Processo
RecInoCiv - RECURSO INOMINADO CÍVEL / SP
0000623-53.2017.4.03.6336
Relator(a)
Juiz Federal LEANDRO GONSALVES FERREIRA
Órgão Julgador
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
Data do Julgamento
05/11/2021
Data da Publicação/Fonte
DJEN DATA: 12/11/2021
Ementa
E M E N T A
RECURSO INOMINADO DA PARTE AUTORA. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA/
APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. Ingresso/reingresso tardio do
segurado(a) no Regime Geral de Previdência Social, quando já acometido(a) de doença ou lesão
incapacitante para o trabalho. Vedação legal de concessão de benefícios por incapacidade
laborativa em caso de incapacidade preexistente. Recurso desprovido.
Acórdao
PODER JUDICIÁRIOTurmas Recursais dos Juizados Especiais Federais Seção Judiciária de
São Paulo
3ª Turma Recursal da Seção Judiciária de São Paulo
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000623-53.2017.4.03.6336
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: MARIA JOSE DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIANA CANOS CHIOSI - SP165696-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
OUTROS PARTICIPANTES:
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000623-53.2017.4.03.6336
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: MARIA JOSE DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIANA CANOS CHIOSI - SP165696-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
A sentença julgou improcedente o pedido de concessão de benefício por incapacidade
laborativa.
A parte autora apresentou recurso inominado. Sustentou que a perícia médica constatou a
incapacidade laborativa total e permanente da parte autora, e que a incapacidade laborativa
surgiu em 22/03/2017, de maneira que teria direito ao benefício em decorrência do
agravamento da doença surgido no momento em que conservava a qualidade de segurada.
Sem contrarrazões.
A parte apresentou nova documentação médica.
O feito foi convertido em diligência para fins de solicitação de prontuários médicos e nova
manifestação pericial.
Com a juntada dos prontuários e dos esclarecimentos periciais, ambas as partes se
pronunciaram.
A parte autora deu-se por ciente das provas anexadas e pugnou pela procedência de sua
pretensão.
O INSS, por sua vez, sustentou a existência de robusta prova em sentido contrário à DII
estimada no laudo pericial, demonstrando, no seu entendimento, a preexistência da
incapacidade da autora, que conduziria à negativa do pedido autoral.
É, no que basta, o relatório.
PODER JUDICIÁRIOJUIZADO ESPECIAL FEDERAL DA 3ª REGIÃOTURMAS RECURSAIS
DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS DE SÃO PAULO
RECURSO INOMINADO CÍVEL (460) Nº0000623-53.2017.4.03.6336
RELATOR:7º Juiz Federal da 3ª TR SP
RECORRENTE: MARIA JOSE DE OLIVEIRA
Advogado do(a) RECORRENTE: FABIANA CANOS CHIOSI - SP165696-A
RECORRIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
A legislação previdenciária veda o ingresso ou o reingresso no sistema de seguro social, de
cunho contributivo (CF, art. 201, “caput”), de indivíduos já portadores de incapacidade laborativa
(incapacidade preexistente). Tal regra objetiva assegurar a sustentabilidade financeira da
cobertura securitária social (princípio constitucional do equilíbrio financeiro e atuarial).
Nesse sentido, cito entendimento da Turma Nacional de Uniformização de Jurisprudência dos
Juizados Especiais Federais (TNU):
E M E N T A PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR INVALIDEZ OU AUXÍLIO-DOENÇA.
REINGRESSO NO RGPS. DOENÇA PRÉ-EXISTENTE. NÃO CONCESSÃO. 1. O reingresso
no Regime Geral de Previdência Social não gera direito ao auxílio-doença ou à aposentadoria
por invalidez, quando comprovado que a incapacidade que acomete o autor preexistia à data de
início de seu novo vínculo com a Previdência Social. 2. Entendimento diverso atentaria contra o
caráter contributivo que o art. 201 da Constituição da República atribui à Previdência Social,
ferindo, ainda, o equilíbrio financeiro, que também lhe é resguardado pelo texto constitucional.
3. Na hipótese dos autos, havendo-se concluído que a incapacidade do autor precederia ao seu
reingresso na Previdência Social, acertado o indeferimento de aposentadoria por invalidez ou
auxílio-doença, mesmo porque, no caso, não incide a ressalva da incapacidade decorrente de
progressão ou agravamento da doença pré-existente, que, diferentemente, autorizaria o
deferimento do benefício pleiteado. 4. Pedido de Uniformização a que se nega provimento.
(PEDIDO 200872550052245 - PEDIDO DE UNIFORMIZAÇÃO DE INTERPRETAÇÃO DE LEI
FEDERAL - Relator(a) JUÍZA FEDERAL JOANA CAROLINA LINS PEREIRA - DJ 11/06/2010).
No caso concreto, após a conversão em diligência e juntada aos autos dos prontuários da parte
autora (IDs 166046038 e 166046048), verifico que se confirmaram os indícios, relatados no
acórdão anterior (ID 166045971), da preexistência da enfermidade incapacitante.
A parte autora efetuou as seguintes contribuições previdenciárias (cf. págs. 4-5 do ID
166045932):
- de 01/10/2002 a 30/09/2003 (Contribuinte Individual);
- de 01/02/2012 a 30/04/2017 (Facultativo).
E com base na última documentação referida, entre 20/09/2003 e 10/01/2004 a autora recebeu
auxílio-doença previdenciário (NB 131.243.305-9).
O laudo pericial judicial (ID 166045629), que atestou a incapacidade total e permanente da
periciada, fixou a data do início da incapacidade (DII) em 22/03/2017, com base em “Raio-X dos
joelhos com data de 22/03/2017”, ratificando em esclarecimentos, por duas vezes, essa
conclusão (ID 166045943 e 166046054).
Merecem destaques os seguintes históricos da segurada por ela fornecidos em perícias
administrativas (SABI – págs. 54-56 do ID 166045932):
- Data Exame: 24/04/2015 - História: AX1, 59 anos, SABI mostra recolhimentos facultativos,
confirma ser dona de casa, antecedente de parecer contrário à concessão de BPC. Atestado Dr
Pedro Budin CRM 37226 (30/03/2015) com texto padrão a seus atestados emitidos (SUS)
"dores lombares e joelho devido artrose, sugiro afastamento do trabalho." Não há descrição de
quadro clínico nem de proposta terapêutica Queixa crônicas há 8 anos, desde quando morava
em São Carlos, mudou-se para Jaú há 2 anos. Exame apresentado RX (19/03/15) "joelho D/E
"genuoartrose" incipiente, coluna lombar pinçamento do espaço discal L5/S1" Mostrou
medicação anotada em cartão do hipertenso: losartana e atenolol e receita Xefo 1 caixa.
- Data Exame: 06/07/2015 - História: AX1, 59 anos, contribuinte facultativa, refere que mora
com o esposo e neto (12 anos), mora em Jaú. Contribuinte facultativa. Refere que tem dor em
coluna lombar há mais de 15 anos, com piora progressiva. Refere que fez cirurgia em ambos os
joelhos há mais de 05 anos. Apresentou RX de Joelhos, com data de 19/03/2015, com
pinçamento do espaço discal L5-S1 e joelhos com genuartrose incipiente. TC de coluna lombar
com data de 29/05/2015 com sinais degenerativos vertebrais e canal estreito lombar no nivel
L5. Refere que esta em uso de analgesicos, e irá fazer a fisioterapias. Refere que faz uso de
calmantes.
- Data Exame: 13/04/2017 - AX1, 61 anos, SABI mostra recolhimentos facultativos, confirma ser
dona de casa, faz as atividades da casa sem auxílio de outros, antecedente de 3 indeferimentos
nas 3 solicitações de auxílio-doença, com anotações: "dor em coluna lombar há mais de 15
anos, ...refere que fez cirurgia em ambos os joelhos há mais de 05 anos" Atestado Dr Renan
Chaim CRM 128958 lombalgia e cervicalgia e gonartrose bilateral. Atestado Dr Faria CRM
28361 (14/03/17) condromalácia de rótulas, lombalgia cervicalgia e sinais de fibromialgia, não
pode realizar atividade laboral. Queixas crônicas prévias o reingresso facultativo. RX (09/02/17)
ombro E tendinite calcárea inicial, uncoartrose inicial C4/C5/C6, pedículos conservados;
escoliose, pequenos osteófitos marginais, pedículos conservados RX (22/03/17) gonartrose
moderada Em uso de analgésico e fisioterapia.
Com base nessas informações do SABI, conclui-se que no mínimo desde 2000 a parte autora já
tinha problemas ortopédicos relacionados à coluna lombar e que, ao menos, no início de 2012
já possuía a lesão no joelho que levou à cirurgia mencionada.
Corrobora essa percepção o prontuário da autora demonstrativo de que, em 04/02/2002 (pág. 6
do ID 166046048), a parte autora já padecia de lesão ortopédica crônica e incapacitante que
levara o médico assistente a ministrar-lhe fármacos como Dispropan e Diclofenaco.
Relembre-se que as contribuições da parte autora iniciaram-se em 01/10/2002, isto é, após a
doença ortopédica crônica geradora da incapacidade laborativa, de maneira que reputo
acertada a sentença (ID 166045952), da qual transcrevo o seguinte fragmento, encampando-o
fundamento de decidir:
No que tange ao requisito da incapacidade, o laudo pericial (evento 10) reconheceu a existência
de deformidades nos joelhos, crepitação, edema e limitação de movimentos, causadoras de
incapacidade laborativa total, permanente e insusceptível de reabilitação, que a impede de
exercer qualquer atividade laborativa. Fixou a DII em 22/03/2017, com base em exame de raio-x
exibido nos autos.
Analisando-se a CTPS (fls. 10-11 – evento 2), nota-se que ela nunca trabalho com registro em
carteira. Por sua vez, o extrato do CNIS (fl. 4 – evento 13) apontou filiação como contribuinte
individual entre 01/10/2002 e 30/09/2003, oportunidade em que gozou auxílio-doença entre
20/09/2003 e 10/01/2004. Veja-se: fez exatos doze recolhimentos e conquistou benefício por
incapacidade.
Depois disso, ficou cerca de nove anos sem contribuir e retomou os recolhimentos em
01/02/2012, como facultativa (11% sobre o salário mínimo), aos 56 anos de idade. Desde então
vem fazendo recolhimentos sob a mesma rubrica, por cinco anos ininterruptos.
Ocorre, no entanto, que a doença da parte autora - degeneração da superfície articular dos
joelhos – é típica da idade e do desgaste natural das articulações, sendo absolutamente
frequente o aparecimento das queixas ortopédicas em tal fase da vida. O quadro em exame
repete-se frequente no foro: segurada mulher, dona de casa, que afirma trabalhar como
faxineira, com (re)filiação tardia (mais de 50 anos de idade) e que recolhe como facultativa, com
11% ou 5% sobre o salário mínimo. A seguir, inicia-se luta árdua, em âmbito administrativo e
judicial, para comprovar incapacidade para o trabalho.
Na realidade, trata-se de disfuncionalidade do RGPS, que não fixa idade para a filiação,
permitindo-se que qualquer pessoa, ainda que notoriamente incapaz para o trabalho por conta
da senilidade, faça recolhimentos como facultativo e postule, a posteriori, benefício por
incapacidade. Quando alguém obtém benefício por incapacidade em razão de moléstias
inerentes ao avanço da idade, ocorre uma subversão na organização das contingências sociais
e dos requisitos previstos pela Lei de Benefícios, na medida em que consegue uma
aposentadoria “por idade”, travestida de invalidez, mas sem realizar as 180 contribuições
exigidas e muitas vezes sem completar a idade 55, 60 ou 65 anos.
Há um claro atalhamento no caminho até a tão sonhada jubilação: enquanto o segurado que
pretende ter aposentadoria ao chegar à velhice programa-se para fazer os recolhimentos
durante toda uma vida, outros passam a fazê-lo tão somente quando já detêm idade avançada
e vários problemas físicos começam a surgir, de modo a cumprir a carência de doze
contribuições e assim obter uma renda para o restante da vida, em franco descompasso com o
princípio do equilíbrio financeiro e atuarial.
Sendo assim, reputo que a parte autora, que nunca exerceu atividade laborativa formal,
ativando-se como dona de casa, retomou as contribuições como facultativa, no ano de 2012
(aos 56 anos de idade), já portadora dos malefícios físicos retratados no laudo médico e nas
perícias administrativas (evento 13), sendo eles inerentes ao avanço da idade, motivo pelo qual
não pode ser beneficiada com aposentadoria por invalidez em razão da norma proibitiva
estampada no § 2º do art. 42 da Lei de Benefícios.
O juiz apreciará a prova constante dos autos, independentemente do sujeito que a tiver
promovido, e indicará na decisão as razões da formação de seu convencimento (art. 371 do
Código de Processo Civil). E, de acordo com essa diretriz, o juiz apreciará a prova pericial,
indicando na sentença os motivos que o levaram a considerar ou a deixar de considerar as
conclusões do laudo, levando em conta o método utilizado pelo perito (art. 479 do Código de
Processo Civil).
Veja-se a propósito, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça: "o órgão julgador não está
adstrito ao laudo pericial, podendo formar sua convicção com base em outros elementos de
prova, desde que o faça de forma fundamentada" (AgInt no REsp 1651138/MG, Rel. Ministro
RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 23/10/2018, DJe
26/10/2018). No mesmo sentido: AgInt no AREsp 1441961/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO,
QUARTA TURMA, julgado em 20/08/2019, DJe 09/09/2019; AgInt nos EDcl no REsp
1750157/RO, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em
17/06/2019, DJe 26/06/2019; REsp 1758265/PR, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA
TURMA, julgado em 02/04/2019, DJe 04/04/2019.
Nesse sentido a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNU)
assentou, com base no art. 436 do CPC/1973- agora art. 479 do CPC/2015 -, que, observada a
necessária motivação, não há hierarquia entre as provas licitamente produzidas (Processo
0052127-08.2009.4.01.3500, Rel. Juiz Federal Sérgio Queiroga, j. 11/02/2015). ́
Sendo assim, a preexistência da incapacidade para o trabalho, em relação à filiação/refiliação
ao RGPS, impede a concessão do benefício postulado nesta demanda.
Pelo exposto, voto por negar provimento ao recurso da parte autora.
Recorrente vencido(a) condenado(a) ao pagamento de honorários advocatícios fixados em 10%
sobre o valor da causa atualizado, limitados a 6 salários-mínimos (montante correspondente a
10% do teto de competência dos Juizados Especiais Federais - art. 3º, “caput”, da Lei
10.259/2001). Em razão da gratuidade da justiça, que deve ser mantida/deferida, incide o
disposto no § 3º do artigo 98 do CPC/2015, que prevê a suspensão das obrigações decorrentes
da sucumbência.
E M E N T A
RECURSO INOMINADO DA PARTE AUTORA. AUXÍLIO POR INCAPACIDADE TEMPORÁRIA/
APOSENTADORIA POR INCAPACIDADE PERMANENTE. Ingresso/reingresso tardio do
segurado(a) no Regime Geral de Previdência Social, quando já acometido(a) de doença ou
lesão incapacitante para o trabalho. Vedação legal de concessão de benefícios por
incapacidade laborativa em caso de incapacidade preexistente. Recurso desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Terceira Turma, por
unanimidade, negou provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
