
| D.E. Publicado em 25/02/2019 |
EMENTA
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, por unanimidade, não conhecer da remessa necessária e dar parcial provimento à apelação do INSS e ao recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Desembargador Federal
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APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA Nº 0004356-67.2015.4.03.9999/SP
RELATÓRIO
Trata-se de ação objetivando a concessão de benefício assistencial de prestação continuada (LOAS) previsto pelo inciso V do artigo 203 da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência ou incapacitada para o trabalho.
A sentença prolatada em 12.03.2013 julgou procedente o pedido nos termos que seguem: "ANTE O EXPOSTO, JULGO PROCEDENTE o pedido constante desta ação, pelo que CONDENO O INSTITUTO-RÉU a conceder à autora MARIA NUNES DE LIMA o benefício de ASSISTÊNCIA SOCIAL DE PRESTAÇÃO CONTINUADA previsto no art. 203, inc. V da CF/88 e na Lei 8.742/93, art. 20 e segs., regulamentado pelo Decreto 1.744/95, fixando como termo inicial a data da citação, qual seja, 15/03/2011 (fls. 53). CONDENO também o INSTITUTO-RÉU ao PAGAMENTO DAS PARCELAS EM ATRASO, incidindo sobre as mesmas correção monetária, bem como juros de mora a partir da data retro mencionada. Cumpre, ainda, explicitar os critérios de cálculo de correção monetária e dos juros de mora. A correção monetária incide sobre as prestações em atraso, desde as respectivas competências, na forma da legislação de regência, observando-se que a partir de 11.08.2006 o IGP-DI deixa de ser utilizado como índice de atualização dos débitos previdenciários, devendo ser adotado, da retro aludida data (11.08.2006) em diante, o INPC em vez do IGP-DI, nos termos do art. 31 da Lei nº 10.741/2003 c.c. o art. 41-A da Lei nº 8.213/91, com a redação que lhe foi dada pela Medida Provisória nº 316, de 11 de agosto de 2006, posteriormente convertida na Lei nº 11.430, de 26.12.2006. Os juros de mora de meio por cento ao mês incidem, a partir da citação, de forma globalizada para as parcelas anteriores a tal ato processual e de forma decrescente para as parcelas posteriores até a data da conta de liquidação, que der origem ao precatório ou a requisição de pequeno valor RPV (STF AI AgR 492.779-DF, Relator Min. Gilmar Mendes, DJ 03.03.2006). Após o dia 10.01.2003, a taxa de juros de mora passa a ser de 1% ao mês, nos termos do art. 406 do Código Civil e do art. 161, § 1º, do Código Tributário Nacional. Com o advento da Lei nº 11.960/09, a partir de 30.06.2009 os juros serão aqueles aplicados à caderneta de poupança (0,5%), conforme decidido pelo E.STJ nos Embargos de Divergência em RESP nº 1.207.197-RS. Como corolário da sucumbência, CONDENO, por fim, o INSTITUTO-RÉU ao pagamento de honorários advocatícios que estipulo em 10% (dez por cento) sobre as prestações vencidas até a prolação desta sentença, conforme explicitação dada recentemente à Súmula 111 do Superior Tribunal de Justiça. Cumpre ressaltar que, nos termos do art. 6º da Lei Estadual 11.608/03, é descabida a condenação do INSS ao pagamento de custas, mesmo na hipótese de sucumbência, senão vejamos: Artigo 6º - A União, o Estado, o Município e respectivas autarquias e fundações, assim como o Ministério Público estão isentos da taxa judiciária. Submeto o presente decisum ao duplo grau obrigatório, de acordo com o art. 10 da Lei 9.469/97.".
Apela a autarquia alegando para tanto que o requisito de hipossuficiência não foi preenchido, eis que a renda per capita familiar não é inferior a ¼ do salário mínimo.
Recorre adesivamente a parte autora pleiteando a reforma da sentença no tocante aos honorários a advocatícios, juros e correção monetária.
Com contrarrazões da parte autora vieram os autos a este Tribunal.
O Ministério Público Federal opinou pelo desprovimento do recurso da parte autora e parcial provimento à apelação do INSS.
É o relatório.
VOTO
Considerando que a sentença foi proferida sob a égide do Código de Processo Civil de 1973, passo ao exame da admissibilidade da remessa necessária prevista no seu artigo 475.
Embora não seja possível, de plano, aferir-se o valor exato da condenação, pode-se concluir, pelo termo inicial do benefício (15.03.2011 - fls. 53), seu valor e a data da sentença (12.03.2013), que o valor total da condenação não alcança a importância de 60 (sessenta) salários mínimos estabelecida no § 2º.
Assim, é nítida a inadmissibilidade, na hipótese em tela, da remessa necessária.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço dos recursos interpostos.
A questão vertida nos presentes autos diz respeito à exigência de comprovação dos requisitos legais para a obtenção do benefício assistencial previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal.
O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família.
Conforme cópia do documento de identidade de fls. 26, tendo a parte autora nascido em 13.01.1957, conta atualmente com 62 anos de idade, e assim, o pleito baseia-se em suposta deficiência ou incapacidade da postulante.
Para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas (Lei 12.470/2011, art. 3º).
A respeito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a Súmula nº 29 que institui: "Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742, de 1993, incapacidade para a vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas também a impossibilita de prover ao próprio sustento."
O laudo médico pericial elaborado em 25.06.2012 (fls. 106/109) revela que a autora, com 55 anos de idade no momento da perícia, é portadora de hemiplegia à esquerda, e apresenta-se inapta para o trabalho de forma definitiva, evidenciada a existência de impedimento de longo prazo que obsta a participação plena e efetiva da autora na sociedade, em condições de igualdade com as demais pessoas.
Assim, atendido um dos critérios fixados no caput do artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011 c/c o art. 34 da Lei nº 10.741/2003, necessário averiguar-se o preenchimento do requisito etário ou a existência de deficiência/incapacidade laboral, imprescindíveis para a concessão do benefício.
O artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
Com relação ao cálculo da renda per capita, a Lei 10.741/03 assim preceitua:
"Art. 34. Aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social - Loas. (Vide Decreto nº 6.214, de 2007)
Parágrafo único. O benefício já concedido a qualquer membro da família nos termos do caput não será computado para os fins do cálculo da renda familiar per capita a que se refere a Loas."
Entretanto, a Suprema Corte, no RE 580.963/PR, sob regime de repercussão geral, declarou a inconstitucionalidade parcial, por omissão, sem pronúncia de nulidade da norma em comento, ante a inexistência de justificativa plausível para discriminação dos portadores de deficiência em, relação aos idosos, bem como dos idosos beneficiários da assistência social em relação aos idosos titulares de benefícios previdenciários no valor de um salário mínimo.
E nesse sentido, assim o Colendo Superior Tribunal de Justiça decidiu em sede de julgamento de recurso repetitivo: "(...) 2. Com a finalidade para a qual é destinado o recurso especial submetido a julgamento pelo rito do artigo 543-C do CPC, define-se: Aplica-se o parágrafo único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), por analogia, a pedido de benefício assistencial feito por pessoa com deficiência a fim de que benefício previdenciário recebido por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado no cálculo da renda per capita prevista no artigo 20, § 3º, da Lei n. 8.742/93." RECURSO REPETITIVO (Tema: 640) REsp 1355052 / SP RECURSO ESPECIAL 2012/0247239-5 Relator(a) Ministro BENEDITO GONÇALVES (1142)Órgão Julgador S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data do Julgamento 25/02/2015, Data da Publicação/Fonte DJe 05/11/2015)
Indo mais além, a constitucionalidade do próprio § 3º, artigo 20 da Lei 8742/93, também foi questionada na ADI 1.232-1/DF, que, todavia, foi julgada improcedente.
Embora reconhecida a constitucionalidade do §3º do artigo 20 da Lei 8.742/93, a jurisprudência evoluiu no sentido de que tal dispositivo estabelece situação objetiva pela qual se deve presumir pobreza de forma absoluta, mas não impede o exame de situações específicas do caso concreto, a comprovar a condição de miserabilidade do requerente e de sua família. Ou seja, a verificação da renda per capita familiar seria uma das formas de aferição de miserabilidade, mas não a única.
Neste sentido decidiu o E. Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.112.557-MG:
O aparente descompasso entre o desenvolvimento da jurisprudência acerca da verificação da miserabilidade e o entendimento firmado no julgamento da ADI 1.232-DF levou a Corte Suprema a enfrentar novamente a questão no âmbito da Reclamação 4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconheceu a inconstitucionalidade parcial, sem pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993. O julgado reconheceu a ocorrência do processo de inconstitucionalização decorrente de notórias mudanças fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais por parte do Estado brasileiro).
O reconhecimento da inconstitucionalidade parcial sem nulidade do § 3º, art. 20 da Lei 8742/93 indica que a norma só é inconstitucional naquilo em que não disciplinou, não tendo sido reconhecido a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência.
Cabe ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial, e suprimir a inconstitucionalidade apontada.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em se tratando de pessoa idosa ou com deficiência é através da própria natureza de seus males, de seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Tecidas tais considerações, no caso concreto o estudo social elaborado em 04.11.2011 (fls. 98/99) revela que a autora reside com seu marido e dois filhos, em imóvel próprio, com 04 quartos, sala, cozinha e 02 banheiros. A residência apresenta boas condições de higiene e está guarnecida com móveis e utensílios necessários.
Informaram que a renda da família advém do salário do filho da autora que aufere mensalmente R$ 724,00.
Relataram despesas com prestação do imóvel (R$ 84,00), água (R$ 80,40), energia (R$ 134,19), alimentos (R$ 400,00) e medicamentos (R$ 60,00) que somados perfazem o valor de R$ 758,59.
O relatório social concluiu que a autora precisa do benefício para cuidar de sua saúde e que aparentemente há dificuldades para suprir as necessidades básicas da autora.
Depreende-se do conjunto probatório apresentado que no momento da perícia social o grupo encontrava-se em condição de vulnerabilidade socioeconômica em razão das condições de saúde da autora e do desemprego de seu marido, pelo que resta evidenciado o preenchimento do requisito de hipossuficiência.
Entretanto, os extratos do sistema CNIS de fls. 192/195 revelam que desde 22.02.2013 o filho da autora mantem vínculo de trabalho, sem períodos de desemprego, com renda significativamente superior ao valor do salário mínimo vigente à época, e dessa forma assinalo que o benefício assistencial é devido a partir da citação (15.03.2011) até março de 2013.
As parcelas vencidas deverão ser corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR - Taxa Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Nesse passo, acresço que os embargos de declaração opostos perante o STF contra tal julgado tem por objetivo único a modulação dos seus efeitos para atribuição de eficácia prospectiva, pelo que o excepcional efeito suspensivo concedido por meio da decisão proferida em 24.09.2018 e publicada no DJE de 25.09.2018, surtirá efeitos apenas no tocante à definição do termo inicial da incidência do IPCA-e, que deverá ser observado quando da liquidação do julgado.
Com relação aos honorários de advogado, estes devem ser mantidos em 10% do valor da condenação, consoante entendimento desta Turma e artigo 20, parágrafos 3º e 4º, do Código de Processo Civil de 1973, aplicável ao caso concreto eis que o recurso foi interposto na sua vigência, considerando as parcelas vencidas até a data da sentença, nos termos da Súmula nº 111 do Superior Tribunal de Justiça, não se aplicando, também, as normas dos §§ 1º a 11º do artigo 85 do CPC/2015, inclusive no que pertine à sucumbência recursal, que determina a majoração dos honorários de advogado em instância recursal (Enunciado Administrativo nº 7/STJ).
Diante do exposto, não conheço da remessa necessária e DOU PARCIAL PROVIMENTO à apelação do INSS e ao recurso adesivo da parte autora para fixar o temo final do benefício e os critérios de juros e correção monetária, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
PAULO DOMINGUES
Desembargador Federal
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| Data e Hora: | 19/02/2019 13:03:19 |
