
| D.E. Publicado em 27/04/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Décima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, dar parcial provimento ao reexame necessário, tido por interposto e negar provimento à apelação do INSS, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 17/04/2018 19:41:41 |
APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0001439-68.2011.4.03.6102/SP
RELATÓRIO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Proposta ação de conhecimento de natureza previdenciária, objetivando a concessão da aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento de atividade urbana, sobreveio sentença de procedência do pedido, condenando-se a autarquia previdenciária a reconhecer a atividade urbana no período de 15/04/1975 a 18/07/1978 e a conceder o benefício de aposentadoria por tempo de serviço, desde o requerimento administrativo, com correção monetária e juros de mora, além do pagamento de honorários advocatícios, fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação até a data da sentença. Por fim, determina a imediata implantação do benefício.
A r. sentença não foi submetida ao reexame necessário.
Inconformada, a autarquia previdenciária interpôs recurso de apelação requerendo, preliminarmente, a revogação da tutela antecipada. No mérito, pugna pela reforma da sentença, para que seja julgado improcedente o pedido, sustentando a ausência dos requisitos legais para a concessão do benefício. Subsidiariamente, requer a alteração da sentença no tocante ao reconhecimento da prescrição quinquenal e à verba honorária.
VOTO
A Senhora Desembargadora Federal LUCIA URSAIA (Relatora): Inicialmente, mostra-se cabível o reexame necessário, nos termos da Súmula 490 do Superior Tribunal de Justiça, que assim dispõe:
"A dispensa de reexame necessário, quando o valor da condenação ou do direito controvertido for inferior a sessenta salários mínimos, não se aplica a sentenças ilíquidas."
Quanto ao pedido de revogação da tutela antecipada, formulado no recurso de apelação do INSS, trata-se de questão eminentemente de cunho instrumental, secundária, relativa à garantia do resultado prático e imediato do provimento jurisdicional que concedeu benefício. Em sendo assim, é pertinente examinar primeiro a questão principal, que é aquela relativa à concessão do benefício, para depois se enfrentar a questão secundária, relativa à tutela específica, não constituindo, assim, objeção processual.
No mérito, pleiteia a parte autora a condenação do INSS à concessão da aposentadoria por tempo de serviço, mediante o reconhecimento do período trabalhado como empregada doméstica, sem o recolhimento das contribuições previdenciárias, no período de 15/04/1975 a 18/07/1978, na residência da Sra. Ondina Pellatieri de Oliveira.
O início de prova material, exigido pelo § 3º do artigo 55 da Lei nº 8.213/91, não significa que o segurado deverá demonstrar mês a mês, ano a ano, por intermédio de documentos, o exercício de atividade laborativa, pois isto importaria em se exigir que todo o período de trabalho fosse comprovado documentalmente, sendo de nenhuma utilidade à prova testemunhal para demonstração do labor exercido sem o devido registro em carteira profissional. O raciocínio é diverso, bastando para o reconhecimento do tempo de serviço que se produza alguma prova documental perante à Previdência Social, contemporânea ao lapso temporal que se pretende comprovar, aliada à prova oral que indique, com segurança, o exercício da atividade em todo o período discutido pelas partes.
Início de prova material, conforme a própria expressão o diz, não indica completude, mas sim começo de prova, princípio de prova, elemento indicativo que permita o reconhecimento da situação jurídica questionada, desde que associada a outros dados probatórios.
Em se tratando de atividade desenvolvida por trabalhador doméstico, considera-se admissível a declaração firmada por ex-empregador como início de prova material do tempo de serviço exercido em tal atividade para o período anterior à edição da Lei nº 5.859/72.
Isto porque na vigência da Lei nº 3.807/60 não se exigia o recolhimento de contribuições, pois inexistia previsão legal para o registro do trabalhador doméstico, que na maioria das vezes era admitido por contrato verbal. Por esta razão, em tais casos, a jurisprudência, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, passou a abrandar o entendimento da Súmula 149, para admitir, como início de prova documental, declaração de ex-empregador, ainda que não contemporânea ao tempo de serviço que se pretende comprovar, como revela a ementa deste julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. TEMPO DE SERVIÇO. EMPREGADA DOMESTICA. APOSENTADORIA. PROVA.
1. É VÁLIDA A DECLARAÇÃO DE EX-EMPREGADOR, CORROBORADA POR PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA, A COMPROVAR A CONDIÇÃO DE DOMÉSTICA DA RECORRIDA, SE, A ÉPOCA DOS FATOS, NÃO HAVIA PREVISÃO LEGAL PARA O REGISTRO DE TRABALHOS DOMÉSTICOS.
2. RECURSO NÃO CONHECIDO" (REsp n.º 112716/SP, Relator Ministro FERNANDO GONÇALVES, j. 15/04/1997, DJ 12/05/1997, p. 18877).
Ressalte-se que, com a edição da Lei nº 5.859/72, a atividade laborativa em comento passou a ser regulamentada, tendo sido determinada a filiação obrigatória ao Regime Geral de Previdência Social. Portanto, a partir de então, para o seu reconhecimento, não basta para o período simples declaração firmada por ex-empregador, sendo indispensável que a prova oral venha acompanhada de início de prova material outro.
No caso dos autos, há início de prova documental da condição de empregada doméstica da autora, para o período anterior e posterior a Lei nº 5.859/72, consistente na cópia da CTPS (fls. 11/12), na qual consta o ínicio do vínculo empregatício junto à empregadora Sra. Ondina Pellatieri de Oliveira, em 15/04/1975. Segundo a jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça, tais documentos, em conjunto com a prova testemunhal colhida no curso da instrução processual, são hábeis ao reconhecimento de tempo de serviço trabalhado como empregada doméstica, conforme revela a seguinte ementa de julgado:
"PREVIDENCIÁRIO. URBANO. EMPREGADA DOMÉSTICA. TEMPO DE SERVIÇO. PROVA. TÍTULO ELEITORAL, DECLARAÇÃO DE EMPREGADORA, CERTIDÃO DE CASAMENTO, TODOS CONSTANDO A PROFISSÃO DE DOMÉSTICA, CONSTITUEM INÍCIO DE PROVA DOCUMENTAL, A CORROBORAR A PROVA ORAL SOBRE O TEMPO DE SERVIÇO TRABALHADO. RECURSO NÃO CONHECIDO." (Resp 251642 / SP - Relator Ministro Gilson Dipp - DJ 03.09.2001 p.238)
Por sua vez, a testemunha ouvida, filha da ex-empregadora, complementou plenamente esse início de prova documental ao asseverar perante o juízo de primeiro grau, sob o crivo do contraditório, da ampla defesa e do devido processo legal, sem contraditas, que a parte autora trabalhou como empregada doméstica na residência de sua genitora até o óbito desta ocorrido em 18/07/1978 (fls. 31 e 311/312).
Assim, comprovado o tempo de serviço como empregada doméstica, é de rigor computá-lo, ainda que não haja prova de recolhimento das contribuições, à vista de ser do empregador a obrigação de recolher as contribuições previdenciárias (L. 5.859/72, art. 5º; D. 71.885/73, art. 12; L. 8.212/91, art. 30, V e art. 33, § 5º).
Não é outro o entendimento do Superior Tribunal de Justiça:
"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. EMPREGADA DOMÉSTICA. CARÊNCIA. COMPROVAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. O recolhimento da contribuição devida pela empregada doméstica é responsabilidade do empregador, cabendo ao INSS fiscalizar e exigir o cumprimento de tal obrigação. Preenchidos os seus demais requisitos, não se indefere pedido de aposentadoria por idade quando, exclusivamente, não comprovado o efetivo recolhimento das contribuições previdenciárias devidas (Lei 8.213/91, art. 36). Recurso Especial conhecido mas não provido" (REsp 272.648 SP, Min. Edson Vidigal).
Além disso, o art. 36 da L. 8.213/91 dispensa a comprovação de recolhimento de contribuições para o segurado doméstico que tenha satisfeito as condições exigidas para a concessão do benefício requerido.
Ressalte-se que, quando da análise do requerimento administrativo, a autarquia previdenciária reconheceu o exercício da atividade especial no período de 13/04/1982 a 26/05/1988, restando incontroverso tal período (fls. 97/98).
O período em que a parte autora trabalhou com registro em CTPS e recolheu contribuição previdenciária (fls. 19/27 e 32/96) é suficiente para garantir-lhe o cumprimento do período de carência de 174 (cento e setenta e quatro) meses de contribuição, na data do requerimento administrativo, nos termos do art. 142 da Lei nº 8.213/91.
No presente caso, a parte autora faz jus ao recebimento de aposentadoria por tempo de contribuição, benefício disciplinado pelo artigo 201, § 7º, da Constituição Federal e artigos 52 e seguintes da Lei nº 8.213/91, tendo em vista o preenchimento dos requisitos após a Emenda Constitucional nº 20/98.
Com efeito, computando-se o tempo de atividade urbana, como doméstica, no período de 15/04/1975 a 18/07/1978, com o tempo de serviço comum (fls. 19/27, 32/96 e 99/100), o somatório do tempo de serviço da parte autora, na data da publicação da EC 20/98, é inferior a 25 (vinte e cinco) anos, totalizando 23 (vinte e três) anos, 06 (seis) meses e 26 (vinte e seis) dias de tempo de serviço, de maneira que é aplicável ao caso dos autos a regra de transição prevista no artigo 9º da referida Emenda Constitucional, pois a parte autora não possuía direito adquirido ao benefício de aposentadoria por tempo de serviço na data da sua publicação, em 16/12/1998.
Observo, ainda, que a Emenda Constitucional nº 20, de 15 de dezembro de 1998, exige um acréscimo de tempo de serviço, que perfaz 25 (vinte e cinco) anos, 06 (seis) meses e 24 (vinte e quatro) dias no presente caso.
De outra parte, incluindo-se o tempo de serviço posterior a 15/12/1998, verifica-se que a parte autora cumpriu o acréscimo previsto pela Emenda Constitucional nº 20/98 totalizando, na data do requerimento administrativo, 28 (vinte e oito) anos, 01 (um) mês e 29 (vinte e nove) dias.
Assim, a parte autora faz jus à concessão do benefício de aposentadoria proporcional por tempo de serviço, uma vez que cumpriu a regra de transição prevista no art. 9º da referida Emenda Constitucional, porquanto atingiu a idade de 48 (quarenta e oito) anos e comprovou o tempo de serviço exigido, devendo ser observado o disposto nos artigos 53, inciso I, 28 e 29 da Lei nº 8.213/91.
É importante salientar que a prescrição quinquenal somente alcança as prestações não pagas nem reclamadas na época própria, não atingindo o fundo de direito, devendo ser observada no presente caso. Neste sentido já decidiu o Superior Tribunal de Justiça, conforme se verifica a seguir:
"Em se tratando de ação proposta com o fito de obter revisão de benefício previdenciário, relação de trato sucessivo e natureza alimentar, a prescrição que incide é aquela prevista na Súmula 85/STJ: "Nas relações jurídicas de trato sucessivo em que a Fazenda Pública figure como devedora, quando não tiver sido negado o próprio direito reclamado, a prescrição atinge apenas as prestações vencidas antes do qüinqüênio anterior à propositura da ação.". Inocorrência da chamada prescrição do fundo de direito." (REsp 544324/SP, Relator Ministro FELIX FISCHER, j. 25/05/2004, DJ 21/06/2004, p. 242).
Neste caso, não há falar em parcelas prescritas, considerando-se o lapso temporal decorrido entre o termo inicial do benefício e a data do ajuizamento da demanda.
Os juros de mora e a correção monetária deverão observar o decidido pelo Plenário do C. STF, no julgamento do RE 870.947/SE, em Repercussão Geral, em 20/09/2017, Rel. Min. Luiz Fux, adotando-se no tocante à fixação dos juros moratórios o índice de remuneração da caderneta de poupança, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97 com a redação dada pela Lei nº 11.960/09, e quanto à atualização monetária, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E).
Os honorários advocatícios devem ser fixados em 15% (quinze por cento) sobre o valor da condenação, conforme entendimento sufragado pela 10ª Turma desta Corte Regional. Ressalte-se que a base de cálculo sobre a qual incidirá mencionado percentual será composta apenas das prestações vencidas entre o termo inicial do benefício e a data da sentença, em consonância com a Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça.
No que tange à determinação de implantação do benefício, os seus efeitos devem ser mantidos. Tendo sido, em sede recursal, reconhecido o direito da parte autora de receber o benefício, não haveria qualquer senso, sendo até mesmo contrário aos princípios da razoabilidade e da efetividade do processo, cassar-se a medida e determinar a devolução de valores para que a parte autora, em seguida, obtenha-os de volta mediante precatório. Por tais razões, mantenho os efeitos da tutela específica de que trata o mencionado artigo 497 do novo Código de Processo Civil.
Diante do exposto, DOU PARCIAL PROVIMENTO AO REEXAME NECESSÁRIO, TIDO POR INTERPOSTO, para determinar a forma de incidência dos juros de mora, conforme explicitado, e NEGO PROVIMENTO À APELAÇÃO DO INSS, na forma da fundamentação.
É o voto.
Desembargadora Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | MARIA LUCIA LENCASTRE URSAIA:10063 |
| Nº de Série do Certificado: | 1B1C8410F7039C36 |
| Data e Hora: | 17/04/2018 19:41:38 |
