do Sistema CNIS, datado de 01.10.2012, em nome da requerente, constando como
empregador “AMANCIO ESTEVAO”, com data de admissão em 15/08/1985 e última
remuneração em 12/2007, bem como o recolhimento de contribuições de 02/2011 a 12/2011 e
02/2012 a 08/2012;
- Demonstrativo do Trabalhador de Recolhimento FGTS Rescisório, com data de admissão em
15/08/1985, no qual consta como empregador “AMANCIO ESTEVAO” e logradouro “FAZENDA
TRES RANCHOS 0000179”;
- TERMO DE RESCISÃO DO CONTRATO DE TRABALHO em nome da ora apelante, com data
de admissão em 15/08/1985 e afastamento em 24/01/2008;
- Cópia do Livro de Registro de Empregado da Estancia Vale do Sol, datado de 04.08.1985,
constando o negócio de Agro-Pecuária, sem inscrição no INPS, constando que a autora foi
admitida em 15.08.1985;
Cabe ressaltar que também acostou-se aos autos a cópia da certidão de casamento da autora
com o Sr. Amancio Estevão, celebrado em 06/04/1968, qualificando-a como doméstica e seu
cônjuge como bancário, bem como a cópia da segunda via daCTPS da demandante, com data
da emissão em 28/06/2004, constando o único registro para o empregador, marido da
requerente, no estabelecimento “Agropecuário”, no cargo serviços gerais, com data de
admissão em 15/08/1985 e data de saída em 24/01/2008.
Frise-se que as anotações em CTPS gozam de presunção de veracidade juris tantum, devendo
o INSS demonstrar a ocorrência de eventual irregularidade para desconsiderá-las.
Ocorre que o INSS juntou as informações do Sistema CNIS da Previdência Social, datado de
09/05/2019, constando somente os seguintes registros:
- RECOLHIMENTO, como contribuinte individual de 01/02/2011 a 31/12/2012 e
- RECOLHIMENTO, como contribuinte “Facultativo” de 01/11/2016 a 31/03/2018 e 01/05/2018 a
31/05/2019.
Insta asseverar que os dados constantes do CNIS, juntado pela autora, relativo ao vínculo
alegado, foi impugnado pelo INSS, tendo em vista a sua extemporaneidade.
Cumpre mencionar que para ser aceita as informações constantes do CNIS, devem ser
corroboradas por documentos que comprovem a sua regularidade, nos termos do art. 19, § 2.º
do Decreto n.º 3.048/99.
Consta dos autos, também, que no procedimento administrativo foi efetuada visita ao local do
serviço alegado, conforme previsto nos §§ 3.º e 5.º do art. 19, do Decreto acima mencionado,
tendo sido relatado que: “COMPROVADO QUE O LOCAL SE TRATA DE UM BAIRRO
CHAMADO TRÊS RANCHOS, QUE FOI DIVIDIDO EM VÁRIOS LOTES. LOCALIZADO O
SÍTIO PERTENCENTE AO SR. AMANCIO ESTEVÃO, EM VISTORIA REALIZADA NO LOCAL.
FICOU COMPROVADO QUE NO LOCAL EXISTE SOMENTE UMA CASA ANTIGA, ONDE
MORA O SR. LUIZ MANOEL DO SANTOS E SUA ESPOSA, BENEDITA APARECIDA DA
SILVA, QUE DECLARARAM QUE SÃO OS ÚNICOS QUE FICAM NO LOCAL, SOMENTE
PARA TOMAR CONTA DO SÍTIO, NA FUNÇÃO DE CASEIRO, DECLARARAM AINDA QUE A
SRA. NILSA NÃO TRABALHA NO LOCAL E MUITO RARAMENTE APARECE POR LÁ, UMA
VEZ QUE A MAIOR PARTE DO SÍTIO É ARRENDADA PARA CRIAÇÃO DE BÚFALOS. EM
CONTATO TELEFÔNICO COM A SRA. NILSA NO DIA DA VISITA AO SÍTIO, A MESMA NÃO
SE ENCONTRAVA TRABALHANDO EM LUGAR ALGUM, SENDO QUE ESTAVA NA SUA
RESIDÊNCIA QUE FICA NA ÁREA URBANA”, consta, ainda, que a vizinhança foi questionada
a respeito da autora, tendo sido informado que “NINGUÉM A CONHECE POR LÁ, A CASA
ESTÁ ABANDONADA E NÃO HÁ SINAIS DE QUE HÁ LABOR NA LOCALIDADE. APÓS
VÁRIOS CONTATOS REALIZADOS NA VIZINHANÇA NENHUM SE LEMBRA DA
PESQUISADA TRABALHANDO NA LOCALIDADE ANTE O EXPOSTO CONCLUO QUE NÃO
HOUVE EFETIVA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS POR PARTE DA SEGURADA” (Id.
134066304).
Em que pese os documentos acostados pela parte autora, verifica-se que não é suficiente esse
início de prova material e não há prova testemunhal produzida nos autos atestando o trabalho
rural da autora no período alegado.
Conforme bem destacou o magistrado sentenciante, in verbis:
“A autora apresentou documentos para comprovar o trabalho rural. Contudo, tais documentos
não demonstram o exercício efetivo da atividade rural. A mera indicação da profissão de
‘serviços gerais’ em propriedade rural, bem como declarações junto a órgãos e entidades
sindicais, por serem atos exclusivamente unilaterais da pessoa declarante, não consistem em
início de prova material a ensejar o reconhecimento da atividade rural, visto que nem mesmo a
prova testemunhal, por si só, é apta para tal reconhecimento.
A lei previdenciária exige, para comprovação de labor rural, o início de prova material, com
possibilidade de posterior complementação com prova testemunhal, conforme se infere no
artigo 55, § 3º, da Lei 8.213/91. No presente caso, não há início de prova material do período de
labor rural declinado na inicial.
O C. Superior Tribunal de Justiça editou a súmula 577, com a seguinte redação: ‘É possível
reconhecer o tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo apresentado, desde que
amparado em convincente prova testemunhal colhida sob o contraditório’.
Nesse contexto, além de não haver início de prova material, intimada a indicar as provas que
pretendia produzir (fls. 48/49), a autora sequer apresentou rol de testemunhas, requerendo o
julgamento do feito no estado em que se encontrava (fls. 51/52).
Não bastasse isso, a própria autora informou que trabalhava para o seu marido, na propriedade
rural adquirida por ambas as partes, tendo sido registrada como funcionária por necessidade,
tendo em vista que ele passava muito tempo viajando como organizador e implantador de
agências bancárias. Essas circunstâncias colocam em dúvida se a autora de fato exerceu a
função de empregada rural.
Assim, não há prova convincente do tempo de serviço rural”.
Dessa forma, embora a documentação juntada qualifique a autora como lavradeira, não é
suficiente esse início de prova material a corroborar o exercício da atividade rural, eis que o
conjunto probatório não se mostra apto à comprovação do vínculo empregatício no período
alegado.
Posto isso, nego provimento à apelação.
É o voto.
THEREZINHA CAZERTA
Desembargadora Federal Relatora
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO.RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. INÍCIO DE
PROVA MATERIAL. PROVA TESTEMUNHAL.
- A atividade rural deve ser comprovada por meio de início de prova material, aliada à prova
testemunhal.
- Conjunto probatório insuficiente à comprovação de atividade rural no período alegado.
- Apelação a que se nega provimento.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu negar provimento à apelação, nos termos do relatório e voto que ficam
fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
