
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005890-16.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: ELAINE CRISTINA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: BRUNO MESKO DIAS - SP447904-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ELAINE CRISTINA ALVES
Advogado do(a) APELADO: BRUNO MESKO DIAS - SP447904-A
OUTROS PARTICIPANTES:
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005890-16.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: ELAINE CRISTINA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: BRUNO MESKO DIAS - SP447904-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ELAINE CRISTINA ALVES
Advogado do(a) APELADO: BRUNO MESKO DIAS - SP447904-A
OUTROS PARTICIPANTES:
R E L A T Ó R I O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Trata-se de pedido de aposentadoria especial ou, sucessivamente, aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), ajuizado por Elaine Cristina Alves em face do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS).
Contestação do INSS na qual sustenta o não enquadramento das atividades exercidas pela parte autora como sendo de natureza especial, requerendo, ao final, a improcedência total do pedido (ID 295797029).
Réplica da parte autora (ID 295797132).
Laudo pericial (ID 295797162 e 295797173).
Sentença pela parcial procedência do pedido, para reconhecer o período de 01.10.1997 a 12.11.2019 como sendo de natureza especial e determinar a implantação da aposentadoria por tempo de contribuição da parte autora, desde a citação (10.06.2022), fixando a sucumbência (ID 295797184).
Foi concedida a tutela antecipada.
Apelação do INSS arguindo, preliminarmente, a necessidade de remessa necessária e a nulidade da perícia. No mérito, pelo não acolhimento do pedido formulado na exordial e consequente inversão da sucumbência. Requer a atribuição de efeito suspensivo ativo ao recurso (ID 295797188).
Apelação da parte autora, na qual alega, em síntese, o direito à concessão do benefício de aposentadoria especial, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 09.12.2019), considerando o tempo contributivo de 20 (vinte) anos submetido ao agente agressivo pressão atmosférica anormal, a fixação do termo inicial dos efeitos financeiros desde a DER, e o afastamento da aplicação da Súmula 111/STJ (ID 295797185).
Com as contrarrazões, subiram os autos a esta Corte.
É o relatório.
10ª Turma
APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 5005890-16.2022.4.03.6183
RELATOR: Gab. 37 - DES. FED. NELSON PORFIRIO
APELANTE: ELAINE CRISTINA ALVES, INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
Advogado do(a) APELANTE: BRUNO MESKO DIAS - SP447904-A
APELADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, ELAINE CRISTINA ALVES
Advogado do(a) APELADO: BRUNO MESKO DIAS - SP447904-A
OUTROS PARTICIPANTES:
V O T O
O Exmo. Desembargador Federal Nelson Porfirio (Relator): Pretende a parte autora, nascida em 18.04.1974, o reconhecimento do exercício de atividades especiais no período de 01.10.1997 a 09.12.2019, e a concessão do benefício de aposentadoria especial ou aposentadoria por tempo de contribuição (melhor hipótese financeira), a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 09.12.2019).
Da tutela antecipada.
Inicialmente, incabível a suspensão do cumprimento da tutela antecipada concedida na sentença.
É pacífico nesta Corte o cabimento da antecipação dos efeitos da tutela para adiantar total ou parcialmente os efeitos pretendidos pela parte autora ante o caráter alimentar do benefício previdenciário, afastando-se os riscos decorrentes da demora na execução definitiva do julgado (Nesse sentido: AC 0010241-11.2008.4.03.6183/SP, Rel. Des. Fed. Therezinha Cazerta, e-DJF3 Judicial 1 de 14/11/2014).
Além do mais, o Egrégio Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento no sentido da possibilidade de concessão da tutela antecipada contra a Fazenda Pública em hipóteses como a dos autos (Conforme AgRg no Ag 1230687/RJ, Rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 19.12.2011, e AgRg no Ag 1405103/RS, Rel. Min. Castro Meira, DJe 16/02/2012).
Da remessa necessária.
Anoto que a sentença foi proferida já na vigência do novo Código de Processo Civil - Lei 13.105/2015 -, razão pela qual se deve observar o disposto no art. 496, §3º, I. No caso dos autos, não obstante a sentença ser ilíquida, é certo que o proveito econômico obtido pela parte autora não superará o valor de 1.000 (mil) salários-mínimos, ainda que se considere o valor máximo dos benefícios do RGPS, tendo em vista que a sentença foi prolatada em 29.04.2024 e a data de início do benefício é 09.12.2019.
Neste sentido observo que a 1ª Turma do C. STJ, ao apreciar o REsp 1.735.097/RS, em decisão proferida em 08.10.2019, entendeu que, não obstante a iliquidez das condenações em causas de natureza previdenciária, a sentença que defere benefício previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos. Assim, na vigência do Código de Processo Civil/2015, em regra, a condenação em ações previdenciárias não alcança o valor de mil salários-mínimos, observada a prescrição quinquenal, com os acréscimos de juros, correção monetária e demais despesas de sucumbência, restando afastado o duplo grau necessário.
Da perícia.
Merece ser afastada a preliminar arguida pelo INSS de nulidade da perícia realizada. Cabe destacar que a prova produzida foi suficientemente elucidativa, não merecendo qualquer complementação ou reparos a fim de reabrir questionamentos, os quais foram oportunizados e realizados em consonância com os princípios do contraditório e da ampla defesa.
Da mesma forma, afasto a preliminar arguida pela autarquia de competência da Justiça do Trabalho para discussão quanto às condições de desempenho das atividades, pois, no presente feito, a relação jurídica possui caráter essencialmente previdenciário, qual seja, a existência de condições especiais de trabalho a justificar a concessão de aposentadoria especial ou a contagem do tempo com o fator de conversão correspondente. Embora exista nítida intersecção entre as esferas previdenciárias e laboral, isto não basta para a consolidação da competência da Justiça Trabalhista. Note-se que o INSS atua no feito como ente responsável pelo cumprimento da obrigação previdenciária e não como empregador, o que afasta a regra excepcional constante na parte final do inciso I, do art. 109 da Constituição da República.
Em relação à competência da Justiça do Trabalho para retificação do Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, ressalto não se tratar da matéria analisada no presente processo.
A realização de prova técnica, a fim de constatar a especialidade do trabalho, para efeitos previdenciários, não implica a alteração das informações do PPP. Nesse sentido já decidiu este E. Tribunal:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. REVISÃO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO EM APOSENTADORIA ESPECIAL. TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL. RUÍDO. CALOR. ENQUADRAMENTO. REQUISITO TEMPORAL PREENCHIDO. CONSECTÁRIOS.
(...)
- Não há que se falar em incompetência da Justiça Federal, porquanto o pedido formulado pela parte autora consiste no reconhecimento da especialidade de períodos não enquadrados administrativamente, para fins de conversão de aposentadoria por tempo de contribuição em aposentadoria especial, e não de retificação de informações contidas em formulário (Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP). Precedentes desta corte.
(...)
(TRF 3 - ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL / SP 5000521-37.2020.4.03.6110, Desembargadora Federal DALDICE MARIA SANTANA DE ALMEIDA, 9ª Turma, Data do Julgamento: 16/02/2022, Data da Publicação/Fonte: DJEN 22/02/2022)
Do mérito.
Para elucidação da controvérsia, cumpre distinguir a aposentadoria especial, prevista no art. 57 da Lei nº 8.213/91, da aposentadoria por tempo de contribuição, prevista no art. 52 do mesmo diploma legal, pois a primeira pressupõe o exercício de atividade laboral considerada especial, pelo tempo de 15, 20 ou 25 anos, sendo que, cumprido esse requisito, o segurado tem direito à aposentadoria com valor equivalente a 100% do salário-de-benefício (§ 1º do art. 57), não estando submetido à inovação legislativa da EC 20/98, ou seja, inexiste pedágio ou exigência de idade mínima, nem submissão ao fator previdenciário, conforme art. 29, II, da Lei nº 8.213/91. Diferentemente, na aposentadoria por tempo de contribuição pode haver tanto o exercício de atividades especiais como o exercício de atividades comuns, sendo que os períodos de atividade especial sofrem conversão em atividade comum, aumentando assim o tempo de serviço do trabalhador, e, conforme a data em que o segurado preenche os requisitos, deverá se submeter às regras da EC 20/98.
A Emenda Constitucional n.º 103/2019, publicada em 13.11.2019, entre outras alterações em diversos dispositivos constitucionais, deu nova redação ao inciso I do art. 201 da CF/88, passando a exigir para a obtenção de aposentadoria urbana no RGPS, a idade mínima de 65 anos de idade (homem) e 62 anos de idade (mulher), observado tempo mínimo de contribuição (o § 1º do referido art. 201 estabelece a previsão de critérios diferenciados de idade e tempo de contribuição para as pessoas com deficiência e para os que exercem atividades tidas por especiais, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação).
Aos segurados filiados ao RGPS até a publicação da EC 103 (13.11.2019), foram estabelecidas algumas regras de transição pelos art. 15, 16, 17, 18 e 20 da referida EC 103/2019, que devem ser avaliadas caso a caso, uma vez que é a situação específica de cada segurado o fator determinante para escolha da regra de transição mais favorável.
Ainda, conforme disposto no art. 3º, caput, e § 2º da referida emenda, foram preservados os direitos adquiridos dos segurados e dependentes do RGPS, que, até a data de entrada em vigor da alteração constitucional (13.11.2019), demonstrem o preenchimento dos requisitos legalmente exigidos para a concessão da aposentadoria ou pensão por morte, ainda que requeridas posteriormente:
“Art. 3º A concessão de aposentadoria ao servidor público federal vinculado a regime próprio de previdência social e ao segurado do Regime Geral de Previdência Social e de pensão por morte aos respectivos dependentes será assegurada, a qualquer tempo, desde que tenham sido cumpridos os requisitos para obtenção desses benefícios até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional, observados os critérios da legislação vigente na data em que foram atendidos os requisitos para a concessão da aposentadoria ou da pensão por morte.
(...)
§ 2º Os proventos de aposentadoria devidos ao segurado a que se refere o caput e as pensões por morte devidas aos seus dependentes serão apurados de acordo com a legislação em vigor à época em que foram atendidos os requisitos nela estabelecidos para a concessão desses benefícios.”.
Com relação à aposentadoria especial, a Emenda Constitucional n. 103/2019 alterou profundamente os critérios para sua concessão, reintroduzindo o requisito etário como exigência e modificando a forma de cálculo do benefício, nos seguintes termos:
“Art. 19. Até que lei disponha sobre o tempo de contribuição a que se refere o inciso I do § 7º do art. 201 da Constituição Federal, o segurado filiado ao Regime Geral de Previdência Social após a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional será aposentado aos 62 (sessenta e dois) anos de idade, se mulher, 65 (sessenta e cinco) anos de idade, se homem, com 15 (quinze) anos de tempo de contribuição, se mulher, e 20(vinte) anos de tempo de contribuição, se homem.
§ 1º Até que lei complementar disponha sobre a redução de idade mínima ou tempo de contribuição prevista nos §§ 1º e 8º do art. 201 da Constituição Federal, será concedida aposentadoria:
I - aos segurados que comprovem o exercício de atividades com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, durante, no mínimo, 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, nos termos do disposto nos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, quando cumpridos:
a) 55 (cinquenta e cinco) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 15 (quinze) anos de contribuição;
b) 58 (cinquenta e oito) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 20 (vinte) anos de contribuição; ou
c) 60 (sessenta) anos de idade, quando se tratar de atividade especial de 25 (vinte e cinco) anos de contribuição; (...)
“Art. 21. O segurado ou o servidor público federal que se tenha filiado ao Regime Geral de Previdência Social ou ingressado no serviço público em cargo efetivo até a data de entrada em vigor desta Emenda Constitucional cujas atividades tenham sido exercidas com efetiva exposição a agentes químicos, físicos e biológicos prejudiciais à saúde, ou associação desses agentes, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação, desde que cumpridos, no caso do servidor, o tempo mínimo de 20 (vinte) anos de efetivo exercício no serviço público e de 5 (cinco) anos no cargo efetivo em que for concedida a aposentadoria, na forma dos arts. 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, poderão aposentar-se quando o total da soma resultante da sua idade e do tempo de contribuição e o tempo de efetiva exposição forem, respectivamente, de:
I - 66 (sessenta e seis) pontos e 15 (quinze) anos de efetiva exposição;
II - 76 (setenta e seis) pontos e 20 (vinte) anos de efetiva exposição; e
III - 86 (oitenta e seis) pontos e 25 (vinte e cinco) anos de efetiva exposição.
Por fim, dentre as alterações promovidas pela EC n.º 103/2019, merece destaque a vedação da conversão em comum de tempo de serviço especial realizado após a sua entrada em vigor (art. 25, §2º).
Por fim, importante consignar que se encontra pendente de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal a ADI 6309, de relatoria do Min. Roberto Barroso, cujo objeto versa sobre a declaração de inconstitucionalidade das seguintes mudanças promovidas pela EC nº 103/2019: i) fixação de idade mínima para a aposentadoria especial; ii) forma de cálculo de cálculo da aposentadoria especial; iii) impossibilidade de conversão de tempo de trabalho especial em comum.
Da atividade especial.
No que se refere à atividade especial, a jurisprudência pacificou-se no sentido de que a legislação aplicável para sua caracterização é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, no caso em tela, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelo Decreto nº 2.172/97, sendo irrelevante que o segurado não tenha completado o tempo mínimo de contribuição para se aposentar à época em que foi editada a Lei nº 9.032/95, como a seguir se verifica.
O art. 58 da Lei nº 8.213/91 dispunha, em sua redação original que “(...) A relação de atividades profissionais prejudiciais à saúde ou à integridade física será objeto de lei específica (...)”. Com a edição da Medida Provisória nº 1.523/96, tal dispositivo legal teve sua redação alterada, com a inclusão dos parágrafos 1º, 2º, 3º e 4º, na forma que segue:
“Art. 58. A relação dos agentes nocivos químicos, físicos e biológicos ou associação de agentes prejudiciais à saúde ou à integridade física considerados para fins de concessão da aposentadoria especial de que trata o artigo anterior será definida pelo Poder Executivo.
§ 1º a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais do trabalho expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.
§ 2º Deverão constar do laudo técnico referido no parágrafo anterior informação sobre a existência de tecnologia de proteção coletiva que diminua a intensidade do agente agressivo a limites de tolerância e recomendação sobre a sua adoção pelo estabelecimento respectivo.
§ 3º A empresa que não mantiver laudo técnico atualizado com referência aos agentes nocivos existentes no ambiente de trabalho de seus trabalhadores ou que emitir documento de comprovação de efetiva exposição em desacordo com o respectivo laudo estará sujeita à penalidade prevista no art. 133 desta Lei.
§ 4º A empresa deverá elaborar e manter atualizado perfil profissiográfico abrangendo as atividades desenvolvidas pelo trabalhador, e fornecer a este, quando da rescisão do contrato de trabalho, cópia autêntica deste documento (...)”.
Verifica-se, pois, que tanto na redação original do art. 58 da Lei nº 8.213/91 como na estabelecida pela Medida Provisória nº 1.523/96 (reeditada até a MP nº 1.523-13 de 23.10.97 - republicado na MP nº 1.596-14, de 10.11.97 e convertida na Lei nº 9.528, de 10.12.97), não foram relacionados os agentes prejudiciais à saúde, sendo que tal relação foi definida apenas com a edição do Decreto nº 2.172, de 05.03.1997 (art. 66 e Anexo IV). Ocorre que, em se tratando de matéria reservada à lei, tal disposição somente teve eficácia a partir da edição da Lei nº 9.528, de 10.12.1997, razão pela qual a apresentação de laudo técnico só pode ser exigida a partir dessa ultima data. Nesse sentido é o entendimento majoritário do E. STJ:
“PREVIDENCIÁRIO - RECURSO ESPECIAL - APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO - CONVERSÃO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL EM COMUM - POSSIBILIDADE - LEI 8.213/91 - LEI 9.032/95 - LAUDO PERICIAL INEXIGÍVEL - LEI 9.528/97.
(...)
- A Lei nº 9.032/95 que deu nova redação ao art. 57 da Lei 8.213/91 acrescentando seu § 5º, permitiu a conversão do tempo de serviço especial em comum para efeito de aposentadoria especial. Em se tratando de atividade que expõe o obreiro a agentes agressivos, o tempo de serviço trabalhado pode ser convertido em tempo especial, para fins previdenciários.
- A necessidade de comprovação da atividade insalubre através de laudo pericial, foi exigida após o advento da Lei 9.528, de 10.12.97, que convalidando os atos praticados com base na Medida Provisória nº 1.523, de 11.10.96, alterou o § 1º, do art. 58, da Lei 8.213/91, passando a exigir a comprovação da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, mediante formulário, na forma estabelecida pelo INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico das condições ambientais do trabalho, expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho. Tendo a mencionada lei caráter restritivo ao exercício do direito, não pode ser aplicada à situações pretéritas, portanto no caso em exame, como a atividade especial foi exercida anteriormente, ou seja, de 17.11.75 a 19.11.82, não está sujeita à restrição legal.
- Precedentes desta Corte.
- Recurso conhecido, mas desprovido” (STJ; Resp 436661/SC; 5ª Turma; Rel. Min. Jorge Scartezzini; julg. 28.04.2004; DJ 02.08.2004, pág. 482).
Assim, em tese, pode ser considerada especial a atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030 (exceto para o agente nocivo ruído, por depender de prova técnica).
Ressalto que os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
Saliento que não se encontra vedada a conversão de tempo especial em comum, exercida em período posterior a 28.05.1998, uma vez que ao ser editada a Lei nº 9.711/98, não foi mantida a redação do art. 28 da Medida Provisória nº 1.663-10, de 28.05.98, que revogava expressamente o parágrafo 5º, do art. 57, da Lei nº 8.213/91, devendo, portanto, prevalecer este último dispositivo legal, nos termos do art. 62 da Constituição da República.
Quanto ao agente nocivo ruído, o Decreto nº 2.172, de 05.03.1997, passou a considerar o nível de ruídos superior a 90 decibéis como prejudicial à saúde. Por tais razões, até ser editado o referido decreto, considerava-se a exposição a ruído superior a 80 decibéis como agente nocivo à saúde. Com o advento do Decreto nº 4.882, de 18.11.2003, houve nova redução do nível máximo de ruídos tolerável, uma vez que por tal decreto esse nível passou a ser de 85 decibéis (art. 2º, que deu nova redação aos itens 2.01, 3.01 e 4.00 do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048/99).
Tendo em vista o dissenso jurisprudencial sobre a possibilidade de se aplicar retroativamente o disposto no Decreto nº 4.882/2003, para se considerar prejudicial, desde 05.03.1997, a exposição a ruídos de 85 decibéis, a questão foi levada ao C. Superior Tribunal de Justiça que, no julgamento do Recurso Especial 1398260/PR, em 14.05.2014, submetido ao rito do art.543-C do Código de Processo Civil (Recurso Especial Repetitivo), fixou entendimento pela impossibilidade de se aplicar de forma retroativa o Decreto nº 4.882/2003, que reduziu o patamar de ruído para 85 decibéis, na forma que segue:
“ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. DESAFETAÇÃO DO PRESENTE CASO. PREVIDENCIÁRIO. REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. TEMPO ESPECIAL. RUÍDO. LIMITE DE 90DB NO PERÍODO DE 6.3.1997 A 18.11.2003. DECRETO 4.882/2003. LIMITE DE 85 DB. RETROAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APLICAÇÃO DA LEI VIGENTE À ÉPOCA DA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO.
1. Considerando que o Recurso especial 1.398.260/PR apresenta fundamentos suficientes para figurar como representativo da presente controvérsia, este recurso deixa de se submeter ao rito do art.543-C do CPC e da Resolução STJ 8/2008.
2. Está pacificado no STJ o entendimento de que a lei que rege o tempo de serviço é aquela vigente no momento da prestação do labor. Nessa mesma linha: REsp 1.151.363/MG, Rel. Ministro Jorge Mussi, Terceira Seção, DJe 5.4.2011; REsp 1.310.034/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe 19.12.2012, ambos julgados sob o regime do art. 543-C do CPC.
3. O limite de tolerância para configuração da especial idade do tempo de serviço para o agente ruído deve ser de 90 dB no período de 6.3.1997 a 18.11.2003, conforme Anexo IV do Decreto 2.172/1997 e Anexo IV do Decreto 3.048/1999, não sendo possível aplicação retroativa do Decreto 4.882/2003, que reduziu o patamar para 85 dB, sob pena de ofensa ao art. 6º da LINDB (ex-LICC). Precedentes do STJ.
4. Na hipótese dos autos, a redução do tempo de serviço especial implica indeferimento do pedido de aposentadoria especial por falta de tempo de serviço.
5. Recurso especial provido” (REsp 1401619/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2014, DJe 05/12/2014).
Dessa forma, deve-se considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a nível de ruído superior a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, superior a 90 decibéis e, a partir de então, superior a 85 decibéis.
De outra parte, o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP, instituído pelo art. 58, §4º, da Lei nº 8.213/91, (incluído pela Lei n. 9.528/97), é documento que retrata as características do trabalho do segurado, e traz a identificação do engenheiro ou perito responsável pela avaliação das condições de trabalho, sendo apto para comprovar o exercício de atividades em condições especiais, fazendo às vezes do laudo técnico.
E não afasta a validade de suas conclusões o fato de ter sido o PPP ou laudo elaborado posteriormente à prestação do serviço, vez que tal requisito não está previsto em lei, mormente porque a responsabilidade por sua expedição é do empregador, não podendo o empregado arcar com o ônus de eventual desídia daquele e, ademais, a evolução tecnológica tende a propiciar condições ambientais menos agressivas à saúde do obreiro do que aquelas vivenciadas à época da execução dos serviços.
No julgamento do Recurso Extraordinário em Agravo (ARE) 664335, em 04.12.2014, com repercussão geral reconhecida, o E. STF fixou duas teses para a hipótese de reconhecimento de atividade especial com uso de Equipamento de Proteção Individual, sendo que a primeira refere-se à regra geral que deverá nortear a análise de atividade especial, e a segunda refere-se ao caso concreto em discussão no recurso extraordinário em que o segurado esteve exposto a ruído, que podem ser assim sintetizadas: i) tese 1 - regra geral: o direito à aposentadoria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria especial; e ii) tese 2 - agente nocivo ruído: na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria especial, tendo em vista que no cenário atual não existe equipamento individual capaz de neutralizar os malefícios do ruído, pois que atinge não só a parte auditiva, mas também óssea e outros órgãos.
NO CASO DOS AUTOS, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via administrativa totalizam 25 (vinte e cinco) anos, 10 (dez) meses e 23 (vinte e três) dias (ID 295797004 – fl. 73), não tendo sido reconhecido como de natureza especial o período pleiteado (ID 295797004 – fls. 69/71, 86/91 e 93/109). Portanto, a controvérsia colocada nos autos engloba apenas o reconhecimento da natureza especial das atividades exercidas nos períodos de 01.10.1997 a 09.12.2019.
Ocorre que, no período de 19.11.2003 a 09.12.2019, a parte autora, nas funções de comissária de voo, esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente admitidos (ID 295797162 e 295797173), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas nesses períodos, conforme código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03.
Outrossim, no período de 01.10.1997 a 09.12.2019, a parte autora, na atividade de comissária de voo (ID 295797186 – fls. 09/13), esteve exposta a pressões atmosféricas anormais, conforme laudos periciais produzidos em outros processos relativos à mesma atividade (ID 295797011, 295797012, 295797013, 295797015, 295797016, 295797017), de acordo com o anexo 6 da NR – 15 do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE.
Em que pese a conclusão do sr. perito judicial, de que "não há pressão anormal em condição de enquadramento, conforme preconiza a legislação Trabalhista", cabe frisar que o julgador não está adstrito apenas à prova técnica para formar a sua convicção, podendo utilizar outros elementos constantes dos autos, especialmente quando coerentes entre si.
No que tange ao pedido de redução do tempo de exposição a agentes nocivos, de 25 (vinte e cinco) anos para 20 (vinte) anos, em julgados semelhantes, reconheci que a submissão à pressão atmosférica anormal não se traduz na contagem diferenciada de 20 (vinte) anos de tempo especial uma vez que as atividades exercidas por aeronautas não são equiparáveis àquelas em que se exige aludido lapso temporal. Neste sentido:
“PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. NATUREZA ESPECIAL DA ATIVIDADE LABORADA RECONHECIDA. COMISSÁRIA DE VOO. PRESSÃO ATMOSFÉRICA ANORMAL. PROVA EMPRESTADA. ADMISSIBILIDADE. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADOS.
1. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 64 do Decreto nº 3.048.99). E a aposentadoria por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 20.98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos, necessária, ainda, a comprovação da carência e da qualidade de segurado.
2. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831.64 e nº 83.080.79, até 05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172.97 e nº 3.049.99.
3. Os Decretos nº 53.831.64 e nº 83.080.79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
4. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica.
5. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
6. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes físicos agressores à saúde.
7. No caso dos autos, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via administrativa totalizam 25 (vinte e cinco) anos, 03 (três) meses e 09 (nove) dias (ID 146881855 – págs. 01.02), não tendo sido reconhecido qualquer período como de natureza especial. Portanto, a controvérsia colocada nos autos engloba o reconhecimento da natureza especial de todo o período pleiteado. Ocorre que, no período de 15.10.1997 a 07.12.2017, a parte autora, na atividade de comissária de voo, esteve exposta a pressão atmosférica anormal, em condições semelhantes as existentes no interior de câmaras hiperbáricas (ID 156881858, ID 15681859 e ID 156881860), devendo ser reconhecida a natureza especial da atividade exercida nesse período, conforme código 2.0.5 do Decreto nº 2.172.97 e código 2.0.5 do Decreto nº 3.048.99. Finalizando, os períodos de 13.08.1990 a 29.03.1991, 19.04.1991 a 15.08.1992, 01.10.1992 a 13.10.1992, 14.10.1992 a 17.06.1994 e 03.08.1994 a 14.03.1997 devem ser reconhecidos como tempo de contribuição comum, ante a ausência de comprovação de exposição a quaisquer agentes físicos, químicos ou biológicos.
8. Quanto à prova emprestada, observo que se trata de casos em que os terceiros realizavam a mesma atividade, nas mesmas condições da autora, sendo a perícia efetuada por profissional equidistante das partes, em empresas do mesmo ramo. Ainda, houve o contraditório, possibilitando ampla defesa à Autarquia. Ademais, com a nova redação do artigo 372 do CPC, que prescreve: “O juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório”, entendo cabível a utilização da prova emprestada nas condições acima descritas. É neste sentido o entendimento da Turma. Precedentes.
9. Com relação ao pedido de reconhecimento da atividade como especial, em razão da exposição ao agente nocivo "pressão atmosférica", nos termos do código 1.1.6, do Decreto n. 83.080.79, que prevê o tempo mínimo de exposição de 20 anos, observo que tal pleito não constou da petição inicial, tampouco do recurso de apelação, conforme salientado pelo próprio advogado em sua sustentação oral. Todavia, por estar inserido no pedido de reconhecimento da especialidade da atividade, entendo não estar configurada a inovação recursal. Contudo, incabível o enquadramento da atividade no código 1.1.6, do Decreto n. 83.080.79, uma vez que a descrição das atividades ali inseridas (“Trabalhos em caixões ou câmaras pneumáticas subaquáticas e em tubulões pneumáticos. Operação com uso de escafandro. Operações de mergulho. Trabalho sob ar comprimido em túneis pressurizados”), diferem das executadas pela parte autora. Ademais, ao fazer referência à atividade de aeronauta, o Decreto n. 83.080.79 o fez de forma expressa, no código 2.4.3, com tempo mínimo de exposição de 25 anos. (grifou-se).
10. Sendo assim, somados todos os períodos especiais, totaliza a parte autora 20 (vinte) anos, (01) mês e 23 (vinte e três) dias de tempo especial na data da entrada do requerimento administrativo (D.E.R. 07.12.2017), insuficientes para a concessão de aposentadoria especial. Observo que, ainda que se reafirmasse a D.E.R., a parte autora não atingiria o tempo necessário para a concessão do benefício. Entretanto, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 30 (trinta) anos, 05 (cinco) meses e 17 (dezessete) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 07.12.2017).
11. O benefício é devido a partir da data do requerimento administrativo (D.E.R. 07.12.2017).
12. A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 267.2013, do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO.RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante nº 17.
13. Com relação aos honorários advocatícios, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
14. Reconhecido o direito da parte autora à aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 07.12.2017), observada eventual prescrição quinquenal, ante a comprovação de todos os requisitos legais. 15. Apelação parcialmente provida. Fixados, de ofício, os consectários legais.” (TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004466-52.2018.4.03.6126, Rel. Desembargador Federal NELSON DE FREITAS PORFIRIO JUNIOR, julgado em 14.12.2021, Intimação via sistema DATA: 17.12.2021).
Dessa forma, incabível o enquadramento da atividade de aeronauta pela exposição ao agente nocivo “pressão atmosférica”, previsto no código 1.1.6, do Decreto n. 83.080/79, uma vez que a descrição das atividades ali inseridas, tais como “trabalhos em caixões ou câmaras pneumáticas subaquáticas e em tubulões pneumáticos. Operação com uso de escafandro. Operações de mergulho. Trabalho sob ar comprimido em túneis pressurizados”, diferem das executadas pela parte autora.
Ademais, as normas que regem a matéria não sofreram alteração ao longo do tempo, pois tanto o Decreto n. 53.831/94, no código 2.4.1 (“transporte aéreo), quanto o citado código 2.4.3, do Decreto n. 83.080/79, previram o tempo mínimo de exposição de 25 anos. Havendo previsão expressa para o enquadramento da atividade “transporte aéreo – aeronauta”, descabe a aplicação, por equiparação, do código 1.1.6 do Decreto n. 83.080/79 (“pressão atmosférica”, com exposição mínima de 20 anos), ao aeronauta.
A partir da edição do Decreto n. 2.172/97, entendo possível a aplicação, por analogia, do agente nocivo "pressão atmosférica anormal", para os aeronautas, ante a inexistência de norma específica para a profissão. Saliente-se, por oportuno, que tanto no Decreto n. 2.172/97, quanto no Decreto n. 3.048/99, normas aplicáveis ao lapso temporal pretendido pela parte autora (01.10.1997 a 09.12.2019), o tempo mínimo de exposição à "pressão atmosférica anormal" exigido é de 25 anos (códigos 2.0.5).
Quanto à prova emprestada, observo que se trata de caso em que terceiro laborava nas mesmas atividades, setor e condições do autor, sendo a perícia realizada por profissional equidistante das partes.
Ademais, com a nova redação do artigo 372 do CPC, que prescreve: “o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório”, entendo cabível a utilização da prova emprestada nas condições acima descritas. É neste sentido o entendimento desta Turma, conforme julgado abaixo transcrito:
“PREVIDENCIÁRIO. PROCESSO CIVIL. AGRAVO INTERNO. IMPUGNAÇÃO A DECISÃO MONOCRÁTICA. PRELIMINAR REJEITADA. ATIVIDADE ESPECIAL. LAUDO PERICIAL EM NOME DE TERCEIRO. EMPRESA DO MESMO RAMO POSSIBILIDADE.
(...)
III - A decisão agravada esclareceu que foram trazidos aos autos para a comprovação da especialidade laborativa dos períodos controversos os seguintes documentos em relação às respectivas empresas: Varig S.A Viação Aérea Rio-Grandense - em Recuperação Judicial, CTPS e PPP (sem constar assinatura do profissional legalmente habilitado), equivalente a formulário, que retrata o exercício da função de comissário de bordo, no interregno de 15.05.1986 a 02.08.2006, constando na descrição da atividade do referido PPP que a autora no exercício de Jurisprudência.TRF3 - Acórdãos suas atividades profissionais, estava ela sujeita a variação de pressão e temperatura.
IV - Em complemento, foram apresentados diversos Laudos Técnicos produzidos para fins de instrução de ações previdenciárias propostas por outros segurados e P.P.R.A, em que os Peritos Judiciais concluíram que os comissários de bordo, laborando no interior de aeronaves das empresas Gol Linhas Aéreas S.A e Varig Linhas Aéreas S.A, sujeitam-se a pressões atmosféricas anormais, cuja condição é equiparável àquelas que se dão no interior de caixões ou câmaras hiperbáricas, ou seja, em pressões superiores à atmosférica.
V - O decisum fundamentou ainda que as aferições vertidas nos laudos periciais devem prevalecer, pois foi levada em consideração a experiência técnica dos auxiliares judiciários, bem como realizada em empresa do mesmo ramo em que a autora exerceu suas atividades e funções, tendo sido emitidos por peritos judiciais, equidistante das partes, não tendo a autarquia previdenciária arguido qualquer vício a elidir suas conclusões.
VI - Mantida a decisão agravada que concluiu pelo exercício da atividade especial do intervalo de 29.04.1995 a 02.08.2006 (Viação Aérea Rio-Grandense), dada a sujeição à pressão atmosférica anormal, nos termos do código 2.0.5 do Decreto nº 3.048.1999, conforme se verificou dos mencionados laudos de terceiros elaborados por peritos judiciais, trazidos aos autos, os quais foram levados em consideração.
VII - Preliminar rejeitada. Agravo interno (art. 1.021, CPC.2015) interposto pelo INSS improvido”. (Processo ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL . SP 5007210-77.2017.4.03.6183 Relator(a) Desembargador Federal SERGIO DO NASCIMENTO Órgão Julgador 10ª Turma Data do Julgamento 30.06.2020 Data da Publicação.Fonte e - DJF3 Judicial 1 DATA: 02.07.2020) (grifo nosso).
Sendo assim, somados todos os períodos especiais, totaliza a parte autora 22 (vinte e dois) anos, 02 (dois) meses e 09 (nove) dias de tempo especial, insuficientes para concessão da aposentadoria especial.
Entretanto, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 30 (trinta) anos, 02 (dois) meses e 29 (vinte e nove) dias de tempo de contribuição até o início da vigência da EC 103/2019 (13.11.2019), observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
Restaram cumpridos pela parte autora, ainda, os requisitos da qualidade de segurado (art. 15 e seguintes da Lei nº 8.213/91) e a carência para a concessão do benefício almejado (art. 24 e seguintes da Lei nº 8.213/91).
Destarte, a parte autora faz jus à aposentadoria por tempo de contribuição, com valor calculado na forma prevista no art. 29, I, da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.876/99.
Na eventualidade do tempo de contribuição ora reconhecido possibilitar a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição segundo as regras da EC nº 20/98, deverá o INSS implantar a melhor hipótese financeira.
A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
A questão relativa ao termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS (se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária), encontra-se em discussão no E. Superior Tribunal de Justiça, no regime de julgamento de recursos repetitivos (Tema n. 1.124), nos termos do art. 1.036 do CPC.
Todavia, verifico que a tese não se aplica à hipótese dos autos, considerando que os documentos referidos no voto, que embasaram o reconhecimento dos períodos especiais pleiteados pela parte autora, já integravam os autos do respectivo processo administrativo da parte autora, sendo de conhecimento do próprio INSS já à época do requerimento do benefício previdenciário, não se tratando, pois, de hipótese de inovação da prova, de tal sorte a manter a fixação da DIB e seus respectivos efeitos financeiros na data da DER. Nesse sentido, já decidiu a 10ª Turma deste Egrégio Tribunal:
"PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO CÍVEL. DECADÊNCIA. INOCORRÊNCIA. TERMO INICIAL DOS EFEITOS FINANCEIROS NA DATA DO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO. - O benefício em comento, foi concedido em definitivo em 10/01/2008, de modo que o prazo decenal para revisão do ato concessório (renda mensal inicial) iniciou-se a partir do primeiro dia do mês seguinte ao primeiro pagamento, ou seja, em 01/02/2008, conforme decidido pelo C. STF, em sede de recursos repetitivos, por ocasião do julgamento do RE 626.489-SE, encerrando-se em 01/02/2018. - No entanto, embora a ação tenha sido ajuizada em 10/10/2018, observa-se que a parte autora requereu a revisão do seu benefício em sede administrativa, para que fosse convertido em aposentadoria especial, conforme demonstra o protocolo n. 35413.010033/2016-66, em 07/06/2016, que foi indeferido em 12/03/2018 (IDs 73401026 e 73401027). - Uma vez deduzido o pedido de revisão na seara administrativa, antes de decorrido o decênio, afasta-se a fluição do prazo decadencial, porquanto o segurado foi diligente ao formular o pleito de reexame da renda mensal de seu benefício, não podendo vir a ser prejudicado pela eventual demora no processamento, que desafia a efetividade dos princípios da eficiência e celeridade administrativas. - No que toca ao termo inicial dos efeitos financeiros do benefício foram afetados pelo C. Superior Tribunal de Justiça os Recursos Especiais 1.905.830/SP, 1.912.784/SP e 1.913.152/SP, em 17/12/2021, para "definir o termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS: se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária" (Tema 1124). - A incongruência apontada pelo apelante refere-se aos efeitos financeiros da revisão do benefício, tecnicamente, à definição da data do início do pagamento (DIP), cujo marco inicial pretende seja fixado na data da citação ou da apresentação do documento comprobatório do labor especial. - A controvérsia é questão intrínseca ao cálculo das prestações vencidas, assunto afeito à fase de liquidação do julgado, porquanto o questionamento remete à discussão sobre demarcação do marco inicial dos efeitos financeiros do benefício previdenciário. - Mister registrar que, no caso concreto, não deve ser observada a tese a ser definida no julgamento do Tema 1124/STJ, devendo ser mantido o termo inicial do benefício e dos efeitos financeiros na data do requerimento administrativo, tendo em vista que a especialidade do trabalho nos períodos vindicados ficou caracterizada por intermédio dos documentos constantes à ocasião do requerimento administrativo, que foram submetidos à análise da Administração. - Decorridos mais de cinco anos da concessão do benefício, deve ser observada a prescrição quinquenal. - A correção monetária e os juros de mora incidirão conforme a legislação de regência, observando-se os critérios preconizados pelo Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, que refere a aplicação da EC n. 113/2001, observados o Tema 96/STF e a Súmula Vinculante 17/STF. - Em razão da sucumbência recursal, majorados os honorários advocatícios fixados na r. sentença em 2% (dois pontos percentuais), observadas as normas do artigo 85, §§ 3º, 5º e 11, do CPC. - Negado provimento à apelação do INSS." (ApCiv 5789083-85.2019.4.03.9999, Desembargadora Federal LEILA PAIVA MORRISON, TRF3 - 10ª Turma, DJEN DATA: 30/06/2023) grifos nossos.
Com relação aos honorários advocatícios, a serem suportados pelo INSS, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
No que diz respeito à aplicação da Súmula 111/STJ, o E. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1883715/SP, submetido à sistemática de recurso repetitivo, atinente ao Tema 1.105, fixou a seguinte tese: "Continua eficaz e aplicável o conteúdo da Súmula 111/STJ (com a redação modificada em 2006), mesmo após a vigência do CPC/2015, no que tange à fixação de honorários advocatícios".
Por ocasião do julgamento, inclusive dos embargos de declaração opostos, destacou-se que as parcelas que haverão de integrar a base de cálculo dos honorários sucumbenciais, nas lides previdenciárias, são aquelas devidas até o momento do pronunciamento favorável à concessão do benefício, tanto em primeira quanto em segunda instância, ou ainda no âmbito dos recursos especial ou extraordinário.
Não prospera a alegação da parte autora de que a ausência de um comportamento protelatório do patrono é motivo para o afastamento da Súmula 111/STJ, "por evidente distinguishing com a ratio decidendi do REsp 1.883.715/SP, o qual serviu de leading case para o julgamento do tema 1105/STJ", pois o critério definido para sua aplicação é objetivo, não tendo sido indicada qualquer ressalva pelo C. STJ. Nesse sentido: TRF 3ª Região, 10ª Turma, ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5004588-83.2021.4.03.6183, Rel. Desembargador Federal LEILA PAIVA MORRISON, julgado em 08/05/2024, DJEN DATA: 10/05/2024.
Embora o INSS seja isento do pagamento de custas processuais, deverá reembolsar as despesas judiciais feitas pela parte vencedora e que estejam devidamente comprovadas nos autos (Lei nº 9.289/96, artigo 4º, inciso I e parágrafo único).
Caso a parte autora já esteja recebendo benefício previdenciário concedido administrativamente, deverá optar, à época da liquidação de sentença, pelo benefício que entenda ser mais vantajoso. Se a opção recair no benefício judicial, deverão ser compensadas as parcelas já recebidas em sede administrativa, face à vedação da cumulação de benefícios.
As verbas acessórias e as prestações em atraso também deverão ser calculadas na forma acima estabelecida, em fase de liquidação de sentença.
Diante do exposto, rejeito a matéria preliminar, nego provimento à apelação do INSS, dou parcial provimento à apelação da parte autora para, fixando, de ofício, os consectários legais, determinar a concessão do benefício de aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 09.12.2019), condenando o INSS a suportar as verbas da sucumbência, tudo na forma acima explicitada.
É como voto.
E M E N T A
PREVIDENCIÁRIO. REMESSA NECESSÁRIA. PROVEITO ECONÔMICO INFERIOR A 1.000 (MIL) SALÁRIOS-MÍNIMOS. PERÍCIA. ALEGAÇÃO DE NULIDADE AFASTADA. APOSENTADORIA ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. NATUREZA ESPECIAL DAS ATIVIDADES LABORADAS RECONHECIDA. EXPOSIÇÃO A RUÍDOS ACIMA DOS LIMITES LEGALMENTE ADMITIDOS. PRESSÃO ATMOSFÉRICA ANORMAL. AGENTE FÍSICO. POSSIBILIDADE DE CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM MEDIANTE APLICAÇÃO DO FATOR PREVISTO NA LEGISLAÇÃO. TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO, CARÊNCIA E QUALIDADE DE SEGURADO COMPROVADOS.
1. Anota-se que a sentença foi proferida já na vigência do novo Código de Processo Civil - Lei 13.105/2015 -, razão pela qual se deve observar o disposto no art. 496, §3º, I. No caso dos autos, não obstante a sentença ser ilíquida, é certo que o proveito econômico obtido pela parte autora não superará o valor de 1.000 (mil) salários-mínimos, ainda que se considere o valor máximo dos benefícios do RGPS, tendo em vista que a sentença foi prolatada em 29.04.2024 e a data de início do benefício é 09.12.2019. Neste sentido observa-se que a 1ª Turma do C. STJ, ao apreciar o REsp 1.735.097/RS, em decisão proferida em 08.10.2019, entendeu que, não obstante a iliquidez das condenações em causas de natureza previdenciária, a sentença que defere benefício previdenciário é espécie absolutamente mensurável, visto que pode ser aferível por simples cálculos aritméticos. Assim, na vigência do Código de Processo Civil/2015, em regra, a condenação em ações previdenciárias não alcança o valor de mil salários-mínimos, observada a prescrição quinquenal, com os acréscimos de juros, correção monetária e demais despesas de sucumbência, restando afastado o duplo grau necessário.
2. Afastada a preliminar de nulidade da perícia realizada. Cabe destacar que a prova produzida foi suficientemente elucidativa, não merecendo qualquer complementação ou reparos a fim de reabrir questionamentos, os quais foram oportunizados e realizados em consonância com os princípios do contraditório e da ampla defesa.
3. Da mesma forma, afastada a alegação de competência da Justiça do Trabalho para discussão quanto às condições de desempenho das atividades, pois, no presente feito, a relação jurídica possui caráter essencialmente previdenciário, qual seja, a existência de condições especiais de trabalho a justificar a concessão de aposentadoria especial ou a contagem do tempo com o fator de conversão correspondente. Embora exista nítida intersecção entre as esferas previdenciárias e laboral, isto não basta para a consolidação da competência da Justiça Trabalhista. Note-se que o INSS atua no feito como ente responsável pelo cumprimento da obrigação previdenciária e não como empregador, o que afasta a regra excepcional constante na parte final do inciso I, do art. 109 da Constituição da República. Em relação à competência da Justiça do Trabalho para retificação do Perfil Profissiográfico Previdenciário – PPP, ressalto não se tratar da matéria analisada no presente processo. A realização de prova técnica, a fim de constatar a especialidade do trabalho, para efeitos previdenciários, não implica a alteração das informações do PPP.
4. A aposentadoria especial é devida ao segurado que tenha trabalhado durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme o caso, sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física (art. 64 do Decreto nº 3.048/99). E a aposentadoria por tempo de contribuição, conforme art. 201, § 7º, da constituição Federal, com a redação dada pela EC nº 20/98, é assegurada após 35 (trinta e cinco) anos de contribuição, se homem, e 30 (trinta) anos de contribuição, se mulher. Nos dois casos, necessária, ainda, a comprovação da carência e da qualidade de segurado. A Emenda Constitucional n.º 103/2019, publicada em 13.11.2019, entre outras alterações em diversos dispositivos constitucionais, deu nova redação ao inciso I do art. 201 da CF/88, passando a exigir para a obtenção de aposentadoria urbana no RGPS, a idade mínima de 65 anos de idade (homem) e 62 anos de idade (mulher), observado tempo mínimo de contribuição (o § 1º do referido art. 201 estabelece a previsão de critérios diferenciados de idade e tempo de contribuição para as pessoas com deficiência e para os que exercem atividades tidas por especiais, vedada a caracterização por categoria profissional ou ocupação). Aos segurados filiados ao RGPS até a publicação da EC 103 (13.11.2019), foram estabelecidas algumas regras de transição pelos art. 15, 16, 17, 18 e 20 da referida EC 103/2019, que devem ser avaliadas caso a caso, uma vez que é a situação específica de cada segurado o fator determinante para escolha da regra de transição mais favorável. Ainda, conforme disposto no art. 3º, caput, e § 2º da referida emenda, foram preservados os direitos adquiridos dos segurados e dependentes do RGPS, que, até a data de entrada em vigor da alteração constitucional (13.11.2019), demonstrem o preenchimento dos requisitos legalmente exigidos para a concessão da aposentadoria ou pensão por morte, ainda que requeridas posteriormente. Com relação à aposentadoria especial, a Emenda Constitucional n. 103/2019 alterou profundamente os critérios para sua concessão, reintroduzindo o requisito etário como exigência e modificando a forma de cálculo do benefício. Por fim, importante consignar que se encontra pendente de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal a ADI 6309, de relatoria do Min. Roberto Barroso, cujo objeto versa sobre a declaração de inconstitucionalidade das seguintes mudanças promovidas pela EC nº 103/2019: i) fixação de idade mínima para a aposentadoria especial; ii) forma de cálculo de cálculo da aposentadoria especial; iii) impossibilidade de conversão de tempo de trabalho especial em comum.
5. A legislação aplicável para caracterização da natureza especial é a vigente no período em que a atividade a ser avaliada foi efetivamente exercida, devendo, portanto, ser levada em consideração a disciplina estabelecida pelos Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79, até 05.03.1997 e, após, pelos Decretos nº 2.172/97 e nº 3.049/99.
6. Os Decretos nº 53.831/64 e nº 83.080/79 vigeram de forma simultânea, não havendo revogação daquela legislação por esta, de forma que, verificando-se divergência entre as duas normas, deverá prevalecer aquela mais favorável ao segurado.
7. A atividade desenvolvida até 10.12.1997, mesmo sem a apresentação de laudo técnico, pode ser considerada especial, pois, em razão da legislação de regência a ser considerada até então, era suficiente para a caracterização da denominada atividade especial a apresentação dos informativos SB-40 e DSS-8030, exceto para o agente nocivo ruído por depender de prova técnica.
8. É de considerar prejudicial até 05.03.1997 a exposição a ruídos superiores a 80 decibéis, de 06.03.1997 a 18.11.2003, a exposição a ruídos de 90 decibéis e, a partir de então, a exposição a ruídos de 85 decibéis.
9. Efetivo exercício de atividades especiais comprovado por meio de formulários de insalubridade e laudos técnicos que atestam a exposição a agentes físicos agressores à saúde, em níveis superiores aos permitidos em lei.
10. No caso dos autos, os períodos incontroversos em virtude de acolhimento na via administrativa totalizam 25 (vinte e cinco) anos, 10 (dez) meses e 23 (vinte e três) dias (ID 295797004 – fl. 73), não tendo sido reconhecido como de natureza especial o período pleiteado (ID 295797004 – fls. 69/71, 86/91 e 93/109). Ocorre que, no período de 19.11.2003 a 09.12.2019, a parte autora, nas atividades de comissária de voo, esteve exposta a ruídos acima dos limites legalmente admitidos (ID 295797162 e 295797173), devendo ser reconhecida a natureza especial das atividades exercidas nesses períodos, conforme código 2.0.1 do Decreto nº 3.048/99, neste ponto observado, ainda, o Decreto nº 4.882/03. Outrossim, no período de 01.10.1997 a 09.12.2019, a parte autora, na atividade de comissária de voo (ID 295797186 – fls. 09/13), esteve exposta a pressões atmosféricas anormais, conforme laudos periciais produzidos em outros processos relativos a mesma atividade (ID 295797011, 295797012, 295797013, 295797015, 295797016, 295797017), de acordo com o anexo 6 da NR – 15 do Ministério do Trabalho e Emprego – MTE.
11. No que tange ao pedido de redução do tempo de exposição a agentes nocivos, de 25 (vinte e cinco) anos para 20 (vinte) anos, em julgados semelhantes por esta Décima Turma, foi reconhecida que a submissão à pressão atmosférica anormal não se traduz na contagem diferenciada de 20 (vinte) anos de tempo especial, uma vez que as atividades exercidas por aeronautas não são equiparáveis àquelas em que se exige aludido lapso temporal.
12. Em que pese a conclusão do sr. perito judicial, cabe frisar que o julgador não está adstrito apenas à prova técnica para formar a sua convicção, podendo utilizar outros elementos constantes dos autos, especialmente quando coerentes entre si.
13. Quanto à prova emprestada, observo que se trata de caso em que terceiro laborava nas mesmas atividades, setor e condições do autor, sendo a perícia realizada por profissional equidistante das partes. Ademais, com a nova redação do artigo 372 do CPC, que prescreve: “o juiz poderá admitir a utilização de prova produzida em outro processo, atribuindo-lhe o valor que considerar adequado, observado o contraditório”, entendo cabível a utilização da prova emprestada nas condições acima descritas.
14. Somados todos os períodos especiais, totaliza a parte autora 22 (vinte e dois) anos, 02 (dois) meses e 09 (nove) dias de tempo especial, insuficientes para concessão da aposentadoria especial. Entretanto, somados todos os períodos comuns e especiais, estes devidamente convertidos, totaliza a parte autora 30 (trinta) anos, 02 (dois) meses e 29 (vinte e nove) dias de tempo de contribuição até a data do requerimento administrativo (D.E.R. 09.12.2019), observado o conjunto probatório produzido nos autos e os fundamentos jurídicos explicitados na presente decisão.
15. O benefício é devido a partir da data do requerimento administrativo (D.E.R.) ou, na sua ausência, a partir da citação.
16. A correção monetária deverá incidir sobre as prestações em atraso desde as respectivas competências e os juros de mora desde a citação, observada eventual prescrição quinquenal, nos termos do Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, aprovado pela Resolução nº 784/2022 (que já contempla a aplicação da Selic, nos termos do artigo 3º da Emenda Constitucional nº 113/2021), do Conselho da Justiça Federal (ou aquele que estiver em vigor na fase de liquidação de sentença). Os juros de mora deverão incidir até a data da expedição do PRECATÓRIO/RPV, conforme entendimento consolidado pela colenda 3ª Seção desta Corte. Após a devida expedição, deverá ser observada a Súmula Vinculante 17.
17. A questão relativa ao termo inicial dos efeitos financeiros dos benefícios previdenciários concedidos ou revisados judicialmente, por meio de prova não submetida ao crivo administrativo do INSS (se a contar da data do requerimento administrativo ou da citação da autarquia previdenciária), encontra-se em discussão no E. Superior Tribunal de Justiça, no regime de julgamento de recursos repetitivos (Tema n. 1.124), nos termos do art. 1.036 do CPC/2015. Não se aplica o Tema 1.124 à hipótese dos autos, considerando que os documentos referidos no voto, que embasaram o reconhecimento dos períodos especiais pleiteados pela parte autora, já integravam os autos do respectivo processo administrativo da parte autora, sendo de conhecimento do próprio INSS já à época do requerimento do benefício previdenciário, não se tratando, pois, de hipótese de inovação da prova, de tal sorte a manter a fixação da DIB e seus respectivos efeitos financeiros, na data da DER.
18. Com relação aos honorários advocatícios a serem suportados pelo INSS, tratando-se de sentença ilíquida, o percentual da verba honorária deverá ser fixado somente na liquidação do julgado, na forma do disposto no art. 85, § 3º, § 4º, II, e § 11, e no art. 86, todos do CPC, e incidirá sobre as parcelas vencidas até a data da decisão que reconheceu o direito ao benefício (Súmula 111 do STJ).
19. No que diz respeito à aplicação da Súmula 111/STJ, o E. Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1883715/SP, submetido à sistemática de recurso repetitivo, atinente ao Tema 1.105, fixou a seguinte tese: "Continua eficaz e aplicável o conteúdo da Súmula 111/STJ (com a redação modificada em 2006), mesmo após a vigência do CPC/2015, no que tange à fixação de honorários advocatícios". Por ocasião do julgamento, inclusive dos embargos de declaração opostos, destacou-se que as parcelas que haverão de integrar a base de cálculo dos honorários sucumbenciais, nas lides previdenciárias, são aquelas devidas até o momento do pronunciamento favorável à concessão do benefício, tanto em primeira quanto em segunda instância, ou ainda no âmbito dos recursos especial ou extraordinário. Não prospera a alegação da parte autora de que a ausência de um comportamento protelatório do patrono é motivo para o afastamento da Súmula 111/STJ, "por evidente distinguishing com a ratio decidendi do REsp 1.883.715/SP, o qual serviu de leading case para o julgamento do tema 1105/STJ", pois o critério definido para sua aplicação é objetivo, não tendo sido indicada qualquer ressalva pelo C. STJ.
20. Reconhecido o direito da parte autora à aposentadoria por tempo de contribuição, a partir do requerimento administrativo (D.E.R. 09.12.2019), ante a comprovação de todos os requisitos legais.
21. Matéria preliminar rejeitada. Apelação da parte autora parcialmente provida. Apelação do INSS desprovida Fixados, de ofício, os consectários legais.
