Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0001085-56.2020.4.03.6319
Relator(a)
Juiz Federal LEANDRO GONSALVES FERREIRA
Órgão Julgador
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
05/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 12/11/2021
Ementa
E M E N T A
RECURSO INOMINADO DA PARTE AUTORA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO COM APROVEITAMENTO DE TEMPO RURAL. Início de prova material
inválido. Rasura documental em ano inicial da CTPS que compromete a idoneidade como início
de prova material. Livro de encerramento do registro de empregados com termo de encerramento
anterior ao início do vínculo alegado. Anotações extemporâneas que não encontram lastro com
as demais provas documentais examinadas. Extinção do processo sem resolução do mérito.
Aplicação da tese do Tema 629/STJ. Recurso da parte autora parcialmente provido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001085-56.2020.4.03.6319
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: AGDA BORBA
Advogado do(a) RECORRENTE: MARCIO ADRIANO TEODORO DE OLIVEIRA - SP360352-A
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001085-56.2020.4.03.6319
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: AGDA BORBA
Advogado do(a) RECORRENTE: MARCIO ADRIANO TEODORO DE OLIVEIRA - SP360352-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de recurso inominado interposto pela parte autora visando à reforma da sentença que
julgou improcedente o cômputo da atividade 01/10/1976 a 04/11/1983 e, diante da falta de
período contributivo, mesmo com a reafirmação da DER, também rejeitou o pedido inicial de
concessão de aposentadoria por tempo de contribuição.
Em resumo, sustenta o autor recorrente que “duvidas referentes aos períodos laborados foram
sanados através de depoimento pessoal, além da confirmação por testemunhas” e que, assim,
o tempo rural postulado na inicial deveria ser reconhecido, com a consequente concessão da
aposentadoria buscada nesta demanda.
Sem contrarrazões.
É, no que basta, o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0001085-56.2020.4.03.6319
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: AGDA BORBA
Advogado do(a) RECORRENTE: MARCIO ADRIANO TEODORO DE OLIVEIRA - SP360352-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
PROCURADOR: PROCURADORIA-REGIONAL FEDERAL DA 3ª REGIÃO
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A comprovação do tempo de serviço para os efeitos previdenciários, inclusive mediante
justificação administrativa ou judicial, só produzirá efeito quando baseada em início de prova
material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal, salvo na ocorrência de motivo
de força maior ou caso fortuito, conforme disposto no Regulamento (art. 55, § 3º, da Lei
8.213/91).
A prova exclusivamente testemunhal não basta a comprovação da atividade rurícola, para efeito
da obtenção de benefício previdenciário (Súmula 149 do STJ).
Para fins de comprovação do tempo de labor rural, o início de prova material deve ser
contemporâneo à época dos fatos a provar (Súmula 34 da TNU).
O início de prova material, de acordo com a interpretação sistemática da lei, é aquele feito
mediante documentos que comprovem o exercício da atividade nos períodos a serem contados,
devendo ser contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função
exercida pelo trabalhador (AgRg no REsp 939.191/SC, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO,
SEXTA TURMA, julgado em 11/09/2007, DJe 07/04/2008).
É certo que a jurisprudência do STJ e da TNU permite a flexibilização do início de prova
material, diante da dificuldade do segurado especial na obtenção de prova escrita do exercício
de sua profissão, entendendo que o rol de documentos hábeis à comprovação do exercício de
atividade rural, inscrito no art. 106, parágrafo único, da Lei 8.213/91, é meramente
exemplificativo, e não taxativo, sendo admissíveis outros documentos além dos previstos no
mencionado dispositivo, inclusive que estejam em nome de membros do grupo familiar ou ex-
patrão. Nesse sentido:
PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ARTIGO 485, VII, DO CPC.
APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. PROVENTOS PROPORCIONAIS. REGRA
TRANSITÓRIA DO ARTIGO 9º, § 1º, DA EMENDA CONSTITUCIONAL 20/1998. CÔMPUTO
DE TEMPO RURAL. DOCUMENTO NOVO QUE SE MOSTRA APTO A LEGITIMAR A
RESCISÃO DA DECISÃO PROFERIDA NO RECURSO ESPECIAL. PEDIDO JULGADO
PROCEDENTE.
1. Nos termos do art. 485, VII, do CPC a sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser
rescindida quando o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou de que não
podia fazer uso, capaz, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável. Precedentes do
STJ.
2. No presente caso, o documento novo trazido pelo autor, correspondente à matrícula escolar,
extraída do livro tombo do Grupo Escolar Rural de Vila Negri, se mostra apto a comprovar a
atividade rural do autor, para os anos de 1964 a 1972.
3. Pedido julgado procedente para, em judicium rescindens, cassar a decisão rescindenda e,
em judicium rescisorium, dar provimento ao recurso especial interposto pelo autor.
(AR 4.987/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em
10/10/2018, DJe 12/11/2018)
No mencionado julgado, verificando a íntegra do acórdão, o STJ considerou aptas, como início
de prova material, as cópias das matrículas do segurado em grupo escolar, mas é preciso
ressaltar que os referidos documentos faziam referência à natureza do trabalho desenvolvido
pelo pai do segurado, isto é, a profissão de lavrador do pai, bem como os respectivos períodos
(STJ, AR 4.987/SP), o que confirma o entendimento de que os documentos para a prova da
atividade campesina devem ser contemporâneos dos fatos probandos e também especificar o
período e a função desempenhada pelo trabalhador (AgRg no REsp 939.191/SC).
Convém, nessa linha, invocar a tese fixada pela TNU no julgamento do Tema 18 (PEDILEF
2009.71.95.000509-1/RS):
A certidão do INCRA ou outro documento que comprove propriedade de imóvel em nome de
integrantes do grupo familiar do segurado é razoável início de prova material da condição de
segurado especial para fins de aposentadoria rural por idade, inclusive dos períodos
trabalhados a partir dos 12 anos de idade, antes da publicação da Lei n. 8.213/91.
Desnecessidade de comprovação de todo o período de carência.
Na mesma direção:
A certidão de casamento ou outro documento idôneo que evidencie a condição de trabalhador
rural do cônjuge constitui início razoável de prova material da atividade rurícola. (Súmula
6/TNU)
Ainda, segundo o STJ, início de prova material não se confunde com prova plena: deve ser
interpretado como meros indícios que podem ser complementados com os depoimentos
testemunhais.
Nessa linha de entendimento do STJ, não há exigência legal de que o documento apresentado
como início de prova material abranja todo o período que se quer comprovar, basta o início de
prova material ser contemporâneo aos fatos alegados e referir-se, pelo menos, a uma fração
daquele período, corroborado com prova testemunhal, a qual amplie sua eficácia probatória.
A propósito, a Súmula nº 14 da TNU:
Para a concessão de aposentadoria rural por idade, não se exige que o início de prova material
corresponda a todo o período equivalente à carência do benefício.
A matéria foi decidida pelo STJ na sistemática de recursos repetitivos (Tema 638), firmando-se
a seguinte tese: “Mostra-se possível o reconhecimento de tempo de serviço rural anterior ao
documento mais antigo, desde que amparado por convincente prova testemunhal, colhida sob
contraditório” (REsp 1348633/SP, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA
SEÇÃO, julgado em 28/08/2013, DJe 05/12/2014).
Ou seja, não é necessária a apresentação, ano a ano, de documentos para a prova do labor
campesino, bastando que a prova testemunhal, de forma coerente e segura, ampare o início de
prova material apresentado, ampliando sua eficácia temporal, tudo devidamente fundamentado
em decisão judicial, nos termos da jurisprudência do STJ e da TNU.
Na mesma direção, destaca-se a tese construída pela Turma Regional de Uniformização dos
Juizados Especiais Federais da 3ª Região no julgamento do Pedido de Uniformização Regional
nº 0001059-10.2018.403.9300 (Assunto 55/2020 – Relator Juiz Federal João Carlos Cabrelon
de Oliveira – Data do julgamento/sessão: 19/02/2020 ), consubstanciada nestes termos:
O início de prova material contemporâneo possui eficácia probatória tanto para o período
anterior quanto para o posterior à sua data, desde que corroborado por prova testemunhal
robusta, convincente e harmônica.
Quanto ao tema de contagem do trabalho rural por menor de idade, aplica-se ao caso a Súmula
5 da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU):
A prestação de serviço rural por menor de 12 a 14 anos, até o advento da Lei 8.213, de 24 de
julho de 1991, devidamente comprovada, pode ser reconhecida para fins previdenciários.
A Súmula 5 da TNU está em consonância com a jurisprudência do STJ (cf. AgRg no REsp
1150829/SP, Ministro CELSO LIMONGI, Sexta Turma, DJe 04/10/2010), no sentido de ser
possível o cômputo do tempo de atividade rural do menor para fins previdenciários quando
comprovado o trabalho, a partir dos seus 12 anos, em regime de economia familiar, porque, a
legislação, ao vedar o trabalho infantil do menor de 14 anos, teve por escopo a sua proteção,
tendo sido estabelecida a proibição em benefício do menor e não em seu prejuízo, aplicando-se
o princípio da universalidade da cobertura da Seguridade Social (cf. PEDILEF
00021182320064036303, JUIZ FEDERAL FREDERICO AUGUSTO LEOPOLDINO KOEHLER,
DOU 10/06/2016).
DO CASO CONCRETO
Fixadas tais premissas, verifico que, realmente, a parte autora não apresentou início de prova
material válido, o que deveria ter feito já com a petição inicial (art. 434 do CPC/2015).
Como bem fundamentado na sentença (ID 183078399), em fragmento na sequência transcrito,
que adoto como razão de decidir, existem rasuras que comprometem a idoneidade dos
elementos indiciários da prova do labor campesino:
Não há início de prova material idôneo a supedanear a alegação de trabalho de 01/10/1976 a
04/11/1983.
Explico.
A Carteira de Trabalho foi emitida em 1983 e o vínculo alegado é de 1976 a 1983, portanto,
anterior à emissão da CTPS.
Há rasura quanto ao ano do termo inicial do primeiro vínculo.
As anotações relativas à contribuição sindical, alteração de salário e férias na CTPS são
posteriores a 1983.
O livro de registro de empregados, que seria prova segundo a autora, teve termo de
encerramento em 1970, ou seja, anterior a 1976 e, além disso, a data da anotação do início do
trabalho da autora consta como sido feita em 1983, ou seja, depois de 1976.
No CNIS também não consta o vínculo.
Portanto, quanto ao período de 1976 a 1983, a prova material é inidônea para supedanear a
procedência da demanda.
Verifico que o INSS reconheceu 22 anos, 1 mês e 25 dias até a DER, em 16/08/2017 (ID.
49284065, fls. 38).
A parte autora requereu a reafirmação da DER para 16/05/2018.
Mas mesmo com a reafirmação da DER para 16/05/2018 (conforme requerido na inicial) e
considerando também o período de 16/05/2018 a 03/2019, que teria sido o último vínculo
constante do CNIS, resta claro, sem a necessidade de cálculos aritméticos mais complexos,
que a parte não completou a tempo de contribuição necessário para a aposentadoria por tempo
de contribuição.
Relembro que, nos termos da jurisprudência do STJ, o início de prova material é satisfeito por
documentos que evidenciem o exercício da atividade nos períodos afirmados, devendo ser
contemporâneos dos fatos a comprovar, indicando, ainda, o período e a função exercida pelo
trabalhador.
No entanto, o julgamento do mérito merece ser afastado, com a reforma da sentença nesse
particular, conforme a tese firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do Tema
629, nestes termos:
A ausência de conteúdo probatório eficaz a instruir a inicial, conforme determina o art. 283 do
CPC, implica a carência de pressuposto de constituição e desenvolvimento válido do processo,
impondo sua extinção sem o julgamento do mérito (art. 267, IV do CPC) e a consequente
possibilidade de o autor intentar novamente a ação (art. 268 do CPC), caso reúna os elementos
necessários à tal iniciativa. (Tema 629/STJ)
Pelo exposto, dou parcial provimento ao recurso da parte autora para julgar extinto o processo
sem resolução de mérito.
Deixo de condenar a parte autora ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos do
artigo 55 da Lei 9.099/95 e conforme entendimento desta 3ª Turma Recursal, em razão da
ausência de atuação do(a) procurador(a) da parte contrária em segundo grau (não
apresentação de contrarrazões).
Dispensada a elaboração de ementa, na forma da lei.
É o voto.
E M E N T A
RECURSO INOMINADO DA PARTE AUTORA. APOSENTADORIA POR TEMPO DE
CONTRIBUIÇÃO COM APROVEITAMENTO DE TEMPO RURAL. Início de prova material
inválido. Rasura documental em ano inicial da CTPS que compromete a idoneidade como início
de prova material. Livro de encerramento do registro de empregados com termo de
encerramento anterior ao início do vínculo alegado. Anotações extemporâneas que não
encontram lastro com as demais provas documentais examinadas. Extinção do processo sem
resolução do mérito. Aplicação da tese do Tema 629/STJ. Recurso da parte autora
parcialmente provido. ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por
unanimidade, deu parcial provimento ao recurso para julgar extinto o processo sem resolução
do mérito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente
julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
