
| D.E. Publicado em 07/12/2018 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, rejeitar a questão preliminar arguida pelo INSS e, no mérito, dar provimento à sua apelação e à remessa necessária, e julgar prejudicado o recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0037432-87.2012.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação objetivando a concessão de aposentadoria por invalidez para trabalhador rural.
A sentença prolatada em 05.03.2014 julgou procedente o pedido para condenar o INSS a conceder a aposentadoria por invalidez nos termos que seguem: "JULGO PROCEDENTE a pretensão formulada para CONDENAR a autarquia-ré a CONCEDER à autora o benefício aposentadoria por invalidez no valor equivalente ao mínimo legal, desde a data de citação do INSS, qual seja, 28.08.2009. As prestações vencidas deverão ser corrigidas monetariamente a partir de cada vencimento, nos termos da Súmula nº 148 do STJ, pelos índices previstos no manual de cálculos da Justiça Federal (ADIn 4357) e acrescidas de juros de mora na forma do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, na redação dada pela Lei 11.960/09 (Resp 1388941). Outrossim, anoto que a autarquia ré está isenta das custas e emolumentos, inclusive de preparo, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei 9.289/96, do art. 24-A da MP 2.180-35, de 24/08/2001 e do art. 8º, §1º da Lei 8.620/92. Não está dispensada, entretanto, das demais despesas processuais, bem como dos honorários advocatícios. Ante a sucumbência suportada, condeno o réu ao pagamento dos honorários advocatícios da patrona da autora, os quais fixo, por equidade, em R$ 500,00 (quinhentos reais), nos moldes do art. 20, §4º, do Código de Processo Civil. Por se tratar de sentença ilíquida, fica interposto o reexame necessário (Súmula nº 490 do Superior Tribunal de Justiça). Decorrido o prazo de recurso voluntário (e seu processamento), remetam-se os autos ao Egrégio Tribunal Regional Federal 3ª Região para apreciação da fase recursal. P.R.I."
Apela a autarquia requerendo preliminarmente a extinção do feito sem resolução do mérito, nos termos dos artigos 267, inciso VI e 301, inciso X do CPC/73, por falta de interesse de agir em razão da ausência de requerimento administrativo. No mérito, pugna pela improcedência do pedido alegando para tanto que não foi preenchido o requisito de qualidade de segurado por falta de início de prova material contemporâneo aos fatos a comprovar.
Recorre adesivamente a parte autora pleiteando a fixação de honorários advocatícios em 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação.
Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
VOTO
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço da remessa necessária e dos recursos do INSS e da parte autora.
Rejeito a preliminar arguida pelo INSS.
O art. 5º, XXXV, da Constituição, assegura o pleno acesso ao Poder Judiciário para a proteção dos cidadãos em caso de lesão ou ameaça a direito. Contudo, essa garantia fundamental não deixa de trazer em si a exigência da existência de uma lide, justificando a atuação do Poder Judiciário como forma democrática de composição de conflitos, o que também se revela como interesse de agir (necessidade e utilidade da intervenção judicial).
Existindo lide (provável ou concreta), é perfeitamente possível o acesso direto à via judicial, sem a necessidade de prévio requerimento na via administrativa.
Contudo, em casos nos quais a lide não está claramente caracterizada, vale dizer, em situações nas quais é potencialmente possível que o cidadão obtenha a satisfação de seu direito perante a própria Administração Pública, é imprescindível o requerimento na via administrativa, justamente para a demonstração da necessidade da intervenção judicial e, portanto, do interesse de agir que compõe as condições da ação. Imprescindível, assim, a existência do que a doutrina processual denomina de fato contrário a caracterizar a resistência à pretensão do autor.
Deveras, de acordo com o entendimento jurisprudencial adotado por esta Corte Regional, tratando-se de ação de cunho previdenciário, ainda que não se possa condicionar a busca da prestação jurisdicional ao exaurimento da via administrativa, tem-se por razoável exigir que o autor tenha ao menos formulado um pleito administrativo - e recebido resposta negativa - de forma a demonstrar a necessidade de intervenção do Poder Judiciário ante a configuração de uma pretensão resistida.
Conclui-se, assim, pela aplicação aos segurados da exigência de prévia provocação da instância administrativa para obtenção do benefício e, somente diante de sua resistência, viabilizar a propositura de ação judicial.
Aliás, é nesse sentido a decisão do Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário 631.240/MG, com repercussão geral reconhecida:
Contudo, nas ações ajuizadas em data anterior à essa decisão, há que se observar as regras de transição nele estabelecidas.
No caso, o feito foi ajuizado em 07/2009, data anterior ao julgamento do paradigma de repercussão geral. O Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, por sua vez, apresentou contestação em 19.10.2009, o que, consoante a modulação de efeitos ali consignada, caracteriza o interesse de agir consubstanciado na resistência à lide.
Passo ao exame do mérito.
A Lei nº 8.213/91, no artigo 42, estabelece os requisitos necessários para a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez, quais sejam: qualidade de segurado, cumprimento da carência, quando exigida, e moléstia incapacitante e insuscetível de reabilitação para atividade que lhe garanta a subsistência. O auxílio-doença, por sua vez, tem seus pressupostos previstos nos artigos 59 a 63 da Lei nº 8.213/91, sendo concedido nos casos de incapacidade temporária.
É dizer: a incapacidade total e permanente para o exercício de atividade que garanta a subsistência enseja a concessão do benefício de aposentadoria por invalidez; a incapacidade total e temporária para o exercício de atividade que garanta a subsistência justifica a concessão do benefício de auxílio-doença e a incapacidade parcial e temporária somente legitima a concessão do benefício de auxílio-doença se impossibilitar o exercício do labor ou da atividade habitual por mais de 15 (quinze) dias pelo segurado.
A condição de segurado (obrigatório ou facultativo) decorre da inscrição no regime de previdência pública, cumulada com o recolhimento das contribuições correspondentes.
O artigo 15 da Lei nº 8.213/91 dispõe sobre as hipóteses de manutenção da qualidade de segurado, independentemente de contribuições; trata-se do denominado período de graça, durante o qual remanesce o direito a toda a cobertura previdenciária. Também é considerado segurado aquele que trabalhava, mas ficou impossibilitado de recolher contribuições previdenciárias em razão de doença incapacitante.
Nesse passo, acresça-se que no que toca à prorrogação do período de graça ao trabalhador desempregado, não obstante a redação do §2º do artigo 15 da Lei nº. 8.213/1991 mencionar a necessidade de registro perante o Ministério do Trabalho e da Previdência Social para tanto, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de Incidente de Uniformização de Interpretação de Lei Federal (Pet. 7.115), firmou entendimento no sentido de que a ausência desse registro poderá ser suprida quando outras provas constantes dos autos, inclusive a testemunhal, se revelarem aptas a comprovar a situação de desemprego.
A perda da qualidade de segurado está disciplinada no §4º desse dispositivo legal, ocorrendo no dia seguinte ao do término do prazo para recolhimento da contribuição referente ao mês de competência imediatamente posterior ao final dos prazos para manutenção da qualidade de segurado.
Depreende-se, assim, que o segurado mantém essa qualidade por mais um mês e meio após o término do período de graça, independente de contribuição, mantendo para si e para os seus dependentes o direito aos benefícios previdenciários.
Anote-se que a eventual inadimplência das obrigações trabalhistas e previdenciárias acerca do tempo trabalhado como empregado deve ser imputada ao empregador, responsável tributário, conforme preconizado na alínea a do inciso I do artigo 30 da Lei nº 8.213/91, não sendo cabível a punição do empregado urbano pela ausência de recolhimentos, computando-se, assim, o período laborado para fins de verificação da qualidade de segurado.
Acresça-se que será garantida a condição de segurado ao trabalhador rural que não tiver vínculo de emprego devidamente registrado em CTPS desde que comprovado o labor mediante ao menos início de prova documental, consoante estabelecido na Súmula nº 149 do STJ.
Também é pacífico o entendimento dos Tribunais, considerando as difíceis condições dos trabalhadores rurais, admitir a extensão da qualificação do cônjuge ou companheiro à esposa ou companheira, bem como da filha solteira residente na casa paterna. (REsp 707.846/CE, Rel. Min. LAURITA VAZ, Quinta Turma, DJ de 14/3/2005)
Por fim, quanto à carência, exige-se o cumprimento de 12 (doze) contribuições mensais para a concessão de aposentadoria por invalidez ou auxílio-doença, conforme prescreve a Lei n.º 8.213/91, em seu artigo 25, inciso I, in verbis: "Art. 25. A concessão das prestações pecuniárias do Regime Geral de Previdência Social depende dos seguintes períodos de carência, ressalvado o disposto no art. 26:I - auxílio-doença e aposentadoria por invalidez: 12 (doze) contribuições mensais;".
No caso concreto.
A autora, com 74 anos de idade no momento da perícia médica judicial, pede neste feito a concessão de auxílio doença/aposentadoria por invalidez na condição de trabalhadora rural.
O laudo médico pericial elaborado em 07.06.2011 (fls. 89/92) concluiu que: "CONCLUSÃO. O(a) autor(a) é portador(a) de problema de osteoartrose dos joelhos obesidade, varizes e idade avançada; tendo sido avaliado pelo conjunto de seu exame físico, história e exames complementares que não tem condições clínicas de exercer a profissão de trabalhadora rural.". Fixou a data de início da doença em 2001, data da cirurgia e início da incapacidade em 2003.
Para comprovar o labor rural a parte autora carreou aos autos os seguintes documentos:
- cópia da sua certidão de casamento celebrado em 26.11.1960 na qual seu marido está qualificado como lavrador (fls. 29);
- cópias das certidões de nascimentos de seus filhos ocorridos entre os anos de 1962 a 1974 na qual seu marido está qualificado como lavrador (fls. 30/34);
- cópia da declaração de atividade rural em nome do marido da autora sem data, referente ao desenvolvimento de atividade rural entre os anos de 1953 e 1983 assinado pelo representante do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Araras e Região (fls. 35);
Foi produzida a prova testemunhal.
Em audiência de instrução realizada em 08.05.2012, Gumercindo Inácio revela que conhece a autora há 40 anos e que ela trabalhava na lavoura branca com a família. Acrescenta que a autora parou de trabalhar quando operou o joelho.
Maria Santana informa que conhece a autora há muito tempo, e que ela sempre trabalhou na roça. Sabe que a família trabalhava com café, e que há pouco tempo parou de trabalhar em razão de problemas de saúde.
Inicialmente, assinalo que a declaração de exercício de atividade rural emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Araras e Região (fls. 35) não configura início de prova material, pois em desacordo com o disposto no artigo 106, III, da Lei nº 8.213/91, que em sua redação original exigia, para sua validade, homologação pelo Ministério Público e após a alteração legislativa em 2008 passou a exigir homologação do INSS.
No mais, verifico que a documentação apresentada refere labor rural entre os anos de 1960 e 1974, mas o laudo médico pericial de fls. 89/92 firma a data de início da incapacidade no ano de 2003.
Nota-se um período de quase trinta anos entre a última evidência material do labor rural e o evento incapacitante, e desta forma, ainda que a prova testemunhal produzida tenha informado o trabalho no campo, necessário reconhecer que ela por si só, não possui o condão de comprovar o efetivo labor rural no largo período.
Observo ainda que consta no laudo médico pericial a informação de que a autora está sem trabalhar como rural desde 1983, pois na época resolveu ser dona de casa (fls. 90).
O reconhecimento da condição de segurado da previdência social para o trabalhador rural, desguarnecida da devida contribuição previdenciária, requer robusto conjunto probatório que não se configura neste feito, pelo que resta indevida a concessão da aposentadoria por invalidez na condição de rurícola.
Inverto o ônus da sucumbência e condeno a parte autora ao pagamento de honorários de advogado que ora fixo em R$ 1.000,00 (um mil reais), de acordo com o §4º do artigo 20 do Código de Processo Civil/1973, considerando que o recurso foi interposto na sua vigência, não se aplicando as normas dos §§1º a 11º do artigo 85 do Código de Processo Civil/2015, cuja exigibilidade, diante da assistência judiciária gratuita que lhe foi concedida, fica condicionada à hipótese prevista no artigo 12 da Lei nº 1.060/50.
Diante do exposto, rejeito a preliminar arguida pelo INSS e, no mérito, DOU PROVIMENTO à sua apelação bem como à remessa necessária, para julgar improcedente o pedido inicial, e julgo prejudicado o recurso adesivo da parte autora, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
| Documento eletrônico assinado digitalmente conforme MP nº 2.200-2/2001 de 24/08/2001, que instituiu a Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por: | |
| Signatário (a): | PAULO SERGIO DOMINGUES:10078 |
| Nº de Série do Certificado: | 112317020459EA07 |
| Data e Hora: | 29/11/2018 16:23:31 |
