
| D.E. Publicado em 08/09/2016 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer do reexame necessário, dar parcial provimento às apelações da parte autora e do INSS, e fixar, de ofício, os critérios de atualização do débito, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 30/08/2016 15:04:10 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0053009-47.2008.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de reexame necessário e apelações interpostas pelas partes em face da sentença proferida nos autos da ação em que se pleiteia a concessão de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, mediante o reconhecimento de período laborado em atividades especiais e atividades rurais sem registro em CTPS.
O juízo a quo julgou parcialmente procedente o pedido, para reconhecer o trabalho rural desempenhado no período de 01/01/64 a 31/12/73 e conceder a aposentadoria por tempo de serviço/contribuição na forma proporcional, a teor do art. 53, inciso II da Lei n° 8.213/91 (sem menção à regra de transição prevista na EC n° 20/98), desde a data do ajuizamento da ação, considerando demonstrado um total de mais de 33 anos de tempo de serviço/contribuição. Na fundamentação da sentença, também reconheceu o tempo especial no período de 01/04/78 a 28/07/86, todavia, tal reconhecimento não integrou o dispositivo. Correção monetária, mês a mês, a partir do vencimento de cada prestação. Juros de mora desde a citação. Condenação do INSS ao pagamento de honorários advocatícios em 15% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença, nos termos da Súmula STJ n° 111, bem como ao pagamento das custas das quais não seja isento.
Apela a parte autora. Sustenta, em síntese, que a somatória do tempo rural (01/01/64 a 31/12/73) e do tempo especial (01/04/78 a 28/07/86) reconhecidos em sentença com os períodos em que houve recolhimento de contribuições previdenciárias como autônomo (11/87 a 01/89, 5/89, 6/01 e 8/01 a 10/01) e gozo de auxílio-doença (09/06/03 a 05/08/03 e 10/03/04 a 26/01/06) resulta em tempo total superior a 37 anos de tempo serviço/contribuição, impondo a concessão do benefício previdenciário na forma integral, de vez que ultrapassados os 35 anos exigidos por lei. Requer a reforma da r. sentença para que sejam computados na contagem os períodos houve recolhimento de contribuições previdenciárias como e gozo de auxílio-doença, bem como concedido do benefício previdenciário na forma integral.
Apela o INSS. Sustenta, em síntese, que: considerando que o início de prova material é a certidão de casamento data de 26/05/73, não é possível o reconhecimento das atividades rurais supostamente iniciadas em 01/01/64 somente com base em prova testemunhal; não restou comprovado o exercício do trabalho em condições especiais nos períodos posteriores a 12/03/74, em que a parte autora alega haver exercido as funções de serviços gerais e tratorista; a atividade de tratorista e serviços gerais não se enquadra nos Decretos n° 53.831/64 e 83.080/79; a ausência de laudo técnico contemporâneo à prestação do serviço para comprovar o agente nocivo ruído impede o enquadramento da atividade como especial; o uso de EPI eficaz afasta a insalubridade. Requer a reforma da r. sentença para que sejam julgados improcedentes os pedidos formulados na petição inicial.
Com contrarrazões da parte autora, vieram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Reexame necessário
Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade do reexame necessário prevista no seu artigo 475.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (20/04/07 - fls. 01 e 101), o seu valor aproximado e a data da sentença (08/05/08 - fls. 102), que o valor total da condenação não alcançará a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º.
Assim, é nítida a inadmissibilidade do reexame necessário.
Aposentadoria por tempo de serviço/contribuição - requisitos
A aposentadoria por tempo de serviço, atualmente denominada aposentadoria por tempo de contribuição, admitia a forma proporcional e a integral antes do advento da Emenda Constitucional 20/98, fazendo jus à sua percepção aqueles que comprovem tempo de serviço (25 anos para a mulher e 30 anos para o homem na forma proporcional, 30 anos para a mulher e 35 anos para o homem na forma integral) desenvolvido totalmente sob a égide do ordenamento anterior, respeitando-se, assim, o direito adquirido.
Aqueles segurados que já estavam no sistema e não preencheram o requisito temporal à época da Emenda Constitucional 20 de 15 de dezembro de 1998, fazem jus à aposentadoria por tempo de serviço proporcional desde que atendam às regras de transição expressas em seu art. 9º, caso em que se conjugam o requisito etário (48 anos de idade para a mulher e 53 anos de idade para o homem) e o requisito contributivo (pedágio de 40% de contribuições faltantes para completar 25 anos, no caso da mulher e para completar 30 anos, no caso do homem).
Atualmente, são requisitos para a concessão da aposentadoria por tempo de contribuição, de acordo com os arts. 52 e 142 da Lei 8.213/91, a carência e o recolhimento de contribuições (30 anos para a mulher e 35 anos para o homem), ressaltando-se que o tempo de serviço prestado anteriormente à referida Emenda equivale a tempo de contribuição, a teor do art. 4º da Emenda Constitucional 20/98.
Aposentadoria Especial
A aposentadoria por tempo de serviço especial teve assento primeiro no artigo 31 da Lei nº 3.807, de 26 de agosto de 1960, Lei Orgânica da Previdência Social - LOPS, que estabeleceu que seria concedida ao segurado que, contando no mínimo 50 (cinquenta) anos de idade e 15 (quinze) anos de contribuições, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, em serviços que, para esse efeito, fossem considerados penosos, insalubres ou perigosos, por Decreto do Poder Executivo.
Essa norma foi expressamente revogada pela Lei nº 5.890, de 8 de junho de 1973, que passou a discipliná-la no artigo 9º, alterando, em efeitos práticos, apenas o período de carência de 15 (quinze) anos para 5 (cinco) anos de contribuição, mantendo no mais a redação original.
Sobreveio, então, o Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, reclassificando as atividades profissionais segundo os agentes nocivos e os grupos profissionais tidos por perigosos, insalubres ou penosos, com os respectivos tempos mínimos de trabalho.
Importante ressaltar que os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79 tiveram vigências simultâneas, de modo que, conforme reiteradamente decidido pelo C. STJ, havendo colisão entre as mencionadas normas, prevalece a mais favorável ao segurado. (REsp nº 412351, 5ª Turma, Rel. Min. Laurita Vaz, j. 21/10/2003, DJ 17/11/2003, pág. 355).
As atividades insalubres previstas nas aludidas normas são meramente exemplificativas, podendo outras funções ser assim reconhecidas, desde que haja similitude em relação àquelas legalmente estatuídas ou, ainda, mediante laudo técnico-pericial demonstrativo da nocividade da ocupação exercida. Nesse sentido, o verbete 198 da Súmula do TFR.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a matéria passou a ser prevista no inciso II do artigo 202 e disciplinada no artigo 57 da Lei nº 8.213/91, cuja redação original previa que o benefício de aposentadoria especial seria devido ao segurado que, após cumprir a carência exigida, tivesse trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme a atividade profissional, sujeito a condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, restando assegurada, ainda, a conversão do período trabalhado no exercício de atividades danosas em tempo de contribuição comum (§3º).
Em seguida, foi editada a Lei nº 9.032/95, alterando o artigo 57 da Lei nº 8.213/91, dispondo que a partir desse momento não basta mais o mero enquadramento da atividade exercida pelo segurado na categoria profissional considerada especial, passando a ser exigida a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, que poderá se dar por meio da apresentação de informativos e formulários, tais como o SB-40 ou o DSS-8030.
Posteriormente, com a edição do Decreto n.º 2.172, de 05/03/1997, que estabeleceu requisitos mais rigorosos para a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, passou-se a exigir-se a apresentação de laudo técnico para a caracterização da condição especial da atividade exercida. Todavia, por se tratar de matéria reservada à lei, tal exigência apenas tem eficácia a partir da edição da Lei n.º 9.528, de 10/12/1997.
Cumpre observar que a Lei nº 9528/97 também passou a aceitar o Perfil Profissiográfico Previdenciário, documento que busca retratar as características de cada emprego do segurado, de forma a facilitar a futura concessão de aposentadoria especial. Assim, identificado no documento o perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, é possível a sua utilização para comprovação da atividade especial em substituição ao laudo pericial.
Ressalto que no tocante ao reconhecimento da natureza da atividade exercida pelo segurado e à forma da sua demonstração, deve ser observada a legislação vigente à época da prestação do trabalho, conforme jurisprudência pacificada da matéria (STJ - Pet 9.194/PR, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/05/2014, DJe 03/06/2014).
A extemporaneidade do documento comprobatório das condições especiais de trabalho não prejudica o seu reconhecimento como tal, "pois a situação em época remota era pior ou ao menos igual a constatada na data da elaboração do laudo, tendo em vista que as condições do ambiente de trabalho só melhoraram com a evolução tecnológica." (Des. Fed. Fausto De Sanctis, AC nº 2012.61.04.004291-4, j. 07/05/2014)
Especificamente em relação ao ruído, o Decreto nº 53.831/64 considerava insalubre o labor desempenhado com exposição permanente a ruído acima de 80 dB; já o Decreto nº 83.080/79 fixava a pressão sonora em 90 dB. Na medida em que as normas tiveram vigência simultânea, prevalece disposição mais favorável ao segurado (80 dB).
Com a edição do Decreto nº 2.172/97, a intensidade de ruído considerada para fins de reconhecimento de insalubridade foi elevada para 90 dB, mas, em 2003, essa medida foi reduzida para 85 dB, por meio do Decreto nº 4.882, de 18 de novembro de 2003.
Até 09 de outubro de 2013, os Tribunais adotavam o enunciado pela Súmula nº 32 da TNU. Contudo, esta Súmula foi cancelada em decorrência do julgamento da PET 9059 pelo Superior Tribunal de Justiça (Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Seção, j. 28/08/2013, DJe 09/09/2013) cujo entendimento foi sufragado no julgamento do REsp 1398260/PR (Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 14/05/2014, DJe 05/12/2014), sob a sistemática dos recursos repetitivos.
Em relação ao agente ruído, vigora o princípio do tempus regit actum. Considera-se especial a atividade desenvolvida acima do limite de 80dB até 05/03/1997, quando foi editado o Decreto nº 2.172/97, a partir de então deve-se considerar especial a atividade desenvolvida acima de 90dB até 18/11/2003, quando foi editado o Decreto nº 4882/2003. A partir de 19/11/2003 o limite passou a ser de 85 dB.
Saliente-se que a especialidade do tempo de trabalho é reconhecida por mero enquadramento legal da atividade profissional (até 28/04/95), por meio da confecção de informativos ou formulários (no período de 29/04/95 a 10/12/97) e via laudo técnico ou perfil profissiográfico previdenciário (a partir de 11/12/97).
É corrente em nossos tribunais a tese de que sempre se exigiu laudo técnico para comprovar a exposição do trabalhador aos agentes físicos ruído e calor em níveis superiores aos limites máximos de tolerância. Entretanto, no tocante às atividades profissionais exercidas até 10/12/97 - quando ainda não havia a exigência legal de laudo técnico -, essa afirmação deve ser compreendida, não na literalidade, mas no sentido de ser necessário o atesto efetivo e seguro dos níveis de intensidade dos agentes nocivos a que o trabalhador esteve exposto durante sua jornada laboral.
Logo, para as atividades profissionais exercidas até 10/12/97, é suficiente que os documentos apresentados façam expressa menção aos níveis de intensidade dos agentes nocivos.
Uso de equipamento de proteção individual - EPI, como fator de descaracterização do tempo de serviço especial
A questão foi decidida pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do ARE nº 664335, da relatoria do E. Ministro Luiz Fux, com reconhecimento de repercussão geral, na data de 04.12.2014, em que restou decidido que o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo à sua saúde, de modo que, se o EPI for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo constitucional ao reconhecimento das atividades especiais.
Restou assentado também que, na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria.
O fato de a empresa fornecer equipamento de proteção individual - EPI para neutralização dos agentes agressivos não afasta, por si só, a contagem do tempo especial, pois cada caso deve ser examinado em suas peculiaridades, comprovando-se a real efetividade do aparelho e o uso permanente pelo empregado durante a jornada de trabalho. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça (REsp 1428183/RS, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 25/02/2014, DJe 06/03/2014).
Ainda, conforme a jurisprudência citada, tratando-se especificamente do agente nocivo ruído, desde que em níveis acima dos limites legais, constata-se que, apesar do uso de Equipamento de Proteção Individual (protetor auricular) reduzir a agressividade do ruído a um nível tolerável, até no mesmo patamar da normalidade, a potência do som em tais ambientes causa danos ao organismo que vão muito além daqueles relacionados à perda das funções auditivas.
Conversão do tempo de serviço comum em especial
Quanto à conversão do período comum em especial, com base no art. 64 do Decreto 611/92, cumpre esclarecer que tal dispositivo legal vigorou até a publicação da Lei 9.032/95, quando, devido à modificação promovida no art. 57 da Lei de Benefícios, a concessão de aposentadoria especial passou a depender da comprovação pelo segurado do efetivo exercício de atividade penosa ou insalubre, de acordo com os critérios da nova legislação, ficando afastada a previsão de conversão de tempo comum em especial (art. 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91).
Ademais, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, apreciando a questão submetida ao rito dos recursos repetitivos do Art. 543-C do CPC, decidiu pela impossibilidade de computar o tempo de serviço comum convertido em especial, para integrar o tempo destinado à concessão do benefício de aposentadoria especial, quando o requerimento for posterior à Lei 9.032/95, conforme se verifica dos EDcl no REsp 1310034/PR, Relator Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, j. 26/11/2014, DJe 02/02/2015.
Portanto, decidiu o STJ que, no tocante ao direito à conversão entre tempos de serviço de especial para comum e de comum para especial, a lei vigente por ocasião da aposentadoria é a que deve ser aplicada, independentemente do regime jurídico à época da prestação do serviço.
Conversão do tempo de serviço especial em comum
Deve ser afastada qualquer tese de limitação temporal de conversão de tempo de serviço especial em comum, seja em períodos anteriores à vigência da Lei nº 6.887, de 10/12/1980, ou posteriores a Lei nº 9.711, de 20/11/1998, permanecendo, assim, a possibilidade legal de conversão, inclusive para períodos posteriores a maio de 1998, uma vez que a norma prevista no artigo 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91 permanece em vigor, tendo em vista que a revogação pretendida pela 15ª reedição da MP 1663 não foi mantida quando da conversão na Lei nº 9.711/98. Nesse sentido decidiu a Terceira Seção do STJ no Resp 1.151.363/MG, Relator Ministro Jorge Mussi, data do julgamento: 23/03/2011.
O Decreto nº 83.080/79 foi renovado pelo Decreto nº 3.048/99 e este, por sua vez, prevê expressamente em seu art. 70 e seguintes (na redação dada pelo Decreto nº 4.827/03), que os fatores de conversão (multiplicadores) nele especificados aplicam-se na conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum ao trabalho prestado em qualquer período.
Tempo de serviço rural anterior e posterior à Lei de Benefícios
A aposentadoria do trabalhador rural apresenta algumas especificidades, em razão sobretudo da deficiência dos programas de seguridade voltados a essa categoria de trabalhadores no período anterior à Constituição Federal de 1988 e do descumprimento da legislação trabalhista no campo. Assim é que, no seu art. 55, §2º, a Lei 8.213/91 estabeleceu ser desnecessário o recolhimento de contribuições previdenciárias pelo segurado especial ou trabalhador rural no período anterior à vigência da Lei de Benefícios, caso pretenda o cômputo do tempo de serviço rural, exceto para efeito de carência. Neste sentido, já decidiu esta E. Corte: SÉTIMA TURMA, APELREEX 0005026-42.2014.4.03.9999, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL FAUSTO DE SANCTIS, julgado em 21/07/2014, e-DJF3 Judicial 1 DATA:31/07/2014 e TERCEIRA SEÇÃO, AR 0037095-93.2010.4.03.0000, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL NELSON BERNARDES, julgado em 28/11/2013, e-DJF3 Judicial 1 DATA:11/12/2013.)
Já em relação ao tempo de serviço rural trabalhado a partir da competência de novembro de 1991 (art. 55, §2º, da Lei 8.213/91 c/c o art. 60, X, do Decreto 3.048/99), ausente o recolhimento das contribuições, somente poderá ser aproveitado pelo segurado especial para obtenção dos benefícios previstos no art. 39, I, da Lei 8.213/91.
A prova do exercício de atividade rural
Muito se discutiu acerca da previsão contida no art. 55, §3º, da Lei de Benefícios, segundo a qual a comprovação do tempo de serviço exige início de prova material. O que a Lei nº 8.213/91 exige é apenas o início de prova material e é esse igualmente o teor da Súmula 149 do Superior Tribunal de Justiça.
"A prova exclusivamente testemunhal não basta à comprovação da atividade rurícola, para efeito de obtenção do benefício previdenciário".
Exigir documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se quer reconhecer equivaleria a erigir a prova documental como a única válida na espécie, com desconsideração da prova testemunhal produzida, ultrapassando-se, em desfavor do segurado, a exigência legal. Neste sentido, o C. STJ: AgRg no AREsp 547.042/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 23/09/2014, DJe 30/09/2014.
Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
É pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Idade mínima para o trabalho rural
Não se olvida que há jurisprudência no sentido de admitir-se o labor rural a partir dos 12 (doze) anos de idade, por ser realidade comum no campo, segundo as regras ordinárias de experiência, mormente se a prova testemunhal é robusta e reforçada por documentos que indicam a condição de lavradores dos pais do segurado.
O raciocínio invocado em tais decisões é o de que a norma constitucional que veda o trabalho ao menor de 16 anos visa à sua proteção, não podendo ser invocada para, ao contrário, negar-lhe direitos. (RESP 200200855336, Min. Jorge Scartezzini, STJ - Quinta Turma, DJ 02/08/2004, p. 484.).
Tal ponderação não é isenta de questionamentos. De fato, emprestar efeitos jurídicos para situação que envolve desrespeito a uma norma constitucional, ainda que para salvaguardar direitos imediatos, não nos parece a solução mais adequada à proposta do constituinte - que visava dar ampla e geral proteção às crianças e adolescentes, adotando a doutrina da proteção integral, negando a possibilidade do trabalho infantil.
Não se trata, assim, de restringir direitos ao menor que trabalha, mas sim, de evitar que se empreste efeitos jurídicos, para fins previdenciários, de trabalho realizado em desacordo com a Constituição. Considero, desta forma, o ordenamento jurídico vigente à época em que o(a) autor(a) alega ter iniciado o labor rural para admiti-lo ou não na contagem geral do tempo de serviço, para o que faço as seguintes observações:
As Constituições Brasileiras de 1824 e 1891 não se referiram expressamente à criança e adolescente tampouco ao trabalho infantil.
A Constituição de 1934 foi a primeira a tratar expressamente da proteção à infância e à juventude e em seu artigo 121 consagrou, além de outros direitos mais favoráveis aos trabalhadores, a proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos; e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
Por sua vez, a Constituição de 1937, repetiu a fórmula da proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos; de trabalho noturno para os menores de 16 anos e de trabalho em indústrias insalubres para menores de 18 anos.
A Constituição de 1946 elevou a idade mínima para a execução de trabalho noturno de 16 para 18 anos, mantendo as demais proibições de qualquer trabalho para menores de 14 anos e em indústrias insalubres para menores de 18 anos, além de proibir a diferença de salário para o mesmo trabalho por motivo de idade.
A Constituição de 1967, embora tivesse mantido a proibição para o trabalho noturno e insalubre para menores de 18 anos, reduziu de 14 para 12 anos a idade mínima para qualquer trabalho.
Por fim, a Constituição da República de 1988, proíbe o trabalho noturno, perigoso e insalubre para os menores de 18 anos; e, inicialmente, de qualquer trabalho para menores de 14 anos, como constava nas Constituições de 1934, 1937 e 1946. Todavia, com a Emenda Constitucional 20, de 1998, a idade mínima foi elevada para 16 anos, salvo na condição de aprendiz a partir de 14 anos.
Caso concreto - elementos probatórios
A parte autora pleiteia a concessão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição, desde a data do requerimento administrativo/da citação, mediante o reconhecimento de períodos laborados em condições especiais (01/04/78 a 28/07/86, 01/02/83 a 21/05/89 e 01/07/89 a 16/12/98) e atividades rurais sem registro em CTPS (01/01/64 a 31/12/73).
Na fundamentação da sentença, o juízo a quo reconheceu o tempo rural no período de 01/01/64 a 31/12/73 e o tempo especial no período de 01/04/78 a 28/07/86 (fls. 32 e 99), todavia, fez constar do dispositivo apenas o reconhecimento do tempo rural (fl. 101). Não obstante a ausência de oposição de embargos de declaração pelas partes, a apelação de INSS contém argumentos aptos a rechaçar o reconhecimento do período especial e as contrarrazões apresentadas pela parte autora abrangem a defesa deste período especial (fl. 144). Assim, observado o contraditório, viável a apreciação da questão em grau recursal.
Nesse sentido, a controvérsia recursal reside nas atividades especiais no período de 01/04/78 a 28/07/86 e atividades rurais no período de 01/01/64 a 31/12/73, bem como no acréscimo ao tempo de serviço/contribuição de períodos em que houve recolhimento de contribuições previdenciárias e gozo de auxílio-doença.
Atividade rural
A parte autora, nascida em 14/03/51, trouxe aos autos, para comprovar o exercício de atividade rural:
- Certidão do Registro de Imóveis de Itararé/SP, certificando que em, 20/07/61, foi registrada Escritura Pública de Compra e Venda, na qual o genitor da parte autora, Sr. José de Campos Pacheco (Filho), consta como adquirente de imóvel rural situado no Bairro de Santa Cruz dos Lopes, no Município de Itararé/SP (fl. 36);
- Certificado de Dispensa de Incorporação emitido pelo Ministério do Exército, com dispensa em 31/12/68, em que a parte autora é qualificada como lavrador (fl. 33);
- Certidão de Casamento, celebrado em 26/05/73, em que a parte autora é qualificada como lavrador (fl. 18);
- Fotografias antigas da parte autora na área rural (fls. 34/35).
Conforme já decidido pela E. 7ª Turma, e tendo em vista o julgamento do Recurso Especial n.º 1.348.633/SP, representativo de controvérsia, pela 1ª Seção do C. Superior Tribunal de Justiça, é possível a admissão de tempo de serviço rural anterior à prova documental, desde que corroborado por prova testemunhal idônea, o que de fato ocorreu.
As testemunhas às fls. 92/93, por sua vez, puderam confirmar que moraram na mesma região em que a parte autora, que a conheceram em 1963 (já trabalhava na roça) e que presenciaram seu labor rural junto à família e sem empregados, na propriedade do seu genitor, atuando na cultura de arroz, feijão, milho e parreiras, voltadas majoritariamente a consumo próprio, indicando o início e térmico aproximado das atividades, de 1963 a 1973/1974.
A Constituição Federal de 1946 fixou a proibição de qualquer trabalho para os menores de 14 anos, enquanto a Constituição Federal de 1967 (entrou em vigor em 15/03/67) fixou proibição de qualquer trabalho para os menores de 12 anos, sendo que a parte autora completou 12 anos em 14/03/63 e 14 anos em 14/03/65. Assim, considerando que, no caso dos autos, incide a limitação veiculada pela Constituição Federal de 1946, o termo inicial do trabalho rural deve ser fixado na data em que a parte autora completou 14 anos.
Dessa forma, reconheço o trabalho rural desenvolvido pelo autor informalmente desde 14/03/65 a 31/12/73, exceto para efeito de carência.
Atividade especial
O período de 01/04/78 a 28/07/86 (PPP de fl. 32), trabalhado na empresa Maringá S/A Cimento e Liga, na função de operário, no setor usina hidrelétrica, executando serviços gerais de limpeza de grade das barragens e o controle de entrada de água por meio dos registros das comportas das barragens, não deve ser reconhecido como especial, porquanto não restou comprovada a exposição habitual e permanente a ruído acima dos limites permitidos, de vez que o documento acostado aos autos, embora mencione este agente nocivo, não atesta a sua graduação, não permitindo o enquadramento nos códigos 1.1.1 e 1.1.6 do Decreto nº 53.831/64 e nos itens 1.1.1 e 1.1.5 do Decreto nº 83.080/79. Ademais, não consta do documento a menção à efetiva exposição a outros agentes nocivos.
Demonstrados os recolhimentos das contribuições previdenciárias nos períodos pleiteados pela parte autora (fls. 24/29), ressalto ser viável a inclusão na contagem do tempo de serviço/contribuição somente em relação às competências de 11/87 a 01/89 e 5/89, de vez que as competências de 6/01 e 8/01 a 10/01 são concomitantes ao vínculo registrado no período de 01/10/99 a 16/05/02 (fl. 22 e CNIS).
O artigo 55, II da Lei nº 8.213/91 e artigo 60, III do Decreto n° 3.048/99 estabelecem que o tempo de serviço/contribuição compreende os períodos em gozo de auxílio-doença e aposentadoria por invalidez, desde que intercalados com períodos de atividade.
Verifica-se que os períodos de fruição dos auxílios-doença previdenciários mencionados pela parte autora não estão intercalados com períodos de atividade e, portanto, não podem ser computados para fins de tempo de serviço/contribuição.
Desta forma, considerando o tempo de serviço rural reconhecido nos autos, bem como as informações constantes na CTPS e no CNIS, embora se verifique que a parte autora não havia cumprido 30 anos de serviço até 15/12/1998, constata-se que, na data do ajuizamento da ação, já havia implementado os requisitos inerentes à concessão da aposentadoria por tempo de serviço/contribuição na forma proporcional (Lei n° 8.213/91), de acordo com as regras de transição previstas na EC n° 20/98, vez que cumpriu o pedágio e contava com a idade mínima.
De ofício, determino que as parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora, a partir da citação, de acordo com os critérios fixados no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal. Na esteira desse entendimento, cumpre destacar decisões desta E. Sétima Turma: AgLegal/ApelReex nº 0000319-77.2007.4.03.6183/SP, Rel. Des. Fed. Fausto de Sanctis, 7ª Turma, data do julgamento 23/02/2015; AC nº 0037843-62.2014.4.03.9999/SP, Rel. Des. Fed. Toru Yamamoto, 7ª Turma, data do julgamento 26/02/2015; AC nº 0000458-61.2013.4.03.6005/SP, Rel. Des. Fed. Denise Avelar, 7ª Turma, data do julgamento 27/02/2015.
Insta esclarecer que não desconhece este Relator o alcance e abrangência da decisão proferida nas ADIs nºs 4.357 e 4.425, nem tampouco a modulação dos seus efeitos pelo STF ou a repercussão geral reconhecida no RE 870.947 pelo E. Ministro Luiz Fux no tocante à constitucionalidade da TR como fator de correção monetária do débito fazendário no período anterior à sua inscrição em precatório.
Contudo, a adoção dos índices estabelecidos no Manual de Cálculos da Justiça Federal para a elaboração da conta de liquidação é medida de rigor, porquanto suas diretrizes são estabelecidas pelo Conselho da Justiça Federal observando estritamente os ditames legais e a jurisprudência dominante, objetivando a unificação dos critérios de cálculo a serem adotados na fase de execução de todos os processos sob a sua jurisdição.
O apelo do INSS não abrangeu pretensão de reforma da sentença em relação aos honorários advocatícios.
Ante a constatação de que a parte autora recebe, atualmente, o benefício de aposentadoria por idade (NB n° 174.736.412-3 - DIB: 15/03/16), anote-se a obrigatoriedade da dedução, na fase de liquidação, dos valores eventualmente pagos à parte autora após o termo inicial assinalado ao benefício concedido, a mesmo título ou cuja cumulação seja vedada por lei, sendo-lhe concedido o direito de optar pelo benefício que entender mais vantajoso (art. 124, Lei nº 8.213/91).
Ante o exposto, não conheço do reexame necessário, dou parcial provimento à apelação da parte autora no tocante à inclusão de períodos decorrentes de recolhimentos efetuados como autônomo na contagem do tempo de serviço/contribuição, dou parcial provimento à apelação do INSS para conceder o benefício de aposentadoria por tempo de serviço/contribuição na forma proporcional, de acordo com a regra de transição prevista na Emenda Constitucional n° 20/98, e, de ofício, fixo os critérios de atualização do débito, na forma acima fundamentada.
Mantida, no mais, a sentença.
É como voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
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