Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000266-22.2020.4.03.6319
Relator(a)
Juiz Federal TAIS VARGAS FERRACINI DE CAMPOS GURGEL
Órgão Julgador
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
23/06/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 25/06/2021
Ementa
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO DA PARTE AUTORA. PENSÃO POR MORTE. SEGURADO
TRABALHADOR RURAL INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA INEXISTENTE.
IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO SOMENTE COM PROVA TESTEMUNHAL. TEMA
629/STJ. EXTINÇÃO SEM MÉRITO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000266-22.2020.4.03.6319
RELATOR:41º Juiz Federal da 14ª TR SP
RECORRENTE: C. J. M. F., J. R. B. M.
Advogado do(a) RECORRENTE: TANIA BEATRIZ SAUER MADOGLIO - SP273008-A
Advogado do(a) RECORRENTE: TANIA BEATRIZ SAUER MADOGLIO - SP273008-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pelaparte autora da sentença que julgou
IMPROCEDENTE o pedido inicial, não concedendo a pleiteada pensão por morte aos
dependentes da falecida, em razão de não ter reconhecido sua condição de segurada especial.
Em suas razões recursais, os autoresalegam que é possível a caracterização de segurado
especial ao boia-fria, entendendo suficientes os documentos juntados aos autos como início de
prova material da atividade, corroborada pelas testemunhas ouvidas em juízo.
Subsidiariamente, requer que o feito seja extinto sem julgamento do mérito pela ausência de
prova material, ante o definido pelo E. STJ no Tema 629.
É o relatório.
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo14ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
V O T O
Conforme preceitua o artigo n. 1.013 do Código de Processo Civil, o recurso devolve à instância
recursal todas as questões suscitadas e discutidas no processo, ainda que não tenham sido
solucionadas desde que relativas ao capítulo impugnado.
A questão central a ser analisada no presente recurso é se comprovada a qualidade de
segurada especial da autora no momento do óbito, ocorrido em 18/04/2018.
Isto porque, nos termos dos arts. 39, inciso I e 74, ambosda Lei nº 8.213/91, a concessão de
pensão por morte aos dependentes do trabalhador rural dispensa o recolhimento de
contribuições para a Previdência Social, mas requer a prova do exercício de atividade rural em
período imediatamente anterior à data do requerimento administrativo.
Desta forma, há que se comprovar que o segurado exercia atividade rural no momento por
ocasião do óbito.
Há que se pontuar, ainda, que a pensão por morte em questão é voltada aos trabalhadores
rurais em sentido amplo, ou seja, desde empregados rurais, até diaristas, que se enquadrariam
como autônomos, por exercer atividade eventual, bem como ao segurado especial
propriamente dito, que explora, individualmente ou em regime de economia familiar, pequena
propriedade rural.
Ademais, nos termos do artigo 55, §3º, da Lei 8.213/91, a comprovação de tempo de serviço
somente pode ser realizada mediante início de prova material contemporânea ao período que
se pretende utilizar. Neste sentido, trago o seguinte julgado do E. TRF da 4ª Região:
EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. REQUISITOS. QUALIDADE DE
SEGURADO DO FALECIDO. CONDIÇÃO DE SEGURADO ESPECIAL. TRABALHADOR
RURAL. NÃO CARACTERIZADA.
1. A concessão do benefício de pensão por morte depende do preenchimento dos seguintes
requisitos: a) a ocorrência do evento morte; b) a condição de dependente de quem objetiva a
pensão; c) a demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito. Além
disso, rege-se o benefício pela legislação vigente à época do falecimento e independe de
carência.
2. A qualidade de segurado especial do de cujus deve ser comprovada por início de prova
material, corroborada por prova testemunhal, no caso de exercer atividade agrícola como
volante ou boia-fria ou mesmo como trabalhador rural em regime de economia familiar.
(TRF4, AC 5026932-34.2018.4.04.9999, TURMA REGIONAL SUPLEMENTAR DO PR, Relator
MÁRCIO ANTÔNIO ROCHA, juntado aos autos em 11/04/2019)
No caso dos autos, foi trazida como início de prova material basicamente a CTPS da falecida,
em que constam vários períodos de labor rural como empregada, a partir de 2005, tendo o
último sido encerrado em 2013. É importante ressaltar que antes de tais vínculos rurais a autora
exerceu diversas atividades urbanas.
Pois bem, os documentos em questão sem dúvida demonstram que a autora exerceu atividade
rural até 2013, mas não possuem contemporaneidade em relação ao período em que é
necessária a comprovação do exercício de labor rural, vale dizer, ao menos 2017/2018, mais
próximas à data do óbito dade cujus.
Com efeito, não é necessário que a prova material abranja todo o período que se pretende
comprovar, podendo dizer respeito a apenas parte dele, desde corroborada pelo conjunto
probatório, como pacífico no E. STJ. Mas é necessário que haja ao menos uma prova material
contemporânea aos fatos, mesmo que por pequeno intervalo, sob pena de haver
reconhecimento de tempo de serviço com base em prova meramente testemunhal. Este é o
posicionamento do E. STJ:
PREVIDENCIÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. APOSENTADORIA POR IDADE. TRABALHADOR
RURAL. TEMA STJ 554. INÍCIO DE PROVA MATERIAL. ABRANGÊNCIA DE TODO O
PERÍODO PRETENDIDO. DESNECESSIDADE. EXTENSÃO DA EFICÁCIA PROBATÓRIA
PELA PROVA TESTEMUNHAL. POSSIBILIDADE. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-
PROBATÓRIO.IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ.
1. Inicialmente, não se configurou a ofensa ao art. 1.022 do Código de Processo Civil, uma vez
que o Tribunal de origem julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia. Não é o órgão
julgador obrigado a rebater, um a um, todos os argumentos trazidos pelas partes em defesa da
tese que apresentaram. Deve apenas enfrentar a demanda, observando as questões relevantes
e imprescindíveis à sua resolução.
2. Cuida-se de inconformismo com decisum do Tribunal de origem, que não conheceu do
Recurso Especial, sob o fundamento de que o julgamento foi proferido de acordo com a
jurisprudência do STJ, sendo aplicada a Súmula 83/STJ. Bem como, considerou que o recurso
combatia questões fáticas, incidindo a Súmula 7/STJ.
3. O Recurso Especial combatia decisum da Corte a quo que considerou suficiente a prova
material dos autos para atestar o exercício da atividade rural, em caso de aposentadoria por
idade de trabalhador boia-fria.
4. O Superior Tribunal de Justiça, ao julgar o Recurso Especial representativo da controvérsia,
pacificou o assunto ora tratado nos seguintes termos: "Tema STJ 554 - Aplica-se a Súmula
149/STJ ('A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola,
para efeitos da obtenção de benefício previdenciário') aos trabalhadores rurais denominados
'boias-frias', sendo imprescindível a apresentação de início de prova material. Por outro lado,
considerando a inerente dificuldade probatória da condição de trabalhador campesino, a
apresentação de prova material somente sobre parte do lapso temporal pretendido não implica
violação da Súmula 149/STJ, cuja aplicação é mitigada se a reduzida prova material for
complementada por idônea e robusta prova testemunhal".
5. Portanto, o Sodalício de origem decidiu a hipótese apresentada nos autos em consonância
com o entendimento do STJ, revelando-se inviável o prosseguimento do Recurso Especial,
tendo em conta a sistemática prevista na legislação processual (art. 1.030, I, "b", ou art. 1.040,
I, do CPC/2015).
6. No tocante à assertiva do INSS de não haver nos autos documentos contemporâneos ao
período de carência para comprovar o exercício de atividade rural da parte autora, o recurso
não merece trânsito. O Superior Tribunal de Justiça decidiu que "A revisão do entendimento
firmado pelo Tribunal a quo, que afirmou a existência de um conjunto probatório harmônico
acerca do efetivo exercício de atividade rural, encontra óbice na súmula 7/STJ" (AgRg no REsp
1.342.788/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe 12/11/2012; REsp
1.587.928/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, DJe 25/5/2016).
7. Ainda que assim não fosse, conforme jurisprudência do STJ, os documentos trazidos aos
autos pela autora, caracterizados como início de prova material, podem ser corroborados por
prova testemunhal firme e coesa, e estender sua eficácia tanto para períodos anteriores como
posteriores aos das provas apresentadas.
Nesse sentido: REsp 1.348.633/SP, Rel. Ministro Arnaldo Esteves Lima, Primeira Seção, DJe
5/12/2014, acórdão sujeito ao regime do art. 543-C do CPC/1973; AgRg no REsp 1.435.797/PB,
Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 10/11/2016, AgInt no AREsp
673.604/PR, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 14/2/2017.
8. Ademais, a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido da desnecessidade de
contemporaneidade da prova material durante todo o período em que se pretende comprovar o
exercício de atividade rural, devendo haver ao menos um início razoável de prova material
contemporânea aos fatos alegados, desde que complementada mediante depoimentos de
testemunhas. A propósito: REsp 1.650.963/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda
Turma, DJe 20/4/2017; AgRg no AREsp 320.558/MT, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho,
Primeira Turma, DJe 30/3/2017; AgInt no AREsp 673.604/PR, Rel. Ministro Og Fernandes,
Segunda Turma, DJe 14/02/2017; AgInt no AREsp 582.483/SP, Rel. Ministro Benedito
Gonçalves, Primeira Turma, DJe 02/02/2017; AgRg no AREsp 852.835/PE, Rel. Ministro Gurgel
de Faria, Primeira Turma, DJe 21/11/2016; AgInt no REsp 1.620.223/RS, Rel. Ministro Mauro
Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 14/10/2016; AgInt no AREsp 925.981/SP, Rel.
Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 31/8/2016; AR 3.994/SP, Rel. Ministro
Reynaldo Soares da Fonseca, Terceira Seção, DJe 1/10/2015.
9. Agravo conhecido para conhecer parcialmente do Recurso Especial, apenas no tocante à
citada violação do art. 1.022 do CPC/2015, e, nessa parte, não provido.”
(AREsp 1550603/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em
03/10/2019, DJe 11/10/2019) – g.n.
Não se nega que a prova testemunhal nos autos confirme a atividade campesina daautora, mas
sem início de prova material não é possível o reconhecimento do tempo de serviço e,
consequentemente, da qualidade de segurada.
Por outro lado, o E. STJ, no Tema 629, fixou a seguinte tese, especificamente para o caso de
tempo rural, ante a dificuldade de obtenção de provas: A ausência de conteúdo probatório
eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do CPC, implica a carência de
pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo, impondo sua extinção sem
o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente possibilidade de o autor intentar
novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos necessários à tal iniciativa.
No presente caso, verifico ser exatamente a hipótese de ausência de conteúdo probatório, não
apenas a apresentação de conteúdo probatório insuficiente, já que nenhum documento idôneo
e contemporâneo foi juntado. Assim, é o caso de extinção do feito sem julgamento do mérito.
Posto isso, dou parcial provimento ao recurso da parte autora, para reformar a sentença,
extinguindo o feito sem julgamento do mérito, em aplicação do Tema 629/STJ
Sem condenação em honorários advocatícios.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. RECURSO DA PARTE AUTORA. PENSÃO POR MORTE. SEGURADO
TRABALHADOR RURAL INÍCIO DE PROVA MATERIAL CONTEMPORÂNEA INEXISTENTE.
IMPOSSIBILIDADE DE RECONHECIMENTO SOMENTE COM PROVA TESTEMUNHAL.
TEMA 629/STJ. EXTINÇÃO SEM MÉRITO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Décima Quarta Turma,
por unanimidade, deu parcial provimento ao recurso da parte autora, para reformar a sentença,
extinguindo o feito sem julgamento do mérito, em aplicação do Tema 629/STJ, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
