Processo
ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP
5293209-07.2020.4.03.9999
Relator(a)
Desembargador Federal PAULO SERGIO DOMINGUES
Órgão Julgador
7ª Turma
Data do Julgamento
22/10/2020
Data da Publicação/Fonte
Intimação via sistema DATA: 26/10/2020
Ementa
E M E N T A
REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO CÍVEL.
BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ASSISTÊNCIA SOCIAL.
DEFICIÊNCIA/IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. MISERABILIDADE. REQUISITOS
COMPROVADOS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Remessa necessária não conhecida.
2. Preliminar de suspensão da tutela arguida pela autarquia rejeitada. Antecipação da tutela
concedida na sentença. Apelação recebida apenas no efeito devolutivo. Art. 1012, § 1º, inciso V
do CPC/2015. Ação de natureza alimentar, o que por si só evidencia o risco de dano irreparável.
3. O benefício assistencial de prestação continuada, previsto no artigo 203, V, da Constituição
Federal, é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação
dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei
nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la
provida por sua família.
4. Para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de
deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem
Jurisprudência/TRF3 - Acórdãos
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas (Lei 12.470/2011, art. 3º).
5. A perícia médica judicial reconheceu a existência das doenças alegadas na inicial e concluiu
que acarretam incapacidade para as atividades habituais da parte autora. O conjunto probatório
indica que as restrições constatadas obstam o desempenho de atividades que garantam o
sustento, no sentido exigido pela legislação aplicável à matéria.
6. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência preenchido. Laudo social indica que a parte autora
encontra-se sem condições de suprir suas necessidades básicas ou de tê-las supridas por sua
família.
7. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Critérios de
atualização do débito corrigidos de ofício.
8. Termo inicial do benefício fixado na data da citação. Considerando a natureza do benefício
assistencial e decorrido largo lapso temporal entre a cessação administrativa e o ajuizamento do
feito, evidencia-se a impossibilidade da concessão desde seu pedido na esfera administrativa.
9. Sucumbência recursal do INSS. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado
na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
10. Sentença corrigida de ofício. Preliminarrejeitada. Apelação do INSS não provida. Recurso
adesivo parte autora não provida.
Acórdao
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293209-07.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDERLEI DE OLIVEIRA GOMES
Advogado do(a) APELADO: ELIZABETH CRISTINA NALOTO - SP230185-A
OUTROS PARTICIPANTES:
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293209-07.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDERLEI DE OLIVEIRA GOMES
Advogado do(a) APELADO: ELIZABETH CRISTINA NALOTO - SP230185-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
Trata-se de ação em que se objetiva a concessão de benefício assistencial de prestação
continuada, previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal à pessoa portadora de deficiência.
A sentença, prolatada em 04.06.2020, julgou procedente o pedido inicial e condenou o Instituto
Nacional do Seguro Social - INSS à concessão do benefício à parte autora conforme dispositivo
que ora transcrevo: “Ante o exposto e por tudo o mais que dos autos consta, JULGO
PROCEDENTE a ação para o fim de CONDENAR a autarquia ré INSS a pagar à parte autora
VANDERLEI DE OLIVEIRA GOMES, qualificado nos autos, o benefício consistente em prestação
continuada, no valor de 01 (um) salário mínimo mensal, nos termos do artigo 20, da Lei 8.742/93,
desde a data da citação, ou seja, 20/09/2017 (fls. 86), eis que o pedido administrativo indeferido
data de mais de cinco anos (24/02/2005, fls. 36) devendo as prestações em atraso serem pagas
de uma só vez, acrescidas de correção monetária e de juros de mora. Os juros de mora devem
ser contados a partir da citação para as parcelas àquela altura vencidas, e desde o momento dos
respectivos vencimentos para as parcelas supervenientes. Esclareço, que para os juros de mora
haverá a aplicação dos índices da caderneta de poupança, nos termos da Lei nº 11.960/09 e para
a correção monetária, por sua vez, o IPCA-E, nos moldes definidos pelo STF no RE nº
870.947/SE, Tema nº 810, DJe de 22/09/2017. Presente os requisitos legais, nos termos do artigo
300 do Código de Processo Civil, ANTECIPO os efeitos da tutela e DETERMINO que o INSS
providencie a implantação do benefício de prestação continuada à parte autora, no prazo de 30
(trinta) dias, sob pena de arbitramento de multa cominatória pelo eventual descumprimento da
obrigação. Condeno, ainda, o Instituto-réu, ao pagamento das custas, despesas processuais e
honorários advocatícios que fixo em 10% sobre o valor da condenação. Ressalta-se que os
honorários advocatícios, nas ações previdenciárias, não incidem sobre prestações vincendas, de
acordo com a Súmula n.º 111 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça. Sentença não sujeita a
reexame necessário, nos termos do art. 496, §3º, I, do Código de Processo Civil, vez que o valor
da condenação não supera 1.000 (mil) salários. Sem prejuízo, após o trânsito em julgado, deverá
o INSS apresentar os cálculos atualizados. P.I.C.”
Apela o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS requerendo preliminarmente a suspensão da
tutela. No mérito, pugna pela da sentença ao fundamento de que não restou comprovado o
requisito de miserabilidade da parte autora e nem sua condição de deficiente a amparar a
concessão do benefício. Prequestiona, a expressa manifestação a respeito das normas legais e
constitucionais aventadas.
Recorre adesivamente a parte autora (ID 138177332 pág. 10/22), pugnando pelo pagamento do
benefício desde a data do pedido administrativo 24.02.2005.
Com contrarrazões da parte autora, subiram os autos a esta Corte.
O Ministério Público Federal, em seu parecer, opinou pelo desprovimento da apelação do INSS e
deixou de opinar acerca do recurso adesivo da parte autora.
É o relatório.
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº5293209-07.2020.4.03.9999
RELATOR:Gab. 24 - DES. FED. PAULO DOMINGUES
APELANTE: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
APELADO: VANDERLEI DE OLIVEIRA GOMES
Advogado do(a) APELADO: ELIZABETH CRISTINA NALOTO - SP230185-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.
Preliminarmente, em relação ao pedido de recebimento do recurso no efeito suspensivo, verifico
que a antecipação da tutela foi concedida na sentença, o que torna possível o recebimento da
apelação apenas no efeito devolutivo, nos termos do art. 1012, § 1º, inciso V do CPC/2015.
Nos termos do artigo 300 do Código de Processo Civil/2015, o juiz poderá antecipar os efeitos da
tutela pretendida no pedido inicial, desde que existam elementos que evidenciem a probabilidade
do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil ao processo.
No caso, conforme avaliação do Juízo a quo, restaram configurados os requisitos autorizadores
da concessão do benefício, pelo que mantenho seus efeitos.
Ressalte-se que a presente ação é de natureza alimentar o que por si só evidencia o risco de
dano irreparável tornando viável a antecipação dos efeitos da tutela.
Rejeito a preliminar arguida pelo INSS, e passo ao exame do mérito
Considerando que a sentença se enquadra entre as hipóteses de exceção de submissão ao
reexame necessário previstas nos § 3º e 4º do artigo 496 do CPC/2015, restrinjo o julgamento
apenas à insurgência recursal.
O benefício assistencial de prestação continuada, previsto no artigo 203, V, da Constituição
Federal, é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação
dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei
nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la
provida por sua família.
Para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de deficiência
aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza física,
mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir
sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas (Lei 8742/93 art. 20, §§ 2º e 10º).
A respeito, a Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais editou a Súmula
nº 29, que institui: "Para os efeitos do art. 20, § 2º, da Lei nº 8.742, de 1993, incapacidade para a
vida independente não só é aquela que impede as atividades mais elementares da pessoa, mas
também a impossibilita de prover ao próprio sustento."
No tocante ao requisito da miserabilidade, o artigo 20, § 3º da Lei 8742/93 considera incapaz de
prover a manutenção da pessoa com deficiência ou idosa a família cuja renda mensal per capita
seja inferior a 1/4 (um quarto) do salário-mínimo. (Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011).
A constitucionalidade dessa norma foi questionada na ADI 1.232-1/DF, tendo o Plenário do
Supremo Tribunal Federal, por maioria, decidido pela improcedência do pedido, ao fundamento
que a fixação da renda per capita no patamar de ¼ do salário mínimo sugere a presunção
absoluta de pobreza. Concluiu, contudo, que não é a única forma suscetível de se aferir a
situação econômica da família do idoso ou portador de deficiência.
Posteriormente, a Corte Suprema enfrentou novamente a questão no âmbito da Reclamação
4374 - PE que, julgada em 18/04/2013, reconhecendo a inconstitucionalidade parcial, sem
pronúncia de nulidade, do § 3º, art. 20 da Lei 8.742/1993, decorrente de notórias mudanças
fáticas (políticas, econômicas e sociais) e jurídicas (sucessivas modificações legislativas dos
patamares econômicos utilizados como critérios de concessão de outros benefícios assistenciais
por parte do Estado brasileiro).
Restou decidido que a norma é inconstitucional naquilo que não disciplinou, não tendo sido
reconhecida a incidência taxativa de qualquer critério para aferição da hipossuficiência, cabendo
ao legislador fixar novos parâmetros e redefinir a política pública do benefício assistencial a fim de
suprimir o vício apontado.
Desta forma, até que o assunto seja disciplinado, é necessário reconhecer que o quadro de
pobreza deve ser aferido em função da situação específica de quem pleiteia o benefício, pois, em
se tratando de pessoa idosa ou com deficiência, é através da própria natureza de seus males, de
seu grau e intensidade, que poderão ser mensuradas suas necessidades.
Não há como enquadrar todos os indivíduos em um mesmo patamar, nem tampouco entender
que aqueles que contam com menos de ¼ do salário-mínimo fazem jus obrigatoriamente ao
benefício assistencial ou que aqueles que tenham renda superior não o façam.
Com relação ao cálculo da renda per capita em si, o Superior Tribunal de Justiça, em sede de
recurso repetitivo REsp 1.355.052/SP, em conformidade com a decisão proferida pelo Supremo
Tribunal Federal no RE 580.963/PR, definiu que a se aplica, por analogia, a regra do parágrafo
único do artigo 34 do Estatuto do Idoso (Lei 10.741/03), a pedido de benefício assistencial
formulado por pessoa com deficiência, a fim de que qualquer benefício previdenciário recebido
por idoso, no valor de um salário mínimo, não seja computado na sua aferição.
Por fim, entende-se por família, para fins de verificação da renda per capita, nos termos do §1º do
artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação dada pela Lei nº 12.435/2011, o conjunto de pessoas
composto pelo requerente, o cônjuge, o companheiro, a companheira, os pais e, na ausência de
um deles, a madrasta ou o padrasto, os irmãos solteiros, os filhos e enteados solteiros e os
menores tutelados, desde que vivam sob o mesmo teto.
Contudo, em que pese a princípio os filhos casados ou que não coabitem sob o mesmo teto não
integrem o núcleo familiar para fins de aferição de renda per capita, nos termos da legislação
específica, não se pode perder de vista que o artigo 203, V, da Constituição Federal estabelece
que o benefício é devido quando o idoso ou deficiente não puder prover o próprio sustento ou tê-
lo provido pela família. Por sua vez, a regra do artigo 229 da Lei Maior dispõe que os filhos
maiores têm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carência ou enfermidade, premissa
também assentada nos artigos 1694 a 1697 da lei Civil.
Depreende-se assim que o dever de sustento do Estado é subsidiário, não afastando a obrigação
da família de prestar a assistência, pelo que, como já dito, o artigo 20, § 3º, da LOAS não pode
ser interpretado de forma isolada na apuração da miserabilidade.
Tecidas tais considerações, no caso dos autos a sentença de primeiro grau julgou procedente o
pedido com base nos elementos contidos no laudo pericial médico e no estudo social, produzidos
pelos peritos do Juízo, tendo se convencido restarem configuradas as condições de deficiência e
miserabilidade necessárias para a concessão do benefício. Confira-se:
“Portanto, se conclui da prova dos autos que a parte autora não possui meios de prover a sua
própria manutenção e nem tê-la provida por sua família, vez que sua família é parca de recursos
financeiros, colocando-se em situação de inexistência da garantia dos mínimos sociais
necessários à vida digna de um cidadão. É evidente que o valor da renda familiar da parte autora
é insuficiente para prover a própria manutenção, fazendo jus ao benefício. Ressalte-se que o
limite estabelecido que fixa renda “per capita” de ¼ do salário mínimo como condição a obtenção
do benefício não pode ser considerado, vez que contraria flagrantemente o dispositivo
constitucional, ao estabelecer o salário mínimo como sendo a “importância suficiente para que
qualquer pessoa possa ter condições de suprir suas necessidades básicas e vitais” sendo certo
que este valor, na prática, sequer é capaz de atender ¼ do que foi estipulado na própria
Constituição Federal de 1988, o que dirá ¼ deste valor (não dá para quase nada). Acolher-se a
tese exposta pelo Instituto réu seria admitir que somos desprovidos das garantias mínimas. O
parecer social confirmou que o autor e seus familiares tange um grau de vulnerabilidade social,
bem como, atende de forma precária os mínimos sociais, vivendo de forma distinta da qual faz jus
conforme os parâmetros definidos pela Política Nacional de Assistência Social (fls. 57/60). Além
disso, apresenta sequela de poliomielite no hemicorpo direito com predomínio no membro inferior,
que apresenta paralisia enquanto no membro superior há plegia, ou seja, perda da força
muscular. Além disso, em janeiro de 2010 evoluiu com infarto agudo do miocárdio e cardiopatia
isquêmica com necessidade de colocação de stents em algumas coronárias obstruídas,
justificando a concessão do benefício. Considerando-se as provas carreadas, conclui-se que o
autor não tem condição alguma de prover sua manutenção, bem como, comprova a
impossibilidade de sua família em prover sua assistência”
Quanto à condição de deficiente do autor, o laudo médico pericial (ID 138177324), realizado em
31.07.2018, revela que o autor, com 44 anos de idade no momento da perícia, é portador de:
“Autor possui sequela de Poliomielite no hemicorpo direito com predomínio no membro inferior,
que apresenta paralisia enquanto no membro superior há plegia ou seja, perda da força muscular.
Necessita de bengala para deambular. Além disso, em Janeiro de 2010 evoluiu com Infarto agudo
do miocárdio e cardiopatia isquêmica com necessidade de colocação de stents em algumas
coronárias obstruídas.” Conclui o expert pela incapacidade laboral total e permanente conforme
ora transcrevo: “Levando-se em consideração o caráter grave e irreversível da doença cardíaca e
as sequelas motoras da Poliomielite, esta Perita médica conclui que: HÁ INCAPACIDADE
LABORAL TOTAL, PERMANENTE E OMNIPROFISSIONAL AUTOR ENQUADRA-SE NO
CONCEITO DE DEFICIENTE.”
Depreende-se da leitura do laudo médico pericial que o autor é portador de enfermidades que
ocasionam incapacidade laboral que impede o desenvolvimento de atividade que lhe garanta o
sustento, no sentido exigido pela legislação aplicável à matéria.
Por sua vez, o estudo social (ID 138177293), elaborado em 11.08.2017, revela que o autor vive
sozinho em imóvel alugado, de alvenaria, localizada nos fundos, simples, limpa e organizada,
sendo composta por: 01 sala; 01 cozinha (sem azulejo); 01 quarto; 01 banheiro interno (sem
azulejo). Os móveis que guarnecem o quarto são: 01 cama de casal; 01 guarda-roupa.
Internamente apresenta piso cimento queimado, lajotada e com pintura látex. Externamente o
terreno é murado, quintal com contra-piso danificado e no mesmo terreno há cinco casas de
aluguel. O imóvel é razoavelmente conservado, aparentando relativo conforto ao morador. Os
equipamentos domésticos e mobiliários são antigos e razoavelmente conservados. Bens
eletrodomésticos e eletrônicos no local: 01 fogão; 01 geladeira; 01 aparelho de som; 01 DVD; 01
forno micro-ondas (quebrado); 01 TV. Não possui imóveis ou veículos.
Informa que o autor não possui renda formal, faz “bicos” consertando computadores em sua casa
para sobreviver, recebe em torno de R$ 340,00, mensais, quando surge trabalho. Recebe uma
cesta básica de uma amiga a cada três meses. Não está inserido em nenhum programa social.
As despesas relatadas são: Alimentação R$200,00; Gás R$70,00; Transporte R$15,00; Aluguel
R$400,00 e Cigarro R$60,00. No quesito vestuário não há gasto porque não compra nada, utiliza
as peças que tem; sapato ele não usa, vive descalço, apenas coloca quando vai ao hospital.
Nota-se claramente a existência de vulnerabilidade socioeconômica, eis que autor, incapacitado
para o trabalho, sobrevive em condições precárias, contando apenas valores informais,
decorrente dos “bicos” consertando computadores.
Verifica-se, assim, que o MM. Juiz sentenciante julgou de acordo com as provas carreadas aos
autos e,comprovada a existência de deficiência/impedimento de longo prazo exigida no caput do
artigo 20 da Lei nº 8.742/93 com a redação dada pela Lei nº 12.470/2011, que aliada à condição
de miserabilidade atestada no estudo social, preenchem os requisitos indispensáveis para a
concessão do benefício e, portanto, de rigor a manutenção da sentença de procedência do
pedido.
Quanto ao termo inicial da benesse, é firme a jurisprudência no sentido de o termo inicial do
benefício assistencial deve ser fixado na data do seu pedido administrativo e, na sua ausência, na
data da citação.
In casu, pleiteia a parte autora a concessão do benefício assistencial requerido
administrativamente em 24.02.2005, contudo, considerando o largo lapso temporal decorrido
entre o pedido administrativo e o ajuizamento do feito ocorrido em 07.2017, não se pode presumir
que a condição socioeconômica da família àquele tempo fosse a mesma da apurada neste feito,
ou mesmo que estivesse a autora em situação de miserabilidade, razão pela qual fixo o termo
inicial do benefício na data da citação.
Confira-se a jurisprudência:
IMPOSSIBILIDADE NO CASO. TRANSCORRIDOS MAIS DE CINCO ANOS ENTRE O
INDEFERIMENTO ADMINISTRATIVO E O AJUIZAMENTO DA AÇÃO. BENEFÍCIO DE
CARÁTER TEMPORÁRIO. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DE DIREITO. NÃO OCORRÊNCIA.
POSSIBILIDADE DE DEFERIMENTO DE OUTRO BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. RECURSO
ESPECIAL NÃO PROVIDO.
1. O benefício de prestação continuada é uma garantia constitucional, de caráter assistencial,
previsto no artigo 203, V, da Constituição Federal de 1988, regulamentado pelo artigo 20 da Lei
8.742/1993 e também pela Lei 10.741/2003, o Estatuto do Idoso. Consiste no pagamento de um
salário mínimo mensal às pessoas com deficiência ou idosas, desde que comprovem não possuir
meios de prover a própria manutenção, nem de tê-la provida por sua família. 2. A concessão do
benefício está sujeita à avaliação da deficiência e do grau de incapacidade, composta por
avaliação médica e avaliação social realizadas por médicos peritos e por assistentes sociais do
INSS, de forma periódica. Caso o benefício seja concedido, deverá ser revisto a cada dois anos
para avaliação da continuidade das condições que lhe deram origem. Portanto, trata-se de um
benefício temporário. 3. A pretensão ao benefício previdenciário/assistencial em si não prescreve,
mas tão somente as prestações não reclamadas em certo tempo, que vão prescrevendo uma a
uma, em virtude da inércia do beneficiário. 4. Em decorrência do caráter temporário do benefício
assistencial, no caso concreto, transcorridos mais de cinco anos entre o indeferimento
administrativo e o ajuizamento da ação, não se mostra razoável fazer retroagir os efeitos do
reconhecimento do direito à data do requerimento administrativo. Novo pedido poderá ser
apresentado, com efeitos retroativos somente a partir desse novo pedido. 5. Recurso especial
não provido.
(Acórdão Número 2018.00.69255-8/201800692558, RESP - RECURSO ESPECIAL – 1731956,
Relator(a) MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA,
SEGUNDA TURMA, Data 22/05/2018, Data da publicação 29/05/2018, DJE DATA:29/05/2018)
CONSTITUCIONAL - BENEFÍCIO ASSISTENCIAL. ART. 203, V, CF/88, LEI N. 8.742/93 E
12.435/2011. TERMO INICIAL - PRIMEIRO PEDIDO ADMINISTRATIVO FEITO EM 19.11.2009.
APELAÇÃO IMPROVIDA.
- O benefício de prestação continuada é devido ao portador de deficiência ou idoso que comprove
não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la provida por sua família. - A
autora trouxe com a inicial cópia do processo administrativo feito em 19.11.2009, apontando que
a autora residia com a mãe, a irmã e o padrasto. Informando ainda que o padrasto exercia a
função de ajudante geral e auferia renda, sem mencionar valores. - A consulta ao CNIS (doc.
anexo) indica que o pai da autora tem vínculo de trabalho nos períodos de 21.06.2007 a 11.2008
e de 05.05.2011 a 14.01.2013. - O primeiro pedido administrativo indeferido foi requerido em
19.11.2009 e a ação foi proposta em 21.09.2016. O segundo pedido administrativo deferido foi
feito em 28.03.2016. Portanto, mais de 6 anos após ter sido indeferido. Decorrido esse lapso de
tempo, a parte autora não pode mais aproveitar-se daquele pedido para impedir a prescrição do
fundo de direito. Mesmo porque não há provas de que a situação fática da autora era a mesma de
quase seis anos atrás. - Acrescente-se que, nos termos do art. 21, caput, da Lei n. 8.742/93, o
benefício de prestação continuada deve ser revisto a cada dois anos, para avaliação da
continuidade das condições que lhe deram origem. - Apelação improvida.
(Acórdão Número 0033008-26.2017.4.03.9999/00330082620174039999, Ap - APELAÇÃO CÍVEL
– 2272537, Relator(a) DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, TRIBUNAL -
TERCEIRA REGIÃO, NONA TURMA Data 26/09/2018, Data da publicação 10/10/2018, e-DJF3
Judicial 1 DATA:10/10/2018)
No que tange aos critérios de atualização do débito, verifico que a sentença desborda do
entendimento firmado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947, tema de
repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux.
Assim, tratando-se de matéria cognoscível de ofício (AgRg no AREsp 288026/MG, AgRg no REsp
1291244/RJ), corrijo a sentença e estabeleço que as parcelas vencidas deverão ser atualizadas
monetariamente e acrescidas de juros de mora pelos índices constantes do Manual de
Orientação para a elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da
conta, observando-se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à
TR – Taxa Referencial. Anoto que os embargos de declaração opostos perante o STF que
objetivavam a modulação dos efeitos da decisão supra, para fins de atribuição de eficácia
prospectiva, foram rejeitados no julgamento realizado em 03.10.2019.
Considerando o não provimento do recurso do INSS, de rigor a aplicação da regra do §11 do
artigo 85 do CPC/2015, pelo que determino, a título de sucumbência recursal, a majoração dos
honorários de advogado arbitrados na sentença em 2%.
Diante do exposto, de ofício, corrijo a sentença para fixar os critérios de atualização do débito,
rejeito a preliminar de suspensão da tutela, NEGO PROVIMENTO à apelação do INSS e, nego
provimento ao recurso adesivo da parte autora, nos termos da fundamentação exposta.
É o voto.
E M E N T A
REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. PRELIMINAR REJEITADA. APELAÇÃO CÍVEL.
BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA. ASSISTÊNCIA SOCIAL.
DEFICIÊNCIA/IMPEDIMENTO DE LONGO PRAZO. MISERABILIDADE. REQUISITOS
COMPROVADOS. TERMO INICIAL DO BENEFÍCIO. JUROS E CORREÇÃO MONETÁRIA.
MANUAL DE CÁLCULOS NA JUSTIÇA FEDERAL.
1. Valor da condenação inferior a 1.000 salários mínimos. Remessa necessária não conhecida.
2. Preliminar de suspensão da tutela arguida pela autarquia rejeitada. Antecipação da tutela
concedida na sentença. Apelação recebida apenas no efeito devolutivo. Art. 1012, § 1º, inciso V
do CPC/2015. Ação de natureza alimentar, o que por si só evidencia o risco de dano irreparável.
3. O benefício assistencial de prestação continuada, previsto no artigo 203, V, da Constituição
Federal, é devido ao portador de deficiência (§2º do artigo 20 da Lei nº 8.742/93, com a redação
dada pela Lei nº 12.470/2011) ou idoso com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais (artigo 34 da Lei
nº 10.741/2003) que comprove não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la
provida por sua família.
4. Para efeito de concessão do benefício assistencial, considera-se pessoa portadora de
deficiência aquela que tem impedimentos de longo prazo, no mínimo de dois anos, de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem
obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais
pessoas (Lei 12.470/2011, art. 3º).
5. A perícia médica judicial reconheceu a existência das doenças alegadas na inicial e concluiu
que acarretam incapacidade para as atividades habituais da parte autora. O conjunto probatório
indica que as restrições constatadas obstam o desempenho de atividades que garantam o
sustento, no sentido exigido pela legislação aplicável à matéria.
6. Requisito de miserabilidade/hipossuficiência preenchido. Laudo social indica que a parte autora
encontra-se sem condições de suprir suas necessidades básicas ou de tê-las supridas por sua
família.
7. Juros e correção monetária pelos índices constantes do Manual de Orientação para a
elaboração de Cálculos na Justiça Federal vigente à época da elaboração da conta, observando-
se, em relação à correção monetária, a aplicação do IPCA-e em substituição à TR – Taxa
Referencial, consoante decidido pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal no RE nº 870.947,
tema de repercussão geral nº 810, em 20.09.2017, Relator Ministro Luiz Fux. Critérios de
atualização do débito corrigidos de ofício.
8. Termo inicial do benefício fixado na data da citação. Considerando a natureza do benefício
assistencial e decorrido largo lapso temporal entre a cessação administrativa e o ajuizamento do
feito, evidencia-se a impossibilidade da concessão desde seu pedido na esfera administrativa.
9. Sucumbência recursal do INSS. Honorários de advogado majorados em 2% do valor arbitrado
na sentença. Artigo 85, §11, Código de Processo Civil/2015.
10. Sentença corrigida de ofício. Preliminarrejeitada. Apelação do INSS não provida. Recurso
adesivo parte autora não provida.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Sétima Turma, por
unanimidade, decidiu de ofício, corrigir a sentença para fixar os critérios de atualização do débito,
rejeitar a preliminar de suspensão da tutela, NEGAR PROVIMENTO à apelação do INSS e, negar
provimento ao recurso adesivo da parte autora, nos termos do relatório e voto que ficam fazendo
parte integrante do presente julgado.
Resumo Estruturado
VIDE EMENTA
