Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5137013-43.2019.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal NEWTON DE LUCCA
Órgão Julgador
8ª Turma
Data do Julgamento
09/08/2019
Data da Publicação/Fonte
e - DJF3 Judicial 1 DATA: 19/08/2019
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. PROVA DA
CONDIÇÃO DE RURÍCOLA. CONJUNTO HARMÔNICO.
I- Inicialmente, tendo em vista o julgamento dos Embargos de Divergência nº 600.596/RS, pela
Corte Especial do C. STJ, deve ser apreciada a remessa oficial em ações meramente
declaratórias.
II- Recurso da parte autora não conhecido, no tocante ao pedido de concessão de aposentadoria,
tendo em vista que essa parte do recurso se apresenta desprovida de conexão lógica com a
decisão impugnada, apresentando razões dissociadas do caso concreto, uma vez que a própria
autora aditou a inicial para afastar tal pedido.
III- Tratando-se de comprovação de tempo de serviço, é indispensável a existência de início
razoável de prova material da atividade rural, contemporânea à época dos fatos, corroborada por
coerente e robusta prova testemunhal.
IV- O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de
Controvérsia nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no sentido de ser possível o
reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material
sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto
que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator
Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14). O E. Relator, em seu
voto, deixou consignada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Nessa linha de compreensão,
mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob o contraditório."
V- Adicionalmente, ressalta-se que o C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o
Recurso Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento
do tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais
antigo, mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova
testemunhal robusta.
VI- A legislação, ao vedar o trabalho infantil, tem por escopo proteger o menor, não podendo ser
utilizada em prejuízo do trabalhador, motivo pelo qual é possível o reconhecimento da atividade
rural a partir dos 12 anos de idade.
VII- No caso concreto, o acervo probatório autoriza o reconhecimento da atividade rural nos
períodos de 18/6/89 a 15/6/95, 18/6/95 a 10/9/98, 27/9/98 a 15/9/01 e de 19/9/01 a 3/2/08
(véspera de seu primeiro registro em CTPS). Ressalva-se que, a atividade rural reconhecida no
período anterior à Lei nº 8.213/91, não poderá ser utilizado para fins de carência, e que o período
posterior à mencionada Lei só poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39,
inc. I, da Lei de Benefícios.
VIII- Os honorários advocatícios fixados à razão de 10% sobre o valor da causa remunera
condignamente o serviço profissional prestado.
IX- Apelação da parte autora conhecida em parte e parcialmente provida. Remessa oficial, tida
por ocorrida, e apelação do INSS parcialmente providas.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5137013-43.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LUCIA OLIVEIRA DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: SILVIA HELENA LUZ CAMARGO - SP131918-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUCIA OLIVEIRA DOS
SANTOS
Advogado do(a) APELADO: SILVIA HELENA LUZ CAMARGO - SP131918-N
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5137013-43.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
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APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUCIA OLIVEIRA DOS
SANTOS
Advogado do(a) APELADO: SILVIA HELENA LUZ CAMARGO - SP131918-N
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Trata-se de
ação ajuizada em face do INSS - Instituto Nacional do Seguro Social, pleiteando a concessão do
benefício de aposentadoria por idade, mediante o reconhecimento do tempo de serviço exercido
na atividade rural, nos períodos de 18/6/89 a 15/6/95, 18/6/95 a 10/9/98, 27/9/98 a 15/9/01 e de
19/9/01 a 30/9/08.
Foram deferidos à parte autora os benefícios da assistência judiciária gratuita.
A parte autora emendou a inicial para o fim de manter apenas o pedido de reconhecimento do
tempo de serviço exercido na atividade rural, com a expedição da respectiva certidão.
O Juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer a atividade rural
exercida no lapso de 18/6/89 a 24/7/91, independentemente do recolhimento das contribuições
previdenciárias. Por fim, condenou a autarquia ao pagamento de despesas processuais, bem
como de honorários advocatícios fixados em 10% sobre o valor da causa.
Inconformada, apelou a autarquia, pleiteando a reforma da R. sentença, julgando-se
improcedente o pedido.
Por sua vez, recorreu a parte autora, pugnando pelo reconhecimento do labor rural por todos os
períodos pleiteados na exordial, com a consequente concessão da aposentadoria.
Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta E. Corte.
É o breve relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5137013-43.2019.4.03.9999
RELATOR: Gab. 26 - DES. FED. NEWTON DE LUCCA
APELANTE: LUCIA OLIVEIRA DOS SANTOS, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL -
INSS
Advogado do(a) APELANTE: SILVIA HELENA LUZ CAMARGO - SP131918-N
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, LUCIA OLIVEIRA DOS
SANTOS
Advogado do(a) APELADO: SILVIA HELENA LUZ CAMARGO - SP131918-N
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O SENHOR DESEMBARGADOR FEDERAL NEWTON DE LUCCA (RELATOR): Inicialmente,
tendo em vista o julgamento dos Embargos de Divergência nº 600.596/RS, pela Corte Especial do
C. STJ, deve ser apreciada a remessa oficial em ações meramente declaratórias.
Outrossim, não conheço de parte do recurso da parte autora, no tocante ao pedido de concessão
de aposentadoria, tendo em vista que essa parte do recurso se apresenta desprovida de conexão
lógica com a decisão impugnada, apresentando razões dissociadas do caso concreto, uma vez
que a própria autora aditou a inicial para afastar tal pedido.
Passo, então, à análise das apelações e da remessa oficial, tida por ocorrida.
No que tange ao reconhecimento de tempo de serviço rural, dispõe o § 3º do artigo 55 da Lei nº
8.213/91, in verbis:
"A comprovação do tempo de serviço para os efeitos desta Lei, inclusive mediante justificação
administrativa ou judicial, conforme o disposto no Art. 108, só produzirá efeito quando baseada
em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na
ocorrência de motivo de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento."
Da simples leitura do referido dispositivo legal, bem como da análise da legislação pertinente e da
observância da jurisprudência dominante, depreende-se que para o reconhecimento do tempo de
serviço é indispensável a existência de início de prova material, corroborado por coerente e
robusta prova testemunhal. Outrossim, nos termos da Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de
Justiça, in verbis:
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito
da obtenção de benefício previdenciário."
O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de Controvérsia
nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no sentido de ser possível o reconhecimento do "tempo
de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material sem delimitar o documento
mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto que corroborado por
testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator Ministro Arnaldo Esteves
Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14). O E. Relator, em seu voto, deixou consignada a
regra que se deve adotar ao afirmar: "Nessa linha de compreensão, mostra-se possível o
reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais antigo, desde que
amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob o contraditório."
Ressalto, adicionalmente, que o C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o Recurso
Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento do
tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais antigo,
mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova
testemunhal robusta, conforme ementas a seguir transcritas:
"PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. RURAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL.
VALIDADE DOS DOCUMENTOS EM NOME DO CÔNJUGE, DESDE QUE COMPLEMENTADA
COM ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL. EFICÁCIA PROBATÓRIA DOS DOCUMENTOS
APRESENTADOS. PERÍODO ANTERIOR E POSTERIOR. VALORAÇÃO DO CONJUNTO
PROBATÓRIO POSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ AFASTADO.
1. O labor campesino, para fins de percepção de aposentadoria rural por idade, deve ser
demonstrado por início de prova material e ampliado por prova testemunhal, ainda que de
maneira descontínua, no período imediatamente anterior ao requerimento, pelo número de meses
idêntico à carência.
2. São aceitos, como início de prova material, os documentos em nome do cônjuge que o
qualifiquem como lavrador, mesmo após seu falecimento, desde que a prova documental seja
complementada com robusta e idônea prova testemunhal, atestando a continuidade da atividade
rural.
3. No julgamento do Resp 1.348.633/SP, da relatoria do Ministro Arnaldo Esteves Lima,
submetido ao rito do art. 543-C do CPC, esta Corte, examinando a matéria concernente à
possibilidade de reconhecimento do período de trabalho rural anterior ao documento mais antigo
apresentado, consolidou o entendimento de que a prova material juntada aos autos possui
eficácia probatória tanto para o período anterior quanto para o posterior à data do documento,
desde que corroborado por robusta prova testemunhal.
4. O juízo acerca da validade e eficácia dos documentos apresentados como o início de prova
material do labor campesino não enseja reexame de prova, vedado pela Súmula 7/STJ, mas sim
valoração do conjunto probatório existente (AgRg no REsp 1.309.942/MG, Rel. Ministro
NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 20/03/2014, DJe 11/04/2014).
5. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STJ, Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.452.001/SP, 1ª Turma, Relator Ministro Sérgio
Kukina, j. em 5/3/15, v.u., DJ 12/3/15, grifos meus)
"AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. INÍCIO DE PROVA MATERIAL
EXTEMPORÂNEO. RATIFICAÇÃO POR MEIO DE ROBUSTA PROVA TESTEMUNHAL.
MATÉRIA DEFINIDA EM SEDE DE RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. CUMULAÇÃO DE
APOSENTADORIA RURAL POR IDADE COM PENSÃO ESTATUTÁRIA. POSSIBILIDADE.
PRECEDENTES. PERCEPÇÃO DE PENSÃO. REGIME DE ECONOMIA FAMILIAR.
CARACTERIZAÇÃO. RENDAS NÃO MENSURADAS. SÚMULA 7/STJ.
1. Este Superior Tribunal firmou entendimento de que as provas testemunhais, tanto do período
anterior ao mais antigo documento quanto do posterior ao mais recente, são válidas para
complementar o início de prova material do tempo de serviço rural (Recurso Especial Repetitivo
1.348.633/SP - acórdão ainda não publicado).
2. Por serem benefícios com distintos fundamentos legais, não há óbice à cumulação de
aposentadoria rural com pensão estatutária.
3. Somente se descaracteriza o regime de economia familiar, caso a renda derivada de outra
atividade supere, ou dispense, a obtida no labor rural. No caso dos autos, entretanto, tal
cotejamento não foi mencionado pelo acórdão de origem, sendo inviável fazê-lo em sede de
recurso especial, em razão do óbice da Súmula 7/STJ.
4. Agravo regimental a que se nega provimento."
(STJ, Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.347.289/SP, 2ª Turma, Relator Ministro Og
Fernandes, j. em 24/4/14, v.u., DJ 20/5/14, grifos meus)
Anoto que o convencimento da verdade de um fato ou de uma determinada situação jurídica
raramente decorre de circunstância isoladamente considerada.
Os indícios de prova material, singularmente analisados, talvez não fossem, por si sós, suficientes
para formar a convicção do magistrado. Nem tampouco as testemunhas provavelmente o seriam.
Mas a conjugação de ambos os meios probatórios - todos juridicamente idôneos para formar a
convicção do juiz - torna inquestionável a comprovação da atividade laborativa rural.
Observo, por oportuno, que a listagem dos documentos mencionados no art. 106 da Lei nº
8.213/91 é meramente exemplificativa, consoante precedente jurisprudencial do C. STJ (REsp. nº
433.237, 5ª Turma, Relator Min. Gilson Dipp, j. 17/9/2002, DJ 14/10/02, p. 262, v.u.).
Com relação às contribuições previdenciárias, dispõe o §2º do art. 55 da Lei nº 8.213/91 que o
tempo de serviço do segurado trabalhador rural, "anterior à data de início de vigência desta Lei,
será computado independentemente do recolhimento das contribuições a ele correspondentes,
exceto para efeito de carência, conforme dispuser o Regulamento." Havendo período posterior ao
advento da Lei de Benefícios, sem o recolhimento das contribuições, o mesmo somente poderá
ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios. Quadra
mencionar que o C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo
de Controvérsia nº 1.352.791/SP, adotou o entendimento de que o período de atividade rural
registrado em carteira profissional deve ser computado como carência.
Passo à análise do caso concreto.
Relativamente ao reconhecimento de tempo de serviço rural da parte autora, nascida em 18/6/77,
nos períodos de 18/6/89 a 15/6/95, 18/6/95 a 10/9/98, 27/9/98 a 15/9/01 e de 19/9/01 a 30/9/08,
encontram-se acostadas aos autos as cópias dos seguintes documentos:
1) CTPS da autora, com registros como trabalhadora rural entre os anos de 2008 e 2016;
2) Certidão de Casamento dos pais da requerente, celebrado em 1972, qualificando seu genitor
como lavrador;
3) Certificado de Dispensa de Incorporação do pai da requerente, expedido em 1979,
qualificando-o como lavrador;
4) Declarações Cadastrais de Produtor em nome do pai da demandante, referentes às décadas
de 80;
5) Notas Fiscais de Produtor em nome do pai da autora, emitidas no ano de 1996;
6) Declarações Cadastrais de Produtor em nome do pai da autora, emitidas na década de 90;
7) Contrato Particular de Parceria Agrícola celebrado pelo genitor da requerente, datado de 1998;
8) Contrato Particular de Subparceria Agrícola (porcenteiros) no Sitio Santa Helena, em nome do
genitor da autora, datado de 2001;
9) Contrato Particular de Parceria Agrícola (porcenteiros)-Sitio São João, em nome do pai da
requerente, datado de 2005;
10) Declaração Cadastral de Produtor em nome do pai da demandante, datada de 2006;
11) Certidão de Casamento da autora, celebrado em 5/2/16;
12) Pedido de Talonário de Produtor em nome do pai da autora, datado de 1986;
13) Declaração para fins de inscrição no Cadastro de Produtores Rurais, em nome do pai da
autora como parceiro no Sitio São Paulo, datada de 1988;
14) Pedidos de Talonários (PTP), em nome do pai da requerente, datados de 1988 e 1992;
15) Declaração para fins de inscrição no Cadastro de Produtores Rurais em nome do genitor da
autora, datada de 1992;
16) Declaração Cadastral de Produtor em nome do pai da autora, datada de 1995;
17) Pedido de Talonário (PTP), em nome do pai da requerente, datado de 1995;
18) Carteira do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Adamantina, em nome do pai da autora,
datada de 1983 e
19) Notas Fiscais de Produtor em nome do pai da autora, emitidas entre os anos de 1989 e 2006.
Referidas provas, somadas aos depoimentos testemunhais (sistema de gravação audiovisual),
formam um conjunto harmônico, apto a colmatar a convicção de que a parte autora exerceu
atividades no campo no período pleiteado na exordial.
Com efeito, a testemunha Antônio Jorge de Oliveira afirmou conhecer a autora desde 1989,
enquanto que as testemunhas Clemente Graciano de Souza e Antônio Jorge de Oliveira
informaram conhecê-la desde 1998, sendo que todos os depoentes foram unânimes em afirmar
que a mesma sempre trabalhou na lavoura, auxiliando seu pai.
No que tange ao reconhecimento do trabalho exercido a partir dos 12 (doze) anos de idade,
cumpre transcrever os dispositivos da Constituição Federal de 1967 (art. 158, inc. X) e da
Emenda Constitucional n.º 1 de 1969 (art. 165, inc. X), que tratam da matéria, in verbis:
"Art 158 - A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que,
nos termos da lei, visem à melhoria, de sua condição social:
(...)
X - proibição de trabalho a menores de doze anos e de trabalho noturno a menores de dezoito
anos, em indústrias insalubres a estes e às mulheres;"
"Art. 165. A Constituição assegura aos trabalhadores os seguintes direitos, além de outros que,
nos termos da lei, visem à melhoria de sua condição social:
X - proibição de trabalho, em indústrias insalubres, a mulheres e menores de dezoito anos, de
trabalho noturno a menores de dezoito anos e de qualquer trabalho a menores de doze anos;"
Da leitura dos dispositivos acima transcritos, verifica-se que surgiu a previsão constitucional da
atividade laborativa para os maiores de 12 (doze) anos de idade, motivo pelo qual, havendo prova
do trabalho exercido, deve ser reconhecido o tempo de serviço efetivamente realizado.
O C. Superior Tribunal de Justiça, em 23/6/08, no julgamento da Ação Rescisória nº 3.629-RS, no
qual se discutia o direito de a autora averbar o trabalho rural a partir da data em que completou
12 anos de idade (2/5/1965a 31/1/77), julgou procedente o pedido formulado "para desconstituir o
acórdão proferido no REsp 600.666/RS, mantendo aquele proferido pelo Tribunal Regional
Federal da 4ª Região, no julgamento da Apelação Cível 2000.04.01.113950-0/RS, e confirmando
o direito ao cômputo do trabalho rural, a partir de 02/05/65, sem recolhimento de contribuições
previdenciárias." Asseverou a E. Relatora, em seu voto: "(...) é preciso salientar que já é pacífico
nas Turmas integrantes da Terceira Seção do STJ o entendimento de que, comprovada a
atividade rural do trabalhador menor, a partir dos seus 12 anos, em regime de economia familiar,
esse tempo deve ser computado para fins previdenciários. A justificar tal medida, amparando-se
no princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social, deve-se partir da ideia de que a
proibição do trabalho ao menor de 14 anos foi estabelecida em benefício do menor e não em seu
prejuízo." Nesse sentido: AREsp. nº 315.764, Relator Ministro Benedito Gonçalves, decisão
monocrática proferida em 26/6/15, DJe 4/8/15 e REsp. nº 1.397.928, Relator Mauro Campbell
Marques, decisão monocrática proferida em 28/8/13, DJe 3/9/13.
Desta forma, entendo ser possível o reconhecimento da atividade rural nos períodos de 18/6/89 a
15/6/95, 18/6/95 a 10/9/98, 27/9/98 a 15/9/01 e de 19/9/01 a 3/2/08 (véspera de seu primeiro
registro em CTPS).
Ressalvo que, a atividade rural reconhecida no período anterior à Lei nº 8.213/91, não poderá ser
utilizado para fins de carência, e que o período posterior à mencionada Lei só poderá ser utilizado
para os fins específicos previstos no art. 39, inc. I, da Lei de Benefícios.
Outrossim, cumpre ressaltar que a parte autora não pleiteia o reconhecimento do labor rural para
fins de contagem recíproca.
No tocante aos honorários advocatícios, entendo que a sua fixação à razão de 10% sobre o valor
da causa remunera condignamente o serviço profissional prestado.
Ante o exposto, não conheço de parte da apelação da parte autora e, na parte conhecida, dou-lhe
parcial provimento, para reconhecer o labor rural nos períodos de 25/7/91 a 15/6/95, 18/6/95 a
10/9/98, 27/9/98 a 15/9/01 e de 19/9/01 a 3/2/08, e dou parcial provimento à remessa oficial, tida
por ocorrida, e à apelação do INSS, para ressalvar que a atividade rural reconhecida no período
anterior à Lei nº 8.213/91, não poderá ser utilizado para fins de carência, e que o período
posterior à mencionada Lei só poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39,
inc. I, da Lei de Benefícios, mantendo-se, no mais, a R. sentença recorrida.
É o meu voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. RECONHECIMENTO DE TEMPO DE SERVIÇO RURAL. PROVA DA
CONDIÇÃO DE RURÍCOLA. CONJUNTO HARMÔNICO.
I- Inicialmente, tendo em vista o julgamento dos Embargos de Divergência nº 600.596/RS, pela
Corte Especial do C. STJ, deve ser apreciada a remessa oficial em ações meramente
declaratórias.
II- Recurso da parte autora não conhecido, no tocante ao pedido de concessão de aposentadoria,
tendo em vista que essa parte do recurso se apresenta desprovida de conexão lógica com a
decisão impugnada, apresentando razões dissociadas do caso concreto, uma vez que a própria
autora aditou a inicial para afastar tal pedido.
III- Tratando-se de comprovação de tempo de serviço, é indispensável a existência de início
razoável de prova material da atividade rural, contemporânea à época dos fatos, corroborada por
coerente e robusta prova testemunhal.
IV- O C. Superior Tribunal de Justiça, ao apreciar o Recurso Especial Representativo de
Controvérsia nº 1.348.633-SP, firmou posicionamento no sentido de ser possível o
reconhecimento do "tempo de serviço rural mediante apresentação de um início de prova material
sem delimitar o documento mais remoto como termo inicial do período a ser computado, contanto
que corroborado por testemunhos idôneos a elastecer sua eficácia" (Primeira Seção, Relator
Ministro Arnaldo Esteves Lima, por maioria, j. 28/08/2013, DJe 05/12/14). O E. Relator, em seu
voto, deixou consignada a regra que se deve adotar ao afirmar: "Nessa linha de compreensão,
mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao documento mais
antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob o contraditório."
V- Adicionalmente, ressalta-se que o C. STJ possui diversos julgados no sentido de que o
Recurso Especial Representativo de Controvérsia acima mencionado autorizou o reconhecimento
do tempo de serviço rural não apenas relativamente ao período anterior ao documento mais
antigo, mas também posterior à prova material mais recente, desde que amparado por prova
testemunhal robusta.
VI- A legislação, ao vedar o trabalho infantil, tem por escopo proteger o menor, não podendo ser
utilizada em prejuízo do trabalhador, motivo pelo qual é possível o reconhecimento da atividade
rural a partir dos 12 anos de idade.
VII- No caso concreto, o acervo probatório autoriza o reconhecimento da atividade rural nos
períodos de 18/6/89 a 15/6/95, 18/6/95 a 10/9/98, 27/9/98 a 15/9/01 e de 19/9/01 a 3/2/08
(véspera de seu primeiro registro em CTPS). Ressalva-se que, a atividade rural reconhecida no
período anterior à Lei nº 8.213/91, não poderá ser utilizado para fins de carência, e que o período
posterior à mencionada Lei só poderá ser utilizado para os fins específicos previstos no art. 39,
inc. I, da Lei de Benefícios.
VIII- Os honorários advocatícios fixados à razão de 10% sobre o valor da causa remunera
condignamente o serviço profissional prestado.
IX- Apelação da parte autora conhecida em parte e parcialmente provida. Remessa oficial, tida
por ocorrida, e apelação do INSS parcialmente providas.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Oitava Turma, por
unanimidade, decidiu não conhecer de parte da apelação da parte autora e, na parte conhecida,
dar-lhe parcial provimento, e dar parcial provimento à remessa oficial, tida por ocorrida, e à
apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
