
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5178811-47.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
REPRESENTANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REPRESENTANTE: CARLOS EDVALDO DOS SANTOS
Advogado do(a) REPRESENTANTE: JOSUE SANTO GOBY - SP290471-A
OUTROS PARTICIPANTES:
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5178811-47.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
REPRESENTANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
REPRESENTANTE: CARLOS EDVALDO DOS SANTOS
Advogado do(a) REPRESENTANTE: JOSUE SANTO GOBY - SP290471-A
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R E L A T Ó R I O
Cuida-se de ação ajuizada em 25/04/2016, que tem por objeto a concessão de aposentadoria por invalidez, com adicional de 25%, a partir da DIB do auxílio-doença (26/01/2016) ou o restabelecimento deste, com pedido de tutela de urgência.
O feito foi sentenciado em 31/08/2018. Aposentadoria por invalidez e auxílio-doença foram negados. Mas o pedido foi julgado procedente, para conceder ao autor auxílio-acidente a partir da data do laudo (16/05/2015). Sobre os atrasados, fixaram-se correção monetária e juros de mora na forma da Lei nº 11.960/2009. Os honorários advocatícios foram arbitrados em 10% sobre o valor das parcelas vencidas até a data da prolação da sentença (Súmula nº 111 do STJ). A sentença foi submetida a reexame necessário.
Embargos de declaração do INSS foram tirados da r. sentença. Restaram acolhidos para alterar a DIB do auxílio-acidente para o dia seguinte da cessação do auxílio-doença ou, na ausência deste, fixá-lo no dia seguinte à juntada do laudo pericial aos autos. Determinou a incidência de correção monetária pelo IPCA-e e de juros de mora, na forma da Lei nº 11.960/2009.
O INSS interpôs apelação. Em suas razões, alega, em síntese, que não se demonstrou cumprido um dos requisitos autorizadores do auxílio-acidente, i.e, a comprovação do nexo de causalidade entre a doença e o acidente extralaboral. Subsidiariamente, requer a observância da Lei nº 11.960/2009 no que concerne à correção monetária mandada aplicar. Requereu também a suspensão do feito até o julgamento do RE 870.947/SE.
Com contrarrazões, nas quais a parte autora empenha-se na concessão da tutela antecipada pretendida, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
9ª Turma
APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA (1728) Nº 5178811-47.2020.4.03.9999
RELATOR: Gab. 51 - DES. FED. FONSECA GONÇALVES
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REPRESENTANTE: CARLOS EDVALDO DOS SANTOS
Advogado do(a) REPRESENTANTE: JOSUE SANTO GOBY - SP290471-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Porque preenche os pressupostos de admissibilidade, conhece-se do recurso.
A hipótese não engendra reexame necessário.
O artigo 496, § 3º, I, do Código Processo Civil afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico perseguido for inferior a 1.000 (um mil) salários mínimos. Comparece, no caso, a certeza matemática de que a condenação a alcançar não será superior ao limite legal estabelecido, daí por que aqui não se aplica o teor da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.
Isso considerado, analisam-se as questões trazidas a julgamento.
Os benefícios de auxílio-doença, aposentadoria por invalidez e auxílio-acidente são fungíveis. É facultado ao julgador, depois da produção da prova pertinente, conforme a espécie da incapacidade constatada, conceder um deles, ainda que não requerido, cumpridos seus requisitos autorizadores. O princípio da mais larga proteção social justifica a adequação, não havendo cogitar, no caso, de sentença extra petita.
De fato, nas ações previdenciárias por incapacidade, a definição do benefício adequado ao caso concreto ocorre na ocasião da prolação da sentença, observadas as peculiaridades do caso concreto e as características da incapacidade apresentada. Tal elasticidade na análise da causa de pedir e pedido, portanto, não configura violação ao princípio da congruência ou adstrição.
Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes do C. STJ (REsp nº 1.804.312/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Herman Benjamin, j. 11/06/2019, DJe 1º/07/2019; REsp nº 1.568.353/SP, Segunda Turma, Relator Ministro Herman Benjamin, julgado em 15/12/2015, DJe de 05/02/2016; AgRg no REsp nº 1.305.049/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 03/05/2012, DJe 08/05/2012).
Passo ao exame da matéria devolvida.
A sentença deferiu ao autor auxílio-acidente.
Acerca da espécie de benefício concedido, não se recorreu.
Nessa medida, é de passar em revista o artigo 86 da Lei n.º 8.213/91, que dá regramento à matéria, litteris:
“Art. 86. O auxílio-acidente será concedido, como indenização, ao segurado quando, após consolidação das lesões decorrentes de acidente de qualquer natureza, resultarem sequelas que impliquem redução da capacidade para o trabalho que habitualmente exercia”.
Como daí imediatamente se depreende, auxílio-acidente, benefício de natureza indenizatória, defere-se quando provadas sequelas decorrentes de lesões consolidadas cuja origem é acidente de qualquer natureza. Aludidas lesões devem implicar redução permanente, ainda que mínima, da capacidade para o trabalho habitual do segurado.
De feito, conforme jurisprudência estabelecida pelo STJ, em julgamento de recursos representativos de controvérsia, o benefício será devido quando:
“"Tema 156. Será devido o auxílio-acidente quando demonstrado o nexo de causalidade entre a redução de natureza permanente da capacidade laborativa e a atividade profissional desenvolvida, sendo irrelevante a possibilidade de reversibilidade da doença".
"Tema 416: Exige-se para concessão do auxílio-acidente, a existência de lesão, decorrente de acidente do trabalho, que implique redução da capacidade para o labor habitualmente exercido. O nível do dano e, em consequência, o grau do maior esforço, não interferem na concessão do benefício, o qual será devido ainda que mínima a lesão".
A concessão de auxílio-acidente, que se anote, independe de carência, à luz do disposto no artigo 26, I, da Lei nº 8.213/91.
Muito bem.
O autor, nascido em 09/05/1978 (ID 125727425 – Pág. 3), esteve em gozo de auxílio-doença previdenciário, no período compreendido entre 26/01/2016 e 19/08/2017 (ID 125727425 - Pág. 8 e consulta atualizada ao CNIS).
Mas à cata do melhor benefício por incapacidade que se oportunizasse, o autor ajuizou a presente ação em 25/04/2016. Em suas dobras, aos rigores do devido processo legal, exame médico-pericial foi realizado em 20/07/2017 (ID 125727449).
Os achados revelam que o autor – lavrador, auxiliar de pedreiro, auxiliar de serviços gerais e pintor, com escolaridade correspondente à 3ª série do ensino fundamental – sofreu fratura de vértebra C3, em razão de acidente automobilístico ocorrido em 04/04/2015. Passou por cirurgia de artrodese nas vértebras cervicais C2-C3. A fratura evoluiu para sequela motora (restrição dos movimentos da coluna cervical).
No corpo do laudo, perora o senhor Perito: “o periciando possui incapacidade parcial e permanente ao trabalho desde o acidente, em 16/04/2015. O autor pode ser adaptado em funções laborativas de conformidade com suas limitações, evitando sobrecarga em coluna lombar. Além disso, deve-se considerar que o mesmo é jovem e não apresenta boa escolaridade, o que pode dificultar sua readaptação ou recolocação no mercado de trabalho, se houver necessidade” (ID 125727449 – Pág. 8).
E destaca: “A restrição aos movimentos de coluna cervical leva a uma restrição parcial para suas atividades laborativas, uma vez que na sua ocupação habitual de pintor o autor tem necessidade de realizar tais movimentos” (ID 125727449 – Pág. 8).
No caso em tela identificaram-se sequelas permanentes. Representam elas limitações que exigem maior esforço do autor para o desempenho de sua atividade habitual de pintor.
Ficou também demonstrado o nexo de causalidade entre as sequelas limitantes que no autor se alojam e o acidente extralaboral. O senhor Louvado esclareceu: “A doença não tem relação direta com o trabalho realizado pelo periciando (ausência de nexo causal), nem tampouco as suas atividades profissionais podem ter contribuído para a piora do quadro (ausência de concausa), pois trata-se de evento traumático” (ID 125727449 – Pág. 7). O documento médico juntado no ID 125727425 – Pág. 12 atesta fratura cervical decorrente de acidente de automóvel, ocorrido em abril/2015.
E, segundo o artigo 30 do Decreto nº 3.04899, "entende-se como acidente de qualquer natureza ou causa aquele de origem traumática e por exposição a agentes exógenos (físicos, químicos e biológicos) que acarrete lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda, ou a redução permanente ou temporária da capacidade laborativa".
Não custa remarcar que o requisito qualidade de segurado, que se encontrava presente para o pleito e deferimento do benefício por incapacidade anterior, não se esvaneceu, de vez que conserva filiação previdenciária quem se acha no gozo de benefício (artigo 15, I, da Lei nº 8.213/91) e não a perde por ausência de contribuições quem está incapacitado (STJ, AgRg no REsp n. 1.245.217/SP, 5ª. Turma, Rel. o Min. Gilson Dipp, p. de 20/06/2012).
Conforme consulta realizada no Cadastro Nacional de Informações Sociais – CNIS, o autor possui histórico laborativo nos períodos de 1º/09/2007 a 14/02/2008, de 18/07/2008 a 03/06/2009, de 04/08/2009 a 18/02/2010, de 14/10/2011 a 02/12/2011, de 19/03/2012 a 16/06/2012, de 16/07/2012 a 29/08/2012, de 18/04/2013 a 31/07/2013 e de 21/07/2014 a 18/10/2014. Considerando a DII fixada na perícia (16/04/2015 – data do acidente), não houve a perda da qualidade de segurado.
Na hipótese, pois, o autor faz jus ao auxílio-acidente, tal como lhe foi deferido.
Dispõe o art. 86, §2º, da Lei nº 8.213/91 que “o auxílio-acidente será devido a partir do dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença, independentemente de qualquer remuneração ou rendimento auferido pelo acidentado, vedada sua acumulação com qualquer aposentadoria”.
No mesmo sentido, o Tema nº 862 do C. STJ também assentou posicionamento no sentido de que “O termo inicial do auxílio-acidente deve recair no dia seguinte ao da cessação do auxílio-doença que lhe deu origem, conforme determina o art. 86, §2º, da Lei 8.213/91, observando-se, se for o caso, a prescrição quinquenal de parcelas do benefício”. Conforme ressaltado no indigitado Tema: "o requerimento administrativo ou, na sua ausência, a citação, somente terão relevância para a fixação inicial do auxílio-acidente, nas hipóteses em que não houve prévia concessão de auxílio-doença" (REsp 172.955-5, Rel. Min. Assusete Magalhães, Primeira Seção, j. 09/06/2021, DJe 1º/07/2021).
Bem por isso a data de início do benefício deve recair em 20/08/2017, dia seguinte à cessação do auxílio-doença NB 613.148.720-4 de que o autor chegou a desfrutar.
Não prospera o pedido de suspensão do processo até o julgamento do RE nº 870.947 (Tema 810 do STF), já julgado e transitado em julgado em 03/03/2020.
Ajusto e esclareço os acréscimos legais.
Ao autor serão pagas, de uma única vez, as prestações vencidas desde a data de início do benefício fixada neste julgado, descontando-se o período em que tenha comprovadamente recebido benefício inacumulável, acrescidas de correção monetária, calculada na forma da Lei nº 6.899/81 e legislação superveniente, aplicadas as diretrizes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
Juros de mora correm da citação, no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/2002 e, a partir de então, à razão de 1% (um por cento) ao mês (artigo 406 do Código Civil). Desde de julho de 2009, incide a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE nº 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE nº 579.431.
A contar do mês de promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
Considerado o parcial provimento ao recurso interposto pela autarquia, não incide, neste caso, a regra do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal (Tema 1.059 do STJ).
Presentes os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil, a saber, perigo na demora e plausibilidade do direito alegado, CONCEDO AO AUTOR TUTELA DE URGÊNCIA, determinando a implantação do auxílio-acidente deferido, em até 45 (quarenta e cinco) dias da intimação desta decisão.
Comunique-se ao INSS, via sistema, o teor do presente julgado, com vistas à implantação do benefício (auxílio-acidente), por força da tutela de urgência ora deferida.
Diante do exposto, não conheço do reexame necessário e dou parcial provimento à apelação do INSS, apenas para fixar os critérios de correção monetária explicitados na forma da fundamentação.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. INOCORRÊNCIA DE SENTENÇA EXTRA PETITA. BENEFÍCIO POR INCAPACIDADE. AUXÍLIO-ACIDENTE. LAUDO PERICIAL. COMPROVADA REDUÇÃO DA CAPACIDADE PARA A ATIVIDADE PROFISSIONAL HABITUAL DO AUTOR DA AÇÃO. REQUISITOS PREENCHIDOS. BENEFÍCIO DEVIDO. TERMO INICIAL. CORREÇÃO MONETÁRIA E JUROS DE MORA.
- A hipótese não engendra reexame necessário. O artigo 496, § 3º, I, do Código Processo Civil afasta a exigência do duplo grau de jurisdição quando a condenação ou o proveito econômico perseguido for inferior a 1.000 (um mil) salários mínimos. Comparece, no caso, a certeza matemática de que a condenação que se objetiva não será superior ao limite legal estabelecido, daí por que aqui não se aplica o teor da Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça.
- Em se tratando de benefício previdenciário, cujo caráter é social e protetivo, não há falar em sentença extra petita quando se concede benefício diverso do pleiteado na inicial, cumpridos seus requisitos autorizadores. De fato, o princípio da mais larga proteção social viabiliza a fungibilidade dos pedidos de benefício por incapacidade. Nas ações previdenciárias por incapacidade, a definição do benefício adequado ocorre na ocasião da prolação da sentença, observadas as peculiaridades do caso concreto e as características da incapacidade apresentada. Tal elasticidade na análise da causa de pedir e pedido dos benefícios por incapacidade, portanto, não configura violação ao princípio da congruência ou adstrição. Precedentes do STJ.
- Segundo artigo 86 da Lei nº 8.213/91, auxílio-acidente, benefício de natureza indenizatória, defere-se quando provadas sequelas decorrentes de lesões consolidadas. Estas devem implicar redução da capacidade para o trabalho habitual do segurado.
- A perícia médica judicial constatou a incapacidade parcial e permanente do autor para o desempenho de seu labor habitual de pintor.
- No presente caso, identificaram-se sequelas permanentes que implicam importantes limitações, reduzindo capacidade de trabalho do autor, inclusive para o seu habitual.
- Esclarecido o termo inicial do benefício: 20/08/2017, dia seguinte à cessação do auxílio-doença NB 613.148.720-4.
- Ao autor serão pagas, de uma única vez, as prestações vencidas desde a data de início do benefício fixada neste julgado, descontando-se o período em que tenha comprovadamente recebido benefício inacumulável, acrescidas de correção monetária, calculada na forma da Lei nº 6.899/81 e legislação superveniente, aplicadas as diretrizes do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal.
- Juros de mora correm da citação, no percentual de 0,5% (meio por cento) ao mês, até a entrada em vigor da Lei nº 10.406/2002 e, a partir de então, à razão de 1% (um por cento) ao mês (artigo 406 do Código Civil). Desde de julho de 2009, incide a taxa de juros aplicável à remuneração da caderneta de poupança (Repercussão Geral no RE nº 870.947), observada, quanto ao termo final de sua incidência, a tese firmada em Repercussão Geral no RE nº 579.431.
- A contar do mês de promulgação da Emenda Constitucional nº 113, de 8/12/2021, a apuração do débito se dará unicamente pela Taxa SELIC, mensalmente e de forma simples, nos termos do disposto em seu artigo 3º, ficando vedada a incidência da Taxa SELIC cumulada com juros e correção monetária.
- Considerado o parcial provimento ao recurso interposto pela autarquia, não incide, neste caso, a regra do artigo 85, §§ 1º e 11, do CPC, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal (Tema 1.059 do STJ).
- Presentes os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil, a saber, perigo na demora e plausibilidade do direito alegado, concede-se a tutela de urgência requerida pelo autor.
- Reexame necessário não conhecido. Apelação do INSS parcialmente provida. Tutela de urgência deferida.
ACÓRDÃO
DESEMBARGADOR FEDERAL
