D.E. Publicado em 05/07/2017 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a preliminar arguida pela autarquia e, no mérito, dar parcial provimento à sua apelação e á remessa necessária, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0007015-61.2009.4.03.6183/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez ou benefício previdenciário de auxílio doença, previstos nos artigos 42 e 59/63 da Lei n. 8213/91, ou ainda, de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência ou incapacitada para o trabalho.
A sentença prolatada em 21.08.2015 julgou parcialmente procedente o pedido, para condenar o INSS a pagar o benefício assistencial pleiteado desde a data da citação (08.12.2009 - Fls. 251/251v). Determinou que as parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente nos termos das Resoluções 134 de 21.12.2010 e n. 267 de 02.12.2013 do Conselho da Justiça Federal e alterações posteriores. Sem custas. Condenou, também, a autarquia ao pagamento de os honorários advocatícios em 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, conforme a Súmula n. 111 do STJ. Foi determinado o reexame necessário, nos termos do art. 475, I do CPC.
Apela o INSS requerendo preliminarmente a nulidade da sentença, eis que desprovida de fundamentação no tocante à concessão do benefício assistencial. No mérito, pugna pela reforma do julgado, alegando para tanto que a autora não logrou êxito em comprovar sua condição de miserabilidade.
Com a apresentação de contrarrazões das partes os autos vieram a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou provimento do apelo da autarquia.
É o relatório.
VOTO
Rejeito a preliminar arguida pelo INSS.
A sentença está devidamente fundamentada, nos termos da legislação vigente.
O MM. Juiz a quo após proceder a análise dos pedidos de aposentadoria por invalidez e auxílio doença, rejeitados ante a falta de qualidade de segurado, passou a averiguar os requisitos para a concessão de benefício assistencial que entendeu devido, eis que preenchidos os requisitos de incapacidade para o trabalho e miserabilidade. Estando o julgado devidamente fundamentado, não há que se falar em nulidade.
Passo ao exame do mérito.
A questão vertida nos presentes autos diz respeito à exigência de comprovação dos requisitos legais para a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
Conforme cópia do documento de identidade de fls. 10, tendo a parte autora nascido em 06 de agosto de 1953, conta atualmente com 57 anos de idade, e assim, o pleito baseia-se em suposta deficiência ou incapacidade do postulante.
Para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Lei 12.470/2011, art. 3º).
A respeito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a Súmula nº 29 que institui: "Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento."
O autor alega que é portador de diabetes mellitus, com amputação do pé direito, condição que lhe traz incapacidade laboral.
O laudo médico pericial realizado em 17.11.2011 (fls. 275/282) atesta que o requerente diabético, foi submetido à amputação do halux direito, tendo evoluído com quadros de infecção tegumentar, culminando em amputação transtársica do pé direito em 12/2008. Informa a existência de incapacidade total desde 01/2008, definida como permanente para a atividade formal com finalidade de manutenção do sustento.
Assim, atendido um dos critérios fixados no caput do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011 c/c o art. 34 da Lei nº 10.741/2003, necessário averiguar-se o preenchimento do requisito da miserabilidade, uma vez que a lei exige a concomitância de ambos para que o benefício assistencial possa ser concedido.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Com relação ao cálculo da renda per capita, a Lei 10.741/03 assim preceitua: "Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas. (Vide Decreto nº 6.214, de 2007)
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."
Entretanto, a Suprema Corte, no RE 580.963/PR, sob regime de repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade parcial, por omissão, sem pronúncia de nulidade da norma em comento, ante a inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em, relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo.
E nesse sentido, assim o Colendo Superior Tribunal de Justiça decidiu em sede de julgamento de recurso repetitivo: "(...) 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93." RECURSO REPETITIVO (Tema: 640) REsp 1355052 / SP RECURSO ESPECIAL 2012/0247239-5 Relator(a) Ministro BENEDITO GONÇALVES (1142)Órgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data do Julgamento 25/02/2015, Data da Publicação/Fonte DJe 05/11/2015)
Indo mais além, a constitucionalidade do próprio § 3º, artigo 20 da Lei 8742/93, também foi questionada na ADI 1.232-1/DF, que, todavia, foi julgada improcedente.
Embora reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações específicas do caso concreto, a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Ou seja, a verificação da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única.
Neste sentido decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG:
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade e o entendimento firmado no julgamento da ADI 1.232-DF levou a Corte Suprema a enfrentar novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993. O julgado reconheceu a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
O reconhecimento da inconstitucionalidade parcial sem nulidade do § 3º, art. 20 da Lei 8742/93 indica que a norma só é inconstitucional naquilo em que não disciplinou, não tendo sido reconhecido a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência.
Cabe ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial, e suprimir a inconstitucionalidade apontada.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Tecidas tais considerações, no caso concreto o estudo social realizado em 15.03.2014 (fls. 295/297) indica que o autor mora com sua esposa, e dois filhos (um filho de 28 anos e outra de 15 anos de idade), em apartamento financiado, com dois quartos, sala, cozinha e banheiro, guarnecida com móveis de acordo com a realidade que ali se apresenta.
Informa que a esposa do requerente (contribuinte facultativa da previdência social desde 01.03.2014) deixou de trabalhar para cuidar dos filhos, e que um dos filhos auxilia nas despesas.
Relataram gastos no importe de R$ 731,00, tendo sido reportados gastos com alimentação (R$ 150,00), prestação do apartamento (R$ 235,00), condomínio (R$ 140,00), luz (R$ 34,00), telefone (R$ 42,00), gazes e faixa para curativos (R$ 50,00) e medicamentos (R$ 80,00).
O laudo foi complementado em 16.06.2015, tendo sido informado que naquela data o autor auferia renda de R$ 300,00 mensais com seu trabalho informal na oficina eletrônica de um amigo, e que o filho (Bruno) já não morava mais com a família.
O estudo social indica a existência de vulnerabilidade socioeconômica e de saúde, assinalando a necessidade de aporte financeiro para que o autor possa manter-se de forma saudável. De fato o relatório social indica um elevado gastos com produtos de saúde (R$ 130,00).
Nota-se que a renda familiar é incerta, e que o valor das despesas supera a renda da família.
Desta forma, considerando conjunto probatório que se apresenta nos autos, verifico estarem preenchidos os requisitos necessários à manutenção do benefício assistencial concedido pela MM. Juíza a quo, ressaltando que, conforme previsto no art. 21 da Lei 8.742/93, cabe ao INSS a revisão periódica do benefício aqui concedido, inclusive no que se refere à eventual nova condição socioeconômica.
Todavia, quanto ao termo inicial do benefício, algumas observações se fazem necessárias.
A sentença firmou a data de inicio do benefício em 08.12.2009 (data da citação), entretanto depreende-se do extrato do sistema CNIS de fls. 372/374 que naquele tempo a esposa do requerente exercia atividade remunerada, com vínculo empregatício formal, que encerrou-se em 31.05.2013. Nota-se ainda que o filho do autor também estava empregado, tendo auferido renda de R$ 1.705,03 no mês de maio de 2014 (mês anterior à data da perícia social), tendo mantido rendimentos até 23.10.2015. Sendo assim, fixo o termo inicial do benefício assistencial na data da complementação do laudo social (16.06.2015), momento em que ficou demonstrado que o filho do autor não compunha mais o núcleo familiar.
Para o cálculo dos juros de mora, aplicam-se os critérios estabelecidos no Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta de liquidação. Quanto à correção monetária, acompanho o entendimento firmado pela Sétima Turma no sentido da aplicação do Manual de Cálculos, naquilo que não conflitar como o disposto na Lei nº 11.960/2009, aplicável às condenações impostas à Fazenda Pública a partir de 29 de junho de 2009.
Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida pelo INSS, e no mérito dou parcial provimento à sua apelação e à remessa necessária, nos termos da fundamentação.
Por fim, considerando o caráter alimentar das prestações reclamadas e que os recursos aos Tribunais Superiores não são dotados de efeito suspensivo (art. 995 CPC/2015), determino, com apoio nos artigos 300 e 497 do CPC/2015, a imediata implantação do benefício assistencial com data de início - DIB em 16.06.2015 e renda mensal inicial - RMI a ser apurada pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.
É o voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
Signatário (a): | PAULO SERGIO DOMINGUES:10078 |
Nº de Série do Certificado: | 112317020459EA07 |
Data e Hora: | 26/06/2017 19:17:42 |